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O uso de problemas matemáticos no Ensino Superior sob o viés da Aprendizagem Baseada em Problemas
THE USE OF MATHEMATICAL PROBLEMS IN HIGHER EDUCATION UNDER THE BIES OF PROBLEM BASED LEARNING
EL USO DE PROBLEMAS MATEMÁTICOS EN LA ENSEÑANZA SUPERIOR BAJO EL VIEJO DEL APRENDIZAJE BASADO EN PROBLEMAS
Revista de Educação Matemática, vol.. 16, núm. 22, 2019
Sociedade Brasileira de Educação Matemática

Artigos Científicos

Revista de Educação Matemática
Sociedade Brasileira de Educação Matemática, Brasil
ISSN: 1676-8868
ISSN-e: 2526-9062
Periodicidade: Cuatrimestral
vol. 16, núm. 22, 2019

Recepção: 05 Outubro 2017

Aprovação: 17 Janeiro 2018

Publicado: 01 Maio 2019


Este trabalho está sob uma Licença Creative Commons Atribuição-NãoComercial-Não Derivada 4.0 Internacional.

Resumo: Neste artigo exploramos o uso de problemas matemáticos no Ensino Superior sob a perspectiva da Aprendizagem Baseada em Problemas (PBL). Entende-se que o uso de dinâmicas amparadas no PBL em sala de aula pode contribuir com uma aproximação maior entre os conhecimentos teóricos e práticos contemplados na educação universitária. A presente proposta se pauta na conclusão de uma pesquisa teórica realizada no mestrado profissional, a qual teve como intuito abordar noções de Cálculo Diferencial e Integral, enfatizando a elaboração e adaptação de problemas intrínsecos às carreiras dos estudantes. O objetivo foi construir uma rede de princípios acerca do PBL, em associação a possíveis práticas educativas relativas ao ensino da matemática no nível superior. O referido trabalho se estruturou em uma abordagem qualitativa de cunho teórico e resultou na compilação de um material que possui sugestões de problemas e direcionamentos que podem ser explorados pelo professor de matemática. A partir dos estudos realizados e do produto final obtido, consideramos que o uso de uma abordagem ativa pode ser vinculado ao ensino de matemática, enriquecendo, assim, as práticas educativas no contexto das universidades.

Palavras-chave: Problemas matemáticos, Aprendizagem Baseada em Problemas, Ensino Superior.

Abstract: In this paper we explore the use of mathematical problems in Higher Education from the perspective of Problem Based Learning (PBL). It is understood that the use of dynamics supported by the PBL in the classroom can contribute with a greater approximation between theoretical and practical knowledge contemplated in university education. The present proposal is based on the conclusion of a theoretical research carried out in the professional master's degree, which had as its aim to approach notions of Differential and Integral Calculus, emphasizing the elaboration and adaptation of problems intrinsic to the students' careers. The objective was to build a network of principles about the PBL in association with possible educational practices regarding the teaching of mathematics at the higher level. This work was structured in a qualitative theoretical approach and resulted in the compilation of a material that has suggestions of problems and directions that can be explored by the mathematics teacher. From the studies carried out and the final product obtained, we consider that the use of an active approach can be linked to the teaching of mathematics, thus enriching educational practices in the context of universities.

Keywords: Mathematical problems, Problem-Based Learning, Higher education.

Resumen: En este artículo exploramos el uso de problemas matemáticos en la Enseñanza Superior bajo la perspectiva del Aprendizaje Basado en Problemas (PBL). Se entiende que el uso de dinámicas amparadas en el PBL en el aula puede contribuir con una aproximación mayor entre los conocimientos teóricos y prácticos contemplados en la educación universitaria. La presente propuesta se basa en la conclusión de una investigación teórica realizada en el máster profesional, la cual tuvo como propósito abordar nociones de Cálculo Diferencial e Integral, enfatizando la elaboración y adaptación de problemas intrínsecos a las carreras de los estudiantes. El objetivo fue construir una red de principios sobre el PBL, en asociación a posibles prácticas educativas relativas a la enseñanza de las matemáticas en el nivel superior. Este trabajo se estructuró en un abordaje cualitativo de cuño teórico y resultó en la compilación de un material que tiene sugerencias de problemas y direccionamientos que pueden ser explotados por el profesor de matemáticas. A partir de los estudios realizados y del producto final obtenido, consideramos que el uso de un enfoque activo puede ser vinculado a la enseñanza de matemáticas, enriqueciendo así las prácticas educativas en el contexto de las universidades.

