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Linguagem Matemática no processo de aprendizagem de um grupo de estudantes surdos
MATH LANGUAGE NOT LEARNING PROCESS OF A GROUP OF DEAF STUDENTS
LENGUAJE MATEMÁTICO EN EL PROCESO DE APRENDIZAJE DE UN GRUPO DE ESTUDIANTES SORDOS
Revista de Educação Matemática, vol.. 16, núm. 23, 2019
Sociedade Brasileira de Educação Matemática

Artigos Científicos

Revista de Educação Matemática
Sociedade Brasileira de Educação Matemática, Brasil
ISSN: 1676-8868
ISSN-e: 2526-9062
Periodicidade: Cuatrimestral
vol. 16, núm. 23, 2019

Recepção: 04 Maio 2019

Aprovação: 31 Agosto 2019

Publicado: 01 Setembro 2019


Este trabalho está sob uma Licença Creative Commons Atribuição-NãoComercial 4.0 Internacional.

Resumo: Neste artigo é apresentada parte de uma pesquisa que foi realizada para compreender o processo de aprendizagem de matemática por estudantes surdos focando as especificidades da Linguagem Matemática. A investigação foi desenvolvida em uma escola bilíngue, com um grupo de estudantes surdos do 1o ano do Ensino Médio. Os dados analisados foram coletados por meio de entrevistas semiestruturadas, filmagens das aulas e protocolos das atividades realizadas pelos estudantes. Para este artigo foram selecionadas duas atividades, que tiveram como objetivo inserir a Linguagem Matemática por meio do estudo algébrico, envolvendo a noção de variação e dependência entre grandezas, de regularidade e de generalização. A partir da análise dos dados é possível afirmar que a sinalização das atividades em Libras é um fator decisivo para a compreensão dos enunciados e estratégias na resolução das atividades pelos estudantes; a comunicação entre os estudantes, e entre os estudantes e professor por meio da Língua Brasileira de Sinais ? (LIBRAS) favoreceu a resolução das atividades. Em relação à escrita da Língua Portuguesa, todos os estudantes conseguiram registrar suas estratégias para a resolução das atividades, mas utilizando a lógica de registro baseado em LIBRAS, portanto o conhecimento do professor desta língua possibilitou a compreensão das respostas escritas pelos estudantes

Palavras-chave: Estudante Surdo Libras. Linguagem Matemática..

Abstract: This article is part of a research that was conducted to understand the learning process of mathematics by deaf students, focusing on the specifics of mathematical language. An investigation was carried out at a ?bilíngue? \school with a group of deaf 1st graders. The data analyzed were collected through semi-structured interviews, class films and student activity protocols. For this article, two activities were selected, which aimed to insert Mathematical Language through algebraic study, involving the notion of variation and dependence between grandparents, regularity and generalization. From the analysis of the data it is possible to determine that the signaling of activities in Libras is a decisive factor for understanding the utterances and strategies in solving students' activities; The communication between students and between students and Brazilian teacher of Signals - (LIBRAS) favored the resolution of the activities. Regarding the writing of the Portuguese language, all students were able to register their strategies for activity solving, but using a logging logic based on LIBRAS, therefore, the knowledge of the teacher of this language made it possible to understand the answers written by the students.

Keywords: Deaf student Function. Libras. Mathematical Language.

Resumen: Este artículo es parte de una investigación que se llevó a cabo para comprender el proceso de aprendizaje de las matemáticas por parte de los estudiantes sordos, centrándose en los detalles del lenguaje matemático. Se lleva a cabo una investigación en una escuela bilingüe, con un grupo de sordos del primer año del la enseñanza media. Los datos analizados se recopilaron mediante entrevistas semiestructuradas, videos de clase y protocolos de actividad estudiantil. Para este artículo, fueran seleccionados dos de las actividades, que tienen como objetivo insertar el lenguaje matemático a través del estudio algebraico, involucrando la noción de variación y dependencia entre grandezas, regularidad y generalización. A partir del análisis de los datos, es posible determinar que la señalización de actividades en Libras es un factor decisivo para comprender las declaraciones y estrategias para resolver las actividades de los estudiantes; La comunicación entre estudiantes, y entre estudiantes y profesores a través del idioma de los estudiantes brasileños (LIBRAS) favoreció la resolución de actividades. Con respecto a la escritura del idioma portugués, todos los estudiantes pudieron registrar sus estrategias para resolver actividades, pero utilizando una lógica de registro basada en LIBRAS, por lo que el conocimiento del maestro de este idioma les permitió comprender las respuestas escritas por los estudiantes.

Palabras clave: Estudiantes Surdos Libras. Linguagem Matemática..

1. INTRODUÇÃO

A respeito da população surda que vive no Brasil, o Censo Demográfico realizado em 2010 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), revelou que 9.722.163 brasileiros afirmavam ter deficiência auditiva. Sendo que, 344.206 não conseguiam ouvir de modo algum, 1.799.885 tinha grande dificuldade e 7.574.797 tinha alguma dificuldade ( IBGE, 2010). Com base nos dados apresentado pelo Censo Demográfico de 2010, é possível afirmar que há uma população grande de surdos no país.

Pertinente à educação dos surdos brasileiros, em 2002 a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) foi reconhecida como língua dos surdos que vivem no Brasil por meio da Lei Federal nº 10.436 ( BRASIL, 2002), posteriormente regulamentada pelo Decreto no 5.626, de 2005 ( BRASIL, 2005). Tais documentos preconizam ao surdo uma educação bilíngue, em todas as esferas educacionais; ele tem o direito de aprender Libras como sua primeira língua (L1) e a Língua Portuguesa (leitura e escrita) como segunda língua (L2).

Porém, de acordo com Traldi (2014), o país não tem atingido os objetivos propostos nos documentos oficiais, pois os estudantes surdos continuam em desigualdade, comparados aos ouvintes em relação ao ingresso no ensino superior. O autor salienta que em 2011 a população brasileira era de 189.652.519 pessoas, sendo que 28 milhões declararam ter algum problema auditivo, destes 1.799.885 afirmaram possuir uma grande dificuldade auditiva e 347.481 não conseguem ouvir de modo algum, ou seja, 14,8% do total dos 190 milhões de brasileiros possuem algum problema auditivo.

No entanto, enquanto 8.959.446 de ouvintes ingressaram no ensino superior, apenas 2.278 deficientes auditivos se matricularam, ou seja, 4,7% da população de ouvintes estavam no ensino superior para apenas 0,6% do número de brasileiros que declararam ter deficiência auditiva ( TRALDI, 2014).

Não corremos riscos em afirmar que o principal fator de impedimento do estudante surdo acessar e se manter no ensino superior é o desafio do domínio da Língua Portuguesa. Neste sentido, encontramos nos estudos de Vygotsky (1999) elementos que corroboram com este entendimento. O autor afirma que o desenvolvimento da língua passa por três estágios: a linguagem social, a linguagem egocêntrica e a linguagem interior.

No primeiro estágio a criança aprende a falar para se comunicar, para interagir. No segundo estágio, a fala se torna egocêntrica: a criança passa a falar sozinha, dado que, a fala social está sendo internalizada pela criança. Ainda neste estágio nota-se que, quando a criança fala sozinha, ela está usando a língua como suporte do pensamento para organizar as ideias e planejar as ações. A língua começa a servir ao intelecto e o pensamento começa a ser expresso em palavras. Nesta fase, língua e pensamento se unem ( VYGOTSKY, 2001).

