Artigos
Recepção: 09 Agosto 2020
Aprovação: 29 Setembro 2020
Resumo: Este texto é uma releitura da dissertação intitulada No espelho das águas: um lugar ribeirinho no rio Madeira (Ribeiro, 2010), vinculada ao Grupo de Pesquisa GepCultura. Apresenta-se como objetivo fazer uma leitura geográfica do lugar ribeirinho em três localidades à margem do rio Madeira, enfatizando-se as representações e simbolismos culturais característicos do espaço amazônico. A fundamentação teórica está respaldada nos pressupostos da geografia cultural e em teóricos da antropologia e da sociologia, o que possibilita pensar as relações entre o ribeirinho com seu lugar, marcado pela presença do rio e da mata. Os procedimentos metodológicos se fundamentam na concepção da história oral, inter-relacionada com a proposta do espaço vivido. A pesquisa demonstrou uma outra forma de compreender o lugar do ribeirinho, com relações subjetivas e representativas que caracterizam as populações tradicionais na Amazônia.
Palavras-chave: Geografia Cultural, Lugar, Representação, Seres encantados.
Abstract: This text is a reinterpretation of the master's thesis titled In the mirror of the waters: a riverside place on the Madeira river (Ribeiro, 2010), linked to the GepCultura Research Group. It aims to make a geographical reading of the riverside place in three locations on the banks of the Madeira river, emphasizing the cultural representations and symbolisms characteristic of the Amazonian space. The theoretical foundation is supported by the assumptions of cultural geography and theorists of anthropology and sociology, which makes possible to think about the relationship between the riverside people and its place, marked by the presence of the river and the forest. The methodological procedures are based on the conception of oral history, interrelated with the the lived space proposal. The research demonstrated another way of understanding the place of the riverside people, with subjective and representative relations that characterize the traditional populations in the Amazon.
Keywords: Cultural Geography, Place, Representation, Enchanted beings.
Resumen: Este texto es una reinterpretación de la tesis de maestría com el titulo En el espejo de las aguas: un lugar ribereño en el río Madeira (Ribeiro, 2010), vinculada al Grupo de Investigación GepCultura. Tiene como objetivo realizar una lectura geográfica del lugar ribereño en tres localidades a orillas del río Madeira, destacando las representaciones culturales y simbolismos característicos del espacio amazónico. El fundamento teórico se sustenta en los supuestos de la geografía cultural y los teóricos de la antropología y la sociología, lo que permite pensar en la relación entre la gente de la ribera y su lugar, marcado por la presencia del río y la selva. Los procedimientos metodológicos se basan en la concepción de la historia oral, interrelacionada con la propuesta del espacio vivido. La investigación demostró otra forma de entender el lugar de la gente ribereña con las relaciones subjetivas y representativas que caracterizan a las poblaciones tradicionales de la Amazonía.
Palabras clave: Geografía cultural, Sitio, Representación, Seres encantados.
INTRODUÇÃO
Este texto perpassa pela compreensão da existência de uma complexidade social e se organiza a partir de dois pressupostos: (i) existem diferentes maneiras de se relacionar com os acontecimentos do dia a dia; (ii) em todos os grupos sociais existem crenças que explicam e moldam a vida das pessoas; tais crenças fazem parte da caraterização e formação da essência da cultura de um povo. Em meio a essa complexidade encontram-se as comunidades ribeirinhas amazônicas, com culturas marcadas pela oralidade e transmitidas de geração a geração. Neste trabalho, apresenta-se um olhar sobre as narrativas e modo de vida desse grupo social, enfocando-se a representatividade das manifestações culturais na vida, no lugar e na perspectiva do ribeirinho.
A pesquisa foi realizada entre os anos de 2008 a 2010. Sua importância perpassou - e ainda perpassa - pelo registro do significado do lugar ribeirinho na experiência pessoal do indivíduo, respeitando sua cultura e reconhecendo as particularidades em cada vivência, admitindo-se que a cultura seja dinâmica, pois cada grupo social passa por constantes e diferentes processos de aculturação, assimilação de outras formas de ver, viver e se relacionar com o meio. A partir dessa percepção, a cultura é uma realidade que está em constante transformação, em virtude das vivências do ser humano no tempo e espaço. Essas experiências são reorganizadas de geração a geração (CLAVAL, 2007) e possibilitam demonstrar o processo de construção, permanência e existência de uma cultura.
Ao apresentar o espaço a partir da cultura, tem-se a possibilidade de compreender a relação do ser humano com o meio onde vive, abordando-se a percepção, valores e atitudes desenvolvidas com o seu lugar (TUAN, 1980). Assim, este texto navega pelos caminhos da cultura, com elementos que caracterizam as representações culturais do espaço geográfico e demonstram o modo de vida ribeirinho às margens do rio Madeira. O espaço ribeirinho contextualizado revela uma relação subjetiva e valorativa com a mata e o rio. Considerando-se a diversidade cultural da Amazônia, há de se pontuar que em todos os grupos sociais há representações religiosas, políticas e culturais; essas representações caracterizam a essência da cultura de um povo, um grupo, uma comunidade, uma sociedade, pois são uma forma de conhecimento e explicações de todas as relações, envolvendo o ser humano e o lugar de vivência.
Dessa forma, buscou-se identificar a relação dos moradores com seu espaço, considerando-se as intersubjetividades no modo de vida ribeirinho presentes nas falas dos colaboradores da pesquisa. Há de se destacar o rio como elemento de grande simbolismo para os ribeirinhos. As experiências de vida relatadas possibilitam identificar a percepção do modo de vida das populações tradicionais que vivem as margens do rio Madeira, além de evidenciar a existência de uma relação afetiva dos moradores das localidades ribeirinhas, situação que possibilitou questionar: que “relação é essa” e como ela se configura no espaço ribeirinho? A partir desse questionamento, construiu-se o caminho metodológico, fundamentado nas propostas da história oral (MEIHY, 2005) e do espaço vivido (FRÉMONT, 1980), aplicadas à pesquisa de campo, nos anos de 2008 a 2010, e intermediada pelas concepções de Tuan (1980). Tais escolhas ocorreram pela necessidade de se compreender a percepção que o ribeirinho tem do seu lugar e as relações no seu espaço. As entrevistas foram realizadas na proposta de Meihy (2005) de transcrição, textualização e transcriação; com as concepções do espaço vivido, considerou-se a observação, a percepção e o falar durante todo o processo do trabalho de campo, pois na “investigação do espaço vivido, essa prática tanto do terreno, como do olhar e da palavra são indispensáveis” (SILVA; NASCIMENTO SILVA, 2002, p. 67).
As leituras feitas durante a construção do trabalho foram selecionadas com base no campo teórico da geografia cultural, que propõe a compreensão do espaço a partir das representações culturais, como: rituais, religião, crenças, artes e maneiras de organização do trabalho. Assim, inter-relacionando teoria e metodologia, este artigo decorre de uma pesquisa geográfica, com enfoque cultural, fundamentada nos significados e valores que o indivíduo atribuiu a sua existência, ao lugar, bem como às suas relações sociais e espaciais com o meio (COSGROVE, 2000). A geografia cultural permite abordar sentimentos, valores culturais e experiências vividas do ser humano com/no seu espaço. Partindo desse princípio, identifica-se uma compreensão diferenciada para a relação do ribeirinho com/no seu espaço a partir das emoções, afetos e sentimentos envoltos dos valores atribuídos às relações, fundamentados na cultura do grupo.
Além disso, apresenta-se uma discussão fundamentada nas concepções de Claval (2007), por discorrer sobre a cultura, na complexidade de seu conceito, a partir do comportamento, saberes, técnicas e gerações, o que possibilita compreender as relações entre o ser humano tendo-se as representações culturais como elemento fundamental para a organização do espaço. Logo, pode-se analisar o espaço ribeirinho considerando-se os signos que fazem parte do imaginário humano, vividos e construídos em suas espacialidades, onde são criadas as representações que fundamentam a organização social de seu grupo de pessoas ou mesmo da comunidade.
Dessa forma, pode-se identificar na cultura ribeirinha um universo de possibilidades para pesquisa, uma vez que essa, conforme Loureiro (1995, p. 26), se caracteriza por “profundas relações com a natureza, que perdurou, consolidou e fecundou, poeticamente, o imaginário”. É uma cultura ligada diretamente ao rio e à mata. O caboclo, solitário, adentrava a mata para o corte da seringa, vivenciando e desvendando os segredos do lugar a sua volta (LOUREIRO, 1995).
Assim, apresenta-se um espaço ribeirinho, com suas subjetividades, que envolve o cotidiano das localidades às margens do rio Madeira.
Apontamentos teóricos para compreender o espaço ribeirinho
O espaço ganha uma visão de análise no campo do subjetivo quando se consideram as representações e crenças de uma sociedade, ou mesmo de um determinado grupo social, como indivíduos participantes da sua formação e organização. Compreender o espaço a partir do subjetivo e das experiências vividas possibilita identificar o simbólico, os signos, a construção das representações que estão nas manifestações culturais, na percepção e nos modos de vida de um determinado grupo social.
O ser humano cria os elementos que favorece a relação homem/espaço e homem/lugar. A eles são atribuídos valores e significados[3] que justificam sua existência, mantendo a ordem social de um grupo, transcendendo o real e adentrando numa relação profunda entre o ser humano e o meio. Sendo o espaço humanizado e complexo, seus elementos consequentemente também serão. Nesse sentido, Steiner (1994, p. 16) entende que:
quando a natureza sadia do homem atua como um todo; quando ele se sente no mundo como num todo grande, belo, digno e valioso; quando o bem estar harmonioso lhe proporciona um encantamento livre, então o próprio Universo, se pudesse sentir a si mesmo, alegrar-se-ia como se tivesse cumprido sua missão, admirando o auge de sua evolução e de sua essência.
A confluência das ideias de Steiner (1994) à discussão estética do espaço na perspectiva de um elemento simbólico e emocional, pois o homem que o vivencia atribui valores, cria signos e símbolos que proporcionam a organização e socialização de um grupo social, evidenciando uma profunda relação subjetiva, valorativa e experiencial do ser com o meio. Nesse sentido, considera-se a possibilidade de construir caminhos para compreender as constantes mudanças no espaço ribeirinho, conduzindo para releituras, reconstruções, ressignificações, que são marcas do espaço e do tempo, funcionando como fator de organização e de mudanças na espacialidade dos grupos ribeirinhos, podendo identificar os conflitos sociais e as subjetividades envolvidas nas relações desse grupo social.
A ciência geográfica atual tem-se mostrado atenta às questões socioculturais do espaço das comunidades tradicionais e a suas influências na ação de ocupação e apropriação do meio pelos indivíduos ao compreender o espaço como produto social e que, ao mesmo tempo, se torna elemento de relações da sociedade. Dessa forma, é possível compreender que o espaço, incluindo-se o característico de comunidades tradicionais, está repleto de símbolos e sentimentos atribuídos pelos indivíduos que nele vivem.
Segundo Claval (2002), a discussão a acerca das atividades humanas sobre os elementos em movimento na vida social, possibilita reconhecer a existência de diversas lógicas em funcionamento nas ações feitas no coletivo. A forma e o modo de ocupação e apropriação dos espaços pelos indivíduos sociais também estão vinculados à subjetividade, pois há “muito mais coisas determinando nossas vivências do espaço que o capital” (MASSEY, 2008 p. 179). A relação também acontece por meio da afetividade, da cultura, da história, ou seja, pelo sentimento de pertencimento. Compreender essa relação entre o ser humano com o meio e o outro é fundamental para perceber que os espaços são fruto das relações humanas. Conceber o espaço como resultado das emoções do ser humano permite analisá-lo a partir das relações com a natureza, conduzindo para as “transformações produzidas por nossa existência no mundo da natureza e, sobretudo, os significados que a cultura atribui à sua existência e às suas relações com o mundo natural” (COSGROVE, 2000, p. 34). Dessa forma, compreender as relações envolvendo a experiência emocional conduz para uma leitura das relações espaciais com base nas sensações e nos sentimentos que envolvem o indivíduo.
Cada grupo social apresenta particularidades nas relações socioculturais, caracterizando seu espaço, adquirindo saberes, valores e crenças. Nas particularidades das relações culturais, é possível identificar as representações socioculturais sob a perspectiva e confluência conceitual dos estudos da epistemologia da geografia, por esta apresentar uma discussão plural, com múltiplos caminhos para compreender o espaço socialmente construído. A partir dessa compreensão, torna-se possível “trabalhar no mundo, ou melhor, os mundos, através da pluralidade de suas expressões, sejam estas vividas ou interpretadas” (SAHR, 2007, p. 59). Assim, para compreender a dinâmica e as constantes mudanças das sociedades, busca-se um conhecimento plural, que permite explicar o(s) mundo(s).
No campo teórico da subjetividade, “as interpretações (sentidos) dos signos reproduzem no espaço uma grande variabilidade de intenções e objetos existentes na sociedade” (SAHR, 2007, p. 63). Por isso, nas relações entre o ser humano e o espaço, há valores e sentidos que diferenciam cada grupo, cada indivíduo em relação ao todo, à universalidade. A concepção de espaço considera os signos, que fazem parte do imaginário humano, vividos e construídos em um determinado espaço social. Nessa perspectiva, o espaço é caracterizado pela vivência humana, com múltiplas formas de se explicar e relacionar com o mundo; logo, “a cultura contribui para a interpretação do espaço, permite a articulação entre o imaginário e as coisas do real” (BERQUE, 1998, p. 89). Nesse processo de articulação, o espaço se torna social por inter-relacionar o subjetivo com o visível, ou seja, é um “misto, um híbrido, um composto de forma-conteúdo” (SANTOS, 1996, p. 35). Desse modo, o espaço é um elemento não homogeneizado, uma combinação resultante de um processo histórico, envolto pelo tempo e pelo social, repleto de particularidades locais que permitem buscar na cultura uma outra forma de compreensão das relações espaciais: indivíduo-indivíduo/indivíduo-sociedade/indivíduo-meio/sociedade-meio.
