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Ensino de Ciências por investigação: contribuições de artigos de bases de dados abertas para a práxis docente
Inquiry-Based Science education: contributions of articles from open databases to teaching praxis
Educación científica basada en la investigación: contribuciones de artículos de bases de datos abiertas a la práctica docente
Revista de Ensino de Ciências e Matemática, vol.. 12, núm. 3, 2021
Universidade Cruzeiro do Sul

Artigos

Revista de Ensino de Ciências e Matemática
Universidade Cruzeiro do Sul, Brasil
ISSN-e: 2179-426X
Periodicidade: Trimestral
vol. 12, núm. 3, 2021

Recepção: 04 Março 2021

Aprovação: 01 Abril 2021

Publicado: 23 Maio 2021

Una nueva publicación de artículo publicado en REnCiMa, de iniciativa de sus autores o de terceros, queda sujeta a la expresa mención de la precedencia de su publicación en este periódico, citándose el volumen, la edición y fecha de esa publicación

Este trabalho está sob uma Licença Internacional Creative Commons Atribuição-NãoComercial-Compartilhamento Pela Mesma Licença.

Resumo: Pesquisas sobre a abordagem do Ensino de Ciências por Investigação têm apresentado resultados favoráveis para a aprendizagem. Sua implantação em sala de aula requer que o professor se aproprie desta abordagem e conheça exemplos de sucesso para transformação de sua práxis docente. A bibliografia pode ser um importante aliado de professores que queiram trabalhar o Ensino de Ciências por Investigação com seus alunos. Assim, realizamos uma revisão sistemática em bases de busca abertas, ou seja, disponíveis para consulta dos professores, objetivando caracterizar os artigos empíricos e como contribuem para a práxis docente. Como resultado, obtivemos 20 trabalhos aplicados à Educação Básica, com predominância no ensino de Física. Os artigos com atividades práticas concentravam-se em Física e Química, e atividades de investigação de textos, em Biologia, aspectos que podem estar relacionados aos conteúdos tradicionalmente trabalhados no ensino básico e à natureza dessas ciências. Metade dos trabalhos aplicados ao Ensino Médio foi realizada em escolas técnicas, levantando questões relacionadas a diferenças dessas instituições que possibilitam o envolvimento dos professores nessa abordagem. Os artigos contemplavam: aprendizagem de conceitos, engajamento e alfabetização científica. No entanto, uma questão importante foi observada nos estudos: a avaliação dentro dessa abordagem ainda é pouco explorada nas pesquisas.

Palavras-chave: Ensino de Ciências por Investigação, Revisão Sistemática, Educação Básica.

Abstract: Research on the approach to Inquiry-Based Science Education has shown favorable results for learning. Its implementation in the classroom requires the teacher to take ownership of this approach and learn about successful examples for transforming his teaching praxis. Bibliography can be an important ally for teachers who want to work Inquiry-Based Science Education with their students. Thus, we conducted a systematic review in open databases, therefore, available for consultation by teachers, aiming to characterize the empirical articles and how they contribute to teaching praxis. As a result, we had 20 articles applied to Basic Education. Physics teaching predominated. Articles with practical activities focused on Physics and Chemistry, and text research activities, on Biology. Aspects that may be related to the contents traditionally worked on in basic education and to the nature of these sciences. Half of the work applied to high school was carried out in technical schools, raising questions related to differences in these institutions that make it possible for teachers to be involved in this approach. The articles included: concept learning, engagement and scientific literacy. However, an important issue was observed in the studies: the evaluation within this approach is still little explored in the research.

Keywords: Inquiry-Based Science Education, Systematic Review, Basic Education.

Resumen: La investigación sobre el enfoque de la educación científica basada en la indagación ha mostrado resultados favorables para el aprendizaje. Su implementación en el aula requiere que el docente se apropie de este enfoque y aprenda sobre ejemplos exitosos para transformar su praxis docente. La bibliografía puede ser un aliado importante para los profesores que desean trabajar la educación científica basada en la investigación con sus alumnos. Así, realizamos una revisión sistemática en bases de datos abiertas, o sea, disponibles para consulta por parte del profesorado, con el objetivo de caracterizar los artículos empíricos y cómo contribuyen a la praxis docente. Como resultado, tuvimos 20 artículos aplicados a Educación Básica. Predominó la enseñanza de la física. Artículos con actividades prácticas centradas en Física y Química, y actividades de investigación de textos, en Biología. Aspectos que pueden estar relacionados con los contenidos tradicionalmente trabajados en la educación básica y con la naturaleza de estas ciencias. La mitad del trabajo aplicado al bachillerato se realizó en escuelas técnicas, lo que generó interrogantes relacionados con las diferencias en estas instituciones que posibilitan que los docentes se involucren en este enfoque. Los artículos incluyeron: aprendizaje de conceptos, participación y alfabetización científica. Sin embargo, se observó un tema importante en los estudios: la evaluación dentro de este enfoque aún está poco explorada en la investigación.

Palabras clave: Educación Científica Basada en la Investigación, Revisión Sistemática, Educacion Basica.

Introdução

Nas décadas de 1950 a 1970, após o lançamento da Sputnik - programa de produção de satélites da antiga União Soviética - os Estados Unidos e o Reino Unido reformularam seus currículos de ciências para produzir cursos que levassem os alunos a “pensarem como cientistas”. Esse currículo reorganizado buscava preparar os alunos para carreiras científicas, em resposta à corrida espacial. A partir da década de 1980, novos movimentos na educação passaram a buscar objetivos mais direcionados à cidadania e, neste contexto, a formação de cidadãos alfabetizados cientificamente (DUSCHL, 2008; ZÔMPERO e LABURÚ, 2011).