Posterior à fala egocêntrica surge o discurso interior, que é o terceiro estágio, em que as palavras são pensadas, representadas simbolicamente, sem que necessariamente sejam faladas: é o pensar em palavras. Assim, a língua irá determinar o modo de pensar do sujeito, uma vez que formas avançadas de pensamentos são transmitidas por meio das palavras ( VYGOTSKY, 2001).

Ainda, de acordo com o autor o homem é essencialmente social, porém ?toda a nossa cultura é calculada para a pessoa dotada de certos órgãos, mão, olho, ouvido e de certas funções cerebrais? ( VYGOTSKY, 2011, p. 867), logo, qualquer deficiência modifica a relação do homem com o mundo. Consequentemente, o primeiro obstáculo para o desenvolvimento do indivíduo com deficiência é o meio social, pois ele pode facilitar ou dificultar as possibilidades de desenvolvimento.

A deficiência cria barreiras para o indivíduo acessar a cultura, sendo este o campo de desenvolvimento das funções psicológicas superiores. Assim, conforme destaca o autor, a educação surge em auxilio ?criando técnicas artificiais, culturais e um sistema especial de signos ou símbolos culturais? ( VYGOTSKY, 2011, p. 867), pois o desenvolvimento cultural não está necessariamente ligado a essa ou àquela função orgânica. Por exemplo: ?a fala não está obrigatoriamente ligada ao aparelho fonador; ela pode ser realizada em outro sistema de signos, assim como a escrita pode ser transferida do caminho visual para o tátil? ( VYGOTSKY, 2011, p. 869).

Nessa concepção, Lodi (2011) ressalta que inicialmente, os primeiros gestos da criança surda têm a finalidade de comunicação, posteriormente com a interação com o meio, ela desenvolverá a fala egocêntrica e o discurso interior. A fala interior possibilita que a criança surda construa seus conceitos e significados do mundo.

Logo, a língua de sinais é um dos elementos que possibilita o desenvolvimento cognitivo e social do surdo. Neste contexto, Harrison (2011) salienta que, assim como as demais línguas de sinais, a Libras é de modalidade gesto-visual, porque utiliza como meio de comunicação os movimentos das mãos, do corpo e expressões faciais que são percebidas pela visão. Portanto, é diferente da Língua Portuguesa, que é uma língua de modalidade oral-auditiva, já que utiliza como canal sons articulados que são percebidos pelos ouvidos.

Ademais, para Campello (2008, p. 140)o professor de estudante surdo deve considerar a Libras como uma língua completa e natural do surdo, esta proporciona a aprendizagem de qualquer conhecimento, ?expressando sentidos ou significações que podem facilmente ser captados e decodificados pela visão?.

Segundo a autora, a Libras tem uma diversidade de signos e de outras características que podem ser significativas no processo de ensino-aprendizagem, haja vista que o surdo irá utilizar-se de suas experiências visuais e da língua de sinais para organizar os conceitos e, por este motivo, ela propõe a prática da pedagogia visual ou pedagogia surda, ou seja, é necessário que o professor do estudante surdo explore sua visualidade por meio da língua de sinais e dos recursos visuais.

Tocante ao processo de desenvolvimento de leitura e escrita da Língua Portuguesa por estudantes surdos vale ressaltar que, segundo Pereira (2009, p. 22):

O aluno ouvinte, quando começa a ler e a escrever, já dispõe de uma língua e se baseia nela na construção da leitura e da escrita; a criança surda pode conhecer alguns vocábulos e mesmo algumas estruturas, mas raramente apresenta conhecimento suficiente da Língua Portuguesa que o ajude na tarefa de atribuir sentido na leitura, bem como de construir sentido na escrita.

Esta autora ainda afirma que a oralidade não é uma condição indispensável para a leitura e a escrita, contudo é esperado que a criança ouvinte apoie-se nesta condição para sua interpretação da leitura e reprodução da escrita. Já os surdos, diferentemente dos ouvintes, usarão sua construção visual para fazer a mesma criação de hipóteses.

Sobre o ensino da Língua Portuguesa para estudantes surdos Lodi (2011, p. 87)salienta que a partir da Libras:

[...] o ensino-aprendizagem escolar da Língua Portuguesa em sua modalidade escrita pode ser iniciado, entendida como segunda língua das pessoas surdas (L2). Considera-se ainda, nas práticas bilíngues para surdos, as particularidades e a materialidade da língua de sinais, além dos aspectos culturais a ela associados, fato que demanda metodologias de ensino pensadas a partir da Libras.

Pode-se considerar que o desenvolvimento da leitura e escrita da Língua Portuguesa por estudantes surdos segue os mesmos mecanismos do ensino e aprendizagem de uma segunda língua e, é possível por meio da Libras.

Outro desafio posto ao processo de ensino e aprendizagem do estudante surdo, não é exclusivo do estudante surdo, mas também do estudante ouvinte, que está relacionado com a aprendizagem da linguagem matemática.

Granell (1997, p. 258)identifica um antagonismo em relação ao conhecimento matemático, embora os conhecimentos matemáticos sejam de suma importância para a sociedade moderna altamente tecnológica, ele também é inacessível para a maioria das pessoas. Para a autora, isto advém do fato do conhecimento matemático ser mais abstrato do que qualquer outro conhecimento, além de ser:

[...] dependente de uma linguagem específica, de caráter formal, que difere muito das linguagens naturais. [...] A Linguagem Matemática envolve a ?tradução? da linguagem natural para uma linguagem universal formalizada, permitindo a abstração do essencial das relações matemáticas envolvidas, bem como o aumento do rigor gerado pelo estrito significado dos termos. Na linguagem natural, o sentido das palavras é muito mais vago e impreciso; termos como comprido, estreito, largo, pequeno, grande, muito, etc., que fazem parte da linguagem natural para expressar magnitudes, não se aplicam numa linguagem formalizada ( GRANELL, 1997, p.260).

Nesse sentido, aprender matemática implica na aprendizagem de uma atividade conceitual que mantém uma especificidade como discurso linguístico. Enquanto linguagem, a matemática possui seus próprios signos (ou símbolos). Os signos matemáticos têm como principal função converter conceitos matemáticos em objetos facilmente manipuláveis, possibilitando inferências, generalizações e novos cálculos que, de outro modo, seriam impossíveis. Os signos podem ser formais, obedecendo a regras internas do próprio sistema, ou referenciais permitindo associações com situações reais, tornando-se úteis para resolver diferentes problemas ( GRANELL, 1997, p. 264).

Desse modo, a Linguagem Matemática tem aspectos sintáticos e semânticos. A perspectiva sintática prioriza a manipulação das regras e dos signos. A concepção semântica enfatiza os aspectos conceituais. Conforme Granell (1997, p. 275-282) a junção das tendências, sintática e semântica, representa o modelo de ensino ideal, porque aprender matemática significa saber manipular os signos independentemente das situações, e dar-lhes os significados que lhes são próprios.

No entanto, para se apropriar da Linguagem Matemática o estudante primeiro precisa construir os conceitos, entender os significados das operações básicas (adição, subtração, multiplicação, divisão etc.). Tendo os conceitos já construídos, poderão traduzir o conhecimento para a Linguagem Matemática ( GRANELL, 1997, p. 267).

A autora ( 1998, p. 28) ainda enfatiza que o conhecimento matemático também é desenvolvido fora da escola, à margem da instrução formal, em contextos sociais, por meio de situações informais de aprendizagem. Porém, o domínio da Linguagem Matemática formal, somente é aprendido na escola. Assim, o seu ensino deve ser a partir da linguagem natural do estudante.

