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Suinocultura em um espaço de Fronteira: imagens e paisagens (Oeste de Santa Catarina - décadas de 1920 A 1950)[1]
Porcicultura en un espacio fronterizo: imágenes y paisajes (Oeste del Estado de Santa Catarina, Brasil; décadas de 1920 a 1950)
Pig farming in a border area: pictures and landscapes (west ofSanta Catarina State, Brazil – from the 1920s to the 1950s)
Estudios Rurales. Publicación del Centro de Estudios de la Argentina Rural, vol. 13, núm. 27, 2023
Universidad Nacional de Quilmes

Artículos

Estudios Rurales. Publicación del Centro de Estudios de la Argentina Rural
Universidad Nacional de Quilmes, Argentina
ISSN: 2250-4001
Periodicidade: Semestral
vol. 13, núm. 27, 2023

Recepção: 26 Setembro 2022

Aprovação: 04 Abril 2023

Resumo: O presente trabalho busca lançar algumas considerações a respeito da suinocultura praticada no Oeste de Santa Catarina e das transformações da paisagem advindas deste processo, entre a década de 1920, quando se inicia a colonização na região, até sua consolidação, ocorrida nos anos 1950. A criação de porcos acompanhou o povoamento da região desde pelo menos a segunda metade do século XIX, quando eram criados soltos em florestas com pouco manejo e de forma extensiva pela população cabocla. Essa forma de criação entrou em desestruturação a partir da colonização, que promoveu profundas alterações na paisagem e a partir da qual as florestas paulatinamente foram cedendo lugar às lavouras e serrarias, levando ao fim da prática da suinocultura. A criação de porcos, contudo, também era vista nas propriedades dos colonos, onde era feita de forma fechada, sendo viabilizada pela adoção do binômio milho-porco. Sua produção era destinada tanto ao consumo local quanto à comercialização nas médias e grandes cidades do Sul e do Sudeste do país, funcionando como base para o nascente setor agroindustrial regional. Para compreender esse processo de transformações na paisagem, registrado através da produção de imagens do passado, a pesquisa trabalha com os preceitos da Geografia Histórica, partindo da ideia da indissociabilidade do espaço e do tempo.

Palavras-chave: colonização, suinocultura, paisagem.

Resumen: El propósito del presente trabajo es ofrecer algunas consideraciones sobre la porcicultura desarrollada en el oeste del estado brasileño de Santa Catarina y las transformaciones del paisaje resultantes de este proceso entre la década de 1920 —cuando empieza la colonización en dicha región— hasta su consolidación, ya en la década de 1950. La crianza de cerdos acompañó el proceso de poblamiento de esta región desde al menos la segunda mitad del siglo XIX, cuando los caboclos los criaban sueltos en los bosques con poco manejo y de forma extensiva. Esta forma de crianza, no obstante, comenzó a desestructurase a partir de la colonización iniciada en la década de 1920. Esto provocó profundas transformaciones en el paisaje, donde los bosques dieron paso, paulatinamente, a campos de cultivo y serrerías, lo que acabó suponiendo el fin de tal práctica. La crianza de cerdos, sin embargo, también se podía ver en las propiedades de los colonos, pero de forma cerrada, donde la adopción del binomio maíz-cerdo posibilitó la cría de los animales. Su producción se destinaba tanto al consumo local como a la comercialización en las medianas y grandes ciudades del sur y sureste del país, siendo la base del incipiente sector agroindustrial regional. Para comprender este proceso de transformaciones en el paisaje, registrado mediante la producción de imágenes del pasado, esta investigación trabaja con los preceptos de la geografía histórica a partir de la idea de la indisociabilidad del espacio y del tiempo.

Palabras clave: colonización, porcicultura, paisaje.

Abstract: This paper seeks to make some comments about pig farming as practised in the Western part of the state of Santa Catarina, Brazil, and the transformations in the landscape caused by this process, from the 1920s, a decade that witnessed the start of colonisation in the area, to the 1950s, when this colonisation was established. The rearing of pigs was part of the settlement process in this region from as early as the second half of the 19th Century, when pigs were raised loose, in the forests, extensively and with very little husbandry, by the caboclo population. However, this type of pig raising was destructured with colonisation, which started in the 1920s. This led to significant changes to the landscape, with the forests slowly but surely giving way to cultivation of land and production of lumber, bringing about the demise of this type of pig raising. However, pigs were also raised in the land owned by the settlers, albeit now in a closed format, where the adoption of the combination of pigs and corn made pig raising feasible. The production was for local consumption and for commercialisation in the medium-sized and large towns and cities in the South and Southeast of the country, being the base of the nascent regional agroindustrial segment. To understand this process marked by transformations in the landscape, recorded through production of pictures from the past, this research paper works with the precepts set by historical geography, starting out from the idea of indissociability between space and time.

Keywords: colonisation, pig raising, landscape.