Palabras clave: Problemas matemáticos, Aprendizaje basado en problemas, Enseñanza superior.

Introdução

O presente artigo explora conexões entre o ensino de tópicos matemáticos e a prática pedagógica no ensino superior, por meio da perspectiva da Aprendizagem Baseada em Problemas, reconhecida como Problem Based Learning ? PBL. Seu escopo é embasado em um recorte de uma pesquisa de mestrado já concluída, a qual teve como proposta refletir sobre as possibilidades de abordar noções de Cálculo Diferencial e Integral no contexto universitário por meio do PBL 1.

A pesquisa realizada durante o mestrado contemplou uma visão geral a respeito do ensino e da aprendizagem de Cálculo, pontuou revisões gerais e experiências práticas sobre a metodologia de ensino adotada e, posteriormente, propôs conexões entre essas temáticas, resultando na elaboração de um produto educacional. Este material foi compilado focando-se no trabalho docente. Nele, são exploradas sugestões de problemas voltados a possíveis práticas pedagógicas em sala de aula, inspiradas no PBL. Este trabalho, possibilitou a produção deste artigo, que visa promover reflexões acerca da estruturação, elaboração e desenvolvimento de problemas matemáticos sobre a perspectiva do PBL.

A Aprendizagem Baseada em Problemas, segundo Ribeiro (2008) é uma das diferentes possibilidades de se aliar conhecimentos teóricos aos práticos, observando que a mesma não se pauta em processos de transmissão e recepção de conhecimentos. O PBL, em suas concepções originais, contempla a formatação de um currículo diferenciado, o qual tem uma característica multidisciplinar e está além de uma instrução técnica ( GIJSELAERS, 1995). Ou seja, a idealização de sua estrutura propõe um currículo delineado em torno de problemas. No entanto, ao longo dos anos e, devido ao seu aspecto flexível e dinâmico, essa estruturação passou por adequações diversas, sendo utilizada em seu formato original, híbrido ou, ainda, de forma parcial, em determinadas disciplinas, segundo as necessidades apresentadas ou acordo com o contexto trabalhado.

Suas origens amparam-se em teorias construtivistas e seus ideais têm se estendido a diferentes universidades internacionais, como: McMaster, no Canadá, Aalborg, na Dinamarca, Maastrich, na Holanda, dentre outras. No cenário brasileiro, as Faculdades de Medicina de Marília, em São Paulo, a Universidade Estadual de Londrina, no Paraná e a Universidade Federal da Bahia, por exemplo, retratam a expansão do PBL em vários contextos, desde cursos na área da educação médica até o campo da pedagogia.

O interesse de nosso estudo acerca do PBL e conhecimentos matemáticos emergem a partir da propiciação de maiores vínculos entre noções teóricas e possíveis questões sociais e profissionais ligadas às carreiras dos estudantes. Pesquisas como a de Barufi (1999) e Rezende (2003), por exemplo, retratam que normalmente a matemática é associada aos altos índices de evasão e reprovação universitária. Cury e Bisognin (2006) afirmam que pesquisas compartilhadas em diferentes eventos científicos, relacionados ao ensino de matemática e de engenharia, denotam que muitos estudantes demonstram ter dificuldades com relação às disciplinas relacionadas à área da matemática, como Cálculo Diferencial e Integral, por exemplo. Ressalta-se também que o ensino de cálculo, não vem sendo vinculado às diferentes realidades e campos de conhecimento, fato este que deixa a desejar. Normalmente, observa-se que a maioria das práticas pedagógicas está calcada em exercícios padronizados explanadas teoricamente pelo professor. Partindo dessas reflexões, Cury (2000) entende que é necessário propiciar uma compreensão do significado dos conceitos aos estudantes, despertando nos mesmos sua curiosidade e outras possibilidades de utilização do que se é aprendido. Isto é, no meio acadêmico, essas são preocupações significativas no meio acadêmico.

