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Mapeamento cognitivo sobre ergonomia e segurança em tratores agrícolas utilizados na agricultura familiar
Cognitive mapping of ergonomics and safety on agricultural tractors used in family farming
Revista de la Facultad de Agronomía, vol.. 120, núm. 1, 2021
Universidad Nacional de La Plata

Revista de la Facultad de Agronomía
Universidad Nacional de La Plata, Argentina
ISSN: 1669-9513
Periodicidade: Semestral
vol. 120, núm. 1, 2021

Recepção: 05/06/20

Aprovação: 14/01/21

Autor correspondente: pereira.asp@gmail.com

Resumo: O presente artigo apresenta um mapeamento cognitivo causal elaborado a partir de pesquisas realizadas por especialistas a respeito dos temas ergonomia e segurança em tratores agrícolas. Utilizou-se o mapeamento para representar as informações disponibilizadas em normas técnicas e regulamentadoras nacionais, bem como, em trabalhos científicos divulgados no Portal de Periódicos CAPES/MEC. Os procedimentos adotados na construção dos mapas foram a pesquisa documental e bibliográfica. Além disso, fez-se entrevistas com especialistas em máquinas agrícolas a fim de considerar suas experiências a partir de padrões pessoais de conhecimento. Objetivou-se, através da elaboração do mapeamento, a visualização das relações de causa e efeito dos temas aplicados aos tratores agrícolas. Com a análise do mapeamento cognitivo identificaram-se itens e índices adequados para a avaliação de níveis ou graus de eficácia funcional e satisfação dos diversos atores quanto à ergonomia e à segurança dessas máquinas, de forma a determinar ações potenciais para apoiar a tomada de decisão no momento em que o agricultor venha a adquiri-las.

Palavras-chave: mapa cognitivo, máquinas agrícolas, análise ergonômica, segurança em tratores, mecanização agrícola.

Abstract: This article presents a causal cognitive mapping based on research conducted by specialists on ergonomics and safety issues in agricultural tractors. We used the mapping to represent the information provided in Brazilian technical and regulatory standards, as well as in scientific papers published in the CAPES/MEC Journal WebPortal. We adopted documentary and bibliographic research procedures in the construction of the maps. In addition, we conducted interviews with agricultural machinery experts in order to consider their experiences based on personal knowledge patterns. The objective of this research was the visualization of the cause and effect relations of the themes applied to agricultural tractors through the elaboration of the mapping. The analysis of cognitive mapping identified items and indexes suitable for the evaluation of levels or degrees of functional effectiveness and satisfaction of the various actors regarding the ergonomics and safety of these machines, in order to determine potential actions to support decision-making when the farmer acquires them.

Keywords: cognitive map, agricultural machinery, ergonomic analysis, safety on tractors, agricultural mechanization.

INTRODUÇÃO

Atualmente, as demandas em ergonomia e segurança para operadores de tratores agrícolas vêm sendo alvo em pesquisas acadêmicas. Isso se deve ao fato de que a intensificação da mecanização, em consonância com as crescentes exigências de otimização dos cultivos e da produtividade, constituem uma realidade que se estendeu ao universo das propriedades da agricultura familiar. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou, em 2019, o Censo Agropecuário com dados referentes ao total de tratores existentes nos estabelecimentos agrários, alcançando 1.229.907 unidades. O investimento advindo do PRONAF (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), divulgado no mesmo ano (2019), representou 76,6% dos recursos utilizados, principalmente para investimentos em aquisições de máquinas e equipamentos. Pereira (2019) comenta que as aquisições de máquinas e equipamentos oportunizam aumento de produtividade e eficiência aos sistemas de produção dos agricultores familiares. No entanto, destaca que é preciso investigar se os projetos de produtos, nesse seguimento, estão adequados aos aspectos de saúde e bem estar do agricultor. O atendimento à legislação é fundamental e necessário para a integração "homem-máquina". De um lado, os requisitos de ergonomia trazem conforto durante a operação dos tratores e essa condição reflete diretamente na saúde do mesmo. De outro, requisitos de segurança devem ser incorporados nos projetos de máquinas e equipamentos e são obrigatórios por promover a redução da exposição ao risco e, consequentemente, evitar acidentes.

