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20 años de transgénicos en Brasil: reflexiones para Lula 3.0
20 years of GMOs in Brazil: reflections for Lula 3.0
20 anos de transgênicos no Brasil: reflexões para Lula 3.0
Estudios Rurales. Publicación del Centro de Estudios de la Argentina Rural, vol. 13, núm. 27, 2023
Universidad Nacional de Quilmes

Artículos

Estudios Rurales. Publicación del Centro de Estudios de la Argentina Rural
Universidad Nacional de Quilmes, Argentina
ISSN: 2250-4001
Periodicidade: Semestral
vol. 13, núm. 27, 2023

Recepção: 08 Março 2023

Aprovação: 17 Maio 2023

Resumo: Quase 90% da área plantada de soja e milho no Brasil são cultivos transgênicos. A autora apresenta características dos cultivos aprovados para refletir sobre aplicação do princípio da precaução e deveres do Estado para a garantia da soberania e da segurança alimentar. Trata-se de estudo descritivo de análise bibliográfica e pesquisa documental. Resultados mostram que: duas empresas detêm a patente de 38 dos 74 eventos autorizados, cujas características são a tolerância a herbicidas e a resistência a insetos; não houve respeito ao princípio da precaução; soberania e segurança alimentar são ameaçadas pelo monopólio das sementes e conflitos entre a lei de segurança alimentar e liberações baseadas na equivalência substancial. É urgente que Lula inicie a transição agroecológica.

Palavras-chave: alimentos transgênicos, princípio da precaução, segurança alimentar.

Resumen: Casi el 90% del área sembrada de soja y maíz en Brasil son cultivos transgénicos. El autor presenta características de estos cultivos para reflexionar sobre la aplicación del principio de precaución y los deberes del Estado para garantizar la soberanía y la seguridad alimentaria. Lo estudio es descriptivo, bibliográfico y documental. Los resultados muestran que: dos empresas poseen la patente de 38 de los 74 eventos autorizados, cuyas características son tolerancia a herbicidas y resistencia a insectos; no se respeta el principio de precaución; la soberanía y la seguridad alimentaria se ven amenazadas por el monopolio de las semillas y los conflictos entre la ley de seguridad alimentaria y las liberaciones basadas en la equivalencia sustancial. La transición agroecológica es urgente.

Palabras clave: alimentos modificados genéticamente, principio de precaución, seguridad alimentaria.

Abstract: Almost 90% of the planted area of soybean and corn in Brazil are transgenic crops. The author presents characteristics of these approved crops to reflect on the application of the precautionary principle and duties of the State to guarantee the sovereignty and food security. It is a descriptive study of bibliographic analysis and documentary research. Results show that: two companies hold the patent of 38 of the 74 authorized events, whose characteristics are herbicide tolerance and insect resistance; there was no respect for the precautionary principle; sovereignty and food security are threatened by the monopoly of seeds and conflicts between food security law and releases based on substantial equivalence. It is urgent that Lula begin the agroecological transition.

Keywords: genetically modified food, precautionary principle, food security.

Introdução

Em março de 2003, o Presidente Lula assinou a primeira Medida Provisória (MP 113) liberando a comercialização no Brasil da produção de soja da safra daquele ano, fruto do cultivo de sementes geneticamente modificadas contrabandeadas da Argentina. Em setembro do mesmo ano, o Vice-Presidente assinaria a MP 131, referente ao plantio e comercialização da produção de soja da safra de 2004. No ano seguinte, Lula assinou a MP 223, para liberar o plantio da soja geneticamente modificada da safra 2004–2005 (Fernandes, 2005). O pedido para cultivo comercial dessa soja havia sido feito em 1998, mas por decisão judicial estava suspensa a autorização dada, devido à não apresentação de estudos e relatórios de impacto ambiental (EIA/RIMA), porém as sementes continuaram chegando ao Brasil e sendo utilizadas (Menasche, 2000).

Na campanha presidencial de 2002, porém, o então candidato Lula havia se comprometido em apoiar uma moratória à liberação do cultivo comercial e da comercialização de transgênicos[1] no Brasil, por tempo indeterminado, reconhecendo, em seu programa de governo, no Projeto Fome Zero, que os transgênicos poderiam promover poluição genética e maior dependência dos produtores dessa tecnologia, além não serem solução para o problema da fome, estando ainda associados ao uso de herbicidas (Fernandes, 2005). O fato é que, em menos de duas décadas, após as medidas provisórias, que abriram caminho para a legalização dos transgênicos, o Brasil passou a fazer parte dos top five em área plantada com cultivos transgênicos, superado apenas pelos EUA e seguido por Argentina, Canadá e Índia. Em termos de área plantada, o Brasil passou de “5 milhões de hectares plantados em 2004 para 53 milhões, com os transgênicos ocupando, em 2019, quase 95% da área plantada com soja, 88% com milho e 85% com algodão, além de plantações de cana-de-açúcar, feijão e eucalipto” (Colli, 2021, p. 99).

Na verdade, esperava-se que o Brasil passasse a cultivar transgênicos oficialmente já a partir do ano 2000 (James, 1999). A primeira aprovação para uso comercial de um alimento geneticamente modificado deu-se nos EUA, em 1994, tratava-se do tomate FlavrSavr™ da Calgene, de amadurecimento retardado, que foi um fracasso de vendas. No mesmo ano, a Monsanto entrou com pedido de comercialização da sua soja (Round up Ready® ou soja RR®), geneticamente modificada para tolerar o glifosato, herbicida cuja patente estava para expirar em 2000; tratava-se do “primeiro OGM de amplo cultivo no mundo” (Robin, 2008, p. 157). A partir de então, nenhuma nova tecnologia adotada pela indústria agrícola teve um padrão tão alto de adoção quanto as culturas transgênicas, já que entre os anos de 1998 e 1999 reportou-se um aumento de 44% em hectares de cultivos transgênicos no mundo; em 1996, havia 1,7 milhão de hectares, passando a 39,9 milhões de hectares em 1999 (James, 1999). Relacionado a isso, temos a formação de oligopólios no mercado agrícola, que inclui não apenas as sementes transgênicas, mas também sementes convencionais, fertilizantes e agrotóxicos, em um ambiente cada vez menos transparente de financeirização (Etc Group, 2022).