Sasseron e Carvalho (2011), em revisão de literatura sobre o tema Alfabetização Científica (AC), traçaram três eixos estruturantes da AC: (a) compreensão básica de conceitos científicos fundamentais; (b) compreensão da natureza das ciências e dos fatores éticos e políticos que circundam sua prática; e (c) o entendimento das relações existentes entre ciência, tecnologia, sociedade e meio-ambiente.

Sasseron (2015), assim como outros autores (FERRAZ e SASSERON, 2017a; SCARPA e CAMPOS, 2018), defende que o Ensino de Ciências por Investigação (EnCI) seja o grande catalisador para a promoção da Alfabetização Científica em sala de aula. Entretanto, apesar de já estar bem consolidada na Europa e nos Estados Unidos, ainda é recente no Brasil. Tal temática começa a aparecer nos periódicos de ensino a partir dos anos 2000, como nos mostram os trabalhos de revisão de literatura de Montanini, Miranda e Carvalho (2018) e Silva (2020), com incremento dos estudos a partir de 2014, além de uma tendência de expansão no volume de trabalhos, advinda do crescente interesse da comunidade acadêmica brasileira (OLIVEIRA e MOLINA, 2016).

Sasseron (2015) defende que o EnCI seja uma abordagem didática visto seu caráter pragmático, isto é, por ser colocado em prática nas mais distintas aulas, sob as mais diversas formas e para os diferentes conteúdos. Carvalho (2018) definiu Ensino por Investigação como:

o ensino dos conteúdos programáticos em que o professor cria condições em sua sala de aula para os alunos: pensarem, levando em conta a estrutura do conhecimento; falarem, evidenciando seus argumentos e conhecimentos construídos; lerem, entendendo criticamente o conteúdo lido; e escreverem, mostrando autoria e clareza nas ideias expostas (CARVALHO, 2018. p. 766).

Assim, o EnCI visa desenvolver habilidades cognitivas nos estudantes para a investigação de problemas que surjam em seu entorno. Logo, compreendemos a grande relevância desta abordagem como promotora da AC. Ela une aspectos das culturas científica e escolar, formando uma cultura híbrida, ou seja, não objetiva a formação de cientistas, tampouco a formação de estudantes que utilizem os conhecimentos científicos apenas no âmbito escolar, mas formar uma cultura científico-escolar para a promoção da AC (SASSERON, 2015) .

Pedaste et al. (2015), a partir de uma revisão sistemática da literatura e de uma análise de trabalhos que abordavam as fases da investigação Inquiry-based learning, construiu o ciclo investigativo que, em linhas gerais, compreende as etapas do processo do ensino por investigação. Esse processo inicia-se com a fase de orientação, na qual o professor introduz uma situação problema, a fim de motivar seus alunos. Em seguida, a fase de conceitualização traz uma pergunta de investigação e o levantamento das hipóteses dos alunos. Cabe ressaltar que essa fase é importante para o levantamento dos conhecimentos prévios dos estudantes. A busca de evidências, por sua vez, é a fase de investigação, a qual pode acontecer por meio de experimentação (no teste de hipóteses) e também através da exploração de uma situação ou evento que não possa ser testado. Ainda nesta fase, há a interpretação dos dados para, somente assim, chegarmos à fase de conclusão, com a articulação das informações e hipóteses levantadas, dando um parecer em resposta à pergunta de investigação através da argumentação. Essas etapas podem se repetir de acordo com o surgimento de novas perguntas de investigação. No mais, todo o processo é entremeado por intensa colaboração e discussão, desenvolvendo os processos de argumentação dos estudantes, conforme é evidenciado em diversos trabalhos (BOUÇAS e JÚNIOR, 2015; FERRAZ e SASSERON, 2017a, 2017b; SASSERON, 2015).

Carvalho (2018) defende que a liberdade intelectual seja fundamental para o EnCI, já que, sem ela, os estudantes não teriam coragem de expor seus raciocínios, seus pensamentos e suas argumentações. Em contexto de sala de aula, comumente são os professores que determinam o grau de liberdade intelectual que será dado ao aluno, a partir das atividades propostas em sala. No entanto, ao analisar décadas de trabalhos de seu grupo de pesquisa em EnCI (LAPEF - Laboratório de Pesquisa e Ensino de Física da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo), a autora observou que, quando aplicadas suas sequências didáticas em EnCI, os estudantes de Ciências do primeiro segmento do Ensino Fundamental (Ensino Fundamental I) conseguiam, com frequência, mais liberdade intelectual e construção do conhecimento científico do que estudantes de Ciências (Física, Química e Biologia) do Ensino Médio.

Para investigar esse problema, Carvalho (2018) levou em consideração dois aspectos: (a) o cuidado do professor com o grau de liberdade dado aos alunos e (b) características de formulação de um bom problema de investigação. Nessas duas ações, encontram-se as diferenças entre professores do Ensino Fundamental I e Ensino Médio. Dado o cronograma de disciplinas, inferimos que professores do EM têm pouco tempo semanal com suas turmas em relação aos professores do Ensino Fundamental I, além de turmas com número elevado de alunos. Esses fatores dificultam o delineamento do grau de liberdade intelectual dos estudantes, uma vez que tal parâmetro dependa da relação interpessoal entre aluno e professor.

Além disso, os problemas propostos pelo ensino de Ciências do Ensino Médio são mais complexos, pois são construídos para abranger a linguagem científica: escrita, oral, gráfica e matemática. Além das diferenças apontadas acima, observamos que os professores de Química, Física ou Biologia do Ensino Médio, muitas vezes, são os únicos professores dessas disciplinas na escola, impossibilitando a troca de experiências entre pares, situação importante para aumento da crença de autoeficácia do professor ao experimentar novas abordagens de ensino (BANDURA, AZZI e POLYDORO, 2008, p. 108). Diante deste panorama de dificuldade na troca de experiências, a bibliografia pode ser uma importante aliada para os professores que queiram implantar o Ensino de Ciências por Investigação em suas salas de aula.

A partir destas observações, duas indagações podem ser feitas: i) Como se caracterizam os trabalhos, disponíveis em plataformas de busca abertas, para auxílio dos professores na construção da abordagem investigativa em aulas de ciências? e ii) Como esses trabalhos contribuem para a práxis docente?

Metodologia

Para responder às questões, realizamos um processo baseado nos princípios da revisão sistemática da literatura, definida por Kitchenham (2004, p.1) como “um meio de identificar, avaliar e interpretar todas as pesquisas disponíveis relevantes para uma questão de pesquisa específica, ou área, ou fenômeno de interesse”.

Nossa revisão segue as três etapas: o planejamento, com a formulação das questões de pesquisa, seleção das fontes e dos estudos; a execução da seleção e da extração das informações e a análise dos resultados com sua sumarização (FELIZARDO e MARTINS, 2009).

I. Planejamento da pesquisa:

A partir das considerações de Carvalho (2018), elegemos três questões de pesquisa para a investigação:

QP1: Como os trabalhos empíricos sobre ensino de ciências por investigação que estão disponíveis para os professores da Educação Básica se distribuem nos níveis da Educação Básica e quais assuntos são contemplados?

QP2: Que princípios e autores norteiam os trabalhos que focam no Ensino de Ciências do Ensino Médio e segundo segmento do Ensino Fundamental (Ensino Fundamental II)?

QP3: Que contribuições eles trazem para a práxis docente?

Para respondermos às perguntas, realizamos buscas nas seguintes fontes: Scientific Electronic Library Online - Scielo (https://scielo.org/) e Google Scholar (https://scholar.google.com/). Essas fontes foram escolhidas, pois são acessíveis a todos os professores do Ensino Básico e por serem gratuitas, bastando apenas acesso à conexão com internet.

Os critérios de inclusão dos trabalhos na pesquisa consistiram em: (a) serem trabalhos publicados e disponíveis integralmente nas bases de dados pesquisadas e (b) serem recentes (publicados a partir de 2015) e possuírem aprovação pela comunidade científica (avaliado por pares – publicados em Revistas), com público-alvo na Educação Básica do Brasil. Conforme Kitchenham (2004), além dos critérios de inclusão, devem ser definidos critérios de exclusão, a fim de otimizar a delimitação do corpus de pesquisa e de facilitar o processo de seleção dos trabalhos.

Em sequência, apresentaremos os critérios de exclusão dos trabalhos da pesquisa. São eles: (a) trabalhos de revisão; (b) trabalhos fora do campo de Ensino ou Educação de Ciências; e (c) trabalhos exclusivamente teóricos sobre o tema.

II. Seleção dos trabalhos:

Nossa pesquisa, realizada em novembro de 2020, buscou artigos publicados no período de 2015 a 2020. Para os fins do estudo, os artigos deveriam versar sobre temática de “Ensino de Ciências por Investigação” na Educação Básica brasileira.

Sendo assim, realizamos três buscas na Scielo (em português, inglês e espanhol) cujas palavras-chave envolveram o tema Ensino de Ciências por Investigação. Após o resultado de cada busca, os artigos foram analisados pelos critérios de inclusão e exclusão, através da leitura dos títulos. Desta forma, caso não fosse possível determinar a situação do artigo, o resumo seria analisado. Vejamos:

Busca 1: ("ensino por investigação") OR ("ensino de ciências investigativo") OR ("Ensino de ciências por investigação") OR ("atividades investigativas") OR ("práticas investigativas") em ‘todos os índices’, retornando 60 artigos. Após a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, restaram 8 artigos.

Busca 2: ("teaching by investigation") OR ("inquiry-based science education") OR ("investigative teaching") OR ("inquiry-based science teaching") OR ("inquiry-based teaching") OR ("investigative activities") em ‘todos os índices’, retornando 53 artigos. Nesta busca, 26 artigos estavam repetidos conforme a primeira busca, 25 artigos foram excluídos após o uso dos critérios de exclusão, restando 2 artigos.

Busca 3: ("enseñanza por investigación") OR ("educación científica basada en la indagación") OR ("enseñanza investigativa") OR ("enseñanza científica basada en la indagación") OR ("enseñanza basada en la indagación") OR ("actividades de investigación") em ‘todos os índices’. Foram encontrados 202 artigos, porém, após a análise dos títulos, restaram 23 artigos. Entre eles, 8 estavam repetidos e 13 não atenderam aos pré-requisitos da pesquisa, após a leitura dos resumos. Nesta busca, 2 artigos foram incluídos.

Seguidamente, realizamos mais duas buscas na base de dados Google Scholar. As buscas (em português e espanhol) estão discriminadas abaixo. Vejamos:

Busca 4: Pesquisa avançada Google Acadêmico com a frase exata: ‘ensino por investigação’, em qualquer lugar do artigo, sem a palavra ‘matemática’, com data entre 2015-2020. Foram encontrados 202 trabalhos. Entre eles, 78 materiais foram excluídos previamente por compreenderem, pelo menos, um dos critérios de exclusão. A triagem foi realizada a partir das leituras dos títulos no Google Scholar e, por vezes, pelo link disponível para mais informações.