Assim sendo, faz-se necessário estabelecer critérios de avaliação que sejam capazes de traduzir a realidade dos produtos ofertados, o que pode envolver o aprofundamento do conhecimento não só da legislação que regula a fabricação de tratores agrícolas como, ainda, das mais recentes inovações das indústrias e laboratórios de experimentação em tecnologia de máquinas e equipamentos agrícolas. Se os fabricantes atenderem aos requisitos propostos na legislação, e continuarem investindo na pesquisa e desenvolvimento tecnológicos das máquinas, o agricultor familiar poderá usufruir de máquinas modernas que atendam aos requisitos de produtividade sendo, ao mesmo tempo, ergonômicas e seguras.

Uma das técnicas utilizadas no presente artigo para buscar a representação das informações técnicas sobre os tratores agrícolas, bem como, o conhecimento de especialista sobre os temas de ergonomia e segurança chama-se mapeamento cognitivo.

Em conformidade com Abramova (2016), o termo “mapa cognitivo” concerne ao arcabouço das influências causais de situações mapeadas, objetos ou sistemas. Formalmente, a base obrigatória de todos os modelos é um gráfico direcionado onde os nós estão associados a conceitos e os arcos são interpretados como conexões entre fatores. Já para Nascimento (2010, p.1), “refere-se à capacidade que o indivíduo tem de abstrair o mundo real através de imagens mentais. Esta abstração efetiva-se mediante a percepção que o indivíduo possui do mundo real no qual interage”. Segundo Bastos (2002, p. 2) “Os mapas envolvem, portanto, conceitos e relações entre conceitos que são utilizados pelos sujeitos para compreender e dar sentido ao seu ambiente”.

Existem diversos tipos de mapas cognitivos. Bastos (2002) os identificou em: mapas de identidade, mapas de categorização e mapas causais. Os mapas mais divulgados e que interessam para o presente trabalho são os causais tendo em vista que a forma como as pessoas estruturam a explicação dos eventos envolve associações causais. De acordo com Barreto et al. (2015, p.1378), “os mapas causais são um subtipo de mapa cognitivo que visa especificamente identificar constructos com relações de causalidade entre si”.

Para Fiol & Huff (1992), além da identificação de rotas e similaridade ou diferenças entre elas, os mapas causais fornecem evidências dos pressupostos das pessoas referentes ao uso do mapa, já que explicitam julgamentos de um evento ou ação. Em conformidade com Bastos (2002), existem três metodologias para a construção dos mapas causais. A primeira delas refere-se ao modelo desenvolvido por Bougon (1983) que traz como elemento singular a técnica denominada Self-Q (técnica de autoquestionamento) que é utilizada para extrair e relacionar os conceitos que integram o mapa. Já a segunda metodologia denominada Comparative Causal Mapping (CCM) foi desenvolvida por Mauri Laukkanen e volta-se para a análise comparativa - entre sujeitos de um mesmo grupo, entre diferentes grupos de sujeitos ou entre diferentes momentos ao longo do tempo – das estruturas de crenças dos gestores sobre a efetividade dos seus comportamentos. Nesta metodologia que envolve a construção de um software específico para a análise dos dados – o CMPA2, os mapas causais são construídos a partir de dados levantados em várias entrevistas. Denominada Strategic Options Development Analysis (SODA), a terceira metodologia trabalha com três tipos de conceitos e é oriunda de uma linha de trabalho desenvolvida por Colin Eden e associados, melhor explicitada na obra Messing about in problems: an informal structured approach totheir identification and management. Primeiramente, aparecem os conceitos objetivos e que devem vir no topo do mapa. Logo após estão aqueles cujos pares implicam em consequências de longo prazo, elevado custo ou que são irreversíveis e que exprimem questões ou escolhas estratégicas. Por fim temos os conceitos normais devem representar opções preferenciais da pessoa e, de forma imperativa, devem ser enunciados com a opção preferida como o primeiro polo. Para facilitar e ordenar no espaço os conceitos, as relações causais e as linhas de argumentação estabelecidas, o modelo proposto por Colin Eden lança mão do Decision Explorer Application, um software para diagnóstico muito utilizado para intervenção em decisões organizacionais e que permite que os dados sejam organizados na forma de mapas.