No espaço híbrido e plural, cada grupo social tem crenças e individualidades que caracterizam suas relações. Assim, “espaço só poderá ser essência enquanto ente ideal, ou seja, como algo diante da ideia que necessita ser definido” (MARTINS, 2007, p. 35). Dessa forma, o espaço é resultado da existência, das ações e atitudes do ser humano, representando as experiências tanto coletivas como individuais, no âmbito das objetividades e das subjetividades, considerando-se, ainda, as intersubjetividades de uma coletividade. Quando se trata da coletividade, o espaço se torna uma categoria real e em constantes transformações, pois é constituído por ações humanas e está essencialmente ligado ao social (SANTOS, 1996). Então, o espaço é um objeto complexo e precisa ser analisado e interpretado considerando-se cada grupo social, cada sociedade e as diferentes temporalidades, visto que o ser humano, “não se movimenta arbitrariamente em seu espaço, mas todos os seus caminhos são [...] referidos à oposição básica entre o partir e o retornar” (BOLLNOW, 2008, p. 89).
No espaço, estão as múltiplas relações cotidianas, econômicas, políticas e culturais - ideologias que se entrelaçam e que fazem parte do dia a dia de cada indivíduo. Nesse emaranhado de relações sociais e culturais, tem-se como ponto central o ser humano enquanto herdeiro cultural de gerações passadas (LARAIA, 2004), cujas crenças, moral, leis, costumes, arte e aprendizado se baseiam naquilo que aprendeu socialmente. O certo ou o errado, o bonito ou o feio dependem das relações que o ser humano vivencia. Assim, através de suas experiências e dos saberes acumulados durante a vida, o ser humano organiza seu espaço. Esse processo acumulativo de experiências que se tornam práticas de vivência e apresenta a influência de gerações passadas.
O espaço é cultural e heterogêneo, uma vez que todos os indivíduos são diferentes uns dos outros. Dito isso, defende-se um espaço cultural, pois “não há espaço produzido que não seja através da cultura dos grupos que o constituem, seja no sentido mais amplo ou lato da cultura” (HAESBAERT, 2008, p. 396). Nesses termos, o espaço vivido com um ambiente valorativo e relacional do ser abre possibilidades para uma análise com base nas particularidades de cada sociedade, pois “as relações do homem com o espaço não constituem um feixe de dados imanentes ou inatos; combinam-se numa experiência vivida” (FRÉMONT, 1980, p. 23).
O espaço é caracterizado pelas experiências vividas pelos sujeitos e repleto de valores subjetivos e afetivos que inter-relacionam o indivíduo com o meio: “o homem em harmonia com o seu espaço tem necessidade de referências simbolizantes” (PANKOW, 1998, p. 17). O homem simboliza as experiências vividas, entra em harmonia com o meio e se percebe como parte do espaço vivido. Essas experiências são acumulativas e transmitidas de pais para filhos e filhas, sofrem algumas mudanças conforme o tempo e o espaço, mas têm, em essência, a acumulação de conhecimentos transmitidos pelas gerações anteriores.
Na discussão do espaço vivido, a subjetividade existente na formação das relações do homem com o espaço é vista como “espaço vivido de cada indivíduo ou de cada grupo corresponde à área das mudanças que tem valor exemplar” (GALLAIS, 2002, p. 81). A partir do espaço vivido, o campo da análise geográfica se amplia também para grupos sociais como os ribeirinhos; logo, o espaço pode ser enfatizado como resultado do “papel das representações, crenças e sistemas de ideias na formação das paisagens e na organização do espaço” (CLAVAL, 2002, p. 135).
Espaço ribeirinho: as localidades ribeirinhas
As localidades ribeirinhas, predominantemente, foram núcleos de apoio aos seringais, com os barracões[4](NASCIMENTO SILVA, 2000), por serem locais estratégicos, à margem dos rios e de fácil acesso. No modo de vida no seringal, destacam-se as casas palafitas, para evitar alagamentos na época da cheia ou que sejam arrastadas pela correnteza do rio, a farinha e o peixe como forma predominante de alimentação e a familiaridade com a mata. Essa característica predomina nesse grupo social por viverem isolados, sendo a pescaria e a caça os elementos de diversão dos trabalhadores (SILVA, 2008).
A partir da segunda metade do século XIX, a atividade extrativista da produção de borracha e a organização de seringais influenciou diretamente a formação das localidades ribeirinhas do rio Madeira (SILVA, 1999). Com o fim do segundo ciclo da borracha, a população trabalhadora fixou-se na área às margens do rio Madeira e no interior das localidades, desenvolvendo uma agricultura de subsistência, juntamente com a caça, a pesca e o extrativismo vegetal (NASCIMENTO SILVA, 2000).
Ainda no período dos ciclos da borracha, a predominância da migração nordestina para a Amazônia foi outro fator que veio a caracterizar o espaço ribeirinho. Essas pessoas procuraram essa região, fugindo da seca e da fome, juntando a essa situação a propaganda do governo de uma vida melhor, sem fome, sem miséria e trabalho para todos (SANTOS, 2002, p. 11). Essa relação espacial, vivida por gerações anteriores, influenciou e marcou o modo de vida e a organização do espaço ribeirinho. A migração nordestina influenciou na formação do espaço ribeirinho na Amazônia, mais especificamente dos grupos existentes nas margens do rio Madeira, trazendo de sua região de origem um conhecimento do modo de vida característico de sua cultura e espalharam nas margens dos rios da Amazônia, desde o final do século XIX, disseminando pelo vale do rio Madeira subindo os rios da região (NASCIMENTO SILVA, 2000, p. 85).
Nesse processo de migração, a partir de 1945, houve a predominância de uma migração familiar e sertaneja (NASCIMENTO SILVA, 2000) que passou a intercambiar culturalmente com a população local, proporcionando o desenvolvimento de uma nova cultura: a cultura cabocla ou ribeirinha (LOUREIRO, 1995). Essa cultura, na sua formação, tem como característica a solidão e o isolamento, juntamente com a relação de sobrevivência do seringueiro com a mata. Mediante essa solidão, é possível dimensionar a sensação da imensidade e os pensamentos se perpetuam livremente no espaço (TUAN, 1983). Esses pensamentos, ao vagarem pelo espaço, na solidão da mente, proporcionam experiências que ultrapassam a materialidade e são vividas e compartilhadas na cultura do grupo em que o indivíduo está inserido, caracterizando suas relações inter/intra-espaciais. Diante dessa particularidade, a relação do nordestino com o espaço amazônico e com a população indígena existente proporcionou o surgimento de um novo contexto sociocultural na Amazônia; com as ações cotidianas praticadas no seringal, foi possível dar a este lugar existência, tanto material como cultural, uma vez que o seringueiro fez do seringal seu lugar de viver.
Os ribeirinhos se organizaram no espaço amazônico às margens dos rios, adaptaram suas vidas entre a cultura da época do seringal e as novas culturas que passaram a existir, caracterizando uma vida ribeirinha. Essa vivência às margens dos rios transformou a particularidade da vida desses ex-seringueiros, que agora são pescadores, agora ribeirinhos da Amazônia.
O rio e o ribeirinho: uma relação espacializada
A relação do ser humano com os elementos da natureza existe desde os tempos primórdios, em que a floresta se tornou o meio de sobrevivência. Nesse sentido, ao rio e à mata, para o ribeirinho da Amazônia, são atribuídos sentidos e valores além da materialidade. Há de se destacar o rio como o elemento de múltiplas espacialidades nos grupos ribeirinhos, pois, observando seu modo de vida, percebem-se as representações deste elemento para a dinâmica dos indivíduos.
As localidades ribeirinhas estão localizadas às margens dos rios, podendo ser considerados de fácil acesso, em relação aos percursos da viagem por meio de barco recreio[5]. O rio inter-espacializa os espaços ribeirinhos, numa relação próxima com a natureza, permitindo tranquilidade aos passageiros que embarcam no porto e desembarcam nas mais longínquas localidades espalhadas às margens do rio Madeira. Assim, é possível se chegar tanto nas localidades distantes como nas próximas ao núcleo urbano da cidade, a exemplo dos grupos ribeirinhos localizados à margem esquerda do rio Madeira, em frente ao complexo da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, sendo necessário somente atravessar o rio de voadeira[6] e, entre cinco a oito minutos, chega-se ao destino. Há localidades ribeirinhas cujo acesso pode ser feito por via terrestre, por um ônibus coletivo de linha rural ou pela ponte do rio Madeira. Essa situação não desconfigura a relação de proximidade do ribeirinho com esse elemento, uma vez que pode desenvolver outras espacialidades com o rio.
Nascimento Silva (2000, p. 103) afirma que “o Rio Madeira tem uma importância muito grande para essas pessoas, pois é a partir dele que os ribeirinhos tiram sua sobrevivência e utilizam-no como transporte”. Os ribeirinhos espacializam o rio no momento em que passam a conhecê-lo - suas cheias, seus perigos, suas mudanças – e o humanizam quando acreditam que ele oferece o peixe, desbarranca locais e engana navegantes, fazendo com que embarcações virem no meio do rio.
Subindo e descendo o rio Madeira, os moradores o usam como “estrada” e se inter-espacializam, trocam alimentos, participam de festejos entre as localidades às margens do rio, para comemorar a colheita e fazer as vendas ou trocas de mantimentos. Organizam festejos e/ou comemorações religiosas que atraem moradores de outras localidades, sendo o rio o meio pelo qual navegam e se inter-relacionam (SARAIVA, 2007). De acordo com Saraiva (2007), é através do rio que chegam à localidade alimentos de todos os tipos, gás e produtos de limpeza, para serem comercializados nos mercados das localidades. Pelo rio é transportada a produção, principalmente de banana, pupunha e açaí, para ser comercializada em todo o rio Madeira.
O navegar noturno também é possível para esses moradores que, em busca de uma dança de forró, se movimentam em aventuras pelo rio, “estrada” que interliga e socializa as localidades pelo rio Madeira. Em algumas localidades, geralmente à noite, há realização de campeonato de futebol entre os times ribeirinhos. Esses campeonatos são comuns e a divulgação ocorre dentro dos próprios barcos de viagens (SOUZA, 2004). Durante a noite, a única luz é a do barco. Aqueles que navegam constroem suas linhas de referências, cuja delimitação pode ser feita por uma árvore ou um igarapé. Por meio da navegação pelas águas do rio Madeira, chegam a Porto Velho para resolver situações documentais, de saúde, fazer compras e visitar familiares que residem na cidade. Assim, o navegante faz do rio seu lugar, ressignificando-o, dotando-o de valores afetivos, sentindo saudades e, ao conhecê-lo pelo movimento das águas, faz dele um espaço de vivência.
Na compreensão da subjetividade da discussão proposta tem-se a realização do trabalho de campo, entre os anos de 2008 a 2010, que possibilitou a realização de entrevistas com moradores, nesse período, a partir da proposta metodológica da História Oral apresentada por Meihy (1995) por compreender a entrevista aberta/livre como meio para apresentar a concepção de vida do narrador (a), além de apresentar os caminhos para o contato com os entrevistados (pré-entrevista e a entrevista). Há de pontuar que nesse método de coleta de dados possibilita uma pergunta de corte, segundo o autor corresponde de forma indireta ou uma indagação que possibilitar o desenvolvimento da fala (MEIHY, 1995). Tal procedimento ocorreu no ato da entrevista permitindo a continuidade da fala de forma livre e a critério dos narradores. Outro instrumento fundamental nesse método corresponde ao diário de campo, o qual realiza-se a escrita detalhadamente os acontecimentos durante a pesquisa de campo.
O método para análise das entrevistas correspondeu ao Espaço Vivido proposto por Frémont (1980) por apresentar o olhar (observar), ouvir e falar como meios de investigação para compreender, descrever e interpretar as organizações dos ambientes, realizar as entrevistas e apresentar os dados a partir da relação do ser humano com o espaço. Assim, tais escolhas perpassam pelo uso da entrevista como principal técnica do trabalho de campo e a possibilidade de apresentar uma interpretação da percepção que o ribeirinho tem do seu lugar e as relações espaciais.
Durante o trabalho de campo, as falas dos colaboradores da pesquisa evidenciaram que o rio está presente na vida do ribeirinho, possibilitando a construção de uma relação subjetiva, humanizando esse elemento da natureza, que se torna personagem na vida do homem da Amazônia. Há uma relação espacial entre o ribeirinho e os elementos da floresta, na qual “os homens passam pelo rio, usam o rio, trabalham no rio, alimentam-se do rio, navegam pelo rio, vivem no rio e morrem no rio” (GONDIM,1994, p. 98). A referida autora demonstra a relação de sobrevivência do ribeirinho com o rio: seja através da pesca ou do transporte fluvial, o homem organiza sua vida às margens do rio, vivenciando-o e atribuindo-lhe valores afetivos que fazem parte de sua cultura e modo de vida.
Além do rio, elemento de proximidade com os ribeirinhos, tem-se a mata. Nessa relação espacial, a organização das casas segue a linearidade desses elementos, conforme observado durante a pesquisa de campo (2008 a 2010). Vale ressaltar que essa situação favorece uma relação simbólica, repleta de signos culturais que demonstram o envolvimento do ribeirinho com o rio e a mata.
Identifica-se uma afetividade para com o rio, que faz parte do lugar vivido. A relação que estabelecem com o rio está marcada pela subjetividade. Para os pescadores, o rio traz o peixe, que é o principal alimento, a paz, a saúde, as experiências vividas e o lugar ganha os sentimentos de gostar e de gratidão, como se pode identificar em falas como: “[...] aqui ninguém morre de fome, é só pescar...” (morador da Vila de Calama/2009).
Os ribeirinhos observam o movimento das águas, identificam as cheias e as vazantes, escolhem o melhor momento e local para pesca. O rio é um dos elementos que fazem parte da vida dos moradores e está presente na organização e na produção do espaço ribeirinho. O rio liga e move a vida do ribeirinho, portanto existe “[...] um vínculo permanente entre o nativo e o rio. A canoa é o veículo que ele usa para se locomover” (GONDIM, 1994, p. 98). Logo, usando o rio como “estrada” e a canoa como “automóvel”, o ribeirinho alcança as distâncias desejadas e especializa sua cultura nos mais diversos locais de sobrevivência humana na Amazônia.