Segundo ex-presidentes da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBIO), órgão responsável pela criação de normas de avaliação e gestão de riscos e pelas autorizações de cultivos transgênicos no Brasil, “os debates sobre o uso de vegetais GM foram muito intensos. Não sem razão. O Brasil foi o primeiro país do mundo tropical a adotar o plantio em larga escala de vegetais geneticamente modificados” (Barroso, Finardi e Felipe, 2021, p. 165), indicando que estes ex-presidentes entenderam que não podiam transferir a realidade dos países temperados para nossas condições.

Os debates, no entanto, não foram suficientes e houve críticas à falta de transparência nas ações da CTNBio, à pouca participação popular nos processos de liberação, bem como ao desrespeito ao princípio da precaução, que tem amparo constitucional (Andrioli e Fuchs, 2008; Mariconda, 2014; Zanoni e Ferment, 2011; Ferreira e Terra, 2017; Fonseca e Guivan, 2019). A maioria da população brasileira não tem conhecimento bastante sobre o que são alimentos transgênicos, suas principais preocupações são a informação sobre a presença transgênicos nos alimentos e a falta de informação sobre os efeitos do consumo, para sua saúde, a longo prazo, o que tem gerado desconfianças (Furnival e Pinheiro, 2008, 2009; Castro et al., 2014). Além disso, a difusão das plantas transgênicas no mundo trouxe uma questão fundamental ao debate político sobre a segurança dos alimentos transgênicos, como aponta Fonte (2004): quem vai controlar este novo sistema agroalimentar? Qual o grau de monopólio que será aceito ou aceitável? Quais as consequências sociais e ambientais de uma eventual concentração de poder na indústria?

Diante deste cenário dominado por disputas judiciais, polêmicas, controvérsias e incertezas, 20 anos após as primeiras Medidas Provisórias que liberaram a soja transgênica no país, e considerando o terceiro mandato do Presidente Lula, o estudo tem por objetivo analisar criticamente as aprovações feitas pela CTNBio para comercialização de sementes de milho e soja transgênicas no Brasil até dezembro de 2022, e elaborar algumas reflexões que possam ser consideradas pelo governo que se inicia, à luz da aplicação do princípio da precaução e dos deveres do Estado para a garantia da soberania e da segurança alimentar. Para tanto, foi feita uma revisão narrativa de literatura sobre o estado da arte da liberação e regulação de transgênicos no Brasil, Europa e Estados Unidos, em que se destaca a oposição entre a utilização da equivalência substancial e do princípio da precaução neste processo. Em seguida, apresenta os resultados da pesquisa no banco de dados da CTNBio sobre as sementes transgênicas de milho e soja que foram liberadas para cultivo comercial, para relacionar com o arcabouço jurídico-normativo da biossegurança e da segurança alimentar em vigor até o ano de 2022.

Espera-se contribuir para a retomada do debate sobre a liberação de transgênicos no país, no contexto da defesa do direito humano à alimentação adequada.

Revisão bibliográfica

Os primeiros organismos geneticamente modificados (OGM) foram desenvolvidos nos anos 70. Na Conferência de Asilomar que ocorreu na Califórnia, em 1975, os biólogos moleculares ali reunidos, em razão dos riscos concernentes ao uso confinado de OGM em laboratório, decidiram estabelecer uma moratória – que durou apenas um ano – para três experimentos, recomendando, tanto a precaução, dada a imprevisibilidade dos seus efeitos, como o adiamento, até que fossem melhor avaliados os seus perigos, donde resultaram diretrizes para a biossegurança de pesquisas com OGM confinados (Cascais, 2007; Pelaez, 2010). Esteve ausente dos debates à época, o uso agrícola e a fabricação de plantas geneticamente modificadas para serem lançadas no ambiente (Apoteker, 2011).

O uso comercial de OGM chegou ao mercado, não na forma de alimentos, mas de proteínas usadas em vacinas e medicamentos, como a insulina, e não gerou contestações nem polêmicas. Para Ferment (2011), isso pode ser explicado por dois motivos: este uso representou um passo técnico importante para a comunidade científica no atendimento a necessidades sociais, e porque os usuários destas novas tecnologias poderiam ser monitorados, permitindo a detecção de efeitos secundários da tecnologia sobre a saúde humana e a intervenção das autoridades públicas caso necessário. Outras diferenças importantes: o que se consome, por exemplo, no caso da insulina, é o produto de expressão do transgene (a proteína recombinante), uma vez que os OGM propriamente ditos, proteínas e vírus que produzem as proteínas de interesse terapêutico, são descartados após o isolamento e a purificação dos seus produtos de síntese; além disso, trata-se de OGM confinados em laboratórios. Com as plantas transgênicas, o processo e os riscos são diferentes, uma vez que, liberadas no meio ambiente, estes seres vivos podem transferir material genético para outros organismos (Ferment, 2011). Por este motivo, afirmou o então ativista do Greenpeace Arnaud Apoteker: “as consequências dos cultivos geneticamente modificados sobre o meio ambiente, o modo de vida e a escolha do modelo agrícola, necessitam um debate público indubitavelmente maior do que o uso de OGM em meio confinado” (2011, p. 85). Os debates sobre o tema, envolvendo os mais diversos atores, são quase sempre permeados por controvérsias e polarizações (Lacey, 2006; Camara et al., 2013; Mariconda, 2014, Barroso et al., 2021)

