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Álgebra nos Anos Finais do Ensino Fundamental: reflexões a partir dos PCN e da BNCC para construção do pensamento algébrico significativo
Algebra in the Final Years of Elementary School: reflections from PCN and BNCC to build significant algebraic thinking
Álgebra en los Últimos Años de la Enseñanza Fundamental: reflexiones del PCN y BNCC para la construcción de un pensamiento algebraico significativo
Revista de Ensino de Ciências e Matemática, vol.. 12, núm. 3, 2021
Universidade Cruzeiro do Sul

Artigos

Revista de Ensino de Ciências e Matemática
Universidade Cruzeiro do Sul, Brasil
ISSN-e: 2179-426X
Periodicidade: Trimestral
vol. 12, núm. 3, 2021

Recepção: 24 Janeiro 2021

Aprovação: 28 Fevereiro 2021

Publicado: 11 Maio 2021

Una nueva publicación de artículo publicado en REnCiMa, de iniciativa de sus autores o de terceros, queda sujeta a la expresa mención de la precedencia de su publicación en este periódico, citándose el volumen, la edición y fecha de esa publicación

Este trabalho está sob uma Licença Internacional Creative Commons Atribuição-NãoComercial-Compartilhamento Pela Mesma Licença.

Resumo: Os índices aquém do considerado básico para estudantes brasileiros, nas avaliações nacionais e internacionais, apontam para possíveis déficits na aprendizagem de Matemática, inclusive, uma deficiência no ensino de álgebra. Nesse contexto, o artigo apresenta reflexões sobre a álgebra nos anos finais do Ensino Fundamental (EF), a partir dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), para construção do pensamento algébrico significativo no cotidiano escolar. Possui uma abordagem qualitativa, desenvolvida por meio de um estudo bibliográfico. Nos PCN, a álgebra compunha um dos conteúdos trabalhados pelo bloco Números e Operações, sendo sua abordagem explícita a partir do 3º ciclo do EF. A Base atribuiu papel de destaque à álgebra, quando a definiu como uma das cinco unidades temáticas da Matemática, propondo trabalhá-la desde o 1º ano do EF, através da construção gradativa de conhecimentos, tirando do 8º ano o compromisso de enfatizá-la massivamente. Diante do exposto, observa-se que a BNCC apresenta uma proposta mais detalhada para álgebra, pautada na dissolução dos conteúdos em todo o EF, na tentativa de promover o desenvolvimento do pensamento algébrico significativo, o que gera expectativas de reorganização curricular como uma das alternativas para melhora no desempenho dos estudantes brasileiros em Matemática.

Palavras-chave: Matemática, Ensino de Álgebra, Parâmetros Curriculares Nacionais, Base Nacional Comum Curricular, Pensamento Algébrico Significativo.

Abstract: The rates below what is considered basic for Brazilian students, in national and international assessments, point to possible deficits in the learning of Mathematics, including a deficiency in the teaching of algebra. In this context, the article presents reflections on algebra in the final years of Elementary School (ES), based on the Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) and the Base Nacional Comum Curricular (BNCC), for the construction of meaningful algebraic thinking in school life. It has a qualitative approach, developed through a bibliographic study. In the PCN, algebra comprised one of the contents worked on by the Numbers and Operations block, its approach being explicit from the 3rd ES cycle. The Base attributed a prominent role to algebra, when it defined it as one of the five thematic units of Mathematics, proposing to work it since the 1st year of the ES, through the gradual construction of knowledge, taking from the 8th year the commitment to emphasize it massively. In view of the above, it is observed that BNCC presents a more detailed proposal for algebra, based on the dissolution of contents throughout the ES, in an attempt to promote the development of significant algebraic thinking, which generates expectations of curricular reorganization, as one of the alternatives for improving the performance of Brazilian students in Mathematics.

Keywords: Mathematics, Algebra Teaching, Parâmetros Curriculares Nacionais, Base Nacional Comum Curricular, Significant Algebraic Thinking.

Resumen: reflexiones del PCN y BNCC para la construcción de un pensamiento algebraico significativo : Las tasas por debajo de lo que se considera básico para los estudiantes brasileños, en evaluaciones nacionales e internacionales, apuntan a posibles deficiencias en el aprendizaje de las Matemáticas, incluso una deficiencia en la enseñanza del álgebra. En este contexto, el artículo presenta reflexiones sobre el álgebra en los últimos años de Enseñanza Fundamental (EF), con base en los Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) y la Base Nacional Comum Curricular (BNCC), para la construcción del pensamiento algebraico significativo en la vida escolar. Tiene un enfoque cualitativo, desarrollado a través de un estudio bibliográfico. En el PCN, el álgebra comprendía uno de los contenidos trabajados por el bloque Números y Operaciones, siendo su enfoque explícito a partir del 3er ciclo EF. La Base atribuyó un papel destacado al Álgebra, al definirla como una de las cinco unidades temáticas de las Matemáticas, proponiendo trabajarla desde el 1er año del EF, mediante la construcción paulatina del conocimiento, tomando a partir del 8vo año el compromiso de enfatizarlo masivamente. En vista de lo anterior, se observa que BNCC presenta una propuesta más detallada de álgebra, basada en la disolución de contenidos a lo largo de la EF, en un intento de promover el desarrollo de un pensamiento algebraico significativo, que genera expectativas de reorganización curricular, como una de las alternativas para mejorar el desempeño de los estudiantes brasileños en Matemáticas.

Palabras clave: Matemáticas, Enseñanza de Álgebra, Parâmetros Curriculares Nacionais, Base Nacional Comum Curricular, Pensamiento Algebraico Significativo.

Introdução

Este artigo é trabalho de conclusão do curso de Especialização em Educação para os Anos Finais do Ensino Fundamental, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-rio-grandense (IFSul), câmpus Lajeado, Rio Grande do Sul. Tem por objetivo apresentar reflexões sobre a álgebra nos anos finais do Ensino Fundamental (EF), a partir de documentos legais, tais como os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), para construção do pensamento algébrico significativo no cotidiano escolar.

Considerando o desempenho dos estudantes brasileiros em avaliações que aferem suas competências e habilidades, como as aplicadas pelo Sistema Nacional de Avaliações da Educação Básica (Saeb) e pelo Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), observam-se lacunas nos processos de ensino e de aprendizagem de Matemática, em especial, na unidade temática Álgebra, assim definida pela BNCC (BRASIL, 2018).