Consequentemente, em sua forma gráfica, um mapa causal irá associar conceitos ou nodos através de setas que irão representar as crenças dos sujeitos sobre as relações de causalidade envolvidas entre os mesmos (Bastos, 2000). Pode-se dizer que quanto à estrutura, um mapa cognitivo deverá permitir que se obtenha e que se represente ligações de influência percebidas entre conceitos meios e conceitos fins (Montibeller, 2000). Sob a influência da teoria dos construtos pessoais de Kelly, cuja obra seminal foi publicada em 1955 The psicology of personal constructs, no presente trabalho, optou-se por trabalhar com os mapas causais e de argumentação que utilizam a metodologia SODA. Percebe-se que essa teoria considera o homem como um buscador de problemas, que necessita encontrar significados para sua vida e sua interação com o meio onde está inserido, ao mesmo tempo em que também é um solucionador de problemas, porque necessita prever e controlar esse ambiente (Kelly, 1955 apud Eden, 1988).

Sendo assim, objetivou-se neste artigo, de caráter exploratório, apresentar a elaboração de uma representação do conhecimento especializado sobre ergonomia e segurança, oriundo de normas técnicas, estudos científicos e especialistas no assunto através de mapas cognitivos causais.

METODOLOGIA

Para abranger a proposta do presente artigo, foi necessário identificar os aspectos metodológicos a serem empregados na pesquisa. Realizou-se um estudo exploratório sobre os temas ergonomia e segurança em tratores agrícolas por meio de um levantamento em documentos e bases científicas, a fim de ampliar o conhecimento dos pesquisadores sobre o problema. A seguir, organizou-se o material relativo à revisão de literatura entre livros, páginas na internet e catálogos das máquinas, bem como um levantamento bibliométrico sobre trabalhos (artigos, folhetos, guias) existentes na área. A busca por documentos online ocorreu nas bases: Scientific Electronic Library Online (SciELO), periódicos Capes, Catálogo de Teses e Dissertações da Capes, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em meio as palavras-chave buscadas, destaca-se: tratores agrícolas, ergonomia em tratores, segurança em tratores, saúde e tratores, comandos em tratores, ruído em tratores, vibração em tratores, análise ergonômica, avaliação em tratores, multicritério, ergonomia e multicritério, segurança e multicritério, mapas cognitivos, entre outras. A seleção dos dados ocorreu entre os anos de 2015 e 2017. Partiu-se para análise documental das normas técnicas impressas disponíveis no Núcleo de Inovação em Máquinas e Equipamentos Agrícolas (NIMEq) localizado na Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e no site da Instituição, que dispõe de acesso à base de consulta online da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). No total, pesquisaram-se 29 Normas Brasileiras (NBRs), 4 Normas Regulamentadoras (NRs), 2 resoluções, 2 projetos de lei e uma lei alterando a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Destaca-se que esse trabalho faz parte da tese de Pereira (2019), onde utilizou-se a metodologia multicritério de apoio à decisão para sustentar a avaliação do trator mais adequado ao agricultor familiar, embasada em um modelo especialista. Nesse modelo a metodologia multicritério de apoio a decisão selecionada foi a de Ensslin et al. (2001), que é realizada por meio de três fases principais, diferenciadas, mas correlacionadas: a fase de estruturação, a fase de avaliação e a fase de recomendações. Com a definição dos participantes na construção do modelo, voltou-se a aplicar a metodologia de Ensslin et al. (2001). Para a fase de contextualização, determinou-se um o rótulo para o problema em questão: "Como avaliar se um trator é ergonômico e seguro para o agricultor familiar?". Na sequência, houve a estruturação do modelo por meio do levantamento dos Elementos Primários de Avaliação (EPAs) os quais têm como objetivo gerar entendimento e definir os limites entre o pretendido e o mínimo aceitável. A organização dos EPAs é feita pela construção dos mapas cognitivos. Nessa perspectiva, estabeleceu-se que os mapas cognitivos seriam separados para as duas áreas de estudo: um sobre o tema ergonomia e outro sobre o tema segurança. Os mapas cognitivos foram elaborados a partir das discussões realizadas em diversas reuniões, agregando critérios conforme aprofundados os estudos na legislação da área. Além disso, geraram-se versões impressas e análises de cada mapa individual, de forma a explicar a sua lógica de construção e visualização do trabalho. O software Decision Explorer Application permitiu a construção dos mapas cognitivos de forma rápida e