Introdução

O presente trabalho busca lançar algumas considerações a respeito da suinocultura praticada no Oeste de Santa Catarina e das transformações da paisagem advindas deste processo, em um período que se estende da década de 1920, quando tem início a colonização na região, até a década de 1950, quando a atividade passa a se consolidar na localidade. Na pesquisa, consideramos como região Oeste toda a área compreendida na época pelos municípios de Chapecó e Cruzeiro (atual Joaçaba), criados em 1917, logo após o final do acordo de limites envolvendo os estados do Paraná e de Santa Catarina, em 1916. A extensão desses dois municípios pode ser visualizada no mapa da Figura 1, produzido no ano de 1934.


Figura 1
Municípios de Chapecó e Cruzeiro, década de 1930
Fonte: Centro de Memória do Oeste de Santa Catarina – CEOM

Nesse período, a colonização por teuto e ítalo-brasileiros, provenientes majoritariamente do Rio Grande do Sul e iniciada nos vales dos rios do Peixe e Uruguai, estava em pleno curso, como aponta Waibel (1949, p, 18), em estudo sobre a colonização do Sul do Brasil: “semeando povoados ao longo de estradas e rios, na direção norte, onde está o sertão desabitado”. Esse espaço, já ocupado por populações indígenas e caboclas[2], pode ser visto como uma fronteira, que seria, para Martins (1996, p. 27), “essencialmente o lugar da alteridade” um “lugar do encontro dos que por diferentes razões são diferentes entre si”, que ocorre, conforme Little (2002, p. 4), na expansão de um grupo, quando este, “com sua própria conduta territorial, entra em choque com as territorialidades dos grupos que residem aí”.

O artigo analisa esse espaço de fronteira e suas transformações na paisagem no passado sob os preceitos da Geografia Histórica, introduzindo, como ressalta Philo (1996, p. 270), uma “sensibilidade geográfica”, ao estudar “fenômenos do passado – econômicos, sociais, políticos ou qualquer outro – que são a própria ‘substância’ da história”. Entendemos que paisagem seja o que Santos (2006, p. 103) define como “o conjunto das formas que, num dado momento, exprimem as heranças que representam as sucessivas relações entre o homem e a natureza” e que expressam uma imbricada relação envolvendo “objetos naturais e objetos fabricados, isto é, objetos sociais”, bem como ações em variadas escalas temporais (Santos, 2004, p. 53). A paisagem também possui uma dimensão atrelada a aspectos culturais e históricos, carregando elementos simbólicos, valores, crenças, mitos e utopias (Corrêa e Rosendahl, 2004, p. 08), os quais, por sua vez, podem ser expressos através da produção de registros, como a fotografia de um determinado processo ou evento.

A pesquisa foi desenvolvida por meio do emprego de imagens disponíveis em acervos públicos e privados, como museus, centros de memória e arquivos, procurando-se conhecer as permanências e rupturas do ambiente em um dado período, bem como compreender a época que permeia a paisagem que circundava essas imagens. Chegamos ao objeto de estudo a partir dessa fonte, produzida “pelos olhos e pela visão de mundo de outro homem, o seu testemunho” (Correa, 2008, p. 137). Assim, é necessário ter a clareza de que esse material

envolve a percepção, interpretação, seleção e organização dos elementos vegetais, minerais, geográficos e culturais visualizados, o testemunho apresenta um conceito sobre a organização social do espaço, o que implica presenças e ausências tanto humanas quanto naturais no quadro exposto. (Corrêa, 2008, p. 137)

Para a análise dessas fontes, é necessário reconhecer que elas foram produzidas com distintas intencionalidades, compreender que são fragmentos do passado e que foram também selecionadas para serem preservadas. Por isso, como ressalta Abreu (2000, p. 18), “é preciso sempre desconfiar dos vestígios que encontramos, pois os documentos vindos de tempos antigos não são neutros, isto é, incorporam estruturas de poder”. Isso pode ser visto, por exemplo, na produção das imagens que registraram a colonização na região Oeste, nas quais, como veremos, encontram-se preservadas representações sobre a natureza, assim como sobre discursos e ideias, como a do progresso resultante da superação das adversidades por parte de colonos e empresários, sobretudo vinculadas ao ambiente local.

Para compreender o processo de transformação em um espaço de fronteira dos lugares onde se praticava a criação de porcos, como o Oeste catarinense, o texto é dividido em três partes. A primeira discute o que se entende por paisagem cabocla, formada a partir da ocupação da região por essa população e por suas práticas socioespaciais, relacionadas à agricultura de subsistência, à extração da erva-mate e, sobretudo, à criação de animais, como os porcos, cujos tratadores compartilhavam a floresta em comum. A segunda parte trata da chegada de uma nova lógica de uso desse espaço, baseada na colonização e na atuação da indústria madeireira, que promoveu uma série de mudanças também na criação de animais. Uma nova forma de criação é tratada no último item do artigo, no qual se analisa a prática do binômio milho-porco, bem como o surgimento e o desenvolvimento de frigoríficos e fábricas de banha locais, que originaram muitas das atuais empresas do setor agroindustrial de carnes da região.