Os fatores que sinalizam essas lacunas “parecem, estar associados à maneira como a álgebra é trabalhada nas escolas” (DALTO; BURIASCO, 2009, p. 452). Nesse cenário, torna-se relevante uma análise de documentos oficiais que orientam a Educação Básica (EB) brasileira, buscando-se subsídios que permitam tecer ponderações sobre o ensino de Matemática, em especial de álgebra nos anos finais do EF. Para tanto, realiza-se uma pesquisa qualitativa, por meio de um estudo bibliográfico.

Além desta seção, o artigo ainda apresenta a metodologia de investigação, o desempenho de estudantes na Matemática em avaliações nacionais e internacionais, a fundamentação com base na teoria de aprendizagem significativa e na construção do pensamento algébrico, trazendo, por fim, perspectivas para o ensino de álgebra nos anos finais do EF, a partir dos PCN e da BNCC.

Metodologia da investigação realizada

Para tecer reflexões sobre o ensino de álgebra nos anos finais do EF, a partir de documentos legais, como os PCN e a BNCC, realizou-se uma pesquisa qualitativa, através de um estudo bibliográfico. A abordagem é qualitativa, pois de acordo com Prodanov e Freitas (2013, p. 70):

Os dados coletados nessas pesquisas são descritivos, retratando o maior número possível de elementos existentes na realidade estudada. Preocupa-se muito mais com o processo do que com o produto. Na análise dos dados coletados, não há preocupação em comprovar hipóteses previamente estabelecidas, porém estas não eliminam a existência de um quadro teórico que direcione a coleta, a análise e a interpretação dos dados.

Nesse sentido, o procedimento técnico empregado é o estudo bibliográfico que se utiliza de material já publicado, constituído basicamente de livros, artigos e documentos legais (GIL, 2017). O artigo está embasado na teoria de aprendizagem significativa de Ausubel (1968, 1978, 1980, apud MOREIRA, 1999, 2010), na qual se buscam subsídios para discorrer sobre o insucesso do ensino de álgebra, atrelado a um aprendizado mais mecânico do que significativo.

O desempenho dos estudantes brasileiros na área de Matemática em avaliações nacionais, como o Saeb, e internacionais, como o Pisa, também é alvo de discussão neste artigo, promovido através de pesquisa em sites governamentais, como o do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), que passou a integrar o portal único do Governo Federal e que apresenta, por meio de índices, um panorama da EB no país, gerado pelo desempenho dos estudantes brasileiros em avaliações internas e externas e será apresentado na seção que segue.

Além disso, aborda-se a construção do pensamento algébrico, a partir de autores e de documentos legais que discorrem sobre essa temática, como Ponte, Branco e Matos (2009), encontrados, principalmente, na web, através de e-books, revistas digitais e bibliotecas eletrônicas. Por último, promove-se um estudo comparativo entre os documentos oficiais, PCN e BNCC, na área de Matemática, com o propósito de arrolar reflexões sobre a álgebra nos anos finais do EF, para construção do pensamento algébrico significativo no cotidiano escolar.

Estatísticas da Matemática em avaliações

As dificuldades encontradas em Matemática fazem com que essa disciplina seja um obstáculo para muitos estudantes, que não conseguem raciocinar de forma lógica ou não enxergam um motivo para aprender a fazer cálculos e resolver equações. Os PCN, em vigor desde 1998, já apontavam que a Matemática acaba atuando como um filtro social, por ser a área do conhecimento com maior índice de reprovação, selecionando os estudantes capazes de utilizar os saberes matemáticos em suas vidas.

Em nosso país, o ensino de Matemática ainda é marcado pelos altos índices de retenção, pela formalização precoce de conceitos, pela excessiva preocupação com o treino de habilidades e mecanização de processos sem compreensão. A seleção e organização de conteúdos devem levar em conta sua relevância social e sua contribuição para o desenvolvimento intelectual do aluno e não deve ter como critério apenas a lógica interna da Matemática (BRASIL, 1998, p. 19).

O Saeb apresenta um conjunto de avaliações aplicadas a cada dois anos na rede pública de ensino e uma amostra da rede privada, com o intuito de mensurar a qualidade do ensino no país, o que permite ao INEP um diagnóstico da EB, através do nível de aprendizado dos estudantes ao final de cada etapa de ensino. A prova aplicada no ano de 2019 passou por uma reestruturação para se adequar à BNCC. O documento da Base se tornou referência na sua reformulação, adicionando áreas do conhecimento a serem avaliadas, como Ciências da Natureza e Ciências Humanas, no 9º ano do EF, com testes aplicados de forma amostral e não somente em Português e Matemática, como era até então.

De acordo com o resultado preliminar do Saeb 2019 (BRASIL, 2020), os estudantes brasileiros matriculados no 9º do EF possuem, em média, o nível 3 de proficiência em Matemática, com 263 pontos, em uma escala de níveis de 0 a 9, que em regime de crescimento agregam capacidades específicas da disciplina com conhecimentos mínimos em cada categoria. O Brasil apresentou pouca evolução em relação à última edição do Saeb, realizada em 2017, em que alcançou a mesma posição, com 258 pontos em Matemática, ainda distante do objetivo almejado. Esse dado do Saeb influencia nos resultados do IDEB, alcançando-se 4.9, no ano de 2019, abaixo da média proposta para os anos finais do EF, que era 5.2, com previsão de atingir o índice de 5.5, em 2021.

Já as avaliações externas, como o Pisa, apontam para possíveis déficits na aprendizagem de Matemática, com ênfase para a álgebra. Acredita-se que essa deficiência esteja relacionada a uma aprendizagem mecânica, alicerçada em aspectos técnicos e operacionais, e não ao desenvolvimento do pensamento lógico abstrato. As estatísticas indicam que uma parcela muito pequena de estudantes se encontra no estágio considerado adequado em Matemática.

A avaliação do Pisa é um estudo comparativo realizado a cada três anos, que permite aos países integrantes da OCDE[1] avaliarem os conhecimentos e habilidades de seus estudantes. Analisa os domínios de Leitura, Matemática e Ciências, em todos os ciclos, dando destaque a um campo específico em cada edição, na qual os estudantes respondem a um maior número de itens no teste dessa área do conhecimento. O Pisa também avalia outros domínios, chamados inovadores, como o letramento financeiro[2] e a competência global[3].

Em 2018, aproximadamente 31,8% dos estudantes brasileiros alcançaram o nível 2 ou acima, em contraste a 76% dos estudantes dos países da OCDE. O nível 2 é considerado o básico de proficiência, que se espera de todos os estudantes, a fim de que possam tirar proveito de novas oportunidades de aprendizagem, participando plenamente da vida social de uma sociedade moderna em um mundo globalizado (BRASIL, 2019). O percentual de estudantes em cada nação, que alcança cada nível de proficiência, indica quão bem os países conseguem fomentar a excelência em seus sistemas educativos. O Quadro 1 apresenta os sete níveis de proficiência da escala de Matemática do Pisa 2018, bem como o percentual de estudantes da OCDE e do Brasil em cada nível.

Quadro 1
Resultados do PISA de 2018

Adaptado de Brasil (2019)

A partir dos resultados do Pisa 2018, apresentados no Quadro 1, retorna-se às lacunas no ensino de Matemática. Conforme indicativo, 68,1% dos estudantes brasileiros estão concentrados nos dois primeiros níveis, o abaixo de 1 (de quem é esperado que consigam realizar algumas tarefas matemáticas diretas e fáceis) e 1 (que propõe questões claramente definidas), sendo que atingir, pelo menos, o nível 2 é chegar ao nível básico.

Destaca-se que apenas 9,3% dos estudantes brasileiros chegaram ao nível 3, sendo o nível com maior percentual de estudantes dos países integrantes da OCDE, com 24,9%, que exige conhecimentos de porcentagem, frações, números decimais, relação de proporcionalidade, interpretações e raciocínio lógico. A álgebra aparece somente a partir do nível 4, através da formulação de hipóteses e da representação simbólica, nível máximo alcançado apenas por 3,4% dos estudantes brasileiros.

Ressalta-se que as avaliações tomadas como referência neste artigo, Saeb (2019) e Pisa (2018), explicitam, através da amostragem das habilidades consideradas, a problemática da falta de conhecimentos matemáticos esperados para os estudantes em cada etapa de ensino, possivelmente atrelada a uma aprendizagem mais mecânica do que significativa, conceitos esses discutidos na próxima seção.

Aprendizagem significativa

A análise das estatísticas do desempenho dos estudantes da EB aponta a Matemática como possível vilã na trajetória escolar daqueles que não apresentam destreza na resolução de cálculos e situações problema. Na perspectiva de refletir sobre tal realidade, ainda marcada pela aprendizagem mecânica, realiza-se esse estudo.

Moreira (1999, p. 154) descreve a “aprendizagem mecânica (ou automática) como sendo a aprendizagem de novas informações com pouca ou nenhuma interação com conceitos relevantes existentes na estrutura cognitiva”[4]. Para o autor, os conhecimentos adquiridos de forma mecânica não interagem com os prévios já armazenados pelo indivíduo, pois “não há interação entre a nova informação e aquela já armazenada” (MOREIRA, 1999, p. 154).

Para Moreira (1999, p. 154), “a aprendizagem mecânica é sempre necessária quando um indivíduo adquire informações em uma área do conhecimento completamente nova para ele, isto é, a aprendizagem mecânica ocorre até que alguns elementos de conhecimento existam na estrutura cognitiva”. Quando há um esquecimento total de um assunto, como se o indivíduo nunca tivesse aprendido aquilo, é provável que a aprendizagem tenha ocorrido apenas de forma mecânica. De um modo geral, continua-se promovendo uma aprendizagem mais mecânica do que significativa, ou seja, “aquela praticamente sem significado, puramente memorística, que serve para as provas, e é esquecida, apagada logo após. Em linguagem coloquial, a aprendizagem mecânica é a conhecida decoreba, tão utilizada pelos alunos e tão incentivada na escola” (MOREIRA, 2010, p. 12).

De acordo com Moreira (1999), uma aprendizagem significativa ocorre quando uma nova informação se ancora em conceitos pré-existentes na estrutura cognitiva do estudante. Entende-se por aprendizagem ideal, uma aprendizagem gradual, em que o conhecimento prévio é a variável mais importante para a aprendizagem significativa de novos conceitos.

Aprendizagem significativa é um processo por meio do qual uma nova informação relaciona-se com um aspecto especificamente relevante da estrutura de conhecimento do indivíduo, ou seja, este processo envolve a interação da nova informação com uma estrutura de conhecimento específica, a qual Ausubel define como conceito subsunçor, existente na estrutura do indivíduo. A aprendizagem significativa ocorre quando a nova informação se ancora em conceitos ou proposições relevantes, preexistentes na estrutura do aprendiz. Ausubel vê o armazenamento de informações no cérebro humano como sendo organizado, formando uma hierarquia conceitual, na qual elementos mais específicos de conhecimento são ligados e assimilados a conceitos mais gerais, mais inclusivos (MOREIRA, 1999, p. 153).

Ainda conforme Moreira (2010, p. 23), “a facilitação da aprendizagem significativa depende muito mais de uma nova postura docente e de uma nova diretriz escolar do que de novas metodologias e as mais modernas tecnologias de informação e comunicação”. A BNCC é um dos atuais documentos que orienta a educação no Brasil e aponta as diretrizes essenciais a serem trabalhadas, propondo algumas metodologias de apoio. Para a Matemática, sugere a construção gradativa de conhecimentos, como por exemplo, a unidade temática Álgebra, já presente desde os anos iniciais do EF.

O conhecimento prévio do estudante passa a ser a chave para a aprendizagem significativa; contudo, sabe-se que grande parte da aprendizagem gerenciada pelas escolas, hoje, permanece em uma zona intermediária, denominada zona cinza (MOREIRA, 2010), conforme ilustrado no Quadro 2.

Quadro 2
Transição entre a aprendizagem mecânica e a aprendizagem significativa

Adaptado de Moreira (2010, p. 12)

Nesse panorama, o docente tem um papel primordial entre a transição da aprendizagem mecânica para a significativa. Moreira (1999) apresenta quatro tarefas fundamentais para o professor nesse processo, conforme descrito no Quadro 3.