Os estudantes devem aprender a substituir os códigos da sua linguagem natural pelos códigos próprios da matemática. A linguagem natural deve dar aos signos matemáticos significados, todavia, a linguagem simbólica não substitui a linguagem natural, mas adquire sentido em função dela. Portanto, é preciso que quando o professor fale de matemática na língua natural o estudante faça a ?tradução? para a Linguagem Matemática e vice-versa ( GRANELL, 1998, p. 34-36).

Além disso, Granell (1997, p. 260) afirma que, a linguagem algébrica é considerada a autêntica Linguagem Matemática, dado que os números são substituídos por letras, desse modo, o signo adquiri um significado que vai além do objeto simbolizado, permitindo a Linguagem Matemática um alto grau de generalização.

Então, conclui-se que faz parte da aprendizagem de matemática aprender uma nova linguagem, denominada de linguagem algébrica, que possui seus próprios signos, regras e conceitos. A aprendizagem da Linguagem Matemática é construída a partir da linguagem natural do estudante, o domínio da Linguagem Matemática permite a comunicação das ideias e a interpretação da realidade.

É a partir destas considerações sobre o processo de comunicação do estudante surdo, com as especificidades da Língua Portuguesa, da Libras e da linguagem matemática que o objetivo de pesquisa deste estudo é posto, como sendo: revelar possibilidades e desafios no processo de aprendizagem de matemática de um grupo de estudantes surdos do Ensino Médio, que estudam em uma escola bilíngue, focando o uso da língua portuguesa, de LIBRAS e a linguagem matemática.

2. EDUCAÇÃO DE SURDOS

Segundo Capovilla (2000) a decisão tomada no congresso de Milão norteou as propostas educacionais até aproximadamente 1970. Desse modo, a história da educação de surdos ficou marcada pelo oralismo. Essa compreensão de educação vê o surdo como um deficiente que precisa ser curado para ser integrado à comunidade de ouvintes.

O autor ainda salienta que no oralismo era defendido o ensino da língua oral e a rejeição da língua de sinais. Para tanto o surdo deveria fazer uma reabilitação da fala em direção à normalidade exigida pela sociedade. Esta metodologia não conseguiu desenvolver na maioria dos surdos a fala, a leitura, nem a escrita, pois os surdos apresentavam baixo desempenho escolar.

Nesse sentido, Sacks (1998, p. 41) declara:

[...] pagou-se um preço intolerável pela aquisição da fala. [...] O oralismo e a supressão da língua de sinais acarretaram uma deterioração marcante no aproveitamento educacional das crianças surdas e na instrução dos surdos em geral.

Ainda assim, conforme Lulkin (1998), dentro das escolas e dos institutos os estudantes surdos eram submetidos a castigos pesados caso utilizassem a língua de sinais. Eram obrigados a sentar sobre as mãos. As janelas ou portas de vidro eram retiradas para impedir a comunicação por meio da língua de sinais e os professores surdos foram demitidos.

Os surdos passam a ser excluídos do processo educativo e do trabalho. Estavam transformando-se em deficientes, em objeto de pesquisa para a medicina. Já que a surdez era considerada uma anomalia e precisava ser curada, as escolas passaram a ser salas de tratamento ( LULKIN, 1998).

Inicia-se a medicalização da surdez com as próteses (aparelho auditivo), os implantes, as cirurgias, o treinamento auditivo, a leitura labial, a articulação dos fonemas, as audiometrias, os exercícios respiratórios e a aquisição de vocabulário ( LULKIN, 1998). Lacerda (1998) ressalta que, mesmo usando as próteses, a maioria dos surdos apresentava grande dificuldade em desenvolver a aquisição da fala fracassando academicamente.

A visão clínica permaneceu na educação de surdos por um longo período. A ineficácia do oralismo sobre o ensino fez emergir, nos Estados Unidos, na década de 60 estudos sobre a língua americana de sinais ? ASL ( CAPOVILLA, 2000).

Em 1960 Willian Stokoe publica ? Linguage Structure: na Outline of the Visual Communication System of the American Deaf?, afirmando que a ASL é uma língua semelhante às línguas orais, atendendo aos critérios linguísticos de uma língua genuína no léxico, na sintaxe e na capacidade de gerar uma quantidade infinita de sentenças. A publicação ajudou no reconhecimento da ASL como língua natural dos surdos americanos, e lançou uma base para novas pesquisas nos Estados Unidos e na Europa ( LACERDA, 1998).

Na década de 70, surge nos Estados Unidos uma nova metodologia de ensino para surdos: a comunicação total. Este modelo defende o uso de todos os meios de comunicação para a criança surda adquirir a linguagem. Tem a finalidade de auxiliar a compreensão da língua falada e melhorar o desempenho de leitura e da escrita ( CAPOVILLA, 2000). Surgem várias formas de se trabalhar a comunicação total, porém, como ressalta Lacerda (1998), os métodos valorizavam a comunicação e não a língua, de modo que a língua de sinais é usada como acessório de auxílio à fala.

Em relação ao oralismo, os surdos conseguiam se comunicar melhor, entretanto, as pesquisas mostram que a maioria dos estudantes surdos não alcançava autonomia na leitura e na escrita, bem como apresentava dificuldades em expressar ideias e sentimentos. Embora o método tenha favorecido o reconhecimento da língua de sinais e a sua aprendizagem, seu objetivo se mostrou falho ( LACERDA, 1998).

No Brasil a comunicação total foi introduzida na década de 80. Professores brasileiros visitaram a Universidade Gallaudet e ficaram impressionados com a nova metodologia, logo, trouxeram ao país, consequentemente a aderência por parte das escolas foi gradativa ( CAMPELLO, 2008).

O estudo de Stokoe sobre ASL instigou mais pesquisas sobre as línguas de sinais. Como resultado, os estudos foram evidenciando a educação bilíngue como o método mais adequado para a educação de surdos ( HARRISON, 2011, p.56).

No bilinguismo a língua de sinais é considerada a língua natural do surdo, e, parte desse pressuposto para o ensino da segunda língua, tornando acessível à criança surda duas línguas. Ao sinalizar a criança surda desenvolve sua competência linguística, permitindo-lhe uma comunicação completa e eficaz, que lhe servirá depois de apoio para a aprendizagem da segunda língua ( LACERDA, 1998).

Os estudos mostram que a língua de sinais é aprendida pelos surdos com naturalidade, propiciando o desenvolvimento social e cognitivo apropriado à faixa etária ( CAPOVILLA, 2000). Sendo assim, se faz necessário que os surdos sejam expostos deste os primeiros anos de vida à língua de sinais, para evitar atrasos da linguagem e todas as suas consequências ( SACKS, 1998, p. 44).

O bilinguismo contrapõe-se ao oralismo e à comunicação total, porque considera o canal viso-gestual de fundamental importância para a aquisição da língua de sinais e defende seu espaço. As pesquisas têm mostrado que, atualmente, esta metodologia é a mais adequada para a educação dos surdos, haja vista que, sua finalidade é possibilitar as condições de desenvolvimento cognitivo por meio da língua, permitindo assim, que o estudante surdo tenha acesso a duas línguas ( LACERDA, 1998).

3. ESCOLA BILÍNGUE E A INCLUSÃO NA REDE REGULAR DE ENSINO

A população surda que vive no Brasil tem, de acordo com a legislação vigente ( BRASIL, 2002, 2005), direito a uma educação bilíngue em todas as esferas educacionais. Assim, surge no país a proposta da escola bilíngue para surdos. Esta tem a finalidade de priorizar a Libras, o desenvolvimento da leitura e da escrita da Língua Portuguesa, bem como, o desenvolvimento da identidade surda, por meio da cultura ( JUNG, 2011, s/p).