Os trabalhos para os quais foi necessário buscar mais informações totalizaram 124 itens, e as informações bibliométricas de tais textos foram planificadas com seus respectivos links. Assim, cada link foi acessado para a busca de informações que atendessem aos critérios de inclusão e exclusão.

Nesta fase, as exclusões obedeceram a seguinte sequência: 13 trabalhos por critérios de repetição; 26 trabalhos por serem realizados fora do Brasil; 40 trabalhos por se tratarem de pesquisas de conclusão de curso (monografias, teses e dissertações); 7 trabalhos por se tratarem de livros, capítulos ou documentos institucionais. No mais, 5 trabalhos não foram encontrados nas bases de dados, e outros 30 artigos foram excluídos pelos demais critérios de exclusão. Ao fim da triagem, 3 artigos foram selecionados por responderem aos critérios de inclusão.

Busca 5: Pesquisa avançada Google Acadêmico, com a frase exata: ‘enseñanza por investigación’, em qualquer lugar do artigo, sem as palavras ‘matemáticas’ e ‘tesis’ com data entre 2015-2020, excluindo patentes ou citações. Pesquisando em páginas nas línguas: português, inglês e espanhol.

Nesta fase, a exclusão da palavra ‘matemáticas’ se deu por não constar no escopo da pesquisa, e a exclusão da palavra ‘tesis’ se deu pela ocorrência de grande aporte de teses e dissertações sobre o tema, as quais não são foco deste levantamento. Foram encontrados 486 documentos mediante a busca do termo “Enseñanza por Investigación”, nas condições descritas acima. Ao excluir trabalhos com os termos ‘matemáticas’ e ‘tesis’, o número de textos reduziu a 236 e 138, respectivamente. Por critério de repetição, foram excluídos 13 trabalhos, e 86 pelos critérios de exclusão descritos anteriormente, retornando 5 artigos incluídos na pesquisa.

Resultados e discussão

Compilando os dados encontrados nas cinco buscas, estabelecemos 20 artigos. Destes artigos empíricos, aplicados na Educação Básica, cinco estavam em revistas não avaliadas pela CAPES. Optamos por não excluí-los imediatamente, mas analisá-los na íntegra, de modo a avaliarmos seu rigor metodológico, bem como se o Ensino de Ciências por Investigação estava sendo aplicado conforme seus pressupostos teóricos. Após a leitura desses artigos, dois deles foram excluídos. Posteriormente, um artigo, de classificação B1, também foi excluído por não se enquadrar no escopo da pesquisa.

Cabe ressaltar que todos os trabalhos foram encontrados nas pesquisas feitas pelo Google Scholar, o qual busca os materiais mais relevantes, segundo algoritmos criados pela inteligência artificial do sistema e embasados, principalmente, em citações. Não podemos negar que o Google Scholar fornece acesso a anais de congressos, teses, dissertações, monografias, livros, capítulos, entre outros documentos que podem ser importantes fontes de consulta para a experiência em sala de aula. No entanto, não há critérios claros para os usuários que possam garantir a qualidade dos trabalhos encontrados.

Abaixo, apresentamos o corpus da pesquisa e, a partir dele, as análises:

Quadro 1
Corpus da pesquisa: Periódicos das publicações encontradas nas buscas

Elaborado pelos Autores

Conforme o Quadro 1, os artigos foram distribuídos em sete revistas. Dez trabalhos foram concentrados nas revistas ‘Ciência e Educação’ e ‘Ensaio: Pesquisa em Educação em Ciências’, ambas com Qualis A1. Destacamos que há também artigos em revistas não classificadas pela CAPES, mas que permaneceram na pesquisa por apresentarem contribuição para a sala de aula, através de relatos de experiência.

Em relação ao ano dos artigos, a Figura 1 apresenta a seguinte distribuição:


Figura 1
Distribuição dos artigos ao longo dos anos
Elaborado pelos Autores

É válido enfatizar que, apesar de reduzirmos o corpus da pesquisa a trabalhos empíricos aplicados à Educação Básica, encontramos quantidade considerável de artigos nos últimos seis anos.

Montanini, Miranda e Carvalho (2018), em seu trabalho de revisão de literatura sobre EnCI, observaram evidências de uma popularização do tema entre os pesquisadores brasileiros através da maior concentração de publicação em 2015, 2016 e 2017. Silva (2020), em outra revisão de literatura, mostra que a temática começa a aparecer nas revistas de ensino nos anos 2000, intensificando-se a partir de 2014. Igualmente, Oliveira e Molina (2016) observam a mesma tendência de aumento da popularização de pesquisas sobre o tema nos últimos anos. E Telles, Pereira e Cunha (2020) entendem que a realização do 1º Encontro de Ensino de Ciências por Investigação (EnECI), em 2017, e do 2º EnECI, em 2020, foi emblemática na busca por agregar pesquisadores e professores que tenham o EnCI como temática, e também da abertura de uma nova frente de trabalho e investigação para aqueles que se dedicam à pesquisa em Ensino de Ciências.

Seguidamente, para respondermos à questão de pesquisa QP1, identificamos os artigos por níveis de ensino, disciplinas científicas e temas, conforme o Quadro 2:

Quadro 2
Distribuição dos trabalhos nos diferentes níveis da Educação Básica

Elaborado pelos Autores

Os dados mostram um equilíbrio na distribuição dos artigos entre o Ensino Fundamental (8 artigos) e o Ensino Médio (8 artigos), bem como um artigo que trabalhou em ambos os níveis. Essa distribuição corrobora com resultados de Santos e Silva (2018), os quais fizeram uma revisão de literatura na área, a partir dos artigos encontrados anteriormente por Oliveira e Molina (2016).