Valero (2012) considera que muitas práticas relacionadas ao ensino e a aprendizagem de matemática são embasadas em uma tríade didática, a qual envolve o estudante, o professor e a matemática. A autora considera que existe uma certa descontextualização nessa tríade: o centro do processo volta-se à apresentação e reprodução dos conceitos trabalhados. Esse é um aspecto que pode ser observado no ensino superior.

Logo, entende-se que são necessárias mais reflexões acerca das relações entre a prática docente, o papel do estudante e o ensino de matemática, relacionados ao referido nível educacional.

O conhecimento matemático almeja colaborar com a formação pessoal e profissional dos estudantes; ultrapassar dimensões técnicas e específicas é uma das intencionalidades desta proposta, o que está em consonância com a lei de diretrizes e bases do ensino superior ( BRASIL, 2001): a matemática no contexto universitário tem como propósito promover habilidades e competências relacionadas a diferentes campos de conhecimento, incentivar o uso e a análise de questões contemporâneas, contemplando aspectos da realidade; propiciar uma educação que contribua com a compreensão dos impactos de determinadas soluções em diferentes contextos, globais e sociais, dentre outras.

A proposta deste estudo é refletir sobre o desenvolvimento de ambientes de aprendizagens amparados em problemas, reais ou realísticos, que estejam relacionados com práticas profissionais dos estudantes, de modo que os mesmos sejam apresentados antes da explanação de um conceito.

O ambiente de aprendizagem promovido pelo PBL

No PBL, busca-se integrar a aprendizagem, o conteúdo e aspectos políticos, econômicos e/ou sociais. Para tanto, o desenvolvimento da aprendizagem é iniciado a partir da apresentação do problema, o qual tem como intenção motivar o estudante a aprender, despertando seu interesse por meio de situações que estejam associadas ao seu campo profissional. Os conteúdos ou conceitos abordados são estruturados de modo aberto e precisam ser delineados de forma que os estudantes identifiquem suas necessidades de aprendizagem, tornando-se participantes do processo educativo ( RIBEIRO, 2008). O caráter social se embasa sobre duas perspectivas iniciais: no PBL, os alunos são dispostos em pequenos grupos e, em conjunto, analisam a situação dada, tomam decisões, realizam planejamento de estudos e de ações em favor da resolução do problema. Suas experiências e conhecimentos são compartilhadas e, além disso, habilidades atitudinais e procedimentais, ligadas à sua participação na sociedade, são desenvolvidas ao longo do processo. Ou seja, busca-se relacionar os estudos a contextos que estão fora das universidades.

O ponto de partida inicial para uma abordagem com o PBL é o problema. Sua estruturação irá conduzir o trabalho em sala de aula e, como explanado anteriormente, há diferentes possibilidades em se abordar essa metodologia, desde estruturar um currículo todo até aplicações parciais, em determinada disciplina, como realizado por Filho e Ribeiro (2009). Estes autores utilizaram o PBL em disciplinas da graduação e da pós-graduação, no ano de 2002, da escola de engenharia de uma universidade pública de São Paulo. As abordagens envolveram conteúdos de administração, e procuraram colocar os estudantes como participantes ativos do processo de ensino e aprendizagem.

Com base nos pressupostos teóricos e dados empíricos considerados por outros pesquisadores, entende-se que a partir de dinâmicas de ensino promovidas pelo PBL, os grupos de estudantes são convidados a pesquisar sobre os diferentes assuntos contemplados no problema. Inicialmente eles discutem e destacam os conhecimentos que possuem a respeito do mesmo. E, com isso, alguns encaminhamentos para propor soluções precisam ser definidos. Um problema com inspirações da metodologia do PBL, não se estrutura em comandos do tipo ?calcule?, ?resolva?, mas, sim, se respalda em situações contextualizadas e interdisciplinares, as quais procuram exploram outros campos de conhecimento. Estas características podem possibilitar uma maior interação entre os estudantes, contribuir com a capacidade de comunicação, de resolução de problemas, de planejamentos, de estudos autônomos, além de destacar o quanto a matemática está associada a outras áreas, além das ciências exatas.