O espaço ribeirinho: uma percepção dos outros espaços
As localidades ribeirinhas são atendidas por órgãos governamentais, no âmbito municipal e estadual. Há de se destacar a saúde e a educação, pois a essas são atribuídos valores subjetivos por parte dos moradores que demonstram sua importância para o grupo social.
Por serem localidades próximas ao rio, as demandas referentes à saúde ocorrem muitas vezes fora do espaço vivido do ribeirinho. Os casos de urgência ou emergência são encaminhados para o núcleo urbano de maior proximidade. Em algumas localidades existem pequenos postos de saúde municipais, os quais, segundo os moradores, funcionam sob a responsabilidade de técnicos e auxiliares de enfermagem.
À educação também são atribuídos valores simbólicos, demonstrando sua importância para os ribeirinhos. As escolas são de responsabilidade dos órgãos públicos, estado e prefeitura de Porto Velho. A educação, para os moradores/ribeirinhos entrevistados, é um meio de conhecer o mundo das letras, é algo de muito valor e orgulho para aqueles que frequentam a escola ou chegaram a concluir o ensino médio.
De forma geral, na época da pesquisa de campo, havia predomínio das escolas municipalizadas, com sala de aula multisseriada, em que a professora desenvolve várias tarefas ao mesmo tempo para atender aos alunos com saberes diferenciados. No caso das localidades próximas ao centro urbano de Porto Velho, os professores são moradores de Porto Velho; assim, há um intercâmbio de conhecimentos e saberes específicos que a cultura dos livros não aborda (SOUSA, 2009). Destaca-se que alguns funcionários públicos, principalmente da Secretaria Municipal de Saúde e Educação, socializam o espaço ribeirinho com os pescadores, caçadores e agricultores, caracterizando a dinâmica cultural do lugar.
Observou-se, nas localidades ribeirinhas, a presença de Associações, as quais, segundo os moradores, são de grande valia, pois proporcionam melhor diálogo entre os próprios produtores/ trabalhadores das localidades em prol da venda de produtos produzidos, coletados ou da pesca. Esse tipo organização ajuda a manter e fortalecer a agricultura, visto que podem se organizar para produção e venda dos produtos.
Ao navegar pelo rio Madeira é possível observar que a maior concentração populacional das localidades ribeirinhas está às margens do rio. As casas, grande parte de madeira, foram e ainda são construídas próximas às águas. Dessa forma, pode-se compreender o rio como uma linha de organização do espaço. Vale destacar que os pontos de embarque e desembarque normalmente são próximos às igrejas, o que é muito comum nas localidades ribeirinhas, caracterizando a organização espacial do grupo. Como exemplo, na organização espacial da localidade denominada Vila de Calama, identificam-se: pequenos comércios (mercadinhos), ruas que lembram ciclovias, calçadas com paralelepípedos, igrejas evangélicas e católica, crianças correndo por toda parte e pontes de madeira, características da estrutura das localidades.
Outra situação comum na fala de alguns moradores é a construção representativa dos espaços ribeirinhos como um lugar tranquilo, seguro e com boas condições de vida, principalmente um lugar onde se pode plantar, pescar e caçar. Nesse sentido, a concepção de lugar proposta por Tuan (1983) aborda a afetividade e a segurança que o homem sente para com um lugar, atribuindo a esta importância e valor para sua sobrevivência. Compreende-se, ainda, que “a ordem do lugar é fruto do pensamento organizado” (LIMA, 2008, p. 234).
Logo, todo lugar reflete a convivência com o rio e a mata. Buscando o afeto e a segurança, o grupo cria e organiza seu lugar repleto de sentimentos e valores. Assim, o lugar ribeirinho apresenta-se como uma construção única, singular, carregado de representações, agregando ideias e sentidos produzidos por seus moradores. Considerando essa relação, a narradora e moradora da antiga localidade ribeirinha da Cachoeira de Teotônio exalta-se ao afirmar: “[...] sou a pessoa mais velha daqui de idade...”. Ainda em sua fala, comenta sobre a estrutura social da comunidade, “[...] quando eu cheguei aqui só tinha família...”.
São as múltiplas relações espaciais que mantêm a dinâmica da vida no grupo. Tais relações estão em constantes mudanças, criando novos símbolos e significados espaciais, ressignificando atitudes do cotidiano e, consequentemente, influenciando na organização do modo de vida e na cultura do grupo.
Religiosidade ribeirinha: um espaço simbólico
Ao observar que a vida é dinâmica e está em constantes mudanças (CLAVAL, 1999) identifica-se um fluxo natural que acontece em todas as culturas, possibilitando releituras dos espaços ribeirinhos. No que se refere à religiosidade nas localidades ribeirinhas do rio Madeira, observou-se presença tanto da igreja católica como das igrejas evangélicas. Na entrada de grande parte das localidades há uma igreja católica, com a cruz em destaque, demonstrando a permanência dessa religião ao longo dos tempos. Contudo, os espaços religiosos evangélicos atualmente têm presença considerável e essa dubiedade de espaços religiosos tem influenciado na reorganização das relações espaciais nas localidades. A religiosidade também está presente no cotidiano e, durante as conversas, pode-se ouvir repetidas vezes as palavras Deus e Jesus. Os moradores, ao irem para o rio ou para mata, pedem proteção divina. Observa-se que há maior quantidade de casas nos arredores das igrejas. Logo, percebe-se que a organização do espaço considera as igrejas, pois as pessoas começam a viver próximas a elas e o espaço ocupado cresce em seu entorno, demonstrando a representatividade religiosa para o grupo.
Pesquisadores de comunidades ribeirinhas pontuam que o festejo proporciona o encontro de famílias tanto da localidade como de outras localidades, bem como da zona urbana de Porto-Velho. São organizadas quermesses para a venda de bebidas e comidas típicas, são construídas barracas de palha pelos moradores/participantes do festejo, há leilões de comidas durantes as noites do festejo, cuja renda é repartida entre os organizadores e aqueles responsáveis pela conservação da igreja. Nesse contexto, deve-se salientar que, a ausência de igrejas em algumas localidade não significa falta de religiosidade no grupo, tanto que é possível identificar, dentro das residências, lugares onde ficam imagens de santos e santas correspondentes à igreja católica e, nas conversas com os moradores, percebe-se o quanto eles agradecem e pedem a Jesus Cristo boa pescaria e proteção.
A religiosidade está presente em algumas localidades desde o nome, que homenageia um santo, a exemplo de São Sebastião, aos festejos para os santos e a presença de santuários nas casas. É comum encontrar igreja católica construída em alvenaria, dedicada ao santo padroeiro do lugar. É na igreja que os moradores, principalmente os mais idosos, trocam as experiências de vida e mantêm a dinâmica da cultura ribeirinha.
Concebendo-se que o lugar é vivenciado, o espaço religioso ribeirinho é um lugar simbólico, com signos e significados que fazem parte do modo de vida daqueles que o vivenciam.Os símbolos e signos existentes nos lugares dos festejos religiosos podem ultrapassar séculos e gerações, bem como um novo lugar com as representações desse espaço. Nesse sentido, o espaço ganha uma visão de análise no campo teórico da subjetividade, considerando-se as representações e crenças de uma sociedade ou de um determinado grupo social, enquanto indivíduos participantes na sua formação e organização. Sendo assim, o espaço pode ser enfatizado como resultado do “papel das representações, crenças e sistemas de ideias na formação das paisagens e na organização do espaço” (CLAVAL, 2007, p. 135). A partir desse subjetivo e das experiências vividas, é possível compreender o espaço como simbólico, pois o homem cria os símbolos facilitadores da relação homem/espaço e homem/ lugar, atribuídos de valores e significados que justificam sua existência, mantendo a ordem social de um grupo.
Entrelaçar a cultura com os espaços religiosos possibilita identificar os valores atribuidos às relações espaciais no ambinete religioso. Sob esse aspecto, compreende-se cultura como a soma dos comportamentos, dos saberes, das técnicas, dos conhecimentos e dos valores acumulados pelos indivíduos durante suas vidas e, em uma outra escala, pelo conjunto dos grupos de que fazem parte, pois “[...] Ela tem suas raízes num passado longínquo, que mergulhou no território onde seus mortos são enterrados e onde seus deuses se manifestam. Não é, portanto um conjunto fechado e imutável de técnicas e de comportamentos” (CLAVAL, 2007, p. 63). A cultura transmitida de geração a geração possibilita identificar, compreender e relacionar as relações sociais no espaço religioso e no modo de vida dos ribeirinhos, além de proporcionar novas construções, ressignificados e outros valores culturais.
Nesta discussão, compreende-se que o espaço religioso é um lugar simbólico, com signos e significados que fazem parte do modo de vida ribeirinho. Os símbolos e signos podem ultrapassar séculos e gerações, bem como um novo lugar com as representações desse espaço. Maia (1999, p. 204) define os festejos religiosos como “manifestações culturais que se caracterizam, entre outros aspectos, por serem eventos efêmeros e transitórios, perdurando algumas horas, dias ou semanas”. Sendo uma manifestação cultural, cada festejo está repleto de símbolos que refletem nas ações cotidianas de um grupo, tornando-se uma demonstração de fé coletiva.
Assim, compreender as relações espaciais a partir das representações culturais - tais como rituais, religião, crenças, artes e maneiras de organização social - possibilita ao pesquisador considerar tudo o que for criação e interação humana em um determinado lugar. Dessa forma, os espaços religiosos ribeirinhos como lugares simbólicos, construídos e reconstruídos conforme as experiências vividas pelo grupo que faz parte desse meio.
Cultura ribeirinha: um espaço dos seres encantados da Amazônia
O contexto cultural pode ser a chave para a compreensão do imaginário da família ribeirinha, representada pelo olhar e pelo ver no seu cotidiano. As manifestações da cultura ribeirinha são representadas pelos mitos. contados e narrados pelos moradores, que influenciam sua maneira de compreensão do mundo. É um modo de viver ribeirinho, com transformações históricas e acumulação de experiências sociais adaptadas ao meio, caracterizando as localidades ribeirinhas.
A cultura ribeirinha é uma herança sócio-histórica com particularidades adaptadas ao tempo e ao espaço, em que se adquirem saberes, valores e crenças, onde cada indivíduo explica sua experiência tornado-a coletiva e enraizando-a no convívio familiar. Assim, “compreender a cultura de um povo expõe a sua normalidade sem reduzir sua particularidade” (GEERTZ, 1989, p. 24). A cultura é marcada pela naturalidade e espontaneidade que flui em um grupo social especifico, caracterizando seus costumes, crenças e hábitos, formando um conjunto de modo de vida que mantém a homogeneidade de um grupo social.
Nas localidades ribeirinhas predomina transmissão da cultura pela oralidade, com a influência principalmente da família, o que facilita a permanência das narrativas míticas e delineia o comportamento social do grupo. O espaço é, então, resultado do “papel das representações, crenças e sistemas de idéias na formação das paisagens e na organização do espaço” (Claval, 2002, p. 135). Há uma forte relação dos mitos com o lugar e o homem ribeirinho na Amazônia. Essa relação está norteada pelos valores e experiências de vida do ser humano com o ambiente e está diretamente ligada à cultura. Na concepção de Claval (2002), a cultura compreende:
[...] o conjunto de representações sobre as quais repousa a transmissão, de uma geração a outra ou entre parceiros da mesma idade, das sensibilidades, ideias e normas. Ela inclui a imagem do meio ambiente próximo e os conhecimentos, práticas e ferramentas que permitem tirar partido dele (CLAVAL, 2002, p. 141/142).
Então, as narrativas míticas podem ser entendidas como representação da cultura ribeirinha. Relacionar cultura, geração e meio social com o espaço perpassa para a transmissão da cultura entre gerações e a relação do meio ambiente como um dos fatores favoráveis à existência dessas representações mitológicas na Amazônia. Na perspectiva da cultura e do espaço entrelaçada á relação do lugar com os mitos, a cultura também corresponde à vivência no meio, através das práticas e crenças desenvolvidas pelo ribeirinho. As representações da cultura ribeirinha estão diretamente relacionadas à mata, ao rio e à vida ribeirinha. Assim, “nas civilizações localizadas à margem dos grandes rios, o animismo dá aos diversos elementos ou trechos da hidrografia valores bem diferentes: água proibidas, águas exploradas segundo certos rios, águas livres [...]” (GALLAIS, 2002, p. 73).
A vivência diária do ribeirinho com a mata e o rio possibilita o desenvolvimento de um pensamento subjetivo/mítico que, incorporado ao grupo, ganha significado e valor, tornando-se parte da cultura e do mundo ribeirinho. O mito, resultado da dimensão cósmica do viver e ser ribeirinho, torna-se parte do social, comandando simbolicamente as construções sociais do lugar, onde são atribuídos valores aos rios e à mata.
As narrativas míticas fazem parte da vida ribeirinha. Essas comunidades desenvolvem uma intensa relação com o meio ambiente, tanto no campo da dependência econômica, uma vez que são comunidades de pescadores, como no campo de vivência, pois todo o seu mundo está entre a mata e o rio. Dessa relação, o homem ribeirinho atribui significados aos mundos natural, sobrenatural e humano, caracterizando a imaginação poética ribeirinha. Nas palavras de Loureiro (1995),
O pescador sonhador, perdido na solidão das águas, tenta ultrapassar a familiaridade redundante do cotidiano, buscando explicações que ele desentranha da ambigüidade do mundo em torno, no qual o dia a dia adquire dimensão cósmica. Conhecer o que há de inexplicado ou descobrir o que de submerso se pode encontrar nas explicações habituais, eis o sentido da navegação desse ser imaginante dentro de si mesmo e em face às coisas (LOREIRO, 1995, p. 62).
Assim, quando se pergunta como as narrativas míticas fazem parte da vida do homem ribeirinho, percebe-se a busca de explicações para acontecimentos do cotidiano ligadas ao imaginário cósmico humano, com intensa presença da água e da mata; o lugar passa a ser representado nas narrativas míticas de uma maneira sobrenatural. As narrativas ultrapassam a experiência individual ao serem compartilhadas e transmitidas à comunidade e, a partir da coletividade, transmissão e aceitação dos mitos como representação cultural pelo grupo, o ribeirinho passa a pensar sua relação com o ambiente considerando esses mitos. Essas representação se tornam coletivas, representando “os modos como os grupos pensam suas relações com os objetos que os afetam” (GIL FILHO, 2005, p. 55).
Essas representações culturais ribeirinhas são uma das características da cultura amazônica, visto que “ ao atribuir significado ao mundo do presente, a imaginação constrói narrativas que juntam o passado e o futuro numa forma de síntese” (COSGROVE, 2000, p. 48). Quando um mito começam a fazer parte da vida da comunidade, significa que a este foi atribuído sentido para sua permanência, ultrapassando a temporalidade do passado distante, sendo vivido no presente imediato e projetado no futuro próximo.
Neste trabalho, admite-se a dinâmica da vida e, consequentemente, suas mudanças; logo, os mitos são reconstruídos e remodelados conforme o tempo vivido do homem ribeirinho. Ainda nessa perceptiva de diferenças temporais e relações espaciais, compreende-se que o meio geográfico não é homogêneo: as muitas comunidades ribeirinhas apresentam diferenças nas narrativas, o que possibilita a identificação de narrativas características de determinadas comunidades. Tal situação é observada na narrativa da Cobra-Grande em duas localidades investigadas, nas quais esse ser encantado apresenta peculiaridades distintas, conforme disposto no Quadro 1:
Na compreensão das diferenças culturais tem-se que “o homem é um animal amarrado a teias de significados que ele mesmo teceu, assumo a cultura como sendo essas teias” (GEERTZ, 1989, p. 15). Essas teias, segundo o autor, criadas e vivenciadas pelo homem, interligam e socializam os indivíduo nos grupos sociais. O autor afirma, ainda, que “a cultura seria esta teia e sua análise uma ciência interpretativa a procura de significados” (GEERTZ, 1989, p. 15) e defende que, por meio da interpretação das teias sociais, podem-se compreender as especificidades da cultura de uma sociedade ou um grupo.
O homem atribui significados e valores às ações e pensamentos que vivencia no decorrer da vida. Pensando assim, Sahr (2007, p. 58) afirma que “sempre se reúnem no agir movimentos materiais com reflexões culturais, permitindo uma duplicidade sígnica - significante e significado”. A cultura, com seus significados e significantes, movimenta o agir humano no espaço, organizando-o socialmente.
A partir dessas compreensões teóricas, verificou-se que, nas comunidades ribeirinhas, existem marcas características da cultura de grupo social e os seres encantados são uma delas. Essas marcas culturais decorrem da relação subjetiva entre o ser ribeirinho e o lugar onde vive. Nessa relação de afetividade e inter-relação, surgem as narrativas sobre os seres encantados como representação cultural, como “expressão concreta, quer por manifestação, quer por emanação de uma vontade incontida do aqui e agora” (GIL FILHO, 2005, p.53).
Os seres encantados resultam de experiências vividas ligadas ao lugar e de devaneios que, conforme Loureiro (1995, p.38), são a “interpenetração das realidades do mundo físico com as do mundo surreal, criando uma zona difusa”. Nesta perspectiva, exemplifica-se a fala de uma narradora: “Minha mãe que contava pra gente cada história e eu fiquei com isso na minha cabeça (...) COBRA fêmea era mal e o outro o homem era que acalmava ela, ele era uma boa COBRA...”. Nesta fala, há a presença da mãe na transmissão da cultura, o que favorece a confiança e a segurança da narradora para com a história da Cobra-Grande. Identifica-se, ainda, a existência de narrativas envolvendo o Boto cor-de-rosa: “[...] quem tava em cima daquele flutuante caia na água e quem tava subindo voltava e quando batia na água saia tum tum tum para o meio do rio, era tudo BOTO”.
As narrativas envolvem situações como essas, de um animal se transformando em pessoa, o que não significa que este ser encantando não faça mais parte do lugar ribeirinho. Claval (2007, p. 87) considera que “as transformações efetuam-se sem que sejam questionados e sem que as pessoas tenham a impressão de viver num mundo mutável”.
O lugar do Boto encantado, assim como da Cobra Grande, é o rio. Loureiro (1995, p. 202) afirma que “o verbo emergir confere ao rio a significação de lugar de onde as coisas aparecem. É das águas que se emerge”. O Curupira e a Matinta-Perera, por sua vez, são seres da mata, conforme demonstrado no Quadro 2:
O lugar , então, é um elemento simbólico do espaço, ao qual o homem que o vivencia atribui valores sociais e culturais ao criar signos, símbolos e representações que proporcionam organização e socialização de um grupo. Na geografia, o lugar evidencia uma profunda relação subjetiva, valorativa e experiencial para os moradores das localidades ribeirinhas.
Na visão de Tuan (1983), o lugar é analisado a partir da percepção que os seres humanos, pois um espaço só se torna um lugar quando nele o homem constrói e organiza sua vida. Nesse sentido, pode-se interpretar o lugar como parte de um espaço simbólico, caracterizado pelos signos e representações que o homem cria e vivencia. Essa vivência é influenciada pela cultura. Claval (1999, p. 11) afirma que, “a cultura é um dado fundamental na compreensão dos lugares. Ela permite perceber os laços que os indivíduos tecem entre si, sobre a maneira como instituem a sociedade, como a organizam e como a identificam ao território no qual vivem ou com o qual sonham”.
Durante a pesquisa verificou-se que, nas comunidades ribeirinhas, os seres encantados são marcas características da cultura. Essas e outras marcas culturais se constituem em virtude da relação subjetiva entre o ser ribeirinho e o lugar onde vive.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste texto, através da fala dos colaboradores da pesquisa, identificou uma cultura composta de representações, significados, valores e visão de mundo correspondentes à vida ribeirinha, manifestadas nas narrativas e espacializadas por meio da compreensão do lugar. Pode-se perceber que as representações dos seres encantados fazem parte do lugar ribeirinho, em que há uma a cultura marcada pela presença do rio e múltiplos espaços na organização social do lugar.
Discutir o espaço ribeirinho perpassa pela subjetividade da cultura, quando se apresentam os mecanismos de sobrevivência, organização e explicações de um modo de vida característico das localidades às margens do rio Madeira: uma organização sociocultural com um tempo marcado pela relação subjetiva com a mata e o rio, que caracteriza o modo de vida ribeirinho. No balançar de uma rede e nos reflexos das águas, sobrevivem sem o “corre-corre” característico da vida urbana.
Compartilhando das histórias e experiências de vida dos moradores, foi possível identificar e interpretar sentimentos e desejos dos indivíduos para com seus lugares, sendo perceptível uma ligação simbólica do ribeirinho com seu espaço, atribuindo-lhe valores subjetivos, uma relação afetiva para com seu lugar, espacializando suas experiências de vida.
Deve-se salientar que a organização e as relações espaciais características do grupo possibilitam compreender um modo de vida marcado por simbolismos subjetivos que permite compreender o espaço ribeirinho. Portanto, não é viável fazer generalizações, considerando-se as muitas localidades ribeirinhas. Por mais semelhante que sejam, suas construções espaciais são únicas dentre muitas influências. Essa situação movimenta espacialmente e cronologicamente o ser humano no mundo. Evidenciando-se as diferenças, espera-se que este texto posso contribuir para novas reflexões, considerando-se a diversidade sócio-étnica-cultural humana.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CHAVEIRO, E. F. Símbolos das paisagens do cerrado goiano. In: ALMEIDA, Maria Geralda de. (Org.). Tantos Cerrados. 1ª ed. Goiânia: Vieira, 2005, v. 1, p. 47-62.
COSGROVE, D.; JACKSON, P. Novos rumos da geografia cultural. In: CORRÊA, Roberto Lobato; ROSENDAHL, Zeny (Orgs.). Geografia cultural: um século (2). Rio de Janeiro, EduERJ, 2000. (Coleção Geografia Cultural).
BERQUE, A. Paisagem-marca, paisagem-matriz: elementos da problemática para uma geografia cultural. In: CORRÊA, Roberto Lobato; ROSENDAHL, Zeny (Orgs.). Paisagem, tempo e cultura. Rio de Janeiro, EDUERJ, 1998.
BOLLNOW, O. F. O homem e o espaço. Trad. Aloísio Leoni Schmid. Curitiba: UFPR, 2008.
CLAVAL, P. Campo e perspectiva da geografia cultural. In: CORRÊA, Roberto Lobato; ROSENDAHL, Zeny (Orgs.). Geografia cultural: um século (3). Rio de Janeiro, EduERJ, 2002. (Coleção Geografia Cultural).
CLAVAL, P. A geografia cultural. Trad. Luiz Fugazzola Pimenta e Margareth de Castro A. Pimenta. 3ª ed. Florianópolis: UFSC, 2007.
CLAVAL, P. A geografia cultural. Trad. Luiz Fugazzola Pimenta e Margareth de Castro A. Pimenta. Florianópolis: UFSC, 1999.
FRÉMONT, A. A região, espaço vivido. Trad. Antônio Gonçalves Reivão e Antônio G. Mendes. Coimbra, Almeida, 1980.
GALLAIS. J. Alguns aspectos do espaço vivido nas civilizações do mundo tropical. In: CORRÊA, Roberto Lobato, ROSENDAHL, Zeny (Orgs.). Geografia cultural: um século (3). Rio de Janeiro, EduERJ, 2002. (Coleção Geografia Cultural).
GEERTZ, C. A interpretação das culturas. São Paulo: Copgright, 1989.
GIL FILHO, S. F. Geografia cultural: estrutura e primado das representações. In: Espaço e cultura. UERJ, RJ nº 19-20. pp. 51-59, jan./dez. 2005.
GONDIM, N. A invenção da Amazônia. São Paulo: Marco Zero, 1994.
HAESBAERT, R. Hibridismo, mobilidade e multiterritorialidade numa perspectiva geográfico-cutural integradora. In: SERPA, Angelo (Org.). Espaços culturais: vivências, imaginação e representações. Salvador, EDUFBA, 2008.
LARAIA, R. de B. Cultura: um conceito antropológico. 17ª ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2004.
LIMA, D. de A. O juízo reflexionante kantiano e a natureza humana de representar no lugar. In: SERPA, Angelo (Org.). Espaços culturais: Vivências, Imaginação e Representações. Salvador: EDUFBA, 2008.
LOUREIRO, J. de J. P. Cultura amazônica: uma poética do imaginário. Belém: CEJUP, 1995.
MAIA, C. E. S. Ensaios interpretativos da dimensão espacial das festas populares: proposições sobre festas brasileiras. In: ROSENDAL, Zeny e CORRÊA, Roberto Lobato (Orgs.). Manifestação da cultura no espaço. Rio de Janeiro: EDURJ, 1999.
MASSEY, D. Pelo espaço: uma nova política da espacialidade. Trad. Hilda Pareto Maciel e Rogério Haesbaert. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil. 2008.
MARTINS, É. R. Geografia e ontologia: o fundamento geográfico do ser. GEOUSP - Espaço e Tempo, São Paulo, nº 21, pp. 33-51, 2007.
MEIHY, J. C. S. B. Manual de história oral. 5ª ed. São Paulo: Loyola, 2005.
NASCIMENTO SILVA, M. das G. S. O espaço ribeirinho. São Paulo: Terceira Margem, 2000.
PANKOW, G. O homem e seu espaço vivido: análises literárias. Trad. Flávia Cristina de Souza Nascimento. Campinas, Papirus, 1998.
RIBEIRO, M. A. No espelho das águas um lugar ribeirinho no Rio Madeira. 2010. 158f. Dissertação (Mestrado em Geografia) - Fundação Universidade Federal de Rondônia, Porto Velho, 2010.
SAHR, W. D. Signos e espaço mundos – a semiótica da espacialização na geografia cultura humanista e cultural? In: KOZEL, Salete, SILVA; Josué da Costa; GIL FILHO, Sylvio Fausto (Orgs.). Da percepção e cognição a representação: reconstruções teóricas da geografia cultural e humanista. São Paulo: Terceira Margem. Curitiba: NEER, 2007.
SANTOS, M. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. São Paulo: Hucitec, 1996.
SANTOS, N. Seringueiros da Amazônia: sobreviventes da fartura. Tese (Doutorado em Geografia Humana) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2002.
SARAIVA, A. L. Festejos e religiosidade popular: o festejo em comunidades ribeirinhas de Porto Velho-RO. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Regional) - Universidade Federal de Rondônia, Porto Velho, 2007.
SILVA, A. G. da. Conhecer Rondônia. Porto Velho: ABG, 1999.
SILVA, A. C. G. da. O seringal no município de Lábrea: o espaço vivido e a resistência de um tempo. Dissertação (Mestrado em Geografia) - Universidade Federal de Rondônia, Porto Velho, 2008.
SILVA, J. da C.; NASCIMENTO SILVA, M. das G. S. Os relatos orais e a pesquisa com populações ribeirinhas. In: SILVA, Josué da Costa Silva; SOUZA, Mariluce Paes de; FIGUEIREDO, Expedita Fátima Gomes de; SOUZA, Lucileyde Feitosa; PEREIRA, Wilma Suely Batista (Orgs.). Nos banzeiros do rio: sustentabilidade e desenvolvimento em comunidades ribeirinhas da Amazônia. Porto Velho: EDUFRO, 2002.
SOUSA, D. L. F. Espaço vivido e mapas mentais em escola ribeirinha. Dissertação (Mestrado em Geografia) - Universidade Federal de Rondônia, Porto Velho, 2009.
SOUSA, L. F. Navegar é preciso: barqueiros do Madeira, cultura, resistência e sustentabilidade. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Regional) - Universidade Federal de Rondônia, Porto Velho, 2004.
STEINER, R. Arte e estética segundo Goethe: Goethe como fundador de uma estética nova. Trad. Marcelo Veiga. São Paulo: Antroposófica: Centro das Artes de São Paulo, 1994.
TUAN, Y. F. Topofilia: um estudo da percepção, atitudes e valores do meio ambiente. Rio de Janeiro: DIFEL, 1980.
TUAN, Y. F. Lugar e espaço. São Paulo: DIFEL, 1983.
Notas
Autor notes