Quadro 3
Papel do professor na promoção da aprendizagem significativa

Adaptado de Moreira (1999, p. 162)

É papel do professor de Matemática organizar os conteúdos de modo progressivo, em uma rede de conceitos, partindo de exemplos simples até chegar aos mais complexos, considerando os conhecimentos que o estudante já tem para atribuir novos significados a eles.

Moreira (2010) ainda considera necessárias duas condições para que a aprendizagem ocorra de forma significativa: a disposição do estudante para aprender e o material didático desenvolvido, que deve ser potencialmente significativo para ele, além de ser construído a partir dos seus conhecimentos prévios.

Os conceitos subsunçores, definidos por Ausubel (1968 apud MOREIRA, 1999), encontram-se na Matemática como fundamentais para possibilitar a construção estruturada de novos conhecimentos, que se interligam as estruturas cognitivas já existentes e disponíveis no estudante. Acrescenta-se que “o fator isolado mais importante que influencia a aprendizagem é aquilo que o aluno já sabe; descubra isso e o ensine de acordo” (AUSUBEL, 1968, p. 78 apud MOREIRA, 1999, p. 163).

Discute-se na seção que segue a definição de pensamento algébrico, destacando que seu trabalho desde os primeiros anos de escolaridade constitui uma base importante para o desenvolvimento de uma aprendizagem significativa.

Construção do pensamento algébrico

Diante da proposta da BNCC (BRASIL, 2018) para o ensino de álgebra, torna-se relevante fazer referência à maneira como o estudante constrói o conhecimento algébrico, presente em situações como observação de regularidades, compreensão de tabelas e gráficos e resolução de situações problemas. E a álgebra é a principal aliada no desenvolvimento do pensamento hipotético-dedutivo, através da manipulação de equações e não, puramente, da sua resolução mecânica.

O significado de álgebra, segundo o dicionário online (MICHAELIS, 2020) é a “Ciência matemática que tem por objetivo simplificar e generalizar as questões da aritmética, buscando resolução de problemas por meio de fórmulas em que os símbolos (letras e sinais) representam números desconhecidos ou uma faixa de possíveis números”. A álgebra surge para resolver questões abstratas e desenvolver nos indivíduos a capacidade de criar hipóteses. Portanto, torna-se objetivo de sua aprendizagem o desenvolvimento do pensamento algébrico para aquisição de ferramentas, como o uso do simbolismo e a generalização de padrões, para a resolução de situações problemas (KAPUT, 2008 apud PONTE; BRANCO; MATOS, 2009). Todavia, dependendo da ênfase dada ao ensino de álgebra, acontece o insucesso no desenvolvimento dessa habilidade, desenvolvida por meio de uma aprendizagem mecânica, tão logo esquecida na zona cinza (MOREIRA, 2010).

Conforme a BNCC (BRASIL, 2018), integram o pensamento algébrico competências, como: identificar regularidades e padrões de sequências numéricas e não numéricas, compreender e utilizar a simbologia algébrica, além da capacidade de abstração e generalização como ferramenta para resolver problemas.

A unidade temática Álgebra tem como finalidade o desenvolvimento de um tipo especial de pensamento – pensamento algébrico – que é essencial para utilizar modelos matemáticos na compreensão, representação e análise de relações quantitativas de grandezas e de situações e estruturas matemáticas, fazendo uso de letras e outros símbolos. Para esse desenvolvimento, é necessário que os alunos identifiquem regularidades e padrões de sequências numéricas e não numéricas, estabeleçam leis matemáticas que expressem a relação de interdependência entre grandezas em diferentes contextos, bem como criar, interpretar e transitar entre as diversas representações gráficas e simbólicas, para resolver problemas por meio de equações e inequações, com compreensão dos procedimentos utilizados. As ideias matemáticas fundamentais vinculadas a essa unidade são: equivalência, variação, interdependência e proporcionalidade. Em síntese, essa unidade temática deve enfatizar o desenvolvimento de uma linguagem, o estabelecimento de generalizações, a análise da interdependência de grandezas e a resolução de problemas por meio de equações ou inequações (BRASIL, 2018, p. 270).

Acrescenta-se que o ensino de álgebra é marcado pela transição de uma Matemática concreta para um campo mais abstrato.

Deste modo, o pensamento algébrico inclui a capacidade de lidar com expressões algébricas, equações, inequações, sistemas de equações e de inequações e funções. Inclui, igualmente, a capacidade de lidar com outras relações e estruturas matemáticas e usá-las na interpretação e resolução de problemas matemáticos ou de outros domínios. A capacidade de manipulação de símbolos é um dos elementos do pensamento algébrico, mas também é o “sentido de símbolo”. Ou seja, no pensamento algébrico dá-se atenção não só aos objetos, mas, principalmente, às relações existentes entre eles, representando e raciocinando sobre essas relações tanto quanto possível de modo geral e abstrato. Por isso, uma das vias privilegiadas para promover este raciocínio é o estudo de regularidades num dado conjunto de objetos (PONTE; BRANCO; MATOS, 2009, p. 10).

Aprender álgebra significa ser capaz de pensar algebricamente, isso inclui o conhecimento das propriedades das operações, pois a identificação dessas e a sua generalização, desde os primeiros anos de escolaridade, constitui uma base importante para o desenvolvimento do pensamento algébrico. Esse último, segundo Ponte, Branco e Matos (2009), inclui três vertentes fundamentais: representar, raciocinar e resolver problemas, conforme descrito no Quadro 4.

Quadro 4
Vertentes fundamentais do pensamento algébrico

Adaptado de Ponte, Branco e Matos (2009, p. 11)

Nesse contexto, passa a ser desafio do professor possibilitar a estruturação do pensamento hipotético-dedutivo e abstrato, através de uma aprendizagem significativa, que contemple a capacidade de “pensar algebricamente numa diversidade de situações, envolvendo relações, regularidades, variação e modelação. Resumir a atividade algébrica à manipulação simbólica equivale a reduzir a riqueza da Álgebra a apenas uma das suas facetas” (PONTE; BRANCO; MATOS, 2009, p. 10).