Paisagem cabocla: criação de porcos em comum na floresta

Ocupada durante séculos por diversas populações indígenas, entre as quais as mais recentes são as Guarani e Kaingang (Brighenti, 2015), a região do Oeste catarinense passou a ser alvo de incursões portuguesas e espanholas desde o século XVI, por meio da presença de jesuítas, bandeirantes ou exploradores, que, no entanto, não se fixaram localmente. Um maior fluxo populacional seria registrado somente a partir da abertura dos caminhos de tropas ligando o Rio Grande do Sul ao Sudeste, na primeira metade do século XVIII, e da posterior formação de fazendas de criação de gado nas áreas de campos, nas regiões de Lages, Curitibanos e Campos Novos, em Santa Catarina, de Guarapuava e Palmas, no Paraná, e nas regiões de Passo Fundo e Vacaria, no Rio Grande do Sul (Machado, 2004; Nascimento, Valentini, Brandt, Scherma, Tombini, 2021). Esse processo de expansão pode ser visualizado no mapa da Figura 2.


Figura 2
Frentes de povoamento do Oeste catarinense.
Fonte: Nascimento, Valentini, Brandt, Scherma, Tombini, 2021.

A dualidade campo/floresta marcou a natureza da ocupação da região em um período em que a economia e o povoamento estavam ligados à pecuária praticada nos campos, pois a floresta representava um espaço marginal, de pouca valia para o pecuarista (Lago, 1988). Esses espaços, sobretudo as florestas localizadas às margens das formações de campos ou nos vales de rios e seus afluentes, nas bacias do Canoas, Pelotas, do Peixe, Iguaçu e Uruguai, paulatinamente passaram a ser ocupados a partir da primeira metade do século XIX por um contingente populacional composto por ex-peões e agregados, criadores em busca de novas terras, ex-escravizados fugitivos ou libertos, dentre outros, sobretudo sob o regime de posse. Costa (1999, p, 175) aponta que essa era a principal forma de acesso à terra, sobretudo nesses espaços de fronteira, com grandes extensões territoriais disponíveis, o que permitia o controle de um pedaço de terra. Nessa ocupação, campos e florestas não representavam apenas paisagens distintas, mas também a possibilidade de uma nova vida e independência dos laços até então existentes com as fazendas das áreas de campos (Brandt, 2015a).

Ao se instalarem nessas terras, esses novos moradores se dedicavam à criação de animais, à coleta da erva-mate, área onde esta erva abundava, e à agricultura de subsistência, formando o que Queiroz (1981) denominou de “roça cabocla”, a qual era composta, conforme Renk (1997), pelas “terras de plantar” e pelas “terras de criar”. A primeira, geralmente distante da residência, era formada em meio à floresta pelo emprego da queimada e posterior plantio, em um sistema de rotação de terras, sendo destinada ao consumo familiar, com plantação principalmente de milho e feijão, junto com culturas como as de abóbora e melancia. Para evitar a invasão de animais, a roça era cercada com toras, tábuas ou lascas de madeira ou, ainda, por meio da abertura de trincheiras. As “terras de criar”, por sua vez, ocupavam toda a extensão da posse ou propriedade, formada pelas florestas e manchas de campo, onde os animais eram criados livremente. Esses espaços de criação eram frequentemente compartilhados com criadores vizinhos principalmente na criação de porcos.

A criação de porcos no Brasil acompanhou o processo de ocupação territorial do continente promovido por portugueses e espanhóis, sendo um elemento comum nas paisagens rurais desde então. Dean (2004) aponta, por exemplo que essa criação seria a responsável pela conservação e/ou disseminação da vegetação florestal, embora pudesse trazer impactos à flora e fauna locais, nessa última, ao competir com espécies nativas por alimento e espaço. O fato do porco ser onívoro era uma vantagem sobretudo na floresta, por encontrar uma maior variedade de alimentos disponíveis nas florestas em comparação com os herbívoros bois, cavalos e mulas, que eram criados nas áreas de campos. Comiam de tudo: frutos caídos, sementes, raízes, relva e qualquer animal pequeno. Nas regiões dominadas pela floresta no Oeste de Santa Catarina o ambiente favorável propiciou a muitos dos moradores do planalto encontrar na propagação do porco a principal fonte de renda, sobretudo para as famílias que não dispunham de grandes áreas de campos em suas terras. Criados em um ambiente rico em fontes de alimento, as porcas poderiam ter grandes ninhadas, com mais de dez bacorinhos, ou seja, o porco era um animal de grande fertilidade e baixo custo de produção, pois para seu trato não se necessitava de nada além dos recursos disponíveis (Crosby, 1993). Nas áreas onde encontravam-se as florestas com araucária (Araucaria angustifolia), sua semente, o pinhão, cuja dispersão ocorre a partir do outono, servia como principal fonte de alimento para os animais, que poderia ser complementado, no verão, com o milho cultivado em espaços cercados para onde então eram levados os animais para finalizar a engorda antes do abate ou comercialização. Junto com a abundância de recursos florestais disponíveis, outro fator que pode explicar a adoção do porco é sua capacidade de conversão de seu alimento em carne e banha. Os porcos convertem cerca de um quinto do que comem em alimento para consumo humano, contra aproximadamente um vigésimo dos bois (Crosby 1993). Essa forma de criação extensiva dos animais, com ausência de cercas e uso de amplas florestas, formava o que pode ser entendido como uma “paisagem cabocla” (Brandt, 2015b), que durou em alguns espaços da região por mais de um século.