precisa. Os mapas cognitivos foram elaborados a partir das discussões realizadas em diversas reuniões, agregando critérios conforme aprofundados os estudos na legislação da área. As entrevistas e dinâmicas contaram com a participação de quatro docentes e de um operador de trator do NIMEq da UFPel. Os docentes têm a formação em Engenharia Agrícola, Engenharia Mecânica, Engenharia Produção Mecânica e o operador de trator com formação em Engenharia Agronômica e experiência de 25 anos de profissão. A análise dos mapas foi feita por meio da identificação das características estruturais, com o objetivo de gerenciar sua complexidade e compreender as relações de causa e efeito dos conceitos que foram identificados. De acordo com Ensslin et al., (2001), há dois tipos de análises que podem ser feitas: a tradicional e a análise avançada. A tradicional considera a forma do mapa e objetiva ordená-lo, enquanto a avançada pretende identificar os eixos de avaliação e considera não só a forma, mas o conteúdo do mapa. Um eixo de avaliação é definido aqui como uma dimensão considerada relevante, segundo os valores dos decisores, para avaliar as ações potenciais Bana & Costa et al. (1999) apud Ensslin et al. (2001). Dada a estrutura hierárquica do mapa cognitivo, é interessante que o facilitador identifique, inicialmente, os conceitos que são "cabeças" e os que são "rabos". Os conceitos do mapa dos quais não saem setas são chamados de "cabeças” e revelam os objetivos/fins/resultados/valores mais fundamentais (e, portanto, mais estratégicos) dos decisores expressos no mapa. Os conceitos do mapa em que não entram flechas são chamados de "rabos" e indicam os meios/ações/alternativas, através dos quais podem ser atingidos os objetivos/fins/resultados/valores mais fundamentais para os decisores. Para prosseguir na metodologia, estudam-se os chamados clusters. Eden et al. (1992) comentam que a lógica da análise de clusters é a de que, em vários sistemas complexos e hierárquicos, as ligações intra-componentes são mais fortes que aquelas ligações inter-componentes. Ensslin et al. (2001) explicam que, dessa forma, a descoberta de onde estão as ligações mais fracas é uma base à análise de complexidade. A detecção de clusters permite uma visão macroscópica do mapa, sendo, portanto, de grande relevância a sua análise. Esse procedimento pode ser realizado de duas formas: uma através de um algoritmo incorporado ao software Decision Explorer (Jones, 1996) que detecta o cluster a partir de características estruturais da forma do mapa, e a outra feita manualmente, agrupando-se aqueles conceitos que têm sentido próximo e representam uma área de interesse para o(s) decisor(es). Nesse sentido, a segunda forma parece ser mais eficaz, uma vez que a análise leva em conta não apenas a forma do mapa, mas também o conteúdo dos conceitos. Nessa etapa, verificaram-se os conceitos "cabeça" e "rabos" e a presença de laços de realimentação, além dos clusters. Segundo Ensslin et al. (2001), uma vez realizada a primeira análise, busca-se identificar, observando a forma do mapa, as linhas de argumentação. Elas são constituídas por uma cadeia de conceitos que são influenciados e hierarquicamente superiores a um conceito "rabo". Uma linha de argumentação começa com um conceito "rabo" e termina em um conceito "cabeça". A análise que visa a identificar uma linha de argumentação é basicamente ligada à forma do mapa. Ensslin et al. (2001) expõem que, após determinar as linhas de argumentação do mapa cognitivo, deve-se buscar os "ramos do mapa". Eles são constituídos por uma ou mais linhas de argumentação que demonstrem preocupações similares sobre o contexto decisional. Trata-se, portanto, essencialmente, de uma análise de conteúdo que leva em consideração as ideias expressas nos conceitos. Depois de efetuar o desenho do mapa, procedeu-se a sua análise por meio da identificação das características estruturais. O objetivo da análise foi gerenciar sua complexidade, bem como compreender as relações de causa e efeito dos conceitos que foram identificados. Na sequência, os clusters foram detectados (conjuntos de nós relacionados por ligações intra-componentes) e partiu-se para a análise avançada, em que se identificaram as linhas de argumentação (cadeia de conceitos) e os ramos (constituídos por uma ou mais linhas de argumentação que demonstrem preocupação similar sobre o conceito decisório) do mapa cognitivo. Ensslin et al. (2001) expõem que, após determinar as linhas de argumentação do mapa cognitivo, deve-se buscar os "ramos do mapa". Eles são constituídos por uma ou mais linhas de argumentação que demonstrem preocupações similares sobre o contexto decisional.