Sendo assim, o papel do professor nesse é fundamental. Nesse contexto, ele atua como facilitador da aprendizagem, ou ainda, pode ser visto com o tutor do processo de ensino e aprendizagem. Sua função é mediar as discussões em grupo, propor alguns caminhos de trabalho com o problema, estimular o compartilhamento de informações e experiências, dentre outros aspectos. A proposta não é vê-lo como transmissor e detentor do conhecimento, nem como propagador da chamada educação bancária, descrita por Freire (1996).

Em suma, um ambiente educativo inspirado no PBL tem como intenção promover a participação ativa tanto do estudante quanto do professor.

O problema

O ambiente de aprendizagem construído em perspectivas do PBL procura trabalhar com os significados que os estudantes fazem a respeito de determinado conteúdo. No caso da pesquisa realizada, o propósito foi refletir sobre diferentes possibilidades de transformação no ensino de tópicos matemáticos do ensino superior, associando-as ao desenvolvimento de competências tanto profissionais quanto pessoais dos estudantes. O foco de sugerir o uso de problemas matemáticos sobre determinada metodologia de ensino buscou reforçar que a matemática é uma ferramenta construtiva no processo educativo e que pode contribuir com futuras atuações dos estudantes em nossa sociedade. Não se deseja reforçar práticas de ensino que sirvam de adaptação, de ajustamento, que por vezes ocorrem de modo fragmentado e sem a propiciação de reflexões ( SKOVSMOSE, 2008), ocultando de certo modo novas leituras a respeito do mundo. Os conteúdos ou conceitos matemáticos contemplados nas universidades, de algum modo, precisa estar atrelado a outras áreas de conhecimento, considerando também com enfoques críticos e reflexivos.

Entende-se que matemática e aspectos da realidade, sejam eles sociais, políticos, profissionais, interagem dinamicamente. Por isso, há necessidade de contemplá-la com o cuidado de não focar apenas na formação dos estudantes, enquanto especialistas, mas sim, preocupando-se em formar indivíduos críticos que compreendam as ligações entre esta e suas diferentes contextualizações.

Abordar problemas nessa perspectiva não significa que todas as informações serão dadas nem tampouco espera-se que as respostas ou soluções obtidas sejam únicas, como ocorre em típicos exercícios de livros didáticos. Essa abordagem pretende desafiar professores e estudantes a recorrer ao uso do diálogo, da ação coletiva e do uso de constantes planejamento de tarefas. A utilização desses recursos tende a colaborar com o desenvolvimento de visões críticas e participativas ? os envolvidos no processo não estarão apenas em busca de resoluções de exercícios e de uma situação específica em si, a intenção é que possam investigar, de modo construtivo e colaborativo, embasando-se em reflexões realizadas durante e posteriormente ao trabalho realizado.

O PBL se desenvolve nas chamadas sessões tutorias, onde o professor, visto como mediador da aprendizagem, orienta os trabalhos em pequenos grupos de estudantes. As fases desses encontros dependem da situação apresentada e dos objetivos delineados, podendo se estender por semanas ou até mesmo por um semestre todo. Em todos eles, propõe-se que haja registro das reuniões por meio de relatórios. Relevante destacar que os papeis dos membros dos grupos de estudos precisam ser rotativos, a fim de diversificar as tarefas e as posturas de cada um na equipe. Avaliações individuais, entre os pares e do grupo como um todo, são realizadas ao final do processo, demonstrando o quanto o aspecto social é relevante nessa abordagem.

Com isso, entendemos que a interação propiciada por um ambiente de ensino como esse pode ir além de uma dinâmica de aulas amparadas no paradigma do exercício. "Os padrões de comunicação podem mudar-se e abrir-se para novos tipos de cooperação e para novas formas de aprendizagem" ( ALR Ø;SKOVSMOSE, 2010, p. 58 ), contribuindo para que efetivas relações entre a matemática e outras questões sejam conectadas.