No negócio de sementes, a Monsanto foi pioneira. Os primeiros testes de campo ocorreram em 1986, na França e nos EUA, com a cultura do tabaco resistente a herbicida (International Service for the acquisition of agri-biotech applications [ISAAA], 1996). Neste mesmo ano, o Escritório de Política Científica e Tecnológica da Casa Branca (OSTP) emitiu uma diretiva criando uma Estrutura Coordenada para a Regulamentação da Biotecnologia, estabelecendo que os produtos da biotecnologia seriam regulamentados no âmbito das leis federais já existentes, não cabendo novas regulamentações (Robin, 2008). Foi com base no conceito da equivalência substancial que não foi feita regulamentação específica para transgênicos nos EUA, nem se considerou, até o ano de 2022, a necessidade de rotulagem[2], diferente do que ocorreu na Europa, onde houve moratória no tocante ao cultivo de transgênicos e a regulamentação optou pelo princípio da precaução, caso a caso, além de estabelecer a indicação no rótulo para garantir o direito do consumidor à informação sobre alimentos transgênicos (Saija, 2017; Errigo, 2020; Ferment, 2008). A União Europeia, ao disciplinar os OGM, adotou o princípio da precaução, seja na Diretiva nº 18 (2001), relativa à libertação deliberada de OGM no ambiente, seja no Regulamento nº 178 (2002), que determina os princípios e normas gerais da legislação alimentar – o que inclui regras de rastreabilidade e rotulagem para identificar os alimentos transgênicos –, além de instituir a Autoridade Europeia de Segurança Alimentar, encarregada da avaliação de risco dos OGM sobre a saúde e o meio ambiente (Saija, 2017).

Outra característica do processo nos EUA foi a contínua simplificação, como forma de incentivar a biotecnologia no país, o que não se deu sem controvérsias (Lacey, 2006; Pizella e Souza, 2016; Fernandes, 2015). Também no Brasil, a ideia de flexibilidade na regulamentação esteve presente, quando se formou um grupo de especialistas, em 1994, para formulação das primeiras normas de biossegurança; o grupo não considerou necessário ter uma lei, nem que a biotecnologia trouxesse algum novo risco; somente os produtos da biotecnologia deveriam ser avaliados, mas pelos órgãos reguladores já existentes (Pelaez, 2010). De fato, estudos que buscam comparar a regulação de OGM no Brasil com o processo europeu e norte-americano apontam que nosso sistema se aproxima mais do modelo norte americano liberal (Pizella e Souza, 2016; Moriconi et al., 2014). Isso se deve à escolha entre aplicar o conceito de equivalência substancial ou o princípio da precaução (PP).

O conceito de equivalência substancial foi introduzido pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), no ano de 1993 e adotado, em seguida, pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) e Organização Mundial de Saúde (OMS), em 1996. Foi proposto no contexto da determinação de segurança de alimentos e componentes alimentares derivados de organismos desenvolvidos pela aplicação da moderna biotecnologia, os quais seriam substancialmente equivalentes aos seus análogos convencionais. A ideia era considerar que os organismos já existentes utilizados como alimentos serviriam de base para comparação quando se quisesse avaliar a segurança do consumo humano de um alimento ou componente alimentar que tivesse sido modificado ou que fosse novo; e uma vez sendo substancialmente equivalentes, os novos alimentos seriam considerados da mesma forma que sua contraparte convencional; se não é substancialmente equivalente, então as diferenças identificadas devem ser foco de avaliações posteriores (OCDE, 1993, pp. 14-15).

Diversas contestações podem ser feitas ao conceito de equivalência substancial, desde questões epistêmicas, que questionam sua cientificidade, dada a imprecisão, uma vez que nunca se definiu o grau de variação tolerada, até seu caráter como princípio regulador, uma vez que não prevê avaliação de toxicidade, além de apresentar uma contradição básica, pois, por exemplo, se o milho transgênico é substancialmente equivalente ao milho não transgênico e, por isso, não precisa ser rotulado, por que, então, foi patenteado como nova invenção? (Millstone et al., 1999; Ferment, 2008, 2011; Lacey, 2008; Fernandes, 2015; Zaterka, 2019).

Da outra parte, o PP acompanha o avanço da biotecnologia desde os seus primórdios, na Carta Mundial da Natureza da Comunidade Europeia (1982), nas Conferências do Meio Ambiente de Estocolmo (1972) e do Rio de Janeiro (1992), bem como no Protocolo de Cartagena (2000), do qual o Brasil é signatário (Wedy, 2009; Platiau e Varella, 2004). Na Declaração do Rio (1992), afirmou-se em seu princípio 15 que “Com a finalidade de proteger o meio ambiente, os Estados deverão aplicar amplamente o critério de precaução conforme suas capacidades”. De acordo com Rios, ao ser inserido na Declaração do Rio, “o princípio da precaução foi elevado à categoria de regra do direito internacional” (2004, p. 4). Um dos resultados da Rio-92 foi a Agenda 21, em cujo capítulo 35, que trata da Ciência para o desenvolvimento sustentável, reafirma-se que “diante das ameaças de danos ambientais irreversíveis, a falta de conhecimentos científicos não deve ser desculpa para postergar a adoção de medidas que se justifiquem por si mesmas” (35.3). O que se pretendia, já naquele momento, era adotar a precaução como “base para políticas relativas aos sistemas complexos que ainda não são plenamente compreendidos e cujas consequências de perturbações não podem ainda ser previstas” (35.3). Foi ainda na Rio-92 que foi assinada a Convenção da Diversidade Biológica (CDB), da qual faz parte o Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança, primeiro documento que tem como escopo os OGM, como se lê no art. 4º: “todos os organismos vivos modificados que possam ter efeitos adversos na conservação e no uso sustentável da diversidade biológica, levando também em conta os riscos para a saúde humana”. Verifica-se, assim, que a precaução não se restringe a danos ambientais, como foi, inicialmente, pensada. O Protocolo explicitamente está voltado aos OGM, embora utilizando outra nomenclatura, e estabelece diretrizes para regulamentação do movimento transfronteiriço de qualquer organismo vivo que tenha uma combinação de material genético inédita obtida por meio do uso da biotecnologia moderna.

No texto original do projeto da primeira Lei de Biossegurança brasileira que chegou ao Senado, em 1992, havia explicitamente a exigência de EIA/RIMA para atividades relacionadas aos OGM, de modo a se conformar à Constituição, mas houve alteração para deixar a cargo da CTNBIO escolher se cabia ou não a exigência. Embora essa discricionariedade da Comissão tenha sido matéria de Decreto, por ter sido vetada do projeto de lei, esse foi o núcleo de toda a controvérsia na liberação de transgênicos no Brasil, sobretudo, porque a Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) nº 237 (1997) reconhecia a introdução de espécies exóticas e/ou geneticamente modificadas como sujeitas ao licenciamento ambiental, como efetiva ou potencialmente poluidora ou causadora de degradação ambiental, cabendo, portanto, a exigência do EIA/RIMA.

Para ex-presidentes da CTNBio (2021), foi a demora da decisão sobre a necessidade ou não do EIA/RIMA que levou os agricultores do Rio Grande do Sul a plantarem soja da Monsanto com sementes trazidas da Argentina. Convém observar que na Argentina, a introdução de sementes transgênicas, em 1996, se deu quando a Monsanto renunciou ao patenteamento da semente da sua soja RR®, vendendo apenas o glifosato, embora seja conhecida a sua prática de processar agricultores por violação de patentes (Andrioli e Fuchs, 2008).

Além do conflito entre legislação ambiental e Lei de Biossegurança, as liberações de transgênicos devem ser analisadas também no contexto de outro importante marco legal. A Lei Orgânica da Segurança Alimentar (LOSAN) – Lei nº 11.346 (2006), regulamentada pelo Decreto nº 7.272 (2010) – que criou o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN), com vistas a assegurar o direito humano à alimentação adequada. Em estudo feito sobre a produção científica brasileira, no campo da saúde pública, sobre os OGM, no que concerne à (in)segurança alimentar, concluiu-se que, de fato, não se aborda a segurança, mas a insegurança dos alimentos geneticamente modificados (Camara et al., 2009).

Os alimentos transgênicos estão, portanto, no ponto de união entre uma intrincada relação que une ciência, direito, precaução, soberania e segurança alimentar, em um contexto que não escapa do debate político (Zanoni e Ferment, 2011; Guivan, 2001).

Percurso metodológico

Foi feito um estudo descritivo, de abordagem quantitativa, utilizando os procedimentos de pesquisa bibliográfica e documental (Sá-Silva, Almeida e Guindani, 2009). Inicialmente, foi feita uma revisão narrativa de literatura sobre o estado da arte da liberação e regulação de transgênicos no Brasil, na Europa e Estados Unidos. Este tipo de revisão, mais simplificada, pode ser útil na descrição do estado da arte de um assunto específico, para uma abordagem mais livre sob o ponto de vista teórico ou contextual (Grant e Booth, 2009; Souza et al., 2018), estando, portanto, a seleção dos estudos e a interpretação das informações, sujeitas à subjetividade da autora. Foram elaboradas fichas de leitura a partir da pesquisa bibliográfica, incluindo documentos jurídicos, para organizar cronologicamente fatos marcantes no processo histórico e político da liberação de sementes transgênicas nos EUA e Europa, para relacionar com o caso brasileiro, objeto do estudo.

O corpus documental da pesquisa foi constituído, a partir de fontes secundárias de dados, por arquivos digitais de documentos eletrônicos que representam registros oficiais com finalidade de comunicação, disponíveis para download em portais de público acesso. Para a coleta de dados, foi localizada a tabela resumo das plantas transgênicas aprovadas para comercialização no Brasil, mediante consulta ao site oficial da CTNBio (http://ctnbio.mctic.gov.br/inicio), aba “Serviços da CTNBio”, “liberação comercial”, pasta “plantas”, subpasta “tabela de plantas – uso comercial”; para tratamento dos dados, foi feito o download deste arquivo em PDF, que recebeu o nome de ‘tabela original’. Foram selecionados e copiados da tabela original para uma planilha elaborada pela autora apenas os dados referentes às liberações de soja e milho, incluídas no estudo porque são as plantas preponderantemente utilizadas na alimentação humana e são as que representam o maior percentual de área plantada (Finardi e Sbambato, 2021). Para compor o banco de dados da pesquisa, foram construídas novas planilhas individuais, uma de soja e outra de milho, com as seguintes categorias analíticas selecionadas para o estudo: OGM, detentor da patente, característica fornecida pela manipulação genética, ano da solicitação de autorização do cultivo e ano da aprovação do cultivo comercial. O ano da solicitação foi considerado na análise da distribuição de frequência das plantas autorizadas, segundo suas características e seus detentores, ao passo que o ano da aprovação do pedido foi utilizado para a análise histórica das liberações ao longo do período estudado.

A pesquisa foi realizada no período de junho de 2021 a dezembro de 2022; a última visita à página da CTNBio para verificação de atualização dos dados da tabela original foi feita em 10 de dezembro de 2022, observando-se que a data de atualização do arquivo com a planilha original era 15/02/2022. Para complementar ou esclarecer dados da tabela original, foi feita a consulta diretamente aos pareceres técnicos, obtidos na mesma página da CTNBio, aba “Serviços da CTNBio”, “liberação comercial”, pasta “plantas”, subpasta “soja” e subpasta “milho”. Planilhas, tabelas e gráficos foram construídos utilizando o Microsoft® Excel® para Microsoft 365 MSO (Versão 2203 Build 16.0.15028.20218) 64 bits. O tratamento dos dados para apresentação dos resultados foi feito utilizando medidas de estatística descritiva. A análise crítica dos resultados teve como referência o arcabouço jurídico-normativo da biossegurança e da segurança alimentar atualmente em vigor no Brasil.