Os porcos, criados soltos nas florestas, atendiam não somente às necessidades familiares, mas também ao comércio local em vilas e cidades próximas (Brandt, Cassaro e Naibo, 2021). Mais ao Oeste, Ferrari (2011) demonstra que os produtos dessa criação eram vendidos também no lado argentino, gerando relações transfronteiriças, assim como a erva-mate, embora não no mesmo grau. Essas práticas, contudo, passariam a sofrer uma série de rupturas a partir do avanço de uma nova lógica socioespacial, baseada na propriedade privada da terra, trazendo consigo a atuação de diversas companhias colonizadoras e indústrias madeireiras para a região.

Colonização e indústria madeireira

Desde o final do acordo de limites envolvendo os estados do Paraná e de Santa Catarina, em 1916, o estado catarinense passou a promover uma política de colonização desse território através da concessão de terras para companhias colonizadoras, colocando em prática, conforme Nodari (2009, p. 34), “a opção de uma migração dirigida a grupos específicos que se adequassem aos padrões estabelecidos pelo governo estadual e por elas próprias, ou seja, que povoassem e colonizassem a região ordeiramente”. Se para o governo a colonização significava povoamento e desenvolvimento de áreas “desabitadas”, para uma companhia colonizadora particular significava lucro: “ela quer ganhar dinheiro e é certo que ganhará se conseguir uma boa qualidade de terra e também gente de boa qualidade” (Waibel, 1949, p. 16). E foram os teuto e ítalo-brasileiros estabelecidos, ao longo do século XIX, nos núcleos de colonização do Rio Grande do Sul os escolhidos para o povoamento da região, em detrimento da população que já habitava o local. As terras catarinenses, além do baixo custo, se comparadas às das áreas de colonização no Rio Grande do Sul, davam condições para a compra de lotes contíguos. Isso permitia a manutenção da união das famílias, o que já não ocorria no Rio Grande do Sul, possibilitando também a esses grupos reproduzir e/ou adaptar suas práticas socioculturais e de uso do espaço, valorizadas em seu círculo social (Nodari, 2009).

O aporte desses novos moradores promoveu um choque demográfico local, afetando não apenas a questão da posse da terra por parte da população cabocla. Os posseiros passaram a ser alvo de expropriação, sendo vistos como “intrusos” pelas companhias colonizadoras, e o uso da terra por parte deles passou a ser motivo de conflitos em razão da incompatibilidade com as intenções das companhias, conforme expõe Renk (1997):

Os conflitos se originariam por duas razões. A primeira, pela desvalorização, no mercado imobiliário, das terras próximas às dos intrusos, com a criação sem cerca [...]. Interessava à companhia o fim desta prática. A segunda razão, em nível de atitudes, seria a utilização das terras, isto é, com a agricultura rotativa. Uma utilização mais “racional” permitiria que diversas famílias, em exploração familiar, se valessem da área com resultados que, do ponto de vista do colonizador, seriam, seguramente, melhores. (pp. 120-121)

Com a derrubada das florestas, feita pelos colonos para a abertura de roças, a invasão de animais nas plantações confrontantes às terras de famílias caboclas não era rara. No caso dos caboclos posseiros, muitos foram expropriados de suas terras pela ação das companhias colonizadoras, migrando a áreas mais distantes, onde persistiram com suas formas tradicionais de uso da terra ou se tornaram assalariados em atividades ligadas ao setor madeireiro ou ervateiro. Os que legalizaram as terras acabaram por incorporar as novas lógicas de uso delas, fechando as criações, empregando o modo adotado pelos colonos, mas isso não ocorreu sem eventuais resistências (Brandt, 2015a).

A derrubada das florestas pelos colonos promoveu a fragmentação dos espaços onde os animais circulavam livremente. Isso colaborou com o declínio da criação em comum nas áreas mais próximas aos núcleos de colonização, e a esse fator somam-se a atuação de diversas serrarias na região e a abertura de estradas, o que contribuiu para facilitar o escoamento da produção de colonos e madeireiros, bem como o avanço dessas atividades para áreas mais remotas (Nodari, 2012; Brandt, Cassaro e Naibo, 2021).