RESULTADOS

Como já destacado, o presente trabalho teve o propósito de organizar, na forma de conceitos, o conhecimento sobre os temas ergonomia e segurança em tratores agrícolas, voltado para as áreas utilizadas pela agricultura familiar. Uma contribuição singular da metodologia utilizada neste trabalho para a construção do mapa cognitivo causal é atinente ao tratamento dado aos conceitos que estruturam o mapa. Para capturar de forma mais verdadeira a percepção da pessoa, o conceito deve ser enunciado como um par de construções dicotômicas, isto é, opostos psicológicos, revelando a influência da Teoria dos Construtos Pessoais de Kelly (1955) apud Eden (1992; 1988), segundo a qual o sistema de construções de uma pessoa inclui percepções e é composto por um número finito de construções dicotômicas. Assim, tais opostos psicológicos devem ser emitidos como ações já que outros conceitos podem interferir nesta ação. A vinculação entre conceitos respeita a relação meio – fim/antecedente – procedente e, conduz a um escopo final. Consequentemente, a elaboração do mapa cognitivo causal viabilizou uma visão geral a respeito da relação homem-máquina e possibilitou uma visão geral das possibilidades de conhecimento a respeito de determinados problemas que possam surgir a partir da operação de tratores agrícolas.

Primeiramente os resultados apontaram que o Brasil dispõe de um número abrangente de normas técnicas e legislação para o setor de máquinas e equipamentos agrícolas, com objetivo de garantir a padronização do produto e de promover a saúde e a segurança dos usuários. Nesse sentido, fez-se necessário buscar informações de como o trator agrícola está sendo fabricado a partir desse sistema de garantia da qualidade. Parte da legislação existente no Brasil consultada pode ser visualizada na Tabela 1.

Tabela 1
Legislação e normas consultadas

Além dessas informações sobre a legislação fez-se necessário incluir os resultados dos trabalhos científicos de forma a estabelecer definições mais adequadas para conceitos ambíguos.