O planejamento docente pode tecer estratégias para a construção do pensamento algébrico por parte do estudante, a partir de reflexões sobre os PCN e a BNCC, que serão apresentadas na seção seguinte. O desempenho dos estudantes se constitui num termômetro constante para análise de uma possível mera reprodução de regras algébricas e técnicas operatórias, na resolução de equações descontextualizadas ou da compreensão, generalização, dedução, capacidade de reelaboração e reaplicação em situações problemas e, principalmente, em sua realidade social.

Álgebra nos PCN e na BNCC

O estudo dos PCN (BRASIL, 1998) e da BNCC (BRASIL, 2018) possibilita tecer reflexões sobre as propostas para o ensino de álgebra nos anos finais do EF, trilhando-se as semelhanças entre esses documentos e apresentando-se as alterações presentes na Base. Os PCN (BRASIL, 1998) apontam, como característica fundamental da Matemática, a forma como o estudante compreende e atua no mundo. Por sua vez, a BNCC traz que “o conhecimento matemático é necessário para todos os alunos da Educação Básica, seja por sua grande aplicação na sociedade contemporânea, seja por sua potencialidade na formação de cidadãos críticos, cientes de suas responsabilidades sociais” (BRASIL, 2018, p. 265).

Conforme os PCN, para exercer a cidadania é necessário saber calcular, medir, raciocinar, argumentar, tratar informações estatisticamente. Espera-se que a Matemática desempenhe seu papel na formação de capacidades intelectuais, estruturação do pensamento, agilidade do raciocínio, aplicação a problemas, situações da vida cotidiana e do trabalho, além de seu apoio indiscutível às demais áreas do conhecimento (BRASIL, 1998).

O documento dos PCN organizou o EF em ciclos, em que o 1º e 2º ciclos correspondiam a séries iniciais, o 3º ciclo correspondia a 5ª e 6ª séries e o 4º e último ciclo, a 7ª e 8ª séries. A Matemática foi dividida em quatro blocos de conteúdos: Números e Operações; Espaço e Forma; Grandezas e Medidas; Tratamento da Informação (BRASIL, 1998). A álgebra compunha um conteúdo a ser trabalhado dentro do bloco Números e Operações.

Neste artigo, dar-se-á ênfase ao 3º e ao 4º ciclos, pelo foco ser nos anos finais do EF. O Quadro 5 sintetiza os principais conceitos e procedimentos algébricos propostos pelos PCN para os ciclos finais do Fundamental.

Quadro 5
Conceitos e procedimentos algébricos para os ciclos finais do EF

Adaptado de Brasil (1998)

Os PCN consideram ainda que, devido à complexidade que caracteriza os conceitos e os procedimentos, não é desejável um trabalho aprofundando das operações com expressões algébricas e as equações no 3º ciclo. “É suficiente nesse ciclo que os alunos compreendam a noção de variável e reconheçam a expressão algébrica como forma de traduzir a relação existente entre a variação de duas grandezas” (BRASIL, 1998, p. 68).

No 4º ciclo, o ponto de partida é a pré-álgebra, desenvolvida na etapa anterior por meio de jogos, generalizações e representações matemáticas. Os PCN (BRASIL, 1998) estabelecem como fundamental, nesse ciclo, a compreensão de conceitos como o de variável e de função, explorando apenas a sua noção, uma vez que sua abordagem formal deva ocorrer no Ensino Médio; a representação de fenômenos na forma algébrica e gráfica; a formulação e resolução de problemas por meio de equações. Ainda consideram importante que as explorações de situações levem o estudante a “produzir e interpretar diferentes escritas algébricas, identificando as equações, inequações e sistemas; resolver situações problema por meio de equações e inequações do 1º grau; observar regularidades e estabelecer leis matemáticas” (BRASIL, 1998, p. 87).

No Brasil, mesmo com algumas reformas educacionais, o ensino de álgebra, até então, havia sofrido poucas alterações. Contudo, através da BNCC (BRASIL, 2018), a álgebra passou a compor uma das cinco unidades temáticas da Matemática, devendo ser trabalhada desde os anos iniciais do EF, com foco no desenvolvimento do pensamento algébrico, para que os conhecimentos sobre álgebra, que serão trabalhados nos anos finais, sejam incorporados de forma mais amistosa pelos estudantes, o que gera expectativas de novos rumos para o seu aprendizado.

O documento da BNCC estabelece que, no EF, o estudante precisa ser preparado para entender como a Matemática é aplicada em diferentes situações, dentro e fora da escola (BRASIL, 2018). Destaca-se o compromisso com o desenvolvimento do letramento matemático, que é definido como:

As competências e habilidades de raciocinar, representar, comunicar e argumentar matematicamente, de modo a favorecer o estabelecimento de conjecturas, a formulação e a resolução de problemas em uma variedade de contextos, utilizando conceitos, procedimentos, fatos e ferramentas matemáticas. É também o letramento matemático que assegura aos alunos reconhecer que os conhecimentos matemáticos são fundamentais para a compreensão e a atuação no mundo e perceber o caráter de jogo intelectual da Matemática, como aspecto que favorece o desenvolvimento do raciocínio lógico e crítico, estimula a investigação e pode ser prazeroso (fruição) (BRASIL, 2018, p. 266).

Para chegar ao letramento matemático, o estudante precisa ser capaz de formular, empregar e interpretar a Matemática em uma variedade de contextos. Por isso, na prática pedagógica, é importante que os procedimentos sejam inseridos em uma rede de significados mais ampla, em que o foco não seja o cálculo em si, mas as relações que ela permite estabelecer entre os diversos conhecimentos que o estudante já tem.

Além das dez competências gerais para a EB, o documento da Base (BRASIL, 2018) apresenta oito competências específicas de Matemática para o EF, cinco unidades temáticas[7], seus respectivos objetos de conhecimento (conteúdos, conceitos e processos) e habilidades (objetivos de aprendizagem). De acordo com a BNCC, a Matemática foi dividida nas unidades temáticas: Números; Álgebra; Geometria; Grandezas e Medidas; Probabilidade e Estatística (BRASIL, 2018). No Quadro 6, estão descritos os objetos de conhecimento e as habilidades, previstas pela BNCC, para o 6º e 7º anos do EF, na unidade temática Álgebra.