Para uma escola ser bilíngue, conforme Campos (2011, p. 30-33), é necessário que as duas línguas (Libras e a Língua Portuguesa) existam no mesmo espaço escolar, porém, de acordo com a autora, a maioria das escolas bilíngues para surdos são fracas, os professores não são fluentes em Libras e faltam perspectivas teóricas em relação aos métodos e ao currículo.

Há também a proposta de inclusão dos estudantes surdos em escolas da rede regular de ensino. Neste caso, o estudante surdo dispõe do intérprete educacional de Libras e tem, conforme a Lei nº 10.845 ( BRASIL, 2004), o apoio do ? Programa de Complementação ao Atendimento Educacional Especializado (AEE)?. Porém, há diversas discussões sobre a aplicação do AEE nos espaços escolares, pois os professores não estão preparados para atuar com os estudantes surdos, bem como não possuem fluência em Libras ( CAMPOS, 2011, p. 43).

Neste sentido, Campos (2011, p. 32-37) afirma que a política nacional vigente de inclusão proposta pelo Ministério da Educação ainda vê o surdo como um sujeito com deficiência, desconsiderando suas particularidades e não permitindo que o estudante surdo construa sua subjetividade como diferente do ouvinte. Tal fato ocorre em razão de este modelo integrar todos em um sistema único baseado na cultura universal, comum e igualitária, impondo ao surdo à cultura ouvinte, impedindo-o de mostrar sua diferença de ser, sua cultura, seu povo.

Tanto a proposta que justifica a escola bilíngue para surdos, como a que defende a educação de surdos na escola regular, têm gerado muitas discussões entre pesquisadores, profissionais, familiares e a comunidade surda ( CAMPOS, 2011, p.29). Diante disso, surge o movimento surdo em prol do reconhecimento e da ampliação das escolas bilíngues para surdos ( Jung, 2011, s/p).

Para Jung (2011, s/p), este movimento da comunidade surda em defesa da escola bilíngue, advém do fato deste modelo de escola ter como fundamento a compreensão das especificidades surdas, possibilitando a cultura, a língua de sinais, o desenvolvimento de metodologia, currículo e prática pedagógica direcionada ao estudante surdo.

A autora ainda afirma que, ao reivindicar o direito de discutir seu processo de escolarização, a comunidade surda defendeu seu lugar na sociedade, manifestando suas vontades e necessidades.

Apesar da luta da comunidade surda em prol de uma escola que respeite sua diferença, que a compreenda enquanto minoria linguística, e a surdez como uma diferença histórica e cultural ( JUNG, 2011), ainda há escolas que veem o surdo como deficiente, incorporando-o em salas regulares com ouvintes ou em salas especiais para múltiplas deficiências, sem o uso da língua de sinais, sem os pares surdos, sem a presença da cultura surda ( CAMPOS, 2011, p.34).

Os surdos brasileiros vêm defendendo uma escola que os compreendam como sujeitos diferentes e culturais, entendendo suas diferenças, respeitando sua cultura que é representada pela língua de sinais ( JUNG, 2011). A escola deve proporcionar o desenvolvimento de todas as potencialidades cognitivas do estudante surdo, dispondo de tecnologias especializadas e de uma pedagogia que contemple suas particularidades e diversidades ( CAMPOS, 2011, p.37).

Portanto, compreende-se que, no momento, a escola bilíngue é o modelo mais adequado para os estudantes surdos, dado que ela materializa os princípios de uma educação emancipadora pleiteada pela comunidade surda há anos.

4. LÍNGUA BRASILEIRA DE SINAIS- LIBRAS

As línguas de sinais possuem características que as identificam como língua e não linguagem. A linguagem é um sistema de comunicação natural ou artificial, humana ou não. Assim como as línguas orais, as línguas de sinais também são dotadas de ?gramática, fonologia, semântica, morfologia e sintaxe? e, preenchem os requisitos científicos para serem consideradas línguas ( HARRISON, 2011, p. 53).

Seus usuários conseguem expressar ideias sutis, complexas e abstratas, ou seja, a língua de sinais possibilita a expressão de qualquer pensamento e possui as mesmas características de qualquer outra língua: ?versatilidade e flexibilidade, arbitrariedade, criatividade/produtividade e dupla articulação? ( Harrison, 2011, p. 57).

As línguas de sinais são línguas naturais, em razão de terem surgido espontaneamente entre as comunidades surdas que se contatavam entre si. Ademais, permitem a expressão de qualquer conceito. Além disso, ao contrário do que se acredita a língua de sinais não é universal, cada língua de sinais tem sua própria estrutura gramatical, dentro do mesmo país a língua de sinais pode adquirir características diferentes ( Góes; Campos, 2011).

Para mais, as línguas de sinais são autônomas das línguas orais e das demais línguas de sinais, embora tenham influência de uma língua de origem. Assim como a Língua Portuguesa, o francês, o italiano e o espanhol, tiveram origem no latim, a Libras e a ASL ( American Sign Language) foram influenciadas pela LSF ( Langue des Signes Française), porém com o tempo cada língua foi se transformando, de acordo com a cultura local tornando-se independente ( HARRISON, 2011).

A Libras se configurou sem a influência da Língua Portuguesa no Imperial Instituto de Surdos Mudos - IISM, uma vez que Huet dava aula utilizando a língua de sinais francesa e os estudantes usavam a língua de sinais da sua região (o IISM recebia estudantes oriundos de todo o país), assim misturou-se as línguas, criando a Língua Brasileira de Sinais - Libras, que foi transmitida ao longo das gerações ( GÓES; CAMPOS, 2011).

Assim como as demais línguas de sinais, a Libras é de modalidade gesto-visual, porque utiliza como meio de comunicação os movimentos das mãos, do corpo e expressões faciais que são percebidos pela visão. Portanto, é diferente da Língua Portuguesa, que é uma língua de modalidade oral- auditiva, já que utiliza como canal sons articulados que são percebidos pelos ouvidos ( HARRISON, 2011). E como qualquer língua, possui diferenças quanto ao seu uso em relação à região, ao grupo social, a faixa etária e ao sexo ( CAMPELLO, 2008).

No dia 24 de abril de 2002 a Libras foi reconhecida como língua dos surdos que vivem no Brasil por meio da Lei Federal nº 10.436 ( BRASIL, 2002), posteriormente regulamentada pelo Decreto no 5.626, de 22 de dezembro de 2005 (BRASIL, 2005).

A Libras é parte da cultura da comunidade surda, e é o principal meio para os surdos brasileiros atuarem na sociedade como cidadãos. Sem a língua de sinais, os surdos estão aprisionados a um pequeno mundo, como evidencia Sacks (1998, p. 52):

[...] um ser humano não é desprovido de mente ou mentalmente deficiente sem uma língua, porém está gravemente restrito no alcance de seus pensamentos, confinado, de fato, a um mundo imediato, pequeno.

A conquista do reconhecimento da Libras como língua foi um marco importante para o desenvolvimento linguístico, cognitivo, social e cultural dos surdos brasileiros, possibilitando-lhes o pleno uso de suas potencialidades enquanto ?sujeito diferente e, não deficiente? (DALCIN, 2005), dado que a proibição da língua de sinais os impedia de terem acesso ao mundo social, político, econômico, educacional e cultural ( CAMPOS, 2011).

Pertinente à escolarização dos surdos, Campello (2008)afirma que o professor deve considerar a Libras como uma língua completa e natural do surdo, proporcionando a aprendizagem de qualquer conhecimento, ?expressando sentidos ou significações que podem facilmente ser captados e decodificados pela visão? ( CAMPELLO, 2008, p. 140).