Por outro lado, Montanini, Miranda e Carvalho (2018) encontraram preponderância de artigos empíricos no Ensino Fundamental; enquanto Silva (2020) e Campos e Kalhil (2019) encontraram no Ensino Médio. Essas diferenças entre os achados das revisões se devem às bases de busca utilizadas por cada trabalho, o período de levantamento e aos termos utilizados nas buscas.

Além destes fatores, no Ensino de Ciências por Investigação, há ainda a polissemia presente no campo, conforme é evidenciado por Zômpero e Laburú (2011) em sua análise histórica. Dentro dessa abordagem, há diversas metodologias envolvidas, tais como a Aprendizagem baseada em Problemas, Aprendizagem baseada em Projetos, STEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática, da sigla em inglês) entre outros, que podem não ser encontrados nas buscas por não utilizarem palavras-chave que assim os identifiquem no campo.

Foram encontrados cinco artigos empíricos aplicados ao primeiro segmento do Ensino Fundamental. Entre eles, três estão relacionados a conteúdos de Física. Vale dizer que tal predomínio pode estar relacionado à introdução de práticas experimentais simples (com resultados imediatos) para a iniciação dos estudantes na cultura científica. Esse destaque para a área de Física também pode estar atrelado a uma questão de amadurecimento da área de pesquisa. É pertinente destacar o Laboratório de Pesquisa e Ensino de Física, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (LAPEF) que, há décadas, orienta estudos em atividades investigativas (CARVALHO, 2018). Ao analisar os autores encontrados nesses trabalhos, vários têm ligação ao LAPEF.

No Ensino Fundamental II, embora grande maioria dos professores seja licenciada em Ciências Biológicas, o ensino da Biologia no EnCI não se destacou numericamente como poderíamos esperar. Trivelato e Tonidantel (2015) levantam algumas questões que podem explicar o uso de práticas em Física ou Química por professores de Biologia:

Com relativa frequência, as atividades experimentais são de difícil implementação no ensino de biologia – as montagens com seres vivos requerem vários dias de observação; os resultados podem ser diferentes para cada indivíduo testado sob as mesmas variáveis; a manutenção ou a experimentação com seres vivos envolve problemas práticos e éticos; os resultados são verificados por meio de evidências indiretas etc. Pode-se imaginar que, com tais dificuldades para a realização de atividades experimentais, a proposição de sequências investigativas para o ensino de biologia tenha, pelo menos de início, uma redução de repertório. (TRIVELATO e TONIDANDEL, 2015, p. 99).

O trabalho de Zômpero, Sampaio e Vieira (2016), por exemplo, evidencia essa particularidade da Biologia. Os autores realizaram investigações nas três áreas da Ciência com uma turma de 6º ano do Ensino Fundamental II e verificaram que as atividades relacionadas à Química e Física eram de teor prático, enquanto as de Biologia eram de teor teórico, com os estudantes investigando textos.

Constatamos também que esse padrão se repete em relação aos trabalhos realizados com turmas de Ensino Médio. Entre os três trabalhos da disciplina de Biologia, verificamos que dois deles aplicavam atividades investigativas de cunho de análise de informações, porém não dispunham de práticas. E quanto aos seis trabalhos de Química e Física, verificamos que cinco dispunham deste caráter prático com aulas de laboratório ou observação da realidade próxima.

Destacamos que as atividades práticas têm grande potencial de engajar os estudantes, mas é importante ressaltar que o Ensino por Investigação não se reduz às práticas de laboratório. As atividades (como leitura de textos) podem ter cunho investigativo, basta que exista engajamento dos alunos com perguntas de investigação e estímulo à argumentação como princípio epistemológico (FERRAZ e SASSERON, 2017b).

Entre os três trabalhos de Biologia do Ensino Médio, dois deles versam sobre Ecologia. Acreditamos que os aspectos pragmáticos (assuntos do cotidiano) podem ser fatores predominantes para a preferência pela temática, uma vez que seja um componente curricular com grande potencial de integrar os âmbitos social, científico e ambiental, um dos eixos da AC. Em relação à Física, há um destaque para o tema relacionado à Lei da Gravitação Universal: dos quatro trabalhos encontrados, três versavam sobre o assunto.

Um resultado chamou a atenção quando analisamos os trabalhos voltados para o Ensino Médio: metade dos artigos foi aplicada em turmas do Ensino Médio integrado ao Técnico. É possível que tal distribuição esteja associada aos planos de carreira dos professores deste nível de ensino. Isto é, com estímulos financeiros através de gratificações pela qualificação acadêmica, não é raro observar professores cursando mestrado e/ou doutorado, os quais impulsionam a realização de pesquisas em sala de aula. Outro fator que pode contribuir é o regime de dedicação exclusiva na maioria dessas instituições, circunstância que permite ao professor mais tempo para preparo de aula e desenvolvimento de pesquisa.

Para respondermos às questões de pesquisa QP2 e QP3, analisamos, na íntegra, todos os artigos do Ensino Médio e do Ensino Fundamental II. Ademais, examinamos os princípios e os autores que nortearam os trabalhos, além das contribuições dos artigos e das dificuldades observadas. Destacamos que os artigos do Ensino Fundamental I não foram analisados em nível de aprofundamento, pois o foco da análise centrou-se especificamente nos professores licenciados em Ciências (Biologia, Física e Química), apesar de entendermos a importância do Ensino de Ciências para crianças desde a Educação Infantil.

Sobre a dinâmica do EnCI nos trabalhos, percebemos que todos utilizam Sequências de Ensino Investigativas (SEI), definido por Sasseron (2015, p. 59) como “o encadeamento de atividades e aulas em que um tema é colocado em investigação e as relações entre esse tema, conceitos, práticas e relações com outras esferas sociais e de conhecimento possam ser trabalhados”. Algumas dessas sequências não foram construídas pelos autores, mas apenas aplicadas (FARIA e VAZ, 2019; NUNES e MOTOKANE, 2017; SILVA, 2015) ou adaptadas através do processo de reflexão orientada (MIRANDA, MARCONDES e SUART, 2015). Outras foram construídas com base em documentos do National Research Council (NRC) dos Estados Unidos, os quais oferecem diretrizes para o ensino por Investigação no país (ZÔMPERO, SAMPAIO e VIEIRA, 2016;ZÔMPERO, FIGUEREIDO E GARBIM, 2017). Um dos trabalhos se baseou na metodologia construtivista de Roger Bybee, enriquecido pelo Instituto de Educação da Universidade de Lisboa: 7Es, que, em tradução para o português, denotam: Envolvimento, Exploração, Explicação, Ampliação, Avaliação, Partilha e Ativismo (SCHEID e PERSICH, 2015). Mais um deles utilizou diversos autores (RECH e MEGLHIORATTI, 2016). No entanto, uma parcela considerável dos trabalhos (BAPTISTA, LAWALL e CLEMENT, 2020; DIAS, VIANNA e CARVALHO, 2018; MOURA e SILVA, 2019; SANTOS, SALES e VIANA, 2019) utilizou os princípios de Carvalho (2013).

Ressaltamos, nesse contexto, que o trabalho de Carvalho (2013) é um livro que trata da aplicação do Ensino de Ciências por Investigação no Ensino Fundamental. Sendo assim, apesar das diferenças entre o Ensino Fundamental I e o Ensino Médio levantadas por Carvalho (2018), parece não haver diferenças metodológicas significativas na construção das SEI.

Todos os trabalhos parecem concordar com Zômpero e Laburú (2011), os quais defendem que as atividades de investigação permitem promover a aprendizagem dos conteúdos conceituais, bem como dos conteúdos procedimentais que envolvem a construção do conhecimento científico, além de serem significativamente diferentes das atividades meramente demonstrativas.

Sobre os enfoques das pesquisas feitas na área, encontramos considerável diversidade quando aplicadas atividades investigativas em sala de aula. Abaixo, separamos os trabalhos em grupos e de acordo com esses enfoques de investigação:

Quadro 3
Enfoque dos artigos encontrados

Elaborado pelos Autores

Aprendizagem de conceitos: os trabalhos encontrados com essa abordagem versam sobre a avaliação da Aprendizagem Significativa de Ausubel. A referência ao Construtivismo de Ausubel está intimamente ligada ao Domínio Conceitual de Duschl discutido no artigo de Soares e Trivelato (2019), o qual leva em conta os conhecimentos prévios dos estudantes, trabalhando suas ideias, a fim de tornar seu pensamento visível e de permitir que se avalie como o conhecimento científico está sendo integrado às suas estruturas conceituais.

Zômpero, Figueiredo e Garbim (2017) e Zômpero, Sampaio e Vieira (2016) avaliam a Transferência referente à Aprendizagem Significativa no EnCI. A Transferência Positiva, por sua vez, é definida pela capacidade de utilizar os conceitos aprendidos de forma significativa em novas situações. Esses autores aplicam Sequências Didáticas Investigativas e, na semana seguinte, utilizam uma nova situação problema, na qual os alunos precisam acessar o conhecimento prévio para resolvê-la. Os resultados mostram que há, sim, transferência positiva a partir das atividades investigativas. Uma contribuição importante de Zômpero, Sampaio e Vieira (2016) foi a observação de que a única atividade que investigava texto, sem nenhum experimento, resultou em uma menor taxa de transferência. Baptista, Lawall e Clement (2020) trabalharam a Aprendizagem Significativa de forma semelhante, e seus resultados mostraram que houve enriquecimento dos significados que auxiliaram os estudantes a abandonar seus conhecimentos prévios equivocados cientificamente.

Engajamento: Fredrics, Blumenfeld e Paris (2004, citados por Sasseron e Souza, 2019) dividem o engajamento em três esferas. A saber: i) engajamento comportamental, por meio da participação nas atividades propostas; ii) engajamento emocional, por meio das reações positivas e negativas em relação aos colegas, professor e atividades; e iii) engajamento cognitivo, por meio do compromisso e vontade na realização das atividades. Faria e Vaz (2019) avaliaram o engajamento de estudantes do Ensino Médio em aulas práticas investigativas de Física. Assim, os alunos foram divididos em grupos e, ao realizar as atividades, foram filmados para posterior análise.

O engajamento cognitivo, por sua vez, é o mais importante para a aprendizagem. Os resultados sugerem que o engajamento comportamental é um requisito fundamental para o cognitivo, no entanto, não o garante, ou seja, o aluno pode estar engajado comportamentalmente, mas orientado por demandas pessoais. Os resultados também mostram que o engajamento pode ser comprometido quando não há colaboração entre os indivíduos dentro de um grupo.