A proposta da pesquisa

O estudo proposto no mestrado articulou as relações entre o PBL e o ensino de matemática. Sua perspectiva foi de cunho teórico, no sentido de pontuar possíveis encaminhamentos para um trabalho docente em torno de problemas, inspirados no PBL. A elaboração da dissertação se respaldou em pesquisas bibliográficas que discorriam sobre a utilização do PBL no contexto universitário. Também foram analisados estudos teóricos referentes ao ensino e a aprendizagem de Cálculo Diferencial e Integral. Para tanto, utilizamos artigos acadêmicos, teses e dissertações que tratavam sobre essas temáticas. A partir das leituras e análises realizadas, alguns problemas relacionados ao uso e compreensão de conceitos de Cálculo foram estruturados, fundamentando-se em princípios do PBL. Nos problemas apresentados, buscou-se conectar o uso de problemas matemáticos com outras áreas de conhecimentos, inclusive diferentes campos profissionais.

Há aplicações empíricas do PBL em cursos como medicina, direito, pedagogia, administração, engenharia, dentre outros. No entanto, no contexto brasileiro, em relação à matemática do ensino superior, não se observam conexões pontuais. Trabalhos teóricos bibliográficos acerca das relações entre o PBL e a matemática também foram desenvolvidos por Gouvêa (2016). Os mesmos exploram direcionamentos à prática docente, sugerindo o uso de alguns problemas didático-pedagógicos, que possam contribuir com o desenvolvimento de problemas em aulas de matemática, a partir dos princípios do PBL. Deste modo, este artigo considerou apenas um recorte do estudo apresentado em Souza (2016).

A pesquisa descrita foi delineada por considerações de Vygotsky (2005; 2007), referentes ao conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP), a qual pressupõe que os conhecimentos distanciados entre os níveis de desenvolvimento real e potencial, possam se conectar, por meio da aproximação entre sujeito e objeto. Isto é, compreende-se que o sujeito (os estudantes) e o objeto de estudo (os conteúdos ou conceitos matemáticos explorados) podem ser aproximados através do trabalho em cooperação com outros indivíduos, sendo orientados por algum mediador da aprendizagem.

A fim de explanar essas considerações sobre a proposta apresentada, na próxima seção segue a estruturação/adaptação de um problema no formato do PBL.

Um exemplo de problema adaptado

O exemplo dado a seguir faz parte da pesquisa realizada por Souza (2016) e engloba discussões acerca da produção de citriculturas no cenário brasileiro. O problema em si, não traz explicitamente a aplicação de conceitos envolvendo Cálculo. Sua abordagem pode estar além da área de exatas. Veja o Quadro 1.

Quadro 1
Produção de citriculturas

Souza (2016)

Orientações didáticas

A situação acima, foi um dos problemas sugeridos na dissertação. Compreende-se que a mesma poderia ser proposta em cursos de graduação como Agronomia, Economia, Produção, entre outros.

Os alunos precisariam estar dispostos em pequenos grupos. As discussões e reflexões a serem realizadas têm como intenção evidenciar aspectos vinculados à nossa realidade e à economia do país. Leituras de textos complementares, como reportagens ou outros dados, associados ao problema dado, poderiam ser sugeridos pelo tutor da aprendizagem. No estudo em questão foi proposta a leitura de uma entrevista com o pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Claudio Luiz Leone Azevêdo, no ano de 2003. Esse texto é apresentado no Quadro 2.

Quadro 2
Produção de citricultura e questões econômicas

Souza (2016)

A ideia de explorar esse material é estimular a curiosidade dos estudantes, promover o diálogo entre os mesmos e incentivar o levantamento de alguns pontos relevantes, como: apontar necessidades das empresas ligadas ao ramo de citriculturas; investigar alguns impactos econômicos que esse setor representa ao país; denotar alguns impactos na sociedade em relação a geração de lucros, da receita e da criação de empregos, dentre outros.