Além disso, o professor de estudante surdo precisa ter conhecimento da Libras para efetivar sua prática pedagógica. Dessa forma, é necessário que o docente conheça mais que alguns vocabulários (sinais); também é fundamental que ele conheça a gramática da língua, uma vez que, é imprescindível o uso correto dos parâmetros da língua, para haver uma comunicação significativa ( CAMPELLO, 2008).

5. LEITURA E ESCRITA DA LÍNGUA PORTUGUESA POR ESTUDANTES SURDOS

Quanto ao processo de aquisição da leitura e escrita dos estudantes surdos vale ressaltar que, segundo Pereira (2009, p. 22):

O aluno ouvinte, quando começa a ler e a escrever, já dispõe de uma língua e se baseia nela na construção da leitura e da escrita; a criança surda pode conhecer alguns vocábulos e mesmo algumas estruturas, mas raramente apresenta conhecimento suficiente da Língua Portuguesa que o ajude na tarefa de atribuir sentido na leitura, bem como de construir sentido na escrita.

A autora ainda argumenta que a oralidade não é uma condição indispensável para a leitura e a escrita, contudo é esperado que a criança ouvinte apoie-se nesta condição para sua interpretação da leitura e reprodução da escrita. Já os surdos, diferentemente dos ouvintes, usarão sua construção visual para fazer a mesma criação de hipóteses. Com tal referência pode-se chegar a ideia de que a escrita e leitura do português por falantes de português ocorrerá de forma mais natural em sua construção pelo seu uso antecedente e já no caso do surdo, necessitará conhecer bem a sua primeira língua.

Neste contexto, os Parâmetros Curriculares Nacionais - PCN (BRASIL, 1997) preconiza que o objetivo do professor é incentivar uso melhor da Língua Portuguesa, por ser um mediador entre o texto e a aprendizagem. Já sobre ensino da Língua Portuguesa para estudantes surdos Lodi (2011, p. 87) salienta que a partir da Libras:

[...] o ensino-aprendizagem escolar da Língua Portuguesa em sua modalidade escrita pode ser iniciado, entendida como segunda língua das pessoas surdas (L2). Considera-se ainda, nas práticas bilíngues para surdos, as particularidades e a materialidade da língua de sinais, além dos aspectos culturais a ela associados, fato que demanda metodologias de ensino pensadas a partir da Libras.

Baseando-se nas teorias de Vygotsky, a autora afirma que a criança surda tem a aquisição da língua de sinais da mesma forma que uma criança ouvinte aprende a falar a língua oral à qual é exposta. Na parte do desenvolvimento simbólico, a criança aprende a dar significação aos signos, já que começa a reconhecer a similaridade entre o desenho e seu significado. Daí nota-se nesta fase o distanciamento entre surdos e ouvintes.

Os desenhos progressivamente convertem-se em linguagem no caso das crianças ouvintes, pois ela passa a compreender que também pode desenhar a linguagem oral. No caso das crianças surdas, há a compreensão que se pode desenhar além dos objetos enunciados em Libras. Nesta perspectiva a escrita é entendida como uma linguagem do pensamento, a exposição das ideias de forma organizada, ou seja, há uma relação com a linguagem interior construída no processo de apropriação da primeira língua ( LODI, 2011, pg.89).

Concernente ao conhecimento que o estudante surdo possui da Língua Portuguesa ao ingressar na escola, Pereira (2009, p.22) afirma que:

Passando para a questão da compreensão da leitura por alunos surdos, não se pode esquecer que a maior parte deles chega à escola sem língua e frequentemente inicia o aprendizado da leitura e da escrita do português. Considerando que o ensino obrigatório se inicia por volta dos 6 anos de idade da criança, e coincide, na maior parte das escolas, com o início do processo de ensino da leitura e da escrita, conclui-se que, para a maioria das crianças surdas, aprender a ler e a escrever significa aprender uma língua.

Para que tal processo seja menos desnivelado e que, também, possa ser possibilitado este aprendizado referente à leitura e a escrita, Pereira (2009, p. 19)afirma que ?a leitura é o resultado da interação entre informações visuais e não visuais, ou seja, entre o que o leitor já sabe e o que ele retira do texto?. Entende-se, portanto, que no processo de leitura tem-se a necessidade de expor o estudante surdo a diversos gêneros discursivos.

Na questão da aprendizagem da escrita do surdo Lodi (2011, pg.97) acrescenta que:

[...] práticas de ensino da linguagem escrita envolve o estabelecimento de relações sociais que tomam como base o uso de materiais escritos construídos também em períodos anteriores à aprendizagem formal da escrita, nas diferentes agências de letramento, possibilitando que as crianças venham a se relacionar, de forma privilegiada, com a linguagem escrita em sua constituição como sujeitos letrados.

Ainda, de acordo com a autora, os conhecimentos da primeira língua influenciam a aprendizagem da segunda e vice-versa, dado que, conhecer outra língua possibilita o pensamento nas formas da língua e nos fenômenos da mesma, permitindo o uso mais consciente da palavra, como instrumento do pensamento e como expressão de um conceito. Este processo é ilustrado na figura 1.

Pode-se considerar que o desenvolvimento da leitura e escrita da Língua Portuguesa por estudantes surdos segue os mesmos mecanismos de ensino-aprendizagem de uma segunda língua e, é possível por meio da Libras, sendo construído plenamente na interação com os interlocutores usuários da Libras. Ademais, tal processo de aprendizagem (tanto da leitura quanto da escrita) permeará todo o caminhar da vida do surdo.

6. DESENVOLVIMENTO DO ESTUDO

A partir do objetivo da pesquisa, a pesquisa realizada foi do tipo qualitativa, apresentando características da pesquisa-ação, visto que a pesquisa foi realizada na escola em que a primeira autora é professora, sendo assim teve o papel de professora-pesquisadora. Para Thiollent (2008) este tipo de pesquisa possibilita exceder as lacunas existentes nas pesquisas educativas entre teoria e prática, propiciando que os pesquisadores em educação produzam informações e conhecimentos.

Segundo o autor a pesquisa-ação é:

[...] um tipo de pesquisa social que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação da realidade a ser investigada estão envolvidos de modo cooperativo e participativo ( THIOLLENT, 2008, p. 14).

A coleta de dados foi realizada em uma escola bilíngue para estudantes surdos e os dados foram tratados de forma descritiva. A primeira autora do artigo que é a professora da turma escolhida, também foi á observadora individual e participante natural, coletou os dados a fim de explicar e analisar o problema, investigando os significados de cada dado.

Além disso, não houve nenhuma negativa por parte da direção da escola para a realização do estudo. O trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia ? IFSP, e orientado pelos princípios da Resolução do Conselho Nacional de Saúde- CNS196/1996 que discorre sobre pesquisas com seres humanos, do ponto de vista ético e científico.

Os dados coletados para a pesquisa foram obtidos por meio de: entrevista semiestruturada com os estudantes, filmagens das aulas, diário de campo da professora-pesquisadora e os protocolos das atividades dos estudantes.

A Libras é uma língua que não possui uma representação escrita, assim, para transcrever os momentos de ensino-aprendizagem registrados por meio das filmagens foi adotado o sistema de transcrição desenvolvido pelo grupo de pesquisa da Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos ? FENEIS, denominado "Sistema de notação em palavras", porque as palavras da língua oral são usadas para representar os sinais ( FELIPE, 2009).