Resultados e discussão

Em julho de 1998, no governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC), a Monsanto enviou pedido à CTNBio para liberação do cultivo, em escala comercial, da soja geneticamente modificada para tolerar o herbicida glifosato, a soja RR®. No pedido, a empresa solicitava desregulamentação dos aspectos de biossegurança do produto, alegando, dentre outras coisas que: a soja já estava aprovada em outros países, seu plantio já estava disseminado na Argentina e nos EUA , o gene de resistência ao glifosato inserido na planta era inócuo e o glifosato era biodegradável e não cumulativo no solo; outra importante alegação feita pela Monsanto foi a decisão anterior da CTNBio que havia liberado a importação de soja RR®, afirmando em seu parecer que a mesma era equivalente à soja não-transgênica (Pelaez, 2010). De fato, em setembro de 1997, a CTNBio havia concedido à Ceval Alimentos (adquirida posteriormente pela Bunge) autorização para comercializar óleo feito a partir de soja transgênica importada dos Estados Unidos (Menasche, 2000). A aprovação do pedido da Monsanto foi concedida pela CTNBio, mediante decisão expressa no Comunicado nº 54 (1998), sem a exigência de realização do EIA/RIMA.

A partir daí, teve início uma série de disputas judiciais contra a autorização da soja da Monsanto. A Lei de Biossegurança em vigor não trazia explicitamente a defesa do princípio da precaução, mas o art. 225, § 1º, IV, da Constituição Federal (1988) que exige, na forma da lei, o estudo prévio de impacto ambiental, “para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente”, encontra amparo naquele princípio. Além disso, os artigos da lei que tratavam da criação e competências da CTNBio tinham sido vetados; somente com sua regulamentação, dada pelo Decreto nº 1.752 (1995), foi criada a Comissão e estabelecidas suas competências, dentre as quais, a exigência do EIA/RIMA nos processos de liberação de OGM, “como documento adicional, se entender necessário” (art. 2º, XIV), ou seja, além da CTNBio poder decidir se era ou não o caso de exigir o EIA/RIMA, esta competência foi dada por Decreto, e não por Lei, como exige o inciso IV do §1º do artigo 225 da Constituição (Guimarães, 2021).

Com base na falta do EIA/RIMA (não exigido pela CTNBio) e na falta de definição de critérios de biossegurança para autorização e comercialização de OGM, incluindo a rotulagem, as entidades IDEC e Greenpeace (Instituto Brasileiro do Meio ambiente e Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), posteriormente, entrou na ação) conseguiram decisões favoráveis na justiça, as quais estabeleceram, tanto a rotulagem do óleo de soja transgênica importada, como a proibição da União de autorizar o plantio comercial da soja transgênica, até que a CTNBIO possuísse normas que regulamentassem o controle, fiscalização e liberação de transgênicos no país, com a realização dos EIA, além da segregação de cultivos transgênicos. O prosseguimento da ação judicial levou, em junho de 2000, à decisão definitiva do juiz que declarou inconstitucional o art. 2º, XIV, do Decreto nº 1.752(1995) e estendeu a proibição do cultivo e da comercialização da referida soja a todos os OGM. Nesta ação, a União estava ao lado da Monsanto, o que levou o IBAMA a se retirar, dado o conflito com outros setores governamentais.

Em meio às disputas judiciais da liberação da soja transgênica, a Lei nº 10.165 (2000) alterou a Lei nº 6938 (1981), que instituiu a Política Nacional de Meio Ambiente, para incluir a introdução de espécies exóticas ou geneticamente modificadas e o uso da diversidade biológica pela biotecnologia no rol de atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos ambientais. Com isso, acirrou-se o conflito entre a Lei de Biossegurança (que não abordava a exigência do EIA/RIMA) e a Legislação ambiental. Na tentativa de solucionar a questão, uma Medida Provisória alterou a Lei de Biossegurança, para incluir um artigo estabelecendo a competência da CTNBio para identificar as atividades decorrentes do uso de OGM e derivados potencialmente causadoras de significativa degradação do meio ambiente e da saúde humana. O art. 1º - D, XIV estabeleceu, dentre outras, a competência da CTNBio para “emitir parecer técnico prévio conclusivo, caso a caso, sobre atividades, consumo ou qualquer liberação no meio ambiente de OGM, incluindo sua classificação quanto ao grau de risco e nível de biossegurança exigido [...]”.

O conflito de competências entre legislação ambiental e legislação de biossegurança só foi resolvido judicialmente, em segunda instância, em fevereiro de 2002, quando o tribunal decidiu que deveria prevalecer o disposto na Lei nº 8.974 (1995). Assim sendo, após a suspensão judicial do primeiro pedido autorizado pela CTNBIO, em 1998, foi somente no governo Lula, e mediante MP, que as safras de soja foram liberadas para comercialização, em 2003 e 2004. Contudo, tão logo se deu a aprovação da nova Lei de Biossegurança, em 2005, o Procurador Geral da República propôs uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI 3526) contra as competências da CTNBio para avaliação da biossegurança na área ambiental[3]. Esta ADI ainda se encontra no STF, tendo última movimentação em setembro de 2021, após pedido de vistas do Ministro Gilmar Mendes (https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=2305630). IDEC e Greenpeace seguem participando desta ação como interessados, assim como a entidade Terra de Direitos.

Liberação das plantas transgênicas de soja e milho pela CTNBio: 20 anos de expansão após o fato consumado

Enquanto a disputa no âmbito dos tribunais ainda está em curso, a CTNBio segue liberando cultivos transgênicos. Os resultados apresentados na Tabela 1 mostram que foram autorizados 18 eventos[4] de soja transgênica e 56 de milho transgênico para cultivo comercial no Brasil no período do estudo. As características obtidas pela manipulação genética destes eventos de soja e milho reproduzem o padrão mundial do que se considera a primeira onda das plantas transgênicas (Fernandes, 2015), predominando, na soja, a tolerância a herbicida, de modo isolado ou combinado com outras características, e no milho, uma combinação de tolerância a herbicidas e resistência a insetos.


Tabela 1

Distribuição do nº de plantas transgênicas de soja e milho, por característica, liberadas para cultivo comercial, pela CTNBio, no período 1998-2022, Brasil

*Outras: tolerância à seca e perfil de ácido graxo modificado; **Outra(s) em milho: restauração de fertilidade para produção de sementes; aumento de termoestabilidade de amilase; estresse a seca; em soja: resistência a nematoide e seletividade aos herbicidas inibidores da HPPD.

Para Marinho e Gomez (2004) a forma de atuação das instâncias governamentais brasileiras na liberação de transgênicos “constituiu um importante foco gerador de conflitos” (p. 96). Exemplo disso, quanto à exigência do EIA/RIMA, jamais solicitada pela CTNBio, o primeiro presidente da Comissão afirmou que essa questão não fazia sentido, no caso das plantas transgênicas, pois “Como estudar impacto ambiental de uma árvore ou arbusto?” (Colli, 2021, p. 93). Se para o mais longevo membro da CTNBio, até a aprovação da nova lei, em 2005, “Foram sete anos em que pouco se investiu em biotecnologia no Brasil, dificultando a geração de know-how e massa crítica no setor de biotecnologia em nosso país” (Nepomuceno, 2021, p. 11), para Fernandes (2015), a primeira década de vigência da nova lei foi marcada pela ausência de rigor científico nos processos de aprovação dos transgênicos no Brasil. Pode-se dizer que foi a falta de rigor científico que gerou as disputas judiciais, pois foram embasadas no desrespeito à Constituição pela não exigência de EIA/RIMA.

A partir de 2005, dentro do marco legal da nova Lei de Biossegurança, as primeiras autorizações concedidas pela Comissão foram de milho, em 2007, referentes a pedidos feitos ainda em 1998, 1999 e 2000, pela Bayer (Liberty link/T25 – tolerante ao glufosinato de amônio), Monsanto (MON810 – resistente a insetos) e Syngenta (Bt11 – resistente a insetos), respectivamente.

O caso do milho é emblemático, especialmente, devido ao problema da coexistência e consequente contaminação, considerando as deficiências no processo regulatório, do que resultou, mais uma vez, em suspensão judicial do Liberty link, até que fossem apresentados planos de coexistência e de monitoramento. Posteriormente, com o estabelecimento de normas de monitoramento e de coexistência pela CTNBio em agosto de 2007, a liminar que suspendia a autorização de milho transgênico foi cassada, e este evento e o MON810 foram autorizados para fins comerciais, em março de 2008 (Ferment et al., 2009). Repetem-se, assim, os questionamentos judiciais que têm marcado a história da liberação de transgênicos no Brasil.

Liberação das plantas transgênicas de soja e milho pela CTNBio: os primeiros 20 Anos e as ameaças à soberania e segurança alimentar

A transgenia pode ser considerada um passo adiante no mesmo modelo de industrialização da agricultura implantado pela Revolução Verde, que se fundamentou em reducionismo científico e estratégias de controle da natureza, apresentando-se com promessas jamais cumpridas, como o fim da fome e a redução do consumo de agrotóxicos (Shiva, 1997; Ferment, 2011; Lacey, 2006; Carneiro et al., 2015). O avanço do capital sobre as sementes, fazendo desta mais uma de suas mercadorias, abrigadas pelo direito de propriedade, é um fenômeno mundial, que teve no Brasil um lócus privilegiado para se desenvolver, facilitado pela histórica concentração de terras e opção de política econômica para manter um modelo de exportação de riquezas naturais, sustentado pela desregulação (Lima, 2021; Carneiro et al., 2015).

Em estudo que analisou o impacto da adoção das culturas transgênicas sobre a demanda de agrotóxicos, observou-se que o uso total de agrotóxicos no Brasil aumentou 1,6 vezes entre os anos de 2000 e 2012, com destaque para uso na cultura de soja, que aumentou mais de 3 vezes; além disso, no período de 2000 a 2012, o uso de agrotóxicos per capita aumentou 7%, enquanto a produtividade aumentou apenas 3,5% (Almeida et al., 2017). Disso resulta que os cultivos transgênicos contribuíram para o aumento no uso de agrotóxicos, sendo que herbicidas à base de glifosato, respondem por mais da metade de todo o consumo de agrotóxicos no Brasil (Ministério da Saúde, 2016, p. 13). O crescimento da área de produção de transgênicos é acompanhado de um crescimento muito maior na utilização de pesticidas, não apenas no Brasil (Fernandes, 2019; Carneiro et al., 2015), como também nos EUA (Benbrook, 2009).

O aumento de cultivos tolerantes a pesticidas deve ser uma preocupação para a segurança alimentar e para a sustentabilidade, dado o surgimento de superpragas, a contaminação do solo, lençol freático e danos à saúde dos trabalhadores (Benbrook, 2009;Carneiro et al., 2015). Os perigos do glifosato, herbicida usado desde os primeiros cultivos transgênicos, são amplamente conhecidos, tendo sido classificado como provavelmente cancerígeno para humanos pela International Agency for Research on Cancer (IARC, WHO, 2015). Quanto aos cultivos Bt, seus riscos também já foram amplamente divulgados, inclusive na Europa, tendo sido um dos motivos para a moratória na França (Ferment, 2008). Em 2011, foi constatada a presença da toxina Bt do milho transgênico MON 810, em sangue de mulheres grávidas e seus fetos (Aris e Leblanc, 2011). Nos EUA, o milho StarLink, contaminou a cadeia de alimentos, com a suspeita de que as propriedades da proteína transgênica pudessem desencadear reações alérgicas (Almeida Júnior e Mattos, 2005). O maior estudo já feito com ratos alimentados com milho transgênico tolerante ao glifosato (NK 603 da Monsanto, também aprovado no Brasil), coordenado pelo cientista francês Gilles-Eric Séralini, mostrou resultados preocupantes, dentre eles, mortalidade mais alta e frequente, além de tumores mamários e problemas hipofisários e renais nas fêmeas e deficiências crônicas em fígado e rins de machos (Séralini et al., 2012). Todos estes eventos, aprovados no Brasil, estão sendo cultivados e consumidos pela população brasileira.

Os resultados apontam para o conflito entre as liberações de soja e milho, objeto do estudo, e os marcos jurídicos da segurança alimentar estabelecidos no Brasil. A Tabela 2 mostra que apenas duas empresas – a Monsanto e a Syngenta – são detentoras de 38 dos 74 eventos autorizados de soja e milho no Brasil, portanto, mais da metade.


Tabela 2

Distribuição do n° de cultivos transgênicos de soja e milho autorizados pela CTNBio, por detentor, no período 1998 -2022, Brasil

Para o epidemiologista Jaime Breilh (2015), o monopólio do agronegócio está entre os obstáculos do século 21 para se construir sociedades saudáveis, pelo modelo de agricultura que “destrói as fontes alimentares e culturais da soberania cultural” (p. 41). A concentração de poucas empresas no mercado mundial de sementes transgênicas é uma realidade geradora de grandes preocupações, quando se discute soberania alimentar, dado o poder do capital sobre as sementes (Berlan, 2011; Lima, 2021), que podem ser consideradas um patrimônio da humanidade, dos povos cultivadores (Fernandes, 2007; Machado et al., 2003). Uma arma poderosa para o enfrentamento deste poder é a organização da sociedade, como se viu no caso das tentativas da Syngenta em patentear sementes com a tecnologia Terminator e de uma patente de ampla cobertura, sobre várias sequências genéticas vitais do arroz, que foram barradas, graças à ação do Grupo ETC (Ribeiro, 2011). Para Fonseca e Guivant (2019), no entanto, com a aprovação da nova Lei de Biossegurança, em 2005, ocorreu um movimento de enfraquecimento político do movimento contrário ao processo de transgenização da agricultura, ao mesmo tempo em que crescia a área de produção transgênica e a aprovação comercial de novas variedades de OGM. De fato, no caso da rotulagem de alimentos transgênicos, transita no Senado projeto já aprovado na Câmara que vai tornar bem mais difícil detectar a presença de DNA transgênico de ingredientes derivados de soja ou milho transgênico, presentes na grande maioria dos alimentos processados, como a lecitina de soja, e a glicose de milho (Cortese, 2018; Cortese et al., 2021).

De todo modo, cabe ao Estado prover a população com alimentos adequados, respeitar seu acesso a estes, bem como proteger a população de quem impede tal acesso, como corporações produtoras de sementes transgênicas (ONU, 1999). Em um raciocínio bastante simples, dada a improvável coexistência e impossibilidade de segregação, inclusive em toda a cadeia produtiva, se todos os cultivos forem transgênicos, nem o agricultor, nem o consumidor terão liberdade de escolha, seja para plantar, seja para comer.

O mais contraditório nesse processo é que o SISAN foi instituído pela LOSAN, em 2006, a alimentação foi inserida como direito social fundamental na Constituição Federal (CF) em 2010, ano em que também foi aprovada a Política Nacional de Segurança Alimentar (PNSAN), em 2102, foi aprovada a Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (PNAPO) e em 2015, o Pacto Nacional pela Alimentação Saudável (Pacto).

A Figura 1 representa a distribuição das liberações, por ano, no período do estudo, e a Figura 2 relaciona a frequência acumulada destas liberações na linha do tempo com a aprovação destes marcos legais importantes para a defesa da soberania e da segurança alimentar, em contraposição à transgenia.



Figura 1

Autorizações concedidas pela CTNBio para cultivos de plantas transgênicas de milho e soja, por ano, no período 1998-2022, Brasil



Figura 2

Frequência acumulada de autorizações concedidas pela CTNBio para cultivos de plantas transgênicas de milho e soja, por ano, no período 1998-2022 e marcos jurídicos importantes da segurança alimentar a partir da Lei de Biossegurança, Brasil

Nota. Losan: Lei Orgânica de Segurança Alimentar; CF: Constituição Federal; PNSAN: Política Nacional de Segurança Alimentar; PNAPO: Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica; Pacto: Pacto Nacional pela Alimentação Saudável.

O art. 3º da LOSAN (2006) afirma que a segurança alimentar tem como base “práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis”, algo que a transgenização da agricultura não favorece (Pessanha, 2004; Winckler e Munarini, 2019). Além disso, o art. 5º da mesma lei reconhece que “A consecução do direito humano à alimentação adequada e da segurança alimentar e nutricional requer o respeito à soberania, que confere aos países a primazia de suas decisões sobre a produção e o consumo de alimentos”.

A PNSAN, instituída pelo Decreto nº 7.272 (2010) é bem clara ao estabelecer, dentre suas diretrizes e objetivos enumerados no art. 2º, II, a “promoção do abastecimento e estruturação de sistemas sustentáveis e descentralizados, de base agroecológica”. O Decreto nº 7.974 (2012) instituiu a PNAPO, com o objetivo, disposto em seu art. 1º, de “integrar, articular e adequar políticas, programas e ações indutoras da transição agroecológica e da produção orgânica e de base agroecológica”. A transição, de acordo com a PNAPO, seria um processo “gradual” de mudança de práticas e de manejo de agroecossistemas, que levaria a sistemas de agricultura que incorporassem princípios e tecnologias de base ecológica.

O que se verificou, no mundo real, foi um aumento das liberações de cultivos transgênicos, a partir da aprovação da PNAPO, que teve seu pico no ano de 2015, quando se registrou o maior número de liberações das duas culturas estudadas, sendo 13 de milho e 4 de soja. Isso representa, considerando o acumulado de liberações até o ano de 2015, portanto, a 10 anos da Lei de Biossegurança, 38,2% do milho e 44,4%, no caso da soja. Em relação a todo o período do estudo, as liberações de milho e soja no ano de 2015 representam, respectivamente, 23,2% e 22,2% do total de liberações, ou seja, a 18 anos da vigência da Lei de Biossegurança, um quinto de todos os cultivos autorizados de soja e milho ocorreram no ano de 2015, ano em que foi instituído o Pacto pela Alimentação saudável, mediante Decreto nº 8.553 (2015). Um dos eixos desse Pacto, listados no art. 3º, II, é “reduzir o uso de agrotóxicos e induzir modelos de produção de alimentos agroecológicos”, algo que até o momento, não tem acontecido no Brasil, como revelam os resultados deste estudo.