Não são raras as imagens que ilustram o processo de ocupação e devastação da floresta pelos colonos e, mais tarde, por serrarias que atuaram na região. Mesmo sendo uma época onde poucos fotógrafos circulavam pela região, é significativa a quantidade de registros imagéticos desse período. São destacadas fotos com a derrubada das florestas, a instalação das serrarias, a abertura de roças e com famílias ou madeireiros posando em cima de imensos troncos ou próximos à criação de animais e a lavouras. Essas imagens mostram como esses sujeitos, com seu trabalho, modificaram o ambiente e humanizaram a natureza, além de reforçarem a construção da própria definição dos colonos e madeireiros como trabalhadores austeros e obstinados, o que persiste ainda hoje no discurso do sucesso étnico da colonização, superando as adversidades da natureza. Ou seja, retratavam a colonização e as atividades madeireiras como reflexos do progresso da região, dentro do que Bublitz (2008, p. 335) denominou como “desmatamento civilizador”, para o caso da imigração no Rio Grande do Sul. Para a autora, “essa identidade, antípoda à floresta, foi uma construção coletiva, com a participação de inspetores e diretores de colônias” e que também foi transportada junto com colonos e colonizadores para o Oeste.

Eram, como aponta Nodari (2012), poucas as vozes que se preocupavam na época com a exploração desenfreada dos recursos florestais, cujas iniciativas não passavam do plano do discurso. Eram críticas, contudo, que não visavam garantir a biodiversidade ou a preservação da floresta nativa, mas sim impedir que os recursos se exaurissem, empobrecendo o agricultor e a região. Radin e Silva (2018, p. 684) mencionam que tanto os discursos públicos quanto as representações construídas sobre o ambiente da região mostravam a “necessidade de superar a realidade na qual se encontrava a região. Era preciso enfrentar a ‘tragédia da floresta’, o ‘deserto verde’, as ‘matarias vastas e desertas’, a ‘terra semisselvagem’, o ‘sertão inculto’, os ‘vazios demográficos’”. Essas percepções, que favoreciam o processo de colonização, também eram reforçadas através das fotografias onde a floresta sempre aparecia, mas ao fundo, ou em vias de ser futuramente derrubada ou aproveitada de forma considerada conveniente, dando a ideia de que riqueza da natureza local era pouco ou nada aproveitada pela população anterior à colonização. Na Figura 3, por exemplo, é possível observar a devastação da floresta e sua fragmentação, mesmo em áreas de declive acentuado, para a abertura de lavouras.


Figura 3
Agricultor arando a terra no Oeste de Santa Catarina, em meados da década de 1940-1950.
Fonte: Salini, 2018.

Na derrubada da floresta, no início, também atuaram os chamados engenhos de serrar (Carvalho, 2006), como o da Figura 4, que traz uma serraria localizada onde atualmente se encontra o município de Tunápolis, no início da década de 1950, em um momento no qual a colonização dessas terras ainda se processava. Essas pequenas empresas, além de fornecerem madeira localmente, atuavam em uma espécie de “limpeza das matas” (Moretto, 2021, p. 244), abrindo espaço para lavouras e para a criação de gado bovino e suíno, com os animais fechados em encerras ou chiqueiros.


Figura 4
Serraria de Emílio Bieger, 1953.
Fonte: Acervo fotográfico do Museu Público Municipal Ida Schneider, Tunápolis.

Além dessas pequenas serrarias, outras, com maior porte, passaram a se instalar na região a partir do esgotamento relativo das florestas do Rio Grande do Sul, isso pelo fato da extração de madeira na época ser, como aponta Goularti Filho (2001, p. 56), “a fonte mais rápida, fácil e disponível de acumulação capitalista”. A conjuntura internacional do pós-Primeira Guerra Mundial, trazendo uma valorização enorme no preço da madeira, sobretudo da araucária, promoveu a abertura de diversas serrarias no Sul do Brasil (Carvalho, 2006), muitas delas nas nascentes áreas de colonização do Oeste catarinense. No cenário interno essa expansão, como aponta Carvalho (2010, p. 132), “coincide com o crescimento populacional e econômico do Sul do Brasil e do país como um todo, o que teve como resultado óbvio uma demanda sempre crescente de madeira e seus subprodutos por décadas”. As companhias colonizadoras também atuaram no setor madeireiro, como era o caso da Empresa Colonizadora Ernesto F. Bertaso, que, além da venda das terras, subdividiu seus negócios em empresas menores, como olarias, serrarias e cooperativas madeireiras. Isso fez, por exemplo, com que, só em Chapecó, entre 1936 e 1949, existissem cerca de 109 serrarias (Nodari, 2012).

De pequeno ou grande porte, essas serrarias exploravam araucárias, imbuias, canelas e cedros, cujo escoamento da produção era feito por via férrea, em regiões mais próximas ao Vale do Rio do Peixe, ou por balsas, nos espaços mais próximos ao Vale do Rio Uruguai, em direção à Argentina. Ferrari (2011) aponta também para o aproveitamento do circuito de produção ervateira para o escoamento madeireiro nas regiões mais próximas à fronteira entre os dois países.