A transcrição ocorrerá a partir das seguintes convenções:

· A datilologia é utilizada para soletrar nomes próprios de pessoas ou lugares e outras palavras que não possuem um sinal será representada pela palavra separada por hífen. Exemplos: P-I-T-Á-G-O-R-A-S; E-U-C-L-I-D-E-S;

· Os sinais em Libras serão representados por itens lexicais do português em letras maiúsculas. Exemplos: MATEMÁTICA; ESTUDANTE;

· Os sinais que correspondem a duas ou mais palavras da Língua Portuguesa será representado pelas palavras correspondentes separadas por hífen. Exemplos: NÃO-PODER; NÃO-TER;

· Os sinais compostos, formados por dois ou mais sinais, representados por duas ou mais palavras, mas que possuem uma única ideia será separado pelo símbolo ?^?. Exemplos: CAVALO ^ LISTRA (zebra); CASA ^ ESTUDA ( escola);

· Em Libras não há desinências para gêneros (feminino e masculino) e plural. Para os gêneros é utilizado o símbolo @. Exemplos: Menin@; Amig@. Já o plural pode ser representado por uma cruz situada no lado direito e acima do sinal que está sendo repetido. Exemplos: CARR, CASS;

· Os traços não manuais (expressões facial e corporal), que são realizados simultaneamente com um sinal, serão utilizados para a representação de frases nas formas exclamativas e interrogativas.

Para produzir dados para pesquisa foram cinco atividades para serem desenvolvidas em dez aulas (em duas semanas) de 45 minutos cada. As atividades tinham o objetivo de desenvolver no estudante surdo a Linguagem Matemática, por meio do estudo algébrico, apresentando o estudo das funções como forma de compreensão da noção de variação entre grandezas, dependência, regularidade e da generalização.

Todas as atividades foram elaboradas na Língua Portuguesa, dessa forma, para respondê-las era necessário que o estudante surdo utilizasse três formas de linguagem: a Língua Portuguesa, a Libras e a Linguagem Matemática, dado que, tinha que ler o texto na Língua Portuguesa, ?traduzindo-o? para Libras, ?retraduzindo? para a Linguagem Matemática, além de ter que responder as atividades na modalidade escrita da Língua Portuguesa, já que a Libras é uma língua ágrafa.

Ressalta-se que os protocolos das atividades dos estudantes surdos ficaram ilegíveis após a impressão, portanto, optou-se por passar a caneta esferográfica azul por cima das respostas apresentadas, respeitando a forma de escrita e registro dos estudantes surdos.

6.1 A ESCOLA

A pesquisa foi desenvolvida no Instituto de Educação Para Surdos - Surdez Educação Linguagem e Inclusão - SELI. É uma instituição particular com proposta bilíngue para estudantes surdos, localizada no bairro do Tatuapé, município de São Paulo. O ensino bilíngue pressupõe que o estudante surdo, no seu processo de escolarização, tenha acesso a Libras como primeira língua e a Língua Portuguesa como segunda língua ( LACERDA, 1998).

A escola dispõe de uma sala para os professores, outra para coordenação, possui um laboratório (utilizado nas aulas de biologia, química e física), um auditório, uma biblioteca, uma quadra esportiva e um pátio, porém não possui sala de informática, dispondo de três notebooks para uso coletivo, no entanto, durante todo o período da pesquisa os notebooks estavam quebrados, assim, não foi possível usar as ferramentas computacionais.

A instituição conta com uma equipe multiprofissional, com psicólogos e professores (surdos e ouvintes) que se consideram bilíngues, em Libras e na Língua Portuguesa. O corpo docente é formado por 15 professores que possuem certificação de pelo menos o nível avançado em Libras, sendo que três professores são surdos.

Há uma psicóloga surda que atende estudantes e pais de estudantes e outra psicóloga ouvinte, não fluente em Libras, que atende aos pais dos estudantes. O atendimento psicológico é oferecido a todos os estudantes e responsáveis, dentro das mensalidades já estão inclusas as consultas. A escola oferece gratuitamente todos os módulos dos cursos de Libras para os pais ou responsável pelo estudante.

6.2 PARTICIPANTES DA PESQUISA

A escola possui duas turmas de 1º ano do ensino médio, a professora-pesquisadora é docente somente da turma A, logo, os 15 estudantes desta turma foram convidados a participar do estudo. A escolha desta série ocorre em concordância com os Parâmetros Curriculares Nacionais ? Ensino Médio (PCNEM) que indica o estudo das funções neste ciclo ( BRASIL, 1999).

Foi entregue aos 15 estudantes surdos um cd contendo o termo de assentimento gravado em Libras, juntamente com um modelo impresso na Língua Portuguesa, porém, os pais de dois estudantes não assinaram o termo. Portanto, estes estudantes não foram considerados como participantes deste estudo. Assim, o grupo pesquisado é composto por 13 estudantes (sete homens e seis mulheres), que neste artigo estão identificados como A1...A13. Todos no ato da matrícula entregaram a documentação comprovando a surdez.

Com base na entrevista, é possível afirmar que o grupo de participantes deste estudo é composto em sua maioria por surdos, filhos de pais ouvintes não fluentes na língua de sinais. Além disso, os surdos apresentam surdez profunda. Nove estudantes tiveram o primeiro contato e aprenderam Libras na escola e há cinco estudantes que só tiveram contato com a Libras após os seis anos de idade. Há, também, dois estudantes que consideram a Língua Portuguesa como sua primeira língua e a Libras como segunda, se bem que, no ambiente escolar, todo o grupo utiliza a Libras com fluência e como língua de comunicação.

7. DESENVOLVIMENTO DAS ATIVIDADES

Durante o desenvolvimento da pesquisa foram propostas 5 atividades, mas para este artigo foram selecionadas duas delas, as que solicitavam o registro na língua portuguesa.

ATIVIDADE (1)

Esta atividade buscou desenvolver no estudante surdo a habilidade em compreender a relação entre as grandezas 1 e a noção de proporcionalidade.


Quadro 1
Enunciado da atividade 1
Elaborado pelos autores.

Da mesma forma que na atividade anterior, inicialmente, a professora fez a sinalização em Libras do enunciado para que os estudantes tivessem uma compreensão melhor do que estava sendo solicitado.

Embora tenham sido orientados a fazer a atividade em grupo, notou-se que os estudantes novamente, não interagiam entre si. Por conseguinte, a professora solicitou que os estudantes A9 do grupo A, e A12 do grupo B explicassem suas respostas aos demais, e quem tivesse uma resposta diferente que apresentasse à turma. A seguir as respostas dos dois estudantes:

A9: PÃO CADA 0,25 CENTAVOS PAGAR, DOIS PÃES 0,50 CENTAVOS

PAGAR, TRÊS PÃES 0,75 CENTAVOS PAGAR, AUMENTAR 0,25

CENTAVOS.

PROFESSORA: PÃO CADA PAGAR DINHEIRO PAGAR QUANTO?

A12: 0,25 CENTAVOS VALOR TROCAR NÃO.

PROFESSORA: CERTO! UM PÃO DINHEIRO VALOR DIFERENTE PAGAR

PODE?

A12: PÃO CADA 0,25 CENTAVOS, UM PÃO 0,50 PAGAR NÃO-PODER, DOIS PÃES 0,50 PAGAR PODE.

PROFESSORA: PÃO, DINHEIRO PAGAR VARIAR JEITO P-R-O-P-O-R-C-I-O-N-A-L COMO?

A12: PALAVRA P-R-O-P-O-R-C-I-O-N-A-L ESQUECER.