Essa dinâmica associada a outras informações levantadas pelos demais grupos seriam apresentadas de modo coletivo, usando esquemas, palavras-chave, mapas conceituais, etc. A partir dessa etapa, começam os trabalhos de análise e discussão do problema em si.

Nesse momento, é que entraria o papel do tutor, como condutor desse processo reflexivo: Que visão o grupo tem em relação ao problema e às suas aplicações profissionais? Quais embasamentos matemáticos são necessários para que um estudo mais aprofundado possa ser feito? Como levantar informações sobre os temas que estão implicitamente relacionados com o problema, em especial as taxas de variação (taxa de variação envolvendo produção, custo, lucro e receita)? De que formas há impactos econômicos desse tipo de situação à nossa sociedade? Que conceitos matemáticos há por trás das diferentes questões desse problema (como a relação entre a quantidade de produtos a serem produzidos e a mão-de-obra necessária)? A equipe possui conhecimentos sobre funções marginais? Outras abordagens e indagações podem ser realizadas sobre o problema, mediante as intencionalidades didático-pedagógicas que se pretendem explorar.

A dinâmica de trabalho com o PBL, possibilita que outros encontros sejam realizados pelos grupos de estudantes, sejam em aulas posteriores ou mesmo em ambientes fora da sala de aula, em encontros adicionais. Nessas etapas, o interessante é analisar como ocorrem a elaboração de estratégias de ação e de seleção de referências e materiais de estudos complementares que contribuam para as propostas de soluções. Essas reuniões do grupo, que contam com a orientação do tutor, podem ser feitas ao longo de várias aulas e, pode se estender por algumas semanas, dependendo de suas intencionalidades e exploração da metodologia. Roteiros de estudos ligados às necessidades das empresas/indústrias, por exemplo, bem como o planejamentos e análise/ampliação de estudos voltados ao campo matemático, podem ser estabelecidos conforme o direcionando que for dado durante as sessões de tutoria e desempenho dos grupos.

Em relação à matemática, espera-se que os grupos percebam, neste caso, o quanto o trabalho com funções marginais está ligado ao conceito de derivadas e integrais. Deseja-se que haja uma gama de conhecimentos prévios essenciais ao desenvolvimento dos novos assuntos a serem trabalhados, como: análise e interpretação de funções no cotidiano; a compreensão de taxas de variação; a leitura e interpretação de gráficos; manipulação algébrica; e escolha do modelo matemático.

Tanto os alunos quanto o tutor poderiam observar se há domínio em relação a esses conhecimentos. Caso existam lacunas, planos de estudos paralelos podem ser indicados, a fim de retomar conceitos. Ao longo dos encontros e dos estudos individuais, que também são necessários, os alunos podem trocar suas experiências e se ajudar mutuamente.

Possivelmente, a partir dessas orientações, os grupos podem encontrar referências ligadas à Matemática Aplicada e às áreas de Economia e Administração. O tutor tem a incumbência de fornecer outras sugestões que contribuam para esse roteiro de estudos. O vínculo desse problema com ideias sobre o comportamento de funções e taxa de variação é algo fundamental na perspectiva apresentada.

Mediante as estratégias adotadas, pode haver uma abertura para o tutor realizar explanações e comentários a respeito do campo matemático, principalmente quando se tratar de definições e regras de derivação/integração. Um outro direcionamento é que o tutor proponha aos alunos a pesquisa de alguma definição ou técnica a ser usada e que, de modo voluntário, expliquem o que compreenderam a respeito do assunto. Ou seja, os estudantes podem agir de forma independente, mesmo com a atuação do tutor, o que pode ser feito com o apoio dos recursos disponíveis: lousa, computadores, equipamentos multimídias, livros didáticos, entre outros.

Com a proposta de estudos finalizada, os estudantes partem então para os processos de resolução do problema em si, atrelando suas aprendizagens com seu campo de atuação profissional. Há possibilidades de apresentações escritas e orais. A produção de relatórios ao longo das reuniões em grupo, onde cada integrante tem participação ativa no processo, assumindo a função de relator, líder, secretário, ou mesmo alguma outra tarefa, são exemplos que envolvem a dinâmica desse processo.