Todo esse processo envolvendo a abertura de lavouras e a atuação das indústrias madeireiras, fragmentando a floresta, promoveu uma significativa redução na atividade de criação de porcos soltos, pois ela dependia de uma grande quantidade de área, com cerca de cinco hectares por animal, conforme Correa (1970, p. 93), constituindo “uma atividade de áreas de muito baixa densidade demográfica, e à medida que o povoamento de colonos progredia, essa atividade afastava-se para áreas mais remotas”. Na Tabela 1, é possível observar numericamente as transformações na paisagem local advindas da colonização, trazendo consigo o aumento da população e das áreas destinadas ao uso agropecuário da Zona do Oeste, formada por Chapecó e seus municípios desmembrados a partir da década de 1950, e a Zona do Rio do Peixe, que abrangia Cruzeiro e os municípios desmembrados de parte de seu território e de cidades vizinhas, como Campos Novos, a partir da década de 1930.

Tabela 1
Áreas de uso agropecuário nas zonas fisiográficas do rio do Peixe e Oeste (1920-1960).

Fonte: Brandt, Cassaro e Naibo, 2021.* Considera-se a soma da área dos estabelecimentos agropecuários, entendidos como toda área de exploração agropecuária contínua das propriedades.

As florestas, como visto na Tabela 1, a partir de então, passaram a ter cada vez menos presença na paisagem regional, ao passo que aumentavam as terras destinadas ao uso agropecuário. Percentualmente, com base nos dados dos mesmos censos, em pouco mais de quatro décadas, as matas e florestas tiveram redução de cobertura de 73% para a Zona do Rio do Peixe, em 1920, para 31%, no final da década de 1950, enquanto o Oeste, com quase 80% de matas e florestas na mesma época, teve uma redução para 45%, no final da mesma década (Brandt, Cassaro e Naibo, 2021). Essa redução das florestas, no entanto, ao menos no início, não deu fim à prática da criação de porcos pela população cabocla, que persistiu nos espaços mais afastados dos núcleos de colonização. Com a abertura de pequenos frigoríficos e fábricas de banha, esses lugares se tornaram o destino de muitos desses animais criados soltos.

Frigoríficos, fábricas de banha, safristas e o binômio milho-porco

A construção da Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande viabilizou o povoamento do Vale do Rio do Peixe, tanto para a colonização quanto para a formação de pequenos povoados que surgiam em volta das estações ferroviárias (Valentini, 2015). Mais ao Oeste, a estratégia de empresas colonizadoras, além da venda dos terrenos, foi formar núcleos coloniais ao longo das estradas abertas pelas próprias companhias, em média a cada vinte quilômetros (Rodrigues, 2020). Alguns desses povoados às margens das estações ferroviárias ou núcleos coloniais prosperaram, originando municípios como Caçador e Concórdia, em 1934, e Videira, em 1944. Em 1949, emanciparam-se Capinzal e Tangará e, em 1954, São Miguel do Oeste, Itapiranga, Mondaí, Palmitos, Xaxim, Herval do Oeste e Seara. Muito embora Dionísio Cerqueira e Xanxerê tivessem seu povoamento iniciado ainda no século XIX, através das atividades ervateiras, no primeiro, ou a formação de uma Colônia Militar, no segundo, o crescimento de ambas estava atrelado à colonização (Nascimento, Valentini, Brandt, Scherma, Tombini, 2021).

Surgiu, nesse contexto, uma série de empresas, como serrarias, pequenas oficinas mecânicas, moinhos e fabricantes de banha e derivados de carne nesses nascentes quadros urbanos. Sua produção visava ao atendimento tanto do mercado local quanto do mercado externo, em muitos casos, via Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande, que passou a operar na década de 1910 e que também servia como meio para escoar animais vivos para frigoríficos mais distantes (Correa, 1970; Espíndola, 1999; Ferrari 2011; Brandt, 2015a). No caso da produção da banha seu crescimento relacionava-se, segundo Corrêa (1970, p. 89), à expansão do mercado consumidor, “que o comércio importador não poderia suprir em função dos preços elevados dos artigos importados, possibilitando o aparecimento de unidades fabris produtoras”. Muitas dessas pequenas produções mercantis foram formadas localmente, segundo Goularti Filho (2001, p.129), por pessoas de origem simples e modesta, denominados “capitalistas sem capitais”, filhos de artesãos ou comerciantes que viviam da importação/exportação do sistema colônia/venda, além de representantes comerciais.

Nesse período se sobressaía na criação o chamado “porco banha”, cuja produção desempenhou um importante papel na pauta econômica do comércio catarinense na primeira metade do século XX. Na época, a banha era destinada a abastecer as necessidades da população dos centros urbanos dos estados do Rio de Janeiro e São Paulo (Bossle, 1988; Brandt, 2015a; Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 1986). Os óleos vegetais eram então pouco utilizados, e sua produção, a partir de sementes oleaginosas, como no caso do azeite de dendê, visava atender o consumo regional. A banha era um produto valorizado, servindo tanto no cozimento quanto na conservação de alimentos (Lago, 1988). E os porcos criados soltos, como os da raça Macau, Caruncho, Tatu, Piau, Canastra e Canastrão, algumas das variedades rústicas de origem ibérica e asiática, amplamente disseminadas na região, eram adaptadas às condições locais, apresentando resistência à doenças e facilidade de reprodução, sendo próprios para a produção de banha (Olinger, 1969).