A9: UM PÃO 0,25 CENTAVOS PAGAR, DOIS PÃES 0,50 CENTAVOS PAGAR, TRÊS PÃES 0,75 PAGAR, PÃO AUMENTA DINHEIRO AUMENTARAPLICAR P-R-O-P-O-R-C-I-O-N-A-L.

A12: ENTENDI

(Diálogo entre estudantes e professora-pesquisadora, 2016).


Figura 2
Resposta da estudante A9.
Protocolo das atividades


Figura 3
Resposta do estudante A12.
Protocolo das atividades.

Não houve questionamentos sobre as respostas apresentadas pelos dois estudantes. Para Coll (2006) durante o desenvolvimento da atividade a atuação do professor deve se modificar, ora instigar, em outros momentos mediar. O professor pode mediar os conflitos do grupo por meio do diálogo, por exemplo, dando-lhes ideias para que possam resolver o problema de não cooperação do grupo. Neste caso específico, notou-se que, apesar de não haver uma interação entre a maioria dos estudantes, os dois estudantes que explicitaram as suas respostas, trocaram informações entre eles. Interessante destacar que, inclusive o estudante A9, explicou o significado da palavra ?proporcionalidade?, para o estudante A12, que disse não lembrar do significado dessa palavra.

Além disso, pelos protocolos apresentados foi possível perceber que embora tenham demonstrado falta de proficiência na utilização da Língua Portuguesa escrita, os estudantes compreenderam a relação entre as grandezas envolvidas na atividade, a regularidade e a noção de proporcionalidade, isto é, que ao aumentar a quantidade de pães, consequentemente, aumenta-se o valor a ser pago proporcionalmente.

A falta de proficiência na utilização do português escrito na perspectiva de Pereira (2009) provém do fato do estudante surdo não possuir o mesmo contato com a Língua Portuguesa que o estudante ouvinte, pois a Língua Portuguesa se apresenta para o surdo, não como primeira língua, devido sua modalidade oral-auditiva, mas como uma segunda língua, e assim sendo, seu processo de aprendizagem segue os mecanismos de uma segunda língua. Portanto, o baixo desempenho acadêmico dos estudantes surdos nas produções escritas, advém do fato de não terem domínio da língua que está sendo utilizada, e não pelo fato de serem surdos. No entanto, entende-se que é necessário desenvolver concomitantemente com o estudo da matemática, o estudo da Língua Portuguesa (leitura e escrita), visto que em diferentes situações sociais, acadêmica e profissional, será relevante a compreensão da Língua Portuguesa, por parte destes estudantes.

Ademais, Lodi (2011) afirma que aprender uma segunda língua depende dos repertórios semânticos da primeira língua, e Granell (1997) salienta que aprender a Linguagem Matemática é como aprender um segundo idioma, conforme o conhecimento vai sendo dominado, menos estrangeiro se torna. Isto posto, entende-se a importância de se trabalhar em Libras textos matemáticos, escritos em Língua Portuguesa para que o estudante compreenda o significado das palavras e possa entender a atividade, e assim desenvolva a habilidade em ?traduzir? a Língua Portuguesa para Libras e compreenda o significado na Linguagem Matemática.

Em síntese, pode-se afirmar que esta atividade proposta não propiciou a estratégia de trabalho em grupo. Além disso, diante da postura individualizada dos estudantes a professora buscou instigar o grupo, ou mediar o problema da não interação, propondo que dois estudantes explicitassem suas estratégias de resolução. Isto promoveu uma possibilidade de discussão entre os dois estudantes. Em relação, à escrita da Língua Portuguesa notou-se que, todos os estudantes conseguiram registrar sua estratégia de resolução, porém o grupo apresentou uma escrita com características peculiares, semelhante à escrita de um ?usuário estrangeiro? da Língua Portuguesa.

Sendo assim, entende-se a importância de se trabalhar textos da Língua Portuguesa em Libras. Desta forma, o estudante pode compreender o significado das palavras e desenvolver a habilidade em ?traduzir? os enunciados propostos em Língua Portuguesa escrita, para Libras, e compreender o significado na Linguagem Matemática.

Em relação ao objetivo da atividade, compreender a relação entre as grandezas e a noção de proporcionalidade, nota-se pelas respostas apresentadas nos protocolos que todos os estudantes conseguiram compreender a relação entre as grandezas, isto é, que ao aumentar a quantidade de pães era necessário aumentar o valor a ser pago, também perceberam a proporcionalidade, ou seja, o valor a ser pago era proporcional à quantidade de pães. Destaca-se que os 13 estudantes acertaram as respostas da atividade.

ATIVIDADE (2)

Esta atividade buscou desenvolver no estudante surdo a habilidade em compreender a relação que abrange: relação das grandezas, observar a regularidade e generalizar usando a representação algébrica.

A professora questionou se algum estudante tinha tentando responder esta atividade em casa. Todos responderam que não. Logo, a professora fez a sinalização da atividade (quadro 5) em Libras e solicitou que discutissem com o colega do lado as respostas, porém todos os estudantes adotaram uma postura individualizada em todos os itens.


Quadro 2:
Enunciado da atividade
( NEVES, 2008).

A professora solicitou que um voluntário explicasse para a turma sua resposta para esta atividade. O estudante A13 se apresentou, conforme diálogo:

A13: FÁCIL, TAXA TRÊS REAIS SEMPRE, DOIS REAIS DEPENDER.

(Estudante vai até a lousa e escreve 13-3=10) TRÊS REAIS TIRAR TAXA

PRÓPRIO, DEZ REAIS SOBRAR (estudante escreve novamente na

lousa 10:2= 5) CINCO QUILOMETRO CONSEGUE, CINCO VEZES DOIS IGUAL DEZ, DEZ SOMAR TRÊS IGUAL TREZE REAIS.

PROFESSORA: QUEM RESPOSTA DIFERENTE?

TODOS OS ESTUDANTES: EU RESPOSTA IGUAL.

PROFESSORA: QUEM QUER RESPONDER B?

A13: EU CONTINUAR, FÁCIL, DOIS VEZES QUINZE IGUAL TRINTA (escreve na lousa 2x15=30) TRÊS REAIS SOMAR TRINTA IGUAL TRINTA ETRÊS (escreve na lousa 30+3=33) EXPRESSÃO APLICAR DOIS REAIS PAGAR VEZES QUINZE QUILOMETROS SOMAR TRÊS REAIS ( escreve na lousa: taxa 3 reais + 2x 15 km = 33 ).

A1, A2, A3, A7, A11, A12: EU RESPONDER IGUAL.

PROFESSORA: QUEM RESPOSTA DIFERENTE?

(Diálogo entre estudantes e professora-pesquisadora, 2016)

Os protocolos apresentados mostram que todos os estudantes compreenderam a relação entre as grandezas, isto é, que ao aumentar a quilometragem o valor a ser pago aumenta, pois, o valor a ser pago está em função da quilometragem rodada. Também perceberam a regularidade, ou seja, para cada quilômetro rodado é necessário pagar dois reais.


Figura 4:
Resposta do estudante A13.
Protocolo das atividades.

Em relação à representação algébrica, os estudantes compreenderam o que tinha sido solicitado no item (c), no entanto, é possível verificar, como ilustrado na figura 4, que o estudante primeiro faz uma tradução da situação para a Língua Portuguesa, com sinais da Linguagem Matemática: ?taxa + v. Km?, (valor inicial da corrida, mais o valor do quilômetro vezes a quantidade rodada), para depois escrever a representação algébrica. Para Granell (1998), este é um procedimento para a compreensão das linguagens, isto é, o estudante consegue fazer a tradução da língua natural para a Linguagem Matemática e vice-versa. Neste caso, é possível afirmar que por meio da Libras e da Língua Portuguesa 10 dos 13 estudantes surdos conseguiram compreender o significado da Linguagem Matemática nesta atividade.