Não é possível produzir alimentos de forma agroecológica ao mesmo tempo em que se produz plantas transgênicas que entrarão na cadeia produtiva para gerar produtos e subprodutos da indústria alimentícia; esta coexistência não é fisicamente possível e o resultado é que temos no mercado diversos produtos derivados de transgênicos que sequer estão rotulados (Cortese, 2018), sendo que o próprio Guia alimentar para a população brasileira não faz qualquer referência a esta categoria de produtos (Ministério da Saúde, 2014).

Assim sendo, qualquer governante que se proponha a garantir a segurança alimentar do povo, visando à realização do direito à alimentação adequada e saudável, precisa frear urgentemente o avanço da transgenia no Brasil[5]. Será possível reverter o avanço de 20 anos em 4 anos de Lula 3.0? Aguardaremos a solução pela via judicial ou teremos mobilização social forte o suficiente para pressionar o Presidente Lula a implementar a transição agroecológica? São questões que a sociedade precisa debater, se quiser evitar que cheguemos a um ponto de não retorno.

Considerações finais

O cenário da transgenia no Brasil, 20 anos após o primeiro governo Lula, é bem mais difícil. O Lula que tomou posse em 1º de janeiro de 2003 assumiu em campanha o compromisso de apoiar uma moratória à liberação do cultivo comercial e da comercialização de transgênicos, mas após duas décadas da primeira autorização por medida provisória, o Brasil ocupa o posto de segundo maior produtor de transgênicos do mundo. Ao invés da moratória prometida, o Presidente facilitou e legalizou o avanço da transgenia no país, ao mesmo tempo em que, sucessivamente, eram aprovadas Políticas de Segurança Alimentar que indicavam um caminho inverso; nessa disputa, venceram as corporações de sementes, frente à impossibilidade prática de se efetivar o direito humano à alimentação adequada e o respeito à precaução, simultaneamente à liberação de sementes transgênicas em escala comercial.

Assim sendo, é fundamental trazer reflexões ao Presidente recém-eleito sobre como uma Nação pode ser soberana no contexto do monopólio das sementes que alimentam seu povo. Além disso, a legalização da autorização de cultivos transgênicos no Brasil continua sendo questionada na justiça, considerando que a Constituição brasileira e os instrumentos internacionais dos quais o país é signatário oferecem amparo legal para a proteção do meio ambiente e a garantia da segurança alimentar, por meio de medidas de precaução no tocante às plantas transgênicas, as quais jamais foram adotadas.

O novo governo foi eleito em um cenário de profunda ameaça à democracia e tem diante de si a enorme tarefa de corrigir os rumos da produção de sementes no país, frente à tragédia que começou a ser anunciada no final dos anos 90. Lula 3.0 precisa escolher entre respeitar a democracia e uma ciência cidadã, investindo urgentemente na transição agroecológica e na garantia da segurança alimentar, ou revelar, novamente, contradições entre suas escolhas políticas e seu discurso de combate à fome e defesa da dignidade humana apresentado durante a campanha. Desta vez, porém, a história pode se repetir como farsa.

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Notas

[1] Os termos “transgênico” e “geneticamente modificado”, no contexto deste estudo, podem ser considerados sinônimos, uma vez que todo organismo transgênico é geneticamente modificado, mediante transferência de material genético entre espécies distintas, mas o inverso não é verdadeiro. A Lei de Biossegurança brasileira (tanto a antiga como a atual) define organismo geneticamente modificado (OGM) como aquele organismo cujo material genético (ADN/ARN) tenha sido modificado por qualquer técnica de engenharia genética. Na verdade, como observa Berlan (2011, p. 157), o termo OGM tem pouco significado, já que estamos em constante modificação genética, como seres vivos, tanto que a patente de Cohen e Boyer obtida na primeira manipulação transgênica, em 1973, recebeu o nome de “quimera funcional”, sinônimo de “quimera genética”, mas esse não seria um nome mercadológico. A soja em questão é um OGM na medida em que seu material genético foi modificado para tolerar o herbicida glifosato por meio da transferência de material genético de outra(s) espécie(s), no caso: vírus do mosaico da couve-flor, bactéria do gênero Agrobacterium e petúnia. O nome comercial do glifosato é Round up, e a soja RR® quer dizer “pronta para o Round up”.
[2] A partir de 01.01.2022, entrou em vigor nos EUA a nova Lei 114-126 (bioengineered (BE) food labeling law), que tornou obrigatória a informação para alimentos que contém material genético modificado por técnicas de DNA recombinante, cuja modificação não poderia ocorrer de outra forma através de reprodução convencional ou encontrada na natureza, acima do limite de 0,9% de OGM por peso do produto; a nova lei isenta da rotulagem obrigatória alimentos servidos em restaurantes e estabelecimentos similares, bem como produtos derivados de animais alimentados com ração geneticamente modificada. O Departamento de Agricultura dos EUA mantém uma lista dos alimentos que devem seguir o novo padrão de rotulagem neste site: https://www.ams.usda.gov/rules-regulations/be.
[3] Na elaboração da nova Lei de Biossegurança, houve uma alteração fundamental na proposta original, que conferia papel consultivo e não deliberativo à CTNBio no tocante à emissão de parecer favorável às atividades de pesquisa e comercialização de OGM. A lei aprovada, no entanto, concedeu amplos poderes à Comissão, em relação aos outros órgãos envolvidos dos Ministérios da Saúde, da Agricultura e do Meio Ambiente, inclusive quanto às exigências de EIA/RIMA (Pelaez, 2010).
[4] O termo evento vem da expressão “evento de transformação”, uma vez que o procedimento de transgenia promove uma transformação celular, transferindo material genético exógeno (transgene) a várias células receptoras que incorporarão esse material em distintos locais do seu genoma. Assim sendo, cada célula transformada tem seu padrão particular de integração do transgene. A planta derivada de uma destas células é considerada um “evento” (Galeano, 2017).
[5] Até a finalização deste artigo, a CTNBio do novo governo já havia aprovado a liberação comercial de duas plantas transgênicas (milho e trigo), usadas para alimentação humana, com características de tolerância a herbicidas.


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