A partir de fases como essas torna-se possível estabelecer alguns critérios de avalição, desde a participação individual dos estudantes à avaliação de seus pares e do trabalho desenvolvido por sua equipe. O processo avaliativo da dinâmica do PBL se destaca como algo flexível, podendo contemplar aspectos conceituais, procedimentais e atitudinais. Essas reflexões foram construídas a partir de uma pesquisa qualitativa de cunho teórico. Como produto final, além dos problemas matemáticos apresentados, temos alguns estudos de apoio que podem nortear e contribuir com possíveis práticas educacionais de docentes que buscam trabalhar com uma aprendizagem baseada em problemas.

Considerações finais

O presente artigo promove reflexões sobre possibilidades de abordagens ativas e diferenciadas no ensino superior. Contemplar bases matemáticas elementares, por meio de problemas matemáticos amparados em princípios do PBL emerge como um aspecto viável ao ensino, aos estudantes e à sociedade contemporânea.

Partiu-se do pressuposto que a matemática pode ser explanada não como algo específico, formatador, que remete a aplicações pontuais de conceitos ou conteúdos, por si só, pautando-se em resolução de listas de exercícios, sem vínculos com questões interdisciplinares e reflexivas. A intenção é justamente ampliar os horizontes, construindo um ambiente de aprendizagem que propicie participações efetivas dos estudantes, colocando-os na posição de produtores do conhecimento.

O PBL, nas perspectivas do ensino superior, demonstra ser uma abordagem pertinente, pois explora conhecimentos intrínsecos às carreiras dos estudantes e visa colaborar com a formação dos mesmos além da sala de aula. O trabalho com o problema estruturado (ou adaptado), a dinâmica das aulas, as interações entre estudantes e tutor, remetem a expectativas associadas a processos de ensino e aprendizagem ativos e construtivistas.

Tecer problemas inspirados no PBL não é uma tarefa simples. Em materiais didáticos, comumente utilizados na abordagem de tópicos matemáticos no ensino superior, normalmente não verificamos características de problemas de fim aberto, mal estruturados, que explorem aspectos relacionados a enfoques profissionais ou a aspectos relacionados a nossa sociedade de modo geral. Há projetos de ensino interdisciplinares que focam aplicações de alguns conceitos, mas, normalmente, estes precisariam ser adaptados para caracterizar uma perspectiva de trabalho com o PBL. Entendemos que isso se coloca como uma desvantagem, pois essa aproximação entre teoria e prática, estaria comprometida, porque depende de outros fatores como disponibilidade do professor para elaborar materiais, preocupações com cronograma de aulas, etc. Abarcar as propostas do PBL, sem ter um direcionamento sobre como estruturar um problema, ou ainda, sem ter acesso a materiais didático-pedagógicos que explorem essa perspectiva, seria um obstáculo a ser enfrentado.

As contribuições teóricas da pesquisa de mestrado, bem como outros estudos acadêmicos nessa mesma linha, possibilitam que a matemática seja vista e trabalhada sob essa metodologia de ensino. Idealizamos contribuir com estratégias que enfoquem um maior comprometimento tanto do estudante quanto do docente, no sentido de vincular conhecimentos matemáticos a diferentes realidades.

A continuidade desta pesquisa se faz no prosseguimento de estudos e reflexões dos pesquisadores acerca do uso do PBL no ensino superior, em especial, de possíveis aplicações empíricas em formatos parciais no ensino de disciplinas que utilizam sobretudo o cálculo diferencial e integral como base curricular. Pretende-se, assim, aproximar conhecimentos teóricos dos práticos, remodelando tríades didáticas que se encontram descontextualizadas.

Referências

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Notas

1 A referida dissertação intitulada ?O ensino de noções de Cálculo Diferencial e Integral por meio da Aprendizagem Baseada em Problemas? foi concluída no ano de 2016.

Autor notes

Mestre em Ensino de Ciências e Matemática pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo - IFSP/SPO. Doutoranda em Educação Matemática ? Universidade Estadual Paulista ? Unesp, Rio Claro, São Paulo.

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