As empresas destinadas à produção de banha e de derivados de carne, por sua vez, promoveram também um surto na produção de suínos em toda a região Oeste, inclusive nos espaços mais próximos à fronteira argentina, tanto em Santa Catarina quanto no Paraná (Correa, 1970; Ferrari, 2011; Moretto e Brandt, 2019; Forneck e Lubenow, 2021). Esses animais poderiam ser criados ainda soltos, em meio às florestas, por moradores caboclos nos espaços onde a colonização ainda não havia avançado, ou pelos colonos, de modo fechado.

Nos espaços ainda dominados pela floresta, mais distantes do avanço da colonização, os animais poderiam, posteriormente, ser vendidos diretamente pelas empresas ou por um “safrista”, que reunia os adquiridos de outros criadores em um milharal fechado, para a engorda e posterior comercialização. Os colonos, por outro lado, adotavam o chamado binômio milho-porco, que consista na criação dos animais fechados em mangueiras ou chiqueirões, enquanto as lavouras eram destinadas também para a produção de milho, que alimentava a criação (Moreto e Brandt, 2019). Esta prática era compatível, como aponta Lago (1988), com o tamanho dos lotes coloniais, que possuíam em média dez alqueires ou 24 hectares. Em uma imagem da década de 1940, na Figura 5, observa-se a criação de porcos em mangueiras, alimentados com milho e lavagem, com a floresta devastada para a abertura de lavouras, ao fundo. Tal prática era também adotada por muitos caboclos que permaneceram nas terras, conseguindo legalizar suas posses ou parte delas. Nesse período, a rápida difusão do binômio milho-porco, junto à expansão de fábricas de banha, matadouros e nascentes agroindústrias, tornou a presença de mangueiras, chiqueiros e plantações de milho elementos comuns na paisagem rural da região.


Figura 5
Porcos criados em mangueiras pelos colonos da região de Chapecó. Colônia Cella, década de 1940.
Fonte: Entre Trilhas e Caminhos, 2018.

Nesses tempos, a presença de caminhões ainda era reduzida, não sendo difícil encontrar animais tocados a pé, muitos deles ainda criados por caboclos nas áreas de florestas, rumo aos centros consumidores. É o que se pode observar na Figura 6, que mostra uma tropa de animais em São Lourenço do Oeste, em 1952. Os animais poderiam também ser transportados por carros de boi, como mostra a Figura 7, que evidencia porcos sendo entregues em carroças em um posto de compras da Sadia, no município de Concórdia, na localidade onde atualmente se encontra o município de Arabutã.


Figura 6
Tropa de porcos em São Lourenço do Oeste, 1952.
Fonte: Entre Trilhas e Caminhos, 2018.


Figura 7
Posto de compras de suínos da Sadia, 1948.
Fonte: Entre Trilhas e Caminhos, 2018.

O aumento da frota de caminhões paulatinamente promoveu o abandono dessas formas de transporte de animais. Na Figura 8, é possível observar o uso de caminhões no transporte para o frigorífico da Família Hoss, em São Carlos, no ano de 1956.


Figura 8
Matadouro e chiqueiro da Família Hoss, São Carlos, década de 1950.
Fonte: Deimling, 2014.

O transporte da produção que não era destinada ao mercado local, sobretudo o realizado por empresas que passaram a se destacar economicamente, como Sadia, Perdigão e Chapecó, por exemplo, ainda era prejudicado pelas condições precárias das estradas. Muitas delas foram abertas pelos próprios colonizadores, interligando os núcleos coloniais às principais cidades, estradas e ferrovias da região. Ainda no final da década de 1950, boa parte das rodovias do estado como um todo carecia de pavimentação e pontes, e, no caso do Oeste, algumas das atuais rodovias que interligam a região sequer haviam sido projetadas ou possuíam tráfego intermitente (Santa Catarina, 1958). E mesmo a ferrovia, que no início foi fundamental no escoamento da produção, foi incapaz, como demonstrou Espíndola (1999), de conduzir os produtos nobres e refrigerados que então passaram a ser produzidos por essas empresas. A solução encontrada para esse estrangulamento viria com o transporte aéreo. Empresas como a Sadia, Perdigão e Chapecó, por exemplo, passaram, na década de 1950, a utilizar desse expediente. Inclusive essa distância e a precariedade dos transportes por terra do Oeste aos principais centros urbanos da região Sul, como Porto Alegre, Curitiba e mesmo a capital Florianópolis, seria um dos elementos que fomentou o transporte aéreo regional (Rodrigues e Brandt, 2018).

No caso da Sadia, por exemplo, o primeiro avião adquirido foi um Douglas DC-3, em 1952, dando início ao transporte de produtos como lombo, salame e presunto aos mercados de São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo (Espíndola, 1999). A Perdigão, mesmo instalada às margens da ferrovia, também empregava o transporte aéreo, inclusive para cargas e transporte de matrizes, conforme pode ser visto na Figura 9.