Para definir no mapeamento cognitivo os conceitos sobre ter assentos adequados e confortáveis, seguir padrões e recomendações e medidas antropométricas citam-se as pesquisas realizadas pelos autores Mehta & Tewari (2000; 2015), Mehta et al. (2008) que analisaram as informações existentes sobre o design do assento do trator. Os estudos consideram a antropometria (medidas do corpo humana) e fatores biomecânicos (movimentos e posições realizados pelo corpo humano) para o redesenho de assentos com base nesses dados antropométricos, também avaliaram o desconforto dos assentos e estudaram sobre um modelo biomecânico para avaliar cargas e seus efeitos no corpo sob várias condições.

Para o conceito de fatores biomecânicos aplicados a comandos operacionais de tratores agrícolas consultou-se as pesquisas de Veiga et al. (2014). Os autores avaliaram a concepção de comandos operacionais sob o ponto de vista dos estereótipos populares.

Pelo artigo de Nietiedt et al. (2012), identificaram-se informações sobre a movimentação e o posicionamento adequados para utilizar os pedais, botões, comandos, controles.

O trabalho de Azevedo (2014), sobre a jornada de trabalho do operador de trator agrícola na atividade de subsolagem, apresentou informações sobre a visualização adequada a partir do posto do operador.

O conceito de fadiga e as informações sobre como executar esforços de forma adequada ao acionar pedais, botões e comandos para evitar sobrecarga física consultados no artigo de Fallahi et al. (2016) e de Mehta et al. (2011). Neste último artigo os autores realizaram um estudo com o objetivo de quantificar a força para a operação dos controles do trator e para recomendar o controle máximo de atuação forças para o funcionamento normal dos tratores com base na capacidade de resistência dos trabalhadores indianos.

Para buscar um entendimento sobre como o trator agrícola deve possuir fácil alcance de pedais, botões, comandos, controles consultou-se o artigo de Rozin et al. (2010). Os autores avaliaram a localização dos comandos de operação em tratores agrícolas em relação ao Ponto Índice do Assento (SIP) com as recomendações da norma NBR ISO 4253 - Acomodação do assento do operador. Esse pode indicar como os modelos de tratores agrícolas analisados estão sendo fabricados, se atendem ou não a norma.

Em relação à importância sobre ter espaço adequado no posto do operador foram consultados dois trabalhos. Primeiramente os estudos de Peripolli et al. (2017) que verificaram se os tratores agrícolas se enquadravam nas normas técnicas NBR/ISO 4252 e NR 12, a partir das medidas do espaço livre interno da cabine de tratores agrícolas e a presença de itens obrigatórios. E após, a dissertação de Barbieri (2017), que forneceu informações sobre avaliações e comparações da conformidade dos postos de trabalho dos tratores nacionais segundo as normas nacionais e internacionais de segurança e ergonomia.

Estudos como de Debiasi et al. (2004a), que objetivaram a verificação da presença de itens relacionados à ergonomia de tratores agrícolas usados,além de avaliar o comportamento destas características em função do tempo de uso das referidas máquinas, apoiaram as informações sobre a necessidade do trator possuir dispositivos contra intempéries. Esse estudo também abordou os conceitos sobre o que é ter assentos adequados, de como esses assentos permitem uma postura adequada e de ter um posto trabalho confortável.

A tese de Vilagra (2009), identificou os requisitos ergonômicos necessários para adequação e concepção de sistema tratorizado de média potência. Esses requisitos ajudaram no entendimento sobre como evitar a fadiga (esforço físico e mental, ambiente de trabalho confortável). Além de definir itens de conforto e atributos definidos pelos especialistas.

As pesquisas de Baesso et al. (2017) sobre os níveis de ruído emitidos por tratores agrícolas de diferentes marcas, potências e ano de fabricação, comparando-se os resultados com as normas vigentes no Brasil reforçaram a importância de o trator possuir a cabine para isolamento acústico.