Quadro 6
Álgebra nos 6º e 7º anos do EF

Adaptado de Brasil (2018)

Comparando-se os Quadros 5 e 6, é notável que as habilidades a serem desenvolvidas nos 6º e 7º anos do EF, de acordo com a BNCC, apresentam uma quantidade maior de objetos de aprendizagem a serem trabalhados com os estudantes na etapa inicial dos anos finais em relação à proposta de iniciação à álgebra trazida pelos PCN.

Observa-se que os PCN propõem, para esse ciclo, a representação de variáveis, generalização de sequências através de expressões numéricas e o cálculo do valor numérico. Já a BNCC inicia no 6º ano a relação de igualdades, na premissa de que ela não se altera ao aplicar a mesma operação em ambos os membros da equação, utilizando esses conceitos para encontrar valores desconhecidos, através da resolução de problemas envolvendo ideias de desigualdade (divisão proporcional) e razão. Para o 7º ano do EF, prevê-se uma gama ainda maior de conteúdos, antecipando-se conceitos, propostos pelos PCN para o 4º ciclo do EF, como a linguagem algébrica variável/incógnita, que compete à representação de valores desconhecidos por letras, fazendo uso da simbologia algébrica. O conceito de grandezas direta e inversamente proporcionais, expressas por sentenças algébricas e a própria resolução, e elaboração de problemas envolvendo a equação do primeiro grau do tipo ax + b = c.

Já no Quadro 7, são apresentados os objetos de conhecimento e as habilidades previstas para o 8º e o 9º anos do EF, na unidade temática Álgebra, de acordo com a BNCC.

Quadro 7
Álgebra nos 8º e 9º anos do EF

Adaptado de Brasil (2018)

Nos PCN se observa que a álgebra era proposta de forma massiva na 7ª e 8ª séries do EF, quando, de fato, os estudantes tinham contato com o universo algébrico, como a resolução de equações do 1º e do 2º graus, resolução de sistemas de equações, grandezas direta e inversamente proporcionais, com representação no plano cartesiano, monômios e polinômios, produtos notáveis e, ainda, a resolução de situações problema expressas por uma equação do 2º grau através de fatoração.

A BNCC diluiu os conteúdos, antes trabalhados de forma exaustiva no ciclo final do EF, entre os três anos finais do fundamental e possibilita a construção do pensamento algébrico nos anos anteriores. Para o 8º ano, ainda propõe algumas habilidades similares aos PCN, mas com a diferença de previsão de estudo de equações do 2º grau incompletas do tipo ax² = b, a serem trabalhadas por meio da resolução e elaboração de problemas, através de técnicas variadas.

Para o 9º ano do EF, a BNCC traz os conceitos de fatoração e produtos notáveis, e introduz as funções com representação numérica, algébrica e gráfica, com foco principal no conceito de dependência entre variáveis de função afim e quadrática. Já nos PCN, o trabalho com funções aparecia citado na descrição dos conceitos e procedimentos, fazendo-se a seguinte referência: “Esse caminho dado à álgebra, a partir da generalização de padrões, bem como o estudo da variação de grandezas possibilita a exploração da noção de função nos 3º e 4º ciclos. Entretanto, a abordagem formal desse conceito deverá ser objeto de estudo no Ensino Médio” (BRASIL, 1998, p. 51). O documento da BNCC salienta que as ideias matemáticas fundamentais vinculadas à álgebra no EF são:

Equivalência, variação, interdependência e proporcionalidade. Em síntese, essa unidade temática deve enfatizar o desenvolvimento de uma linguagem, o estabelecimento de generalizações, a análise da interdependência de grandezas e a resolução de problemas por meio de equações e inequações (BRASIL, 2018, p. 270).

Dessa forma, pondera-se que a BNCC propõe uma abordagem mais minuciosa da álgebra, quando comparada ao que está proposto nos PCN. Observa-se a antecipação de conceitos algébricos e o estudo dessa unidade temática desde o 1º ano do EF, primando pela resolução e criação de situações problemas, de forma mais contextualizada e estabelecendo relações entre os conhecimentos matemáticos, o que possibilita uma nova organização curricular, apresentada como perspectivas para o ensino de álgebra na seção seguinte.

Perspectivas para o ensino de álgebra

De acordo com os PCN, “o estudo da álgebra constitui um espaço bastante significativo para que o aluno desenvolva e exercite sua capacidade de abstração e generalização, além de lhe possibilitar a aquisição de uma poderosa ferramenta para resolver problemas” (BRASIL, 1998, p. 115). E o pensamento utilizado na resolução de problemas é o hipotético-dedutivo, desenvolvido por meio do estudo da álgebra.

Os adolescentes desenvolvem de forma bastante significativa a habilidade de pensar abstratamente, se lhes forem proporcionadas experiências variadas envolvendo noções algébricas, a partir dos ciclos iniciais, de modo informal, em um trabalho articulado com a aritmética. Assim, os alunos adquirem base para uma aprendizagem de álgebra mais sólida e rica em significados (BRASIL, 1998, p. 117).

Com base nos índices de desempenho dos estudantes nas avaliações de habilidades em Matemática, como o Pisa (BRASIL, 2019) e o Saeb (BRASIL, 2020), aponta-se para um trabalho docente ainda fragmentado, que não desenvolve todos os aspectos competentes ao conhecimento algébrico no EF. O estudo do cálculo algébrico, através da resolução de equações prontas, ainda é soberano entre as estratégias de ensino aplicadas, e os estudantes continuam com dificuldades para sequenciar operações mecânicas.

A capacidade de abstração e generalização é uma ferramenta adquirida por meio do estudo da álgebra. Todavia, dependendo da ênfase que os professores dão ao seu ensino, acontecem falhas no desenvolvimento dessa habilidade, como se pode observar através de pesquisas em Educação Matemática (FIORENTINI; MIORIM; MIGUEL, 1993; DALTO; BURIASCO, 2009). Espera-se da Matemática “que desempenhe, no currículo, seu papel na formação de capacidades intelectuais, na estruturação do pensamento, na agilização do raciocínio do aluno, na sua aplicação a problemas, situações da vida cotidiana e atividades do mundo do trabalho” (BRASIL, 1998, p. 28). Ademais:

Tradicionalmente, a prática mais frequente no ensino de matemática tem sido aquela em que o professor apresenta o conteúdo, partindo de definições, exemplos, demonstração de propriedades, seguidos de exercícios de aprendizagem, fixação e pressupõe-se que o aluno aprenda por reprodução (BRASIL, 1998, p. 37).

Na perspectiva de mudanças no ensino de álgebra, visando a uma aprendizagem significativa (MOREIRA, 1999, 2010), é imprescindível considerar o estudante como ator principal na construção do seu conhecimento, sendo papel do professor promover conexões entre os conhecimentos que o aprendiz já tem e os novos, num contexto de resolução de problemas. Müller, Hetkowski e Pinheiro (2017) sugerem, como estratégias para o ensino de Matemática, o uso de jogos, de atividades investigativas e da resolução de problemas.

A BNCC reforça a importância de inserir nas aulas de Matemática o uso de tecnologias e calculadoras, que podem trazer contribuições para os processos de ensino e de aprendizagem da álgebra, uma vez que os PCN já tangenciavam para o emprego desses recursos à medida que “relativizam a importância do cálculo mecânico e da simples manipulação simbólica, uma vez que por meio de instrumentos esses cálculos podem ser realizados de modo mais rápido e eficiente” (BRASIL, 1998, p. 43).

A Base (BRASIL, 2018) propõe uma Matemática construída de forma gradativa, ano a ano, retomando e aprofundando os conhecimentos matemáticos e reforça que, para favorecer as abstrações, é importante que os estudantes reelaborem os problemas propostos após os terem resolvido. Por esse motivo, nas diversas habilidades propostas, há relação com a resolução de problemas, como também indicado nos PCN.

A situação-problema é o ponto de partida da atividade matemática e não a definição. No processo de ensino e aprendizagem, conceitos, ideias e métodos matemáticos devem ser abordados mediante a exploração de problemas, ou seja, de situações em que os alunos precisem desenvolver algum tipo de estratégia para resolvê-las (BRASIL, 1998, p. 40).

Além da resolução de problemas, a BNCC (BRASIL, 2018) sugere a investigação, o desenvolvimento de projetos e a modelagem como processos para o ensino de Matemática na perspectiva de promover o desenvolvimento do pensamento algébrico, componente destaque de sua proposta. A Figura 1 sintetiza o caminho percorrido com o ensino de álgebra, entrelaçado com as possibilidades apresentadas pela Base. A leitura da nuvem de palavras pode ser realizada através da legenda de cores.


Figura 1
Perspectivas para o ensino de Álgebra
Elaborado pelos Autores

Espera-se que a Matemática consiga conquistar uma gama maior de estudantes e ser capaz de despertar a curiosidade, a criatividade, o raciocínio lógico e, principalmente, a capacidade de pensar. É papel fundamental da escola preparar o estudante para entender como a Matemática é utilizada dentro e fora dela. Mesmo que os processos adotados estejam integrados a uma cúpula de conteúdos interligados, regras, fórmulas e símbolos próprios da álgebra, o seu objetivo deve primar pela busca de respostas a um desafio inicial:

esta grande potencialidade do simbolismo é também a sua grande fraqueza. Esta vida própria tem tendência a desligar-se dos referentes concretos iniciais e corre o sério risco de se tornar incompreensível para o aluno. É o que acontece quando se utiliza simbologia de modo abstrato, sem referentes significativos, transformando a Matemática num jogo de manipulação, pautado pela prática repetitiva de exercícios envolvendo expressões algébricas, ou quando se evidenciam apenas as propriedades das estruturas algébricas, nos mais diversos domínios (PONTE; BRANCO; MATOS, 2009, p. 8).

Como a Matemática contribui para inúmeras situações do mundo globalizado, espera-se que a escola cumpra o seu papel de mediadora, para que a álgebra deixe de ser explicitada através de uma extensiva gama de cálculos pouco compreensíveis, e que assuma a sua função no desenvolvimento do pensamento algébrico significativo.

Considerações finais

As avaliações tomadas como referência neste artigo, Saeb e Pisa, explicitaram a problemática da falta de conhecimentos matemáticos básicos, esperados para estudantes do EF. Isso é um indício de que aulas de Matemática estão aquém de uma aprendizagem significativa e continuam promovendo uma aprendizagem mecânica e com pouco significado. Nesse contexto, o objetivo deste estudo foi apresentar reflexões sobre o ensino de álgebra nos anos finais do EF, a partir dos PCN e da BNCC, para construção do pensamento algébrico significativo no cotidiano escolar.

Ao entrar em uma aula de Matemática, por exemplo, e propor-se a revisão de algum conteúdo, a maioria dos estudantes participará como ouvinte, não contribuindo com informações. Poucos dirão lembrar, vagamente, de alguns fatos, possivelmente, sem recordar os procedimentos envolvidos na resolução, e uma quantidade menor ainda irá colaborar com o professor, enquanto ele revisa o conteúdo. Esse cenário decorre de um ensino memorístico, resultado de uma aprendizagem que permanece na “zona cinza”, com falta de contexto e intermediária à aprendizagem significativa.

Os estudos apresentados remetem a evidências de que os conhecimentos adquiridos de forma mecânica não interagem com os conhecimentos prévios dos estudantes, não gerando novas aprendizagens. O que não tem significado e utilidade para o indivíduo é esquecido por ele. Provavelmente, esse seja um dos fatores que justifique o baixo desempenho dos estudantes na disciplina de Matemática.

A álgebra visa à resolução de problemas por meio de fórmulas, que utilizam símbolos, e seu objetivo é desenvolver o pensamento hipotético-dedutivo. Observa-se, por intermédio das estatísticas, que ainda está longe de atingir a sua relevância no desenvolvimento do raciocínio lógico de um percentual significativo de estudantes. A BNCC, além de suprir as exigências de um novo tempo, pautando uma Matemática voltada às necessidades dos estudantes, visa promover a construção do pensamento algébrico.

Aprender álgebra significa ser capaz de pensar algebricamente. Esse pensamento inclui capacidades matemáticas que englobam o lidar com a sua simbologia para resolução de expressões algébricas e equações e aplicá-las na resolução de problemas matemáticos ou de outros domínios; contudo, destacam-se as relações existentes entre os objetos, representando e raciocinando sobre elas de modo abstrato.

A BNCC transformou a Álgebra em uma unidade temática própria, indicando novos caminhos na reestruturação curricular e no modo de ensiná-la, desde os anos iniciais, tirando do 8º ano o compromisso de trabalhá-la de forma massiva, sem contar com muitos conhecimentos prévios dos estudantes. Ao analisar as mudanças promovidas pela BNCC, tem-se a impressão de que a álgebra ficou mais leve, pois está presente no currículo desde o 1º ano do EF, com maior clareza quanto ao seu papel de promover o desenvolvimento do pensamento algébrico.

A unidade temática Álgebra apresenta, explicitamente, uma listagem maior de objetos de conhecimento e habilidades a serem desenvolvidos em cada ano do EF, com uma abordagem mais criteriosa do que os PCN, baseada na antecipação de conceitos, como se pode observar com a introdução da relação de igualdades e divisão em partes proporcionais no 6º ano, determinando valores desconhecidos. Já no 7º ano se estuda a linguagem algébrica juntamente com a resolução de equações do 1º grau. Deve-se chegar ao 8º ano com uma bagagem de conhecimentos prévios, disponíveis para dar continuidade ao processo de aprendizagem, em que, além de resolver equações com uma incógnita, passa-se a resolver sistemas de equações com duas incógnitas e equações incompletas do 2º grau por intermédio da fatoração. No 9º ano do EF, além do estudo completo da equação do 2º grau, tem-se o contato com os produtos notáveis e as funções, que até então não eram estudadas ou abordadas superficialmente nesta etapa de ensino.

Ao fazer da Álgebra uma das cinco unidades temáticas da Matemática, a BNCC conferiu-lhe a importância que exerce no desenvolvimento do pensamento hipotético-dedutivo, desde os anos iniciais do EF através da construção do pensamento algébrico, para chegar aos anos finais e atribuir novos significados ao que fora visto. As reflexões discutidas neste artigo fomentam a análise, em médio prazo, do desempenho dos estudantes nas avaliações a serem aplicadas, para verificação da relevância da reestruturação curricular proposta, nos processos de ensino e de aprendizagem da álgebra no EF.

Referências

BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental – Matemática. Brasília: MEC/SEF, 1998.

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2018.

BRASIL. Ministério da Educação. INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Resultados PISA 2018. Brasília: INEP, 2019.

BRASIL. Ministério da Educação. INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Resultados SAEB 2019. Brasília: INEP, 2020.

DALTO, J. O.; BURIASCO, R. L. C. Problema proposto ou problema resolvido: Qual a diferença? Revista Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 35, n. 3, p. 449-461, set./dez. 2009.

FIORENTINI, D.; MIORIM, M. A.; MIGUEL, A. Contribuições para um repensar... a educação algébrica elementar. Pro-Posições, Campinas, v. 4, n. 1, p. 78-91, mar. 1993.

GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2017.

MICHAELIS. Dicionário Brasileiro de Língua Portuguesa. Brasil, 2020.

MOREIRA, M. A. Teorias de aprendizagem. São Paulo: EPU, 1999.

MOREIRA, M. A. O que é afinal aprendizagem significativa. Porto Alegre: UFRGS, 2010.

MÜLLER, Gessilda Cavalheiro; HETKOWSKI, Tânia Maria; PINHEIRO, Gerusa Soares (Orgs.). Estratégias de ensino da Matemática: entrelaçando saberes para a educação básica. Salvador: EDUNEB, 2017.

PONTE, J. P.; BRANCO, N.; MATOS, A. Álgebra no Ensino Básico. Portugal: Direção Geral de Integração e de Desenvolvimento Curricular (DGIDC), 2009.

PRODANOV, C. C.; FREITAS, E. C. Metodologia do trabalho científico [recurso eletrônico]: métodos e técnicas da pesquisa e do trabalho acadêmico. 2. ed. Novo Hamburgo: FEEVALE, 2013.

Notas

[1] A OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) foi fundada em 1961, para estimular o progresso econômico e o comércio mundial. A maioria dos membros da OCDE é formada por economias de alta renda. São 37 países membros: Alemanha, Austrália, Áustria, Bélgica, Canadá, Chile, Colômbia, Coreia do Sul, Dinamarca, Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Estados Unidos, Estônia, Finlândia, França, Grécia, Holanda, Hungria, Islândia, Irlanda, Israel, Itália, Japão, Letônia, Lituânia, Luxemburgo, México, Nova Zelândia, Noruega, Polônia, Portugal, Reino Unido, República Checa, Suécia, Suíça e Turquia; 5 parceiros estratégicos que cooperam entre si em busca de soluções e políticas públicas para implementar em seus governos: África do Sul, Brasil, China, Índia e Indonésia, e 42 países/economias parceiras (BRASIL, 2019).
[2] Letramento financeiro é o grau de domínio das competências financeiras, isto é, o conhecimento e o entendimento de conceitos de finanças e riscos e a capacidade, motivação e segurança para aplicar esse conhecimento para tomar decisões em diferentes contextos financeiros, para melhorar a qualidade de vida dos indivíduos e da sociedade e para permitir a participação na vida econômica (BRASIL, 2019).
[3] Competência global é a capacidade de examinar questões locais, globais e interculturais, para entender e apreciar as perspectivas e visões de mundo dos outros, para se engajar em interações abertas, apropriadas e efetivas com pessoas de diferentes culturas e para agir pelo bem-estar coletivo (BRASIL, 2019).
[4] A aprendizagem mecânica e a aprendizagem significativa, mencionadas neste artigo, consideram os trabalhos de David Ausubel, segundo a releitura de Marco Antônio Moreira (1999).
[5] A 5ª e 6ª séries citadas nos PCN correspondem ao 6º e 7º anos na BNCC.
[6] A 7ª e 8ª séries referenciadas nos PCN correspondem ao 8º e 9º anos na BNCC.
[7] As unidades temáticas são os grandes blocos em que o documento organiza os conhecimentos de cada componente curricular.
[8] Cada habilidade é identificada com um código alfanumérico, cuja composição é a seguinte: o primeiro par de letras indica a etapa Ensino Fundamental, o primeiro par de números indica o ano (6º ano), o segundo par de letras indica o componente curricular Matemática e o último par de números indica a posição da habilidade na numeração sequencial do ano (habilidade 14). (BRASIL, 2018).

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