Figura 9
Avião da Perdigão utilizado para o transporte de carga e matrizes em Videira, Santa Catarina, s/d.
Fonte: Museu do Vinho Mário Pellegrin, Videira, Santa Catarina.

A adoção do binômio milho-porco e o desenvolvimento desse setor de produção de carne e banha promoveram aumento significativo no número de animais na região. Em quatro décadas, o número de animais registrados saltou de 32.000 para Chapecó e Cruzeiro, em 1920 (Ministério da Agricultura, Indústria e Commercio, 1923), para aproximadamente 1.200.000 animais para as zonas fisiográficas do Oeste e do Rio do Peixe, em 1960 (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 1967). O crescimento regional do setor e das nascentes agroindústrias, a partir da década de 1950, fez com que estas suplantassem o setor madeireiro em importância econômica. Essas empresas, articuladas ao poder público estadual e federal, reorganizaram o sistema produtivo da região e produziram um consenso político e econômico em torno da agroindústria (Silva e Hass, 2017). Créditos, subsídios, amparo tecnológico e suporte técnico passaram, assim, a beneficiar sobretudo esse ramo, o que possibilitou o crescimento de empresas como Sadia, Perdigão, Seara, Chapecó e Saule Pagnocelli, bem como a instalação, nos anos seguintes, de novos frigoríficos destinados ao abate de suínos, aves e bovinos no Oeste de Santa Catarina, como o frigorífico Reunidas Ouro, Safrita, Unifrico, Cooperativa Central Oeste Catarinense e Friscar (Goularti Filho, 2001). Essa expansão, marcando de forma cada vez mais intensa sua presença também em outros municípios de menor porte da região, com suas filiais e produtores de animais, promoveu, no entanto, a dependência econômica quase exclusiva das atividades ligadas a esse setor[3].

Considerações finais

A suinocultura acompanhou o processo de ocupação da região que compreende o atual Oeste catarinense desde pelo menos a segunda metade do século XIX, quando esse espaço passou a ser ocupado por famílias que se instalaram nas florestas nos interstícios das fazendas pastoris, localizadas nas áreas de campos do planalto sul-brasileiro. Lá, passaram a se dedicar à agricultura de subsistência, a atividades de extração da erva-mate, onde ocorria com maior frequência, e à criação de animais, sobretudo os porcos, atividade desenvolvida em comum, com a floresta sendo compartilhada entre diversos criadores vizinhos. Essa forma de uso da terra e dos seus recursos naturais, que conservou a floresta ao menos morfologicamente, perdurou em muitos espaços por mais de um século, até a chegada de uma nova lógica socioespacial baseada na propriedade privada da terra, representada pela colonização e pela exploração madeireira.

A colonização, iniciada na década de 1920, sentida como um momento de ruptura para a população cabocla de suas práticas de uso e acesso à terra, promoveu aumento populacional local e inserção de práticas agrícolas incompatíveis com o costume da criação em comum. As florestas, paulatinamente, cediam lugar às lavouras e a criação dos animais pelos colonos, agora fechada, era realizada com o binômio milho-porco. Esses animais, junto aos porcos criados pela população cabocla mais afastada das áreas colonizadas, foram a principal matéria-prima para as nascentes fábricas de banha, derivados de carne suína e matadouros, que passaram a se formar na região. O aumento da criação e o surgimento dessas empresas marcam uma presença cada vez maior da suinocultura na paisagem rural e urbana da região, registrada muitas vezes com o auxílio da fotografia, servindo como um instrumento de reafirmação de um discurso do sucesso étnico do trabalho dos colonos e empresários locais em cima das adversidades enfrentadas, sobretudo em relação à natureza.

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Notas

[1] A pesquisa contou com o auxílio da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina (auxílio financeiro via Edital 12/2020, projeto UNI2020121000338) e da Universidade Federal da Fronteira Sul (auxílio financeiro via Edital 121/GR/UFFS/2021 projeto PES-2021-0246).
[2] A pesquisa segue a definição de caboclo como sendo “um dos habitantes das fronteiras do Sul do Brasil, que aí vive desde o período anterior à chegada dos colonizadores”, apontada por Marquetti e Lopes da Silva (2016, p. 109). Mesmo, que, como declara Machado (2004, p. 48), “não haja uma conotação étnica nesta palavra, frequentemente o caboclo era mestiço, muitas vezes negro. Mas a principal característica desta palavra é que distingue uma condição social e cultural, ou seja, são caboclos os homens pobres, pequenos lavradores posseiros, agregados ou peões”.
[3] É o caso, por exemplo, do município de Xaxim, distante 25 km de Chapecó, cuja crise econômica do frigorífico Chapecó no final dos anos 90 e início dos anos 2000 afetou a cidade em toda a cadeia econômica. Esses impactos incluíram queda da arrecadação tributária, desemprego, inadimplência no comércio, fechamento de empresas, entre outros eventos, como demonstrou o estudo de Alves (2021).


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