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Problemas com mais do que uma solução – seu contributo para o desenvolvimento metacognitivo dos estudantes e da sua capacidade de comunicar matematicamente
Problems with more than one solution - its contribution to the metacognitive development of students and their capacity to communicate matematically
Problemas con más de una solución: su contribución al desarrollo metacognitivo de los estudiantes y su capacidad de comunicarse matemáticamente
Revista de Educação Matemática, vol.. 17, núm. 1, 2020
Sociedade Brasileira de Educação Matemática

Seção Temática: Resolução de Problemas na Educação Matemática

Revista de Educação Matemática
Sociedade Brasileira de Educação Matemática, Brasil
ISSN: 2526-9062
ISSN-e: 1676-8868
Periodicidade: Cuatrimestral
vol. 17, núm. 1, 2020

Recepção: 22 Julho 2019

Aprovação: 29 Janeiro 2020

Publicado: 01 Maio 2020

Copyright Revista de Educação Matemática 2020.

Este trabalho está sob uma Licença Creative Commons Atribuição-NãoComercial 4.0 Internacional.

Resumo: O tema da comunicação matemática tem vindo a ser um aspeto importante a ser promovido nas aulas de Matemática em Portugal deste há muito tempo até à presente data. Colocar os estudantes na condição de poderem e deverem utilizar argumentos comunicacionais válidos para justificarem as suas tomadas de decisão na resolução de tarefas matemáticas é algo que tem vindo a ser promovido ao nível das políticas educativas portuguesas, designadamente através dos últimos Programas de Ensino Básico. Assim, este artigo visa, precisamente, contribuir para uma reflexão importante sobre esta temática, propondo como algo inovador que os docentes procurem proporcionar aos seus estudantes a resolução de problemas que permitam mais do que uma solução válida, em detrimento da resolução de problemas de resposta única. Com essa intenção pedagógica estarão, certamente, a criar as condições para que os estudantes possam, efetivamente, propor resoluções diferentes das dos seus colegas, bem como propor, cada um deles, mais do que uma solução, tendo que apresentar sempre os argumentos que validem as suas tomadas de decisão. Do ponto de vista metodