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A OLIMPÍADA BRASILEIRA DE FÍSICA DAS ESCOLAS PÚBLICAS NO ACRE: RESULTADOS E INFLUÊNCIA DA VULNERABILIDADE SOCIOECONÔMICA
THE BRAZILIAN OLYMPIC OF PUBLIC SCHOOL PHYSICS IN ACRE: RESULTS AND INFLUENCE OF SOCIOECONOMIC VULNERABILITY
REAMEC – Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática, vol.. 7, núm. 3, 2019
Universidade Federal de Mato Grosso

Artigos

REAMEC – Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática
Universidade Federal de Mato Grosso, Brasil
ISSN-e: 2318-6674
Periodicidade: Frecuencia continua
vol. 7, núm. 3, 2019

Recepção: 18 Setembro 2019

Aprovação: 15 Outubro 2019

Os direitos autorais são mantidos pelos autores, os quais concedem à Revista REAMEC –Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática -os direitos exclusivos de primeira publicação. Os autores não serão remunerados pela publicação de trabalhos neste periódico. Os autores têm autorização para assumir contratos adicionais separadamente, para distribuição não exclusiva da versão do trabalho publicada neste periódico (ex.: publicar em repositório institucional, em site pessoal, publicar uma tradução, ou como capítulo de livro), com reconhecimento de autoria e publicação inicial neste periódico. Os editores da Revista têm o direito de proceder a ajustes textuais e de adequação às normas da publicação.

Este trabalho está sob uma Licença Creative Commons Atribuição-NãoComercial 4.0 Internacional.

Resumo: A presente pesquisa tem o objetivo de estudar a participação e o rendimento estadual dos participantes sujeitos à vulnerabilidade social e econômica na Olimpíada Brasileira de Física das Escolas Públicas (OBFEP) do estado do Acre, durante as edições de 2015 a 2018. A pesquisa, de caráter descritivo, utilizou uma abordagem qualitativa, pela qual foram comparados os resultados da primeira e segunda fases, analisando se as condições locais (sociais e econômicas) tiveram influência nos resultados obtidos pelos participantes. Também teve uma abordagem quantitativa, uma vez que os dados referentes à participação nas edições em questão foram analisados. Participaram dessas edições um total de 1.602 alunos, dos quais três foram medalhistas. Concluiu-se que os resultados abaixo da média estão ligados a essas condições. Sugerem-se alternativas para difundir a OBFEP no estado, assim como propostas para atenuar as desigualdades escolares, de modo que os resultados positivos na OBFEP sejam consequência de práticas inclusivas e inovadoras.

Palavras-chave: Olimpíada de Física, Escolas Públicas, Vulnerabilidade, Ensino de Física, Acre.

Abstract: The present research aims to study the participation, the state income and the participants subject to social and economic vulnerability at the Brazilian Public School Physics Olympiad (OBFEP) in the state of Acre, during the 2015-2018 editions. The descriptive research used a qualitative approach, by comparing the results of the first and second phases, analyzing whether local conditions (social and economic) had an influence on the results obtained by the participants. It also took a quantitative approach, as data on participation in the editions in question were analyzed. A total of 1,602 students participated in these editions, of which three were medalists. It was concluded that below average results are linked to these conditions. Alternatives to diffuse OBFEP in the state, as well as proposals to alleviate school inequalities, are suggested so that the positive results in OBFEP are the result of inclusive and innovative practices.

Keywords: Physics Olympics, Public Schools, Vulnerability, Physics Education, Acre.

1. INTRODUÇÃO

As primeiras olimpíadas de Física no Brasil foram realizadas em nível regional no estado de São de Paulo, entre os anos 1985 e 1987, motivadas pelo movimento iniciado na Europa na década de 1960, que culminou com a primeira edição da Olimpíada Internacional de Física (OIF), em 1962, na cidade de Varsóvia (Polônia). Após movimentação em outros estados do Brasil, a Sociedade Brasileira de Física (SBF) assume o projeto e organiza a primeira Olimpíada Brasileira de Física (OBF) no ano de 1999 (ERTHAL; LOUZADA, 2016). Os objetivos das Olimpíadas de Física são: despertar e estimular o interesse pela Física; proporcionar desafios aos estudantes; aproximar o Ensino Superior Público do Ensino Médio; identificar os estudantes talentosos em Física, preparando-os para as olimpíadas internacionais e estimulando-os a seguir carreiras científico-tecnológicas (SBF, 2019).

As olimpíadas de Física, assim como as demais olimpíadas de ciências, geralmente têm uma organização similar, envolvendo um grande número de participantes, agentes educacionais e estudantes. As olimpíadas nacionais habilitam os melhores estudantes a compor uma delegação que estará apta para representar o país em competições internacionais. As delegações brasileiras, por exemplo, participam da Olimpíada Ibero-americana de Física e da Olimpíada Internacional de Física. As Olimpíadas nasceram da necessidade de alavancar o ensino de ciências e de descobrir novos talentos, consequência do movimento de reforma educacional iniciado nos Estados Unidos nos anos de 1950, motivado pelo sucesso soviético no lançamento do Sputnik (OLIVEIRA; PAIXÃO, 2019, REZENDE; OSTERMANN, 2012).

A Olimpíada Brasileira de Física das Escolas Públicas (OBFEP) surge a partir da necessidade de uma prova em um nível menos elevado que a OBF (ERTHAL; LOUZADA, 2016). A OBFEP, assim como OBF, é um projeto permanente da Sociedade Brasileira de Física (SBF), dividido em duas fases, destinado a estudantes de todas as séries do Ensino Médio (EM) e a alunos do 9º ano do Ensino Fundamental (EF). O projeto teve início no ano de 2010, no formato de projeto piloto, ocorrendo somente nos estados da Bahia, Goiás, Piauí e São Paulo. No ano de 2012, o projeto passa a ser nacional.

No estado do Acre, a OBFEP passa a ocorrer somente a partir do ano de 2015, com o Instituto Federal do Acre (IFAC), nos campi Xavier Maia e Sena Madureira e nas Escolas Estaduais de Ensino Médio: Humberto Soares e Divina Providência. Participaram da competição 389 estudantes, divididos em cinco cidades (Acrelândia, Cruzeiro do Sul, Sena Madureira, Xapuri, Rio Branco e Brasiléia). A partir dessa edição, o número de participantes variou devido a diversas situações locais, contudo, o estado participou de todas as edições até o momento, com estudantes premiados com medalhas nas edições de 2015, 2017 e 2018.

A divulgação da OBFEP é realizada através da coordenação estadual em visitas às instituições ou divulgação por mídia digital para professores e gestores. Não há taxa de inscrição para participar do projeto, as provas da primeira etapa são realizadas nas escolas de origem dos estudantes e a segunda etapa é realizada na escola sede da segunda fase. A escolha dessa sede é feita através de chamada pública, realizada pela coordenação estadual, entre as escolas participantes da primeira etapa. O deslocamento de estudantes, sobretudo das cidades do interior do estado, é feito mediante auxílio do IFAC. A mobilização interna da OBFEP se dá por meio de trabalhos de incentivo à participação do projeto em visitas às escolas, espaços de divulgação científica e na articulação do deslocamento dos participantes da segunda fase.

O Acre encontra-se na Amazônia Ocidental e é a 20ª unidade federativa em números de pessoas com o Ensino Médio completo (IBGE, 2019) e a 15ª nos índices de rendimento domiciliar mensal per capita (IBGE, 2018) (razão entre o total dos rendimentos nominais domiciliares e o total dos moradores), cujo valor é 909 reais e abaixo da média do Brasil, que é de 1.373 reais. Logo, é fundamental considerar as condições econômicas, regionais e sociais na análise dos resultados educacionais do estado.

Nesse sentido, o presente trabalho tem o objetivo de analisar o rendimento do Acre na OBFEP e estabelecer uma avaliação no intuito de investigar se a vulnerabilidade social e econômica dos participantes tem influência nos resultados.

2. REFERENCIAIS TEÓRICOS

Discutir a OBFEP é um desafio, dada a escassa literatura acerca do tema, motivo pelo qual apresentaremos, também, bibliografia referente à OBF, igualmente reduzida. A bibliografia disponível pode ser dividida em duas partes, a primeira discute a natureza do projeto e suas reais implicações para o Ensino de Ciências, e a segunda aborda uma discussão mais técnica voltada ao conteúdo e às questões das provas.

Na primeira parte, Rezende e Ostermann (2012) criticam o objeto de estudo abordado na pouca bibliografia acerca do tema que, majoritariamente, concentra-se em discutir questões e conteúdo da prova, não se atendo à problemática envolvida no processo que antecede e sucede a avaliação. Segundo esses autores, apoiar a difusão dessas olimpíadas, desconsiderando as diferenças socioculturais, valorizando o individualismo e rotulando o nível de conhecimento e ensino, através da comparação de resultados injustos, faz desses projetos e da escola reprodutores de desigualdades.

Para exemplificar, traçamos um paralelo com as olimpíadas esportivas, que consistem na forte competição e na divisão entre vencedores e perdedores. Contudo, assim como nos jogos esportivos, nos quais os países que se destacam são os mais desenvolvidos e com grande capacidade de investimento, nas olimpíadas científicas as escolas com alunos pertencentes a uma parcela sociocultural da sociedade mais favorecida podem apresentar mais preparo que as escolas com estudantes de uma parcela menos favorecida.

Na segunda parte, destacamos Sá (2009), Erthal et al. (2015) e Erthal e Louzada (2016), todos focam em uma análise desprendida do que Rezende e Ostermann (2012) julgam imprescindível, eles dão foco à prova. Sá (2009) analisa a Olimpíada Brasileira de Física (OBF) no Estado de Goiás e sua possível utilização como ferramenta para a alfabetização científica, apontando a OBF como intervenção educativa não formal, contudo, chamando atenção para uma reformulação das questões da prova, a fim de que sejam mais atrativas aos estudantes. Erthal et al. (2015), por sua vez, fazem uma análise mais detalhada das questões da OBF, da necessidade de contextualização e do perfil das questões que exigem um conhecimento matemático sobressaído a conhecimentos dos conceitos físicos, na maioria das questões. Erthal e Louzada (2016), em um trabalho similar, reforçam a necessidade de questões com um maior teor físico, contudo, destacam que as provas da OBFEP se adequam melhor à realidade dos estudantes quando comparadas às questões da OBF.

Destacamos, também, o trabalho de Oliveira e Paixão (2019), no qual foi utilizada uma questão adaptada da IV edição da Olimpíada Ibero-americana de Física, com o objetivo de desenvolver habilidades na solução de problemas experimentais desafiadores em estudantes do EM de Portugal. A atividade possibilitou uma melhora na concepção dos estudantes sobre conceitos envolvidos em um experimento de carga e descarga de um capacitor, além do desenvolvimento dessas habilidades. A atividade realizada por Oliveira e Paixão (2019) aponta alternativas positivas na utilização das questões dessas avaliações, sugerindo métodos para potencializar a aprendizagem dos alunos, que serão motivados pelo desafio dessas questões. Podemos, a partir disso, pleitear novos objetivos e ganhos significativos na aprendizagem desses estudantes.

A literatura referente à ligação entre as condições socioeconômicas e o rendimento escolar é escassa, assim como foi evidenciado para o caso da OBFEP, sobretudo, para o ensino de ciências. No entanto, foi encontrado o trabalho de Érnica e Batista (2012), que investigou o efeito do território nas oportunidades escolares no estado de São Paulo, trabalho no qual foram realizadas importantes reflexões sobre as escolas localizadas em regiões de vulnerabilidade social, cultural e econômica.

Érnica e Batista (2012) chamam atenção para o fato de que escolas localizadas nessas regiões de vulnerabilidade tendem a apresentar um corpo discente com baixos recursos culturais, assim como enfrentam dificuldades de encontrar e manter bons profissionais docentes. Isso pode implicar em uma dificuldade maior na relação ensino-aprendizado, uma vez que, segundo os autores, essas condições estão ligadas às condições de desenvolvimento de espaços de aprendizagem.

3. MATERIAIS E MÉTODOS

Enfatizamos que a pesquisa busca analisar os dados referentes à participação do IFAC e das escolas públicas do Estado do Acre na OBFEP e seus resultados nas edições de 2015 a 2018. Os dados foram obtidos diretamente da coordenação estadual e apresentam o número de inscritos por série e notas nas duas fases.

3.1. Tipo de pesquisa

A pesquisa foi de caráter descritivo. Segundo Triviños (1987), esse tipo de pesquisa busca descrever os fatos de uma realidade determinada. A abordagem foi qualitativa e quantitativa. Para Gerhardt e Silveira (2009), a pesquisa qualitativa não está dedicada ao aprofundamento numérico da pesquisa, mas à compreensão de um grupo social ou organização, enquanto a pesquisa quantitativa se detém em dados numéricos.

Do ponto de vista quantitativo, foram analisados os dados referentes à quantidade de escolas e alunos inscritos nas edições acima mencionadas. Do ponto de vista qualitativo, buscamos analisar detalhadamente a participação dos inscritos e seus resultados nas edições de 2015 a 2018 da OBFEP. Considerando o contexto local (social e econômico), a análise visa compreender a participação, os resultados e as motivações desses alunos, de modo a ser possível entender todos os aspectos que envolvem a OBFEP no Acre e sugerir diferentes abordagens na organização, preparação e execução desta.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1. Abordagem quantitativa: participação

Com o intuito de analisar a participação dos estudantes acreanos nas edições de 2015 a 2018 na OBFEP, levantamos os dados referentes à quantidade de participantes da primeira fase por cidade (Figura 1 (a)), o número de inscritos na primeira fase por série (Figura 1 (b)) e o número total de participantes na primeira fase (Figura 2).


Figura 1
Número de participantes na primeira fase por cidade (a) e por série (b) nas edições de 2015 a 2018 da OBFEP.
Fonte: Elaborado pelos autores, 2019.


Figura 2
Gráfico com o número total de participantes na primeira fase por edição da OBFEP.
Fonte: Elaborado pelos autores, 2019.

No ano de 2017, a rede estadual de ensino passou por um período de greve, gerando os resultados expostos na Figura 1 e Figura 2. Podemos perceber que houve somente a participação de instituições das cidades de Rio Branco e Sena Madureira, com estudantes da 1ª e 2ª séries do EM e com menor número total de participantes de todas as edições. Os dados obtidos com a coordenação estadual da OBFEP mostram que, nessa edição, participaram somente o IFAC campus Sena Madureira, órgão federal não envolvido na greve, e a Escola Professor José Rodrigues Leite (Rio Branco), com, respectivamente, 60 alunos da 1ª série e 57 da 2ª série, e 11 da 1ª série e três da 2ª série.

Na Figura 1 (a), é possível notar que Sena Madureira e Rio Branco participaram de todas as edições, Cruzeiro do Sul, Xapuri e Brasiléia apenas na edição 2015, e Acrelândia da edição 2016. Analisando a Figura 1 (b), é possível perceber que foi crescente a quantidade de alunos participantes da 3ª série do EM, com exceção da edição de 2017, para a qual não tivemos inscritos. Os alunos do 9º ano do EF participaram somente das edições de 2015 e 2016. A 4ª série do EM é adotada em escolas de tempo integral e nos Institutos Federais, contudo, existem poucas dessas instituições, o que reflete no resultado do gráfico da Figura1 (b). Desde 2018, o Acre possui dez escolas de tempo integral, sendo sete em Rio Branco e três no interior (Brasiléia, Cruzeiro do Sul e Tarauacá) (ACRE, 2018), além do IFAC, com os campi Rio Branco, Xapuri, Sena Madureira, Tarauacá e Cruzeiro do Sul (IFAC, 2019).

A Tabela 1 apresenta o número de habitantes e o número de escolas de ensino fundamental e médio da capital Rio Branco e demais municípios do Acre que fizeram parte da 1ª fase das edições 2015 a 2018 da OBFEP. Rio Branco é a cidade mais populosa do estado e, consequentemente, concentra a maior quantidade de escolas. Cruzeiro do Sul é a segunda maior cidade do estado em número de habitantes, Sena Madureira ocupa a terceira posição, na sequência aparecem Brasiléia, Xapuri e Acrelândia nas posições sexta, nona e décima quinta, respectivamente. Os dados mostrados na Tabela 2 indicam que há um enorme público que poderia participar e que é preciso investir mais na divulgação da OBFEP no Acre.

Tabela 1
População residente total, quantidade de escolas de ensino fundamental e médio da capital e municípios acreanos que participaram da 1ª fase nas edições 2015 a 2018 da OBFEP.

Fonte: IBGE (2010); IBGE (2019).

Tabela 2
Número de matriculados e participantes da OBFEP por ano.

Fonte: INEP (2015, 2016, 2017, 2018)

4.2. Abordagem qualitativa: resultados da primeira e segunda fases

A análise quantitativa dos dados não é suficiente para responder as questões: “Qual o motivo de poucas cidades com Escolas e estudantes inscritos? Por que algumas das cidades participantes só participaram de uma edição? As condições de vulnerabilidade social e econômica interferem nos resultados dos alunos?”. Além dessas questões, quando observamos com maior detalhe a participação dos estudantes por série distribuídos nas cidades participantes, percebemos, como mostra a Figura 3 (a), que em 2015 houve a maior quantidade de cidades representadas, contudo, notamos que essa pluralidade não foi aumentada, nem mantida.


Figura 3
Gráficos do número de alunos por série das cidades participantes na primeira fase das edições (a) 2015, (b) 2016, (c) 2017 e (d) 2018 da OBFEP.
Fonte: Elaborado pelos autores, 2019.

Compreendemos vulnerabilidade a partir de uma das definições dadas por De León (2006), ao buscar o conceito da referida palavra, usa a proposta da International Strategy for Disaster Reduction (ISDR) e define vulnerabilidade como “o conjunto de condições e processos resultantes de fatores físicos, sociais, econômicos e ambientais, que aumentam a suscetibilidade de uma comunidade ao impacto de perigos” (tradução nossa). E a vulnerabilidade social, segundo Abramovay et al. (2002), tem ligações com a pobreza e com as desigualdades sociais e culturais envolvidas no contexto dos indivíduos.

Em 2015, na primeira participação do Acre na OBFEP, a divulgação foi feita através de visitas às instituições de ensino em todas as cidades possíveis. Contudo, devido à carência de apoio dos órgãos estaduais, como a Secretaria de Estado de Educação, Cultura e Esporte do Acre (SEE–AC), não foi possível divulgar de maneira presencial e massiva em todas as cidades desejadas.

Esse fato afetou bastante o público de Cruzeiro do Sul, onde todos os que participaram da primeira fase na edição de 2015 eram alunos do IFAC da referida cidade. Já em Rio Branco, na mesma edição, 58,91 % dos participantes foram oriundos da Escola Estadual Humberto Soares da Costa, enquanto 41,09% eram provenientes do IFAC campus Rio Branco. Importante destacar que a Escola Humberto Soares da Costa contém mais turmas das séries do EM do que o IFAC campus Rio Branco. Ainda assim, a participação do IFAC é evidentemente expressiva. Isso se justifica devido ao fato de o coordenador estadual da OBFEP pertencer ao quadro docente do IFAC campus Rio Branco, sendo o responsável pela divulgação em todos os campi da referida instituição.

Atentamos, também, ao fato de que nas edições de 2015 a 2018 a representação da cidade de Sena Madureira se deu exclusivamente por alunos do IFAC campus Sena Madureira, ficando evidente que esse instituto foi fundamental na propagação e consolidação da OBFEP nessas regiões.

Se compararmos a participação do IFAC e seus campi com a participação das escolas em todas as edições avaliadas, observamos que, do total de participantes de todas as edições (1.602 alunos), os estudantes participantes do IFAC representam um total de 44,88% desse número, mesmo com a ausência de participantes do IFAC campus Rio Branco em 2017 e com a não participação nessas edições de outros campi do IFAC, como os de Xapuri e Tarauacá.

Como foi dito anteriormente, a expressiva participação do IFAC e seus campi na OBFEP é resultado da proximidade da instituição com a coordenação estadual, ao contrário do que ocorreu com as escolas da rede estadual, por não contarem com devido apoio da SEE–AC. Coube à coordenação estadual divulgar a OBFEP realizando visitas às escolas, estabelecendo contato com professores e coordenadores e por meio de projetos, como o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência (PIBID).

Quanto à reduzida participação de estudantes do 9º ano do EF, isso provavelmente está associado ao desvio de função dos professores dessa série, dado que os docentes da disciplina de Ciências geralmente apresentam formação em Licenciatura em Ciências Biológicas. Essa suposição baseia-se na comparação entre participação de alunos do 9º ano do EF e a quantidade de professores em desvio de função, como já citamos.

Os Parâmetros Curriculares de Ciências Naturais do 3º e 4º ciclos do EF (BRASIL, 1998), vigentes antes da publicação da Base Nacional Comum Curricular em 2018 e da 1ª fase das edições 2015 a 2018 da OBFEP, são compostos por quatro eixos temáticos: Terra e Universo, Vida e Ambiente, Ser Humano e Saúde e Tecnologia e Sociedade. O 1º e o 4º eixos exigem que o professor tenha conhecimento básico de Física e de Astronomia. Entretanto, conforme dito no parágrafo acima, os professores de 9º ano possuem, em sua maioria, formação em Licenciatura em Ciências Biológicas e, nesse curso, não há um bom aprofundamento das disciplinas supramencionadas, fato este que será analisado a seguir.

No curso de Licenciatura em Ciências Biológicas da UFAC há apenas duas disciplinas, cada uma com carga horária de 60 horas, que envolvem estudo de Física: Física Geral e Biofísica, cujas ementas estão expostas na Tabela 3.

Tabela 3
Disciplinas de Física e suas ementas do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas da UFAC.

Fonte: UFAC (2019).

A primeira disciplina da Tabela 3 trata de vários assuntos e não permite que o docente possa aprofundar-se devidamente nos conceitos físicos em sala de aula, dado que ele terá, também, que contemplar aspectos metodológicos para os anos/séries da educação básica, contando com uma insuficiente carga horária. A segunda disciplina aplica conceitos físicos no estudo de Biofísica, usando como base a aprendizagem dos discentes em Física Geral.

Segundo Fidelis (2017) e Filho, Góes e Rocha (2011), professores em desvio de função tendem a utilizar técnicas tradicionais de ensino devido ao despreparo para lecionar disciplinas alheias à sua formação, o que pode acarretar em baixos níveis de aprendizagem por parte dos alunos. Consequentemente, os formandos de Licenciatura em Ciências Biológicas da UFAC não têm, em geral, uma preparação adequada para ensinar conteúdos relacionados à Física da área de Ciências Naturais no EF, sobretudo, no 9º ano, principalmente sobre os eixos temáticos Terra e Universo e Tecnologia e Sociedade (BRASIL, 1998). Tais problemas são vislumbrados à medida que observamos o que discutem Fidelis (2017) e Filho, Góes e Rocha (2011) e atentamos ao fato de que as ementas das disciplinas da Tabela 3 não contemplam o estudo de Astronomia.

Mesmo com os objetivos do 9º ano convergindo com os conteúdos estudados na disciplina de Física, torna-se dificultoso inscrever alunos dessa série para a OBFEP, além do mais, aplicar essa prova a alunos com pouco ou nenhum contato com os conteúdos de Física seria um equívoco metodológico e contribuiria para a perpetuação da desigualdade na Escola, como destacam Rezende e Ostermann (2012). Ainda na perspectiva desses autores, uma preparação especial somente para as provas da OBFEP seria também prejudicial para aprendizagem, se levarmos em conta a realidade sociocultural, além da inviabilidade pela falta de profissionais ou voluntários capacitados para tal.

Nas edições de 2017 e 2018 (Figura 3), podemos observar que participaram da primeira fase somente alunos das cidades de Rio Branco e Sena Madureira. Como citado anteriormente, em 2017 houve uma greve que prejudicou a articulação da OBFEP no estado. Em 2018, com a mudança na gestão no Acre e dois concursos para professores da rede estadual de ensino, um com caráter efetivo e outro de caráter provisório, houve a saída e/ou troca de docentes das escolas, contribuindo, também, com a desarticulação dessa edição, já que as inscrições dos participantes são realizadas através do professor que é escolhido pela escola e orientado pela coordenação estadual.

Isso tudo se somou às dificuldades encontradas na divulgação e preparação para a edição de 2018, quando se deu essa troca de gestão e de pessoal docente. Entretanto, é importante ressaltar que a Olimpíada apresenta características de consolidação nessas duas cidades, considerando a sua participação em todas as edições avaliadas, independentemente dos contratempos supracitados.

4.3. Abordagem qualitativa: resultados da primeira e segunda fase

Nesse ponto, motivados pelo trabalho de Rezende e Ostermann (2012), achamos necessário fazer uma breve análise socioeconômica das cidades participantes, de modo a inferir a realidade dos estudantes e instituições envolvidas e se esse contexto tem relação com os resultados.

Rio Branco possui o maior produto interno bruto (PIB) per capita e o maior Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) em relação às demais cidades acreanas (Tabela 4). Esse índice é composto de três dimensões do desenvolvimento humano: longevidade, educação e renda. Varia de zero a um e, quanto mais próximo de um, maior o desenvolvimento humano (PNUD, 2019). O IDHM 2010 do Acre é 0,663, indicando que Rio Branco está bem acima desse valor, Cruzeiro do Sul praticamente coincide com ele e os outros municípios estão abaixo. Contudo, observamos, ainda, que a cidade de Acrelândia apresenta um PIB per capita maior que Cruzeiro do Sul, como consequência do fato de a economia daquela cidade ser baseada na atividade agropecuária e industrial.

Tabela 4
PIB per capita (2016) e IDHM (2010) das cidades acreanas participantes das edições analisadas da OBFEP.

Fonte: IBGE (2016); BRASIL (2010).

Embora o baixo valor do IDHM possa interferir no desempenho dos participantes da OBFEP e favorecer a vulnerabilidade social e econômica, outros fatores, se trabalhados adequadamente, podem reverter tal contexto. Um caso típico foi o que aconteceu com o estado do Alagoas (IDHM 2010: 0,631). Na edição 2017, o estado teve o segundo maior número de medalhas de ouro, perdendo apenas para o estado de São Paulo (GAZETA, 2018). Em Alagoas, houve uma parceria com a Universidade Federal de Alagoas (UFAL): formação com os professores e oficina com os alunos. Além disso, ocorreu um trabalho descentralizado em todas as Gerências Regionais de Educação atendendo todos alunos, incluindo até uma sala online (ALAGOAS, 2018).

Em relação aos resultados da primeira etapa, os dados fornecidos nos permitem saber apenas a porcentagem de acertos das questões de alunos por série, porém, não é possível identificar a escola, o município e nem o estudante referente a cada nota, sendo inviável realizar, com esses dados, uma análise direta do resultado e da realidade socioeconômica e cultural dos participantes. Vale ressaltar, ainda, que a quantidade de acertos para que o aluno se classifique para a segunda fase depende da média nacional, mas, nas últimas edições, tem variado entre 8 e 10 acertos.

Considerando a média necessária de acertos para progredir para a segunda fase, destacamos os resultados referentes à cada edição analisada. Em 2015, 12,59 % dos alunos participantes ficaram nessa média; em 2016, apenas 4,51 % dos alunos estavam na média supracitada; em 2017 (ano de menor participação), somente 2,28% dos alunos alcançaram a média; e, em 2018, 3,03% dos estudantes atingiram a média. Salientamos que, nessa análise, quando nos referimos à média, estamos considerando a soma dos percentuais dos estudantes que obtiveram nota dentro da faixa entre 8 e 10 acertos.

Analisando esses resultados e confrontando com os dados obtidos, percebemos que, na edição de 2018, a maioria das escolas participantes de Rio Branco faz parte de regiões em vulnerabilidade social e econômica. Na edição de 2016, o mesmo se repetiu na capital. Quanto à participação das escolas da cidade de Acrelândia, observamos que estas, além de ficarem à margem dos principais avanços no ensino, também enfrentam dificuldades com a situação de vulnerabilidade econômica dos seus estudantes. Além disso, não há um campus da Universidade Federal do Acre (UFAC), tampouco do IFAC, dificultando o acesso ao ensino superior naquela região, o que aparenta ser um fator desmotivador para os estudantes daquela região.

Discutir a competição entre escolas e alunos é não se limitar somente à análise fria dos números, realizando um estudo mais aprofundado nas causas dos resultados.

Por que defender a competição entre alunos ou entre escolas? Qual seria o princípio educativo que possibilitaria defender a disseminação do espírito competitivo? Na realidade, se pensarmos na escola tal como ela vem se desenvolvendo desde o século XVIII, a partir de seus laços íntimos com o sistema capitalista, as olimpíadas escolares parecem uma proposta educativa “coerente”. Sabemos que a competição nunca esteve fora da escola, e do sistema educacional, defendida em nome da meritocracia (REZENDE; OSTERMANN, 2012, p. 251).

Ao questionar a existência de um princípio educativo no espírito competitivo adotado nas olimpíadas escolares em geral, e também nas instituições de ensino, Rezende e Ostermann (2012) motivam estudos que considerem, na análise dos resultados dessas olimpíadas, o contexto escolar envolvido nos resultados. Nesse sentido, realizamos um estudo comparando os resultados obtidos pelos participantes e suas situações socioeconômicas e culturais.

Apesar da limitação encontrada para explorar diretamente esses dados, estudando a relação deles com as condições socioeconômicas e culturais, podemos fazer essa exploração indiretamente comparando os resultados da primeira etapa com os resultados da segunda etapa, já que os resultados fornecem as seguintes informações: série, nota, nome do participante, nome da instituição, se o aluno faz parte da rede estadual, municipal ou federal e se o participante foi premiado. De posse dessas informações, da localização das instituições e da situação socioeconômica dessas localizações e dos atendidos por essas instituições, é possível realizar nossa análise entre desempenho e realidade socioeconômica e cultural.

Quando analisamos os resultados da segunda fase, percebemos que, na edição de 2015, foram aprovados para a segunda etapa cinco alunos, sendo quatro da 1ª série do EM e um da 2ª série do EM, contudo, evidenciamos que, desses aprovados, somente um atingiu a nota necessária para a premiação de uma medalha de bronze. Destacamos, ainda, que, dos estudantes aprovados para a segunda etapa, somente um aluno da 1ª série do EM pertencia a uma escola da rede estadual, os demais faziam parte do corpo discente do IFAC, sendo um do campus Sena Madureira, um do campus Cruzeiro do Sul e um do campus Rio Branco, o premiado.

Na edição de 2016, foram dez participantes (cinco da 1ª série do EM e cinco da 2ª série do EM) na segunda fase, todos da rede estadual, sendo dois da cidade de Acrelândia e os demais da cidade de Rio Branco. Vale destacar que todos os participantes obtiveram nota zero nessa fase.

Na edição de 2017, foram três participantes, um da 1ª série do EM, da rede estadual, e dois da 2ª série do EM, sendo um da rede estadual e medalhista de prata e um da rede federal (IFAC campus Sena Madureira). Finalmente, na edição de 2018, foram cinco participantes, sendo três da 2ª série do EM da rede estadual e dois da 3ª série do EM da rede federal, e o medalhista de prata dessa edição era discente do IFAC campus Rio Branco, o outro discente pertencia ao campus Sena Madureira.

Dos três medalhistas, dois eram discentes do IFAC campus Rio Branco e o terceiro da Escola Professor José Rodrigues Leite em Rio Branco. Desse modo, observamos que os medalhistas foram todos da capital. O IFAC campus Rio Branco está localizado na região da capital que apresenta uma variedade de bairros em diferentes situações socioeconômicas e culturais, contudo, pela natureza da proposta de ensino e da instituição, o IFAC tem alunos residentes em variadas regiões da cidade.

A Escola Professor José Rodrigues Leite, está localizada no centro da cidade e tem uma consolidada história local referente à qualidade de ensino, atende a uma gama de alunos oriundos de diferentes regiões da cidade. Chama atenção o fato de nenhum medalhista ser proveniente das outras cidades participantes (interior do estado), assim como nenhum ser de instituições localizadas em regiões de vulnerabilidade social e econômica, mesmo havendo participação dessas na primeira fase. O próprio IFAC tem um campus no bairro Sobral, uma das regiões de maior vulnerabilidade da cidade de Rio Branco e, nessas edições, não apresentou nenhum participante na segunda fase.

Quando analisamos mais profundamente os dados dos resultados da segunda fase, percebemos que os piores resultados são de alunos das instituições do interior do estado e da rede estadual. Os resultados são ainda piores, do ponto de vista quantitativo, das instituições nas regiões de vulnerabilidade.

Inferimos disso que os estudantes em regiões de vulnerabilidade social e econômica e, obviamente, em desfavoráveis condições socioeconômicas e culturais, não atingiram os melhores resultados (medalhas) na segunda fase, apesar de uma pequena parcela lograr êxito na primeira fase, atingindo os pontos necessários para passar para a segunda fase. Entretanto, a segunda fase exige maior conhecimento específico, logo, os participantes de instituições submetidas a essas condições adversas estão, a partir desses resultados, em desvantagem quando comparados aos participantes do IFAC campus Rio Branco que, por sua organização, natureza de ensino, estrutura e pioneirismo na implementação da OBFEP no estado, apresenta os melhores resultados.

O principal destaque que fazemos, aqui, é a convergência desses resultados com a problemática levantada por Rezende e Ostermann (2012), o que nos permite levantar outras questões.

A primeira delas é o fato de a preparação para as provas da segunda fase ser por meio de aulas semanais, dessa maneira, se não houver uma extensão dessa estratégia para os participantes de todas as instituições envolvidas, fica fácil imaginar que a instituição que obtiver esse acompanhamento estará em vantagem diante das demais. No entanto, devemos ponderar a dificuldade de concretizar essa estratégia, já que os docentes da rede estadual não têm um incentivo além daquele passado pela própria coordenação estadual, e enfrentam dificuldades para conciliar as obrigações diárias do cotidiano escolar com essa rotina de preparação.

Outra questão que levantamos é a falta de um trabalho dentro das necessidades das escolas nas situações de maior vulnerabilidade, não focando somente um melhor desempenho nas avaliações da OBFEP, mas usando essa prova como ferramenta de inserção desses estudantes. O propósito seria possibilitar não somente a participação em uma competição, mas propiciar maiores motivações no aprendizado. Isso porque propor essa avaliação como uma competição para estudantes que estejam em desvantagem inicialmente e que, durante o processo, não gozam do mesmo acompanhamento é uma ação de conservar as desigualdades sociais e escolares.

Ademais, percebemos que a falta de atenção aos estudantes sujeitos a essas vulnerabilidades não é um caso particular da OBFEP. Constatamos a carência, na literatura, de trabalhos em ensino de Física no estado do Acre que abordem a relação vulnerabilidade e resultados escolares. Encontramos somente o trabalho de Junior e Silva (2017) que, apesar de ter outro foco, realiza essa análise.

Por fim, levantamos a questão das instituições nas cidades do interior. É notório que nem todas as cidades são contempladas com o projeto da OBFEP, como já foi discutido, e as que participaram são, em sua ampla maioria, pela presença do IFAC com seus campi. Isso nos mostra que seria preciso articular com a SEE-AC uma forma melhor de envolver as escolas no projeto, porém, também nos alerta para a situação da qualidade do ensino, se considerarmos que a prova da OBFEP pode ser um parâmetro de avaliação.

As instituições do interior estão abaixo da média. Importante destacar que, mesmo com a presença do IFAC em algumas cidades, como é o caso de Sena Madureira, que participou de todas as edições, não houve medalhistas no interior. É claro que a preparação para a segunda fase nessas cidades fica aquém da preparação em Rio Branco, já que na capital há uma maior facilidade devido à proximidade com a coordenação local. Outra preocupação que emerge desse fato é se há um cuidado na avaliação dos resultados dos participantes, levando em conta sua situação socioeconômica e cultural.

Contudo, acreditamos que uma única avaliação externa não tem o poder de classificar o nível de ensino em uma instituição ou local. Dessa forma, não queremos centrar essa discussão no resultado numérico dessas instituições do interior, mas, sim, salientar que a prova da OBFEP serve para nos alertar acerca da necessidade de realizar um estudo que relacione as condições socioeconômicas aos resultados em provas externas, ou até mesmo internas.

Os índices (IDHM) expostos na Tabela 4 apontam a superioridade da capital em relação aos demais municípios do Acre, tal condição pode interferir drasticamente nos resultados obtidos nas duas fases das edições da OBFEP. As cidades do interior do estado possuem menor oferta de trabalhos e uma maior desigualdade na distribuição de renda, afetando famílias com filhos matriculados em escolas públicas que podem estar em condições de vulnerabilidade social e econômica.

Segundo Junior e Silva (2017), esses alunos tendem a ficar à margem não somente da sociedade, mas, na rotina escolar, acabam, por muitas vezes, ficando desacreditados. Os autores destacam, ainda, que a necessidade financeira enfrentada por esses estudantes os força a colocar o estudo em segundo plano. Dessa forma, Junior e Silva (2017) apresentam informações que vão ao encontro da ideia de que as situações socioeconômicas e culturais influenciam diretamente nos resultados das avaliações.

Também consideramos relevante salientar os resultados positivos, do ponto de vista da pontuação. Exceto na edição de 2016, em todas as outras edições houve medalhistas, demonstrando uma evolução da edição de 2015 (medalha de bronze) para as edições de 2017 e 2018 (medalha de prata). Esses resultados podem ser entendidos como um amadurecimento na preparação e entendimento do processo de resolução da prova, e refletem os esforços por parte da coordenação em oportunizar momentos para os estudantes se preparem. Além disso, atribuímos a essa evolução a notoriedade que a OBFEP vai adquirindo com o passar dos anos, despertando nos estudantes que já participaram maior interesse pela obtenção de melhores resultados.

5. CONSIDERAÇÕES

A participação dos alunos do 9º ano do EF ocorreu apenas nas edições de 2015 e 2016 e, provavelmente, não foi devidamente incentivada pelos professores de Ciências, diplomados predominantemente em Licenciatura em Ciências Biológicas, cuja base em Física e Astronomia não é suficientemente adequada. A pouca participação de estudantes do 4º ano do EM reflete, em parte, o discreto número de turmas disponíveis no estado e a desarticulação da SEE–AC com a olimpíada, já que toda a organização e divulgação recaem somente sobre a coordenação estadual, que enfrenta dificuldades para alcançar a maioria das escolas de Rio Branco e demais cidades do Acre.

Para melhorar os índices de participação e romper as barreiras de aceitação nas escolas, é necessário que haja uma aproximação da SEE–AC com a OBFEP e seja elaborado um projeto em conjunto com a coordenação estadual, possibilitando uma maior proximidade com as instituições das cidades que já participaram. Também é imprescindível motivar escolas das outras cidades não participantes, atendendo às necessidades de divulgação e aceitação por parte de gestores, professores e alunos. Além disso, esse projeto deve solucionar a disparidade enfrentada pelas escolas do interior que não têm a mesma proximidade com a coordenação que as escolas de Rio Branco.

Um exemplo de sucesso é o da coordenação da OBFEP de Alagoas, que conseguiu o 2o lugar no número de medalhas de ouro na edição 2017 e um expressivo montante de premiações, fruto do trabalho da parceria com a UFAL e as Gerências Regionais de Educação.

Os resultados inferiores dos estudantes de escolas, em regiões de vulnerabilidade, reforçam a ideia de que essa condição deve ser parâmetro em uma análise, sobretudo, quando esses estudantes são expostos a uma avaliação externa, na maioria das vezes, desnivelada, e submetidos a uma disputa direta ou indiretamente. Os resultados explicitam o fato de que é necessário realizar um estudo a fundo sobre as condições e os níveis de aprendizado desses estudantes e, a partir disso, propor alternativas para nivelar esses estudantes e diminuir as desigualdades sociais e escolares que estão diretamente ligadas, como exposto em Rezende e Ostermann (2012) e em Junior e Silva (2017).

A médio e longo prazo, se postas em prática, as propostas oriundas desses estudos devem apresentar resultados positivos, porém, é importante ressaltar que as alternativas que deverão ser implementadas não podem ter o foco unicamente em melhorar o rendimento na OBFEP, dado que, por se tratar de uma prova externa ao cotidiano escolar, o resultado positivo nessa avaliação dever ser consequência das práticas escolares inclusivas e inovadoras. Além do mais, realizar uma preparação única e exclusiva para esse tipo de avaliação contribui para o enfraquecimento do caráter transformador do ensino, já que essa prática reforça a ideia mercantilista da educação, em que os resultados (notas) em avaliações externas e internas são mais importantes. Dessa forma, a metodologia de preparação dos alunos para a segunda fase deve ser repensada.

Como na segunda fase da OBFEP pode haver uma questão prática (experimental), a exemplo de outras olimpíadas internacionais, o momento de preparação pode ser utilizado para desenvolver atividades práticas nas quais o princípio da aprendizagem ativa e significativa possa ser utilizado, priorizando, sobretudo, a autonomia dos alunos, o que é exigido nessas questões. Esse momento servirá, portanto, para imergir os estudantes em uma perspectiva diferente do habitual, que, em geral, tem características mecânicas de aprendizado com alto investimento de tempo na aquisição de dados e não na discussão das estratégias para adquirir e discutir os dados. Dessa forma, os estudantes poderão desenvolver suas habilidades e conhecimentos mais profundamente do que desenvolveriam em um treinamento limitado à repetição de instruções.

Os resultados dos participantes das cidades do interior chamam a atenção para a urgente necessidade de projetos que contribuam na evolução dos níveis de ensino nessas regiões. Mesmo não considerando a prova da OBFEP como único e principal parâmetro, devemos destacar o fato dessas localidades sofrerem com a amplificação das consequências das situações de vulnerabilidade. Mesmo com todas as vantagens que o IFAC tem sobre as escolas da rede estadual, os campi do interior não obtiveram medalhas, evidenciando que as vantagens do instituto não são suficientes para um bom resultado, reforçando a ideia da necessidade de estudos que considerem as condições socioculturais e econômicas dos alunos.

Um projeto em conjunto com a SEE–AC, no qual a OBFEP seria apenas um dos parâmetros de avaliação, é uma alternativa para alavancar esses níveis intensificando a formação continuada de professores nessas regiões, promovendo debates, oficinas e estudos com o objetivo de desenvolver alternativas de ensino que sejam eficazes. Nesses espaços, a OBFEP poderia ser mais bem difundida e motivada. A SEE-AC tem um evento anual de divulgação científica, “Viver Ciência” (ACRE, 2019), que, a cada edição, tem sua versão itinerante amplificada, contemplando mais municípios. O projeto sugerido pode partir do mesmo princípio itinerante. Destacamos, ainda, a necessidade de pesquisas que se debrucem sobre o efeito das condições socioeconômicas no ensino de Física no Acre.

Agradecimentos

Os autores agradecem à CAPES, à OBFEP-SBF, ao IFAC e à SEE–AC pelo apoio financeiro e na organização dos eventos.

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Notas

2 REFERENCIAIS TEÓRICOS
3 MATERIAIS E MÉTODOS
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
5 CONSIDERAÇÕES
[1] Licenciado em Física pela UFAC e mestrando em Física pela PUC-RJ. E-mail: eloi.junior.j@gmail.com
[2] Docente do IFAC e coordenador estadual da OBFEP no Acre. E-mail: cleyton.souza@ifac.edu.br
[3] Doutor em Física, Docente da UFAC, do REAMEC, do MPECIM/UFAC e do MNPEF/UFAC. E-mail: mar_castanheira@yahoo.com.br

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