Alfabetização Científica: A AC tem sido amplamente discutida como um dos principais objetivos do Ensino de Ciências por Investigação, conforme podemos verificar em diversos trabalhos (CARVALHO, 2018;DUSCHL, 2008; SASSERON, 2015; SASSERON e CARVALHO, 2011; SCARPA e CAMPOS, 2018; TRIVELATO e TONIDANDEL, 2015). Ser alfabetizado cientificamente significa ter autonomia nas tomadas de decisões e nos posicionamentos diante de questões científicas da sociedade, a partir da análise e da avaliação de situações que envolvam a ciência. Sasseron e Carvalho (2011), em revisão de literatura sobre o tema, identificaram três pontos mais relevantes na promoção da AC. As autoras chamaram esses pontos de Eixos estruturantes da AC, os quais contemplam: (a) a compreensão básica de termos e conceitos científicos fundamentais; (b) a compreensão da natureza da ciência e dos fatores éticos e políticos que influenciam sua prática; e (c) o entendimento das relações entre ciência, tecnologia, sociedade e ambiente. Scarpa e Campos (2018) chamam esses eixos de: (a) aprender ciências; (b) aprender a fazer ciências; e (c) aprender sobre ciências. As autoras evidenciam, através de um breve apanhado histórico do Ensino de Ciências no século XX, que aprender ciências era o principal objetivo da escola básica. Assim, o Ensino de Ciências por Investigação, baseado nas teorias construtivistas que emergem nas décadas de 1960-1970 como resposta ao Ensino tradicional, passa a contemplar os eixos aprender a fazer ciências e aprender sobre ciências.

Este tema esteve presente em quatro artigos encontrados, já os indicadores da AC foram diretamente levantados em dois artigos. Segundo Sasseron (2015), esses indicadores referem-se ao trabalho com informações e dados disponíveis à formulação de hipóteses, explicação de fenômenos, busca de justificativas, estabelecimento de previsões; ao uso de raciocínio lógico e proporcional durante a investigação; e à comunicação de ideias em situações de ensino e aprendizagem.

Essas ações estão intimamente ligadas às práticas epistêmicas, conforme Soares e Trivelato (2019, p. 48) nos evidenciam ao sintetizar o Domínio Epistêmico de Duschl, o qual “compreende as estruturas de geração do conhecimento científico, tais como a coleta de dados, o uso de evidências, de princípios e teorias e a interpretação de evidências para desenvolver explicações sobre fenômenos”.

Assim, apesar de Silva (2015) não utilizar os indicadores da AC em seu trabalho, a análise das interações entre professor e alunos se enquadra neste grupo. A autora tem Vygotsky, um dos principais autores do construtivismo no EnCI, como principal referencial teórico, evidenciando, desta maneira, a importância dada às relações sociais na construção do conhecimento. Prosseguindo, os resultados de Silva (2015) demonstram que os movimentos epistêmicos do professor na situação investigativa favoreceram o processo de evolução conceitual e a concepção de Natureza da Ciência, que deve estar presente em todo aluno de Ciências.

Miranda, Marcondes e Suart (2015), por sua vez, tratam de avaliar a AC de estudantes em uma aula de química do EM. O trabalho avaliou a AC dos jovens a partir dos seus indicadores, e esses dados foram analisados juntamente aos elementos pedagógicos, a partir dos níveis investigativos presentes nas aulas. Ora, em determinada prática específica, embora a professora tenha atuado com o máximo grau investigativo (mediando o conhecimento e colocando o aluno ativo na busca de informações), os alunos ainda assumiram moderado grau investigativo, atuando ativamente apenas em algumas etapas do processo.

Tal circunstância, segundo os autores, pode estar atrelada às dificuldades com os cálculos matemáticos envolvidos na prática. Esse achado sobre as possíveis causas das dificuldades da liberdade intelectual e construção do conhecimento apresentados pelos estudantes do EM corrobora com Carvalho (2018). Isso significa dizer que os problemas propostos são mais complexos que os problemas do Ensino Fundamental, pois contemplam mais profundamente a linguagem científica que envolve a matemática, podendo ser um obstáculo para estudantes com lacunas de aprendizagem nesse campo.

Dias, Viana e Carvalho (2018) mostram uma sequência didática investigativa com a utilização de imagens estroboscópicas para o ensino de Queda dos Corpos com estudantes do 1º ano do Ensino Médio Técnico. A pesquisa buscou avaliar a SEI, a partir da AC produzida pela intervenção. Pelos resultados, percebemos que toda a construção de explicações se deu a partir de interações discursivas, inclusive houve presença de indicadores de AC em praticamente todas as falas dos alunos ao longo da intervenção. Ademais, em grande parte do tempo, as interações discursivas ocorreram entre os alunos e com poucas intervenções docentes que, quando ocorreram, foram no sentido de fomentar ainda mais as interações discursivas e a formulação de argumentos entre os discentes.

Nunes e Motokane (2017), trabalhando com turmas do Ensino fundamental II e Ensino Médio, avaliam especificamente o momento da produção escrita da construção de hipóteses em sequências de ensino investigativas. Esse processo auxilia o professor a identificar os conhecimentos prévios do estudante e o que ainda necessita de mediação.

Relatos de experiência: os autores que objetivaram comunicar as experiências vividas na escola à comunidade acadêmica estão enquadrados neste grupo.

Scheid e Persic (2015), em turma de 3º ano do Ensino Médio de uma escola politécnica Estadual do Sul do Brasil, aplicam o EnCI sobre Alimentação, utilizando as TICs (Tecnologias da Informação e Comunicação) da Web 2.0. O artigo não detalha a sequência didática, mas contribui com uma questão importante: os alunos tinham dois tempos de 45 minutos semanais e, com isso, algumas atividades precisaram ser continuadas em casa, fato que pode comprometer a interação em grupo, tão importante para o EnCI, como já visto ao longo do texto.

Moura e Silva (2019) constroem e aplicam uma SEI sobre Empuxo e Atração Gravitacional, a partir dos pressupostos de Carvalho (2013) e Azevedo (2009, citado por Moura e Silva, 2019), a qual segue a seguinte sequência: questões abertas, problemas abertos, textos históricos ou leitura de textos, demonstrações investigativas, laboratório aberto e sistematização do conhecimento. Essa sequência foi planejada para ser executada em um período de 4 horas, em turmas de 1º ano do Ensino Médio Técnico, na Região Norte do Brasil. O artigo mostra, por meio de uma avaliação diagnóstica, que os estudantes carregavam bastante deficiência em matemática, mas, ainda assim, conseguiram resolver a situação-problema, através da socioconstrução do conhecimento.

Rech e Meglhioratti (2016) apresentam uma sequência didática investigativa em Ecologia Aplicada, no âmbito de um projeto escolar, com turma de 3º ano do EM. Já Santos, Sales e Viana (2019) utilizam uma SEI na etapa de Encontro do Ciclo da Experiência de Kelly (CEK). Houve um levantamento sobre as percepções dos alunos nessa nova abordagem, a partir de uma roda de conversa, e a professora, inclusive, foi ouvida através de uma entrevista. Tal artigo tem a SEI detalhada e utiliza materiais de baixo custo para sua realização, fato que pode auxiliar no trabalho docente. Na entrevista, a professora da turma declarou “que não é uma tarefa muito fácil implementar a abordagem investigativa em sala, porque requer bastante tempo, não só na elaboração da situação problema, mas também porque requer toda uma sequência didática para no final reaplicar a situação problema para ver se de fato houve aprendizagem”. Essa declaração está alinhada com a avaliação da aprendizagem de conceitos, porém é preciso amadurecer as questões de avaliação neste tipo de abordagem.

Campos e Scarpa (2019), a partir de um estudo preliminar, percebem a baixa presença de reflexões sobre como fazer a avaliação na abordagem de EnCI. Entre os cinco artigos encontrados pelas pesquisadoras, todos entendem a avaliação como um processo centrado nos objetivos de ensino e, em três deles, verificaram que a avaliação valoriza a participação ativa dos estudantes, possibilitando a regulação de sua aprendizagem, indicando uma perspectiva mais emancipatória da avaliação.

Considerações finais

As publicações encontradas trazem importantes contribuições para a práxis docente no que diz respeito à abordagem investigativa. No entanto, devemos nos atentar ao fato de que certos artigos sugeridos pelo Google Acadêmico não estão balizados pelos princípios do Ensino de Ciências por Investigação, isto é, eles apenas utilizam o termo, mas não têm claro o ciclo investigativo (PEDASTE et al., 2015) ou o princípio construtivista, imprescindíveis nesta abordagem.

Metade dos trabalhos encontrados com aplicação no Ensino Médio estavam relacionados à Educação Profissional Tecnológica. Esse fato traz à luz questões importantes referentes à valorização do trabalho docente, uma vez que o professor precise estar engajado para a aplicação de uma nova abordagem em sala de aula. Tal engajamento, por sua vez, passa pela motivação intrínseca em lecionar ou por determinada motivação externa, ou seja, quando planos de carreira incentivam financeiramente professores a continuarem seus estudos de pós-graduação, os quais resultam, consequentemente, em aplicação de novas abordagens de ensino em sua sala de aula. Toda atividade em sala de aula tem potencial de ser investigativa, desde a resolução de um exercício com instrumentos básicos (como lápis e papel) até experimentações construídas exclusivamente pelos alunos. Para isso, é preciso o delineamento de um problema de investigação e o estímulo para os estudantes falarem, discutirem e escreverem.

Nas publicações encontradas, observamos o predomínio de atividades educativas de cunho prático nas áreas de conhecimento de Física e Química, o que não ocorreu nas atividades atreladas especificamente à área de Biologia, fato que pode estar relacionado à complexidade da realização de investigações empíricas com seres vivos.

Em relação às pesquisas, verificamos nos trabalhos encontrados que o EnCI pode ser um promotor de Aprendizagem Significativa de conceitos científicos - principal foco do ensino tradicional nas escolas, além de ser capaz de promover competências importantes para a formação do cidadão, como a argumentação inserida no processo de AC desses estudantes. Os relatos de experiência, por vezes, podem não contribuir substancialmente para a pesquisa na área, mas podem contribuir de forma positiva para a práxis docente através da modelagem, isto é, quando alguém se sente capaz de realizar um procedimento após identificar outra pessoa semelhante a si realizando a mesma atividade (BANDURA, AZZI e POLYDORO, 2008).

Esses artigos detalham as sequências didáticas utilizadas, os materiais necessários, as respostas dos estudantes aos estímulos e as possíveis estratégias para a implementação da abordagem que, conforme visto nas revisões de literatura, é bastante recente no Brasil. Em termos de aplicação em sala de aula, um tema sensível nos saltou aos olhos: Como avaliar dentro desta abordagem? Essa questão ainda é pouco abordada nos trabalhos sobre EnCI, nos quais a avaliação não apareceu como objeto de pesquisa em nenhum artigo encontrado na revisão. Apenas Santos, Sales e Viana (2019) mencionaram brevemente o desconforto de uma professora entrevistada quando o assunto centrou-se na avaliação. Por fim, nos demais artigos, a avaliação estava atrelada à obtenção dos dados de pesquisa, desta forma, evidenciando uma lacuna a ser explorada em trabalhos futuros.

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