Em síntese, nesta atividade, os estudantes adotaram uma postura de trabalho individual, possivelmente em resultado da atividade não ter características de uma atividade necessariamente para ser desenvolvida em grupo. Outro aspecto é o fato de nesta atividade os estudantes já estarem mais familiarizados com os significados das palavras, pois não houve questionamento do significado de palavras específicas. Pode-se afirmar que os objetivos da atividade em compreender a relação das grandezas, observarem a regularidade e generalizar usando a representação algébrica, foram atingidos, pois foi notado pelas respostas apresentadas nos protocolos, que todos os estudantes conseguiram compreender a relação entre as grandezas, isto é, que o valor a ser pago estava em função da quilometragem rodada, bem como, perceberam a regularidade, ou seja, para cada quilômetro rodado era necessário pagar dois reais. Além do mais, 11 dos 13 estudantes conseguiram apresentar uma representação algébrica para a situação pedida.

Então, a partir da análise das atividades desenvolvidas é possível afirmar que a leitura das atividades em Língua Portuguesa, pelos estudantes surdos, possibilitou uma compreensão parcial do que estava sendo solicitado. Foi necessário para uma melhor compreensão à sinalização em Libras de todas as atividades. Além disso, o grupo demonstrou preocupação em entender o significado isolado das palavras, ao invés de entender o contexto. Em relação, à escrita da Língua Portuguesa percebeu-se que, embora apresente falta de proficiência na escrita, todos os estudantes conseguiram registrar suas ideias de estratégias para a resolução das atividades. Ressalta-se, que para o leitor compreender o que o estudante surdo escreveu, é necessário conhecimento da comunicação em Libras.

Também, notou-se que o preenchimento das tabelas possibilitou que os estudantes percebessem a regularidade, embora não mostraram ter compreendido o que estava sendo observado. Sempre que possível os estudantes preferiam utilizar o desenho para mostrar a estratégia de resolução, conforme observado na primeira atividade. Para mais, embora tenha sido solicitado o desenvolvimento das atividades em grupo, os estudantes resolveram de forma individual. Esta situação pode ser explicada pelo fato das atividades não estimularem discussões e a necessidade da interação entre os colegas para resolvê-las.

Em relação aos objetivos das atividades de desenvolver no estudante surdo a Linguagem Matemática, por meio do estudo algébrico, apresentando o estudo da noção de variação entre grandezas, dependência, regularidade e da generalização, observou-se pelo registro das aulas gravadas em vídeos e pelas respostas apresentadas nos protocolos, que os 13 estudantes conseguiram compreender a variação e a relação entre as grandezas, 12 estudantes perceberam as regularidades envolvidas, ademais, na primeira atividade oito estudantes conseguiram fazer a representação algébrica, já na segunda atividade 11 conseguiram. Destaca-se ainda, que oito estudantes responderam todas as atividades corretamente, três estudantes responderam mais de um item erroneamente, logo, pode-se afirmar que os objetivos das atividades foram atingidos por grande parte dos alunos.

ATIVIDADE (1)

Esta atividade buscou desenvolver no estudante surdo a habilidade em compreender a relação entre as grandezas 1 e a noção de proporcionalidade.

Foi solicitado que os estudantes retomassem os grupos iniciais: o grupo A com sete estudantes e o grupo B com seis estudantes.

8. CONSIDERAÇÕES

A partir da análise das atividades desenvolvidas, é possível afirmar que a sinalização de tais na Língua Brasileira de Sinais ? Libras foi essencial para o grupo de estudantes surdos compreenderem o que estava sendo solicitado. Algumas das atividades tinham palavras da Língua Portuguesa usada na matemática, que não possui um sinal correspondente em Libras, de modo que a professora-pesquisadora buscou apresentar o significado de tais palavras.

Foi percebido que embora todas as atividades tenham sido sinalizadas, em algum momento durante o desenvolvimento delas, todos os estudantes surdos sentiram a necessidade de fazer a sua leitura, na Língua Portuguesa. Alguns buscavam nesta leitura auxilio para escrita, outros procuravam palavras já conhecidas que pudessem ajudá-los na resolução da atividade. Então, entende-se a importância de se trabalhar textos matemáticos escritos em Língua Portuguesa, em Libras, estando desse modo em conformidade com a proposta bilíngue, assim o estudante surdo poderá desenvolver a habilidade de ?traduzir? a Língua Portuguesa para Libras e vice-versa, compreendendo o significado da Linguagem Matemática.

Neste contexto, os estudantes surdos demonstraram interesse em aprender novas palavras, em conceituá-las, isso tem como aspecto positivo o enriquecimento do vocabulário, fator fundamental para o desenvolvimento da Linguagem Matemática, haja vista que é relevante para o estudante independente de ser surdo ou ouvinte dominar o significado de termos matemáticos. O fator negativo é que, em muitos momentos o significado isolado das palavras se mostrou mais importante do que a compreensão do texto como um todo, porém, as palavras quando são isoladas de um contexto podem conduzir o leitor a interpretações errôneas, já que o significado das palavras depende do contexto.

Leva-se em consideração que a Língua Portuguesa se apresenta para o surdo como uma segunda língua, consequentemente, a leitura e a escrita apresentada pelo grupo, foi semelhante à de um ?estrangeiro? que é usuário da Língua Portuguesa no Brasil. De modo que, para o leitor compreender a escrita do estudante surdo, é necessário conhecimento da Libras.

Concernente aos objetivos das atividades pode-se afirmar que elas contribuíram para o processo de ensino-aprendizagem da Linguagem Matemática, por meio do estudo algébrico, apresentando o estudo das funções como forma de compreensão da noção de variação entre grandezas, dependência, regularidade e da generalização. Pelas estratégias de resoluções adotadas pelo grupo, é possível afirmar que os estudantes surdos quando são postos nas mesmas condições de aprendizagem dos estudantes ouvintes, o sucesso na resolução da atividade também acontece.

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Notas

1 As grandezas consideradas nesta atividade são a quantidade de pão e o valor a ser pago.

Autor notes

Licenciada em Matemática (2010) pela Universidade Camilo Castelo Branco-UNICASTELO. Especialista em Educação Especial com Ênfase em Deficiência Auditiva (2016) - Faculdade Eficaz de Maringá. Mestre em Ensino de Ciências e Matemática (2016) -Instituto Federal de São Paulo- IFSP. Atuando principalmente nos seguintes temas: Surdos; Libras; Ensino de Matemática para Estudantes Surdos; Formação Docente; Professores Bilíngues.
Licenciado em Matemática pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2002). Bacharel em Ciências da Computação (1997). Especialização em Matemática - Álgebra Linear - (2001). Mestrado em Educação Matemática pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2002). Doutorado em Educação Matemática pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2006). Professor titular do departamento de Matemática do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP). Atua na formação de professores de Matemática. Membro da Sociedade Brasileira de Educação Matemática. Atuou como vice-coordenador do GT 7: Formação de Professores que Ensinam Matemática nas gestões de 2010/2012 e 2013/2015. Professor do Programa de Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática de São Paulo. Líder do Grupo de Pesquisa: Educação Matemática e Profissional - IFSP. Desenvolve pesquisas com os temas: Currículo e a Formação de Professores de Matemática e Educação Inclusiva: matemática e o estudante surdo.

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