Outro conceito que foi incluído no mapa é relativo ao trabalho de Franchini (2017) sobre o nível de vibração vertical em assentos de tratores com os parâmetros indicados pela Norma ISO 2631. Essa pesquisa proporcionou uma compreensão sobre a importância do projeto de assentos para a redução da vibração. O artigo de Pinho (2014) que estudou a transmissibilidade das vibrações no coxim elastomérico (peça mecânica que absorve vibrações) de um trator agrícola com cabine proporcionou informações sobre como minimizar a magnitude de vibração produzida do motor para a cabine através dos coxins.

Em relação a pesquisas realizadas sobre segurança em tratores agrícolas, citam-se as de Robin (1987), Schlosser et al. (2002), Debiasi (2002), Debiasi et al. (2004b, 2004c), Madeira (2011), Flores et al. (2015). Esses trabalhos buscaram a caracterização dos acidentes com tratores agrícolas e o diagnóstico dos acidentes de trabalho e das condições de segurança na operação de conjuntos tratorizados. Reis et al. (2010) quantificaram os acidentes com máquinas agrícolas na agricultura de base familiar da região de Pelotas. Corrêa et al. (2005) verificaram os requisitos de segurança de tratores agrícolas em alguns municípios do Estado de São Paulo. Entre as pesquisas internacionais, podem-se mencionar os estudos relativos às fatalidades ocorridas com acidentes com tratores nas pesquisas de Bunn et al. (2008), Day (1999), Nag & Nag (2004), Marsh & Fosbroke (2015).

Com base na análise do sistema normativo e da legislação do Brasil para tratores agrícolas, e das pesquisas realizadas em trabalhos científicos partiu-se para a elaboração do mapa cognitivo sobre ergonomia e segurança de tratores agrícolas, os mapas podem ser visualizados nos Apêndices A e Apêndices B.

A primeira etapa para elaboração dos mapas foi a definição dos EPA's, os conceitos estabelecidos podem ser visualizados na Tabela 2.

Tabela 2
Elementos Primários de Avaliação (EPAs)

Após o estabelecimento dos EPAs, estes foram agrupados, com a finalidade de tornar o problema mais claro, ficando definidos da seguinte forma:

Ergonomia: facilitar o trabalho e permitir uma operação confortável.

Segurança: permitir atenção, ter estabilidade e dispositivos para evitar acidentes, ter um posto de trabalho adequado.

Para o mapa cognitivo de ergonomia, analisando o Apêndice A foram identificados dois clusters: "facilitar a operação" e "conforto". Em relação ao mapa cognitivo da segurança, analisando o Apêndice B foram reconhecidos três clusters: "atenção", "evitar acidentes" e "posto adequado"

ANÁLISE DE DADOS E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Com base na análise do mapa cognitivo de ergonomia, constatou-se que o estudo desses ramos determinou "Assentos" como candidato a ponto de vista fundamental e, como pontos de vista elementares, "Regulagens" e "Revestimento e Formato". As linhas de argumentação do cluster facilitar a operação levam para o item facilitar a operação através da tomada de decisão e esforço mental, da visão adequado no posto de operação, ter sistemas de controle adequados, permitir uma movimentação e uma postura ideal.

No cluster conforto, as linhas de argumentação incidem em permitir a operação confortável através do ambiente operacional adequado, evitando desgaste físico e a exposição do tratorista a riscos ambientais já citados anteriormente. A Tabela 3 apresenta um exemplo de linhas de argumentação.

Tabela 3
Linhas de argumentação do mapa cognitivo de ergonomia

A Figura 1 mostra os "ramos" encontrados pelo facilitador, juntamente com o decisor, no cluster Facilitar a operação, para o mapa cognitivo da ergonomia. A linha de argumentação A1 expressa a preocupação do decisor a simbologia, sinais e pictogramas para serem acessíveis e de fácil interpretação, enquanto a linha A2 está relacionada ao painel de informações estar na língua de origem do país que comercializou o trator, no caso em português.


Figura 1
Ramos do cluster 1 facilitar a operação. Fonte: Pereira (2019)

A análise do mapa cognitivo de segurança convergiu para que o posto de operação seja adequado ao trabalho visando atender as normas de segurança. Atendendo as medidas do espaço definido na legislação e buscando ter uma operação segura.

Andersson et al. (2015) aplicou a metodologia multicritério como modelo na seleção de tratores de quatro rodas. Foram avaliados aspectos como: técnicos, de custos, de ergonomia e de segurança. A etapa de elaboração e análise do mapa cognitivo passou-se ao estabelecimento de cada cluster individualizado, conforme as linhas de argumentação para a confecção do mapa cognitivo, os quais foram: Economia, com seis linhas de argumentação; Técnica, com quatorze linhas de argumentação; Segurança, com seis linhas de argumentação e Ergonomia, com sete linhas de argumentação. Entre os resultados encontrados destaca-se que houve uma valorização sobre o número de posições de conforto do assento, nível de ruído, posição da alavanca de câmbio e regulagem do volante.Já para o item segurança a presença de EPC, câmbio sincronizado, lanterna traseira, proteção principal TDP, presença de cantos vivos nos comandos e alertas de segurança.

CONCLUSÃO

Ao propor a elaboração dos mapas cognitivos aplicados a tratores agrícolas, baseado na legislação sobre ergonomia e segurança e no conhecimento dos especialistas em máquinas agrícolas, pretendeu-se indicar quais seriam os possíveis itens de avaliação para estabelecer um sistema avaliativo sobre o trator mais adequado ao agricultor familiar a partir das recomendações para o projeto deste produto. Nesse sentido, os resultados das avaliações podem permitir a visualização de aspectos a serem melhorados de forma a disponibilizar tratores mais adequados para promover a saúde ocupacional dos agricultores familiares.

Esse trabalho apresentado no artigo faz parte da tese de Pereira (2019) que estabeleceu um sistema de avaliação multicriterial aplicado a tratores agrícolas, baseado na legislação sobre ergonomia e segurança e no conhecimento dos especialistas em máquinas agrícolas. A investigação da legislação direcionada a tratores foi a base para a geração dos itens de avaliação. Esse primeiro passo com sua complexidade permitiu a busca por uma metodologia que pudesse dar conta para tornar a avaliação possível. A metodologia multicritério de apoio à avaliação foi a ferramenta selecionada para estruturar e hierarquizar esses itens selecionados na investigação. Também foi responsável por gerar índices (pesos) para esses itens a fim de valorar os que mais impactam na saúde ocupacional do agricultor familiar caso não estejam presentes no trator.

Nesse sentido, dentro da estruturação da metodologia multicritério os mapas representam um papel fundamental para organização das informações levantadas na fase de pesquisa científica.

Além disso, os mapas elaborados no presente artigo mostraram-se adequados para a visualização de causa e efeito bem como na organização e codificação do conhecimento sobre ergonomia e segurança aplicado a tratores agrícolas na agricultura familiar. A partir da representação gráfica dos aspectos subjetivos, isto é, referentes a experiências dos especialistas consultados e das informações técnicas do sistema de legislação sobre ergonomia, bem como sobre segurança, foi possível a construção e representação de outros conceitos que representam a visão bipolar da realidade. Apesar de os mapas cognitivos elaborados terem permitido um aprofundamento sobre o que é ergonomia e segurança em tratores, segundo a visão dos especialistas consultados, acredita-se que é necessário ter um seguimento na pesquisa com os agricultores para que o modelo contemple aspectos relativos ao uso diário das máquinas.

AGRADECIMENTOS

CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) e ao CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) pelo apoio na presente pesquisa.

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APÊNDICES


Apêndice A
Mapa cognitivo para avaliar requisitos de ergonomia na visão dos especialistas

Rótulo do problema: "como avaliar se um trator é ergonômico para o agricultor familiar?"


Apêndice B
Mapa cognitivo para avaliar requisitos de segurança na visão dos especialistas

Rótulo do problema: "como avaliar se um trator é seguro para o agricultor familiar?"

Autor notes

pereira.asp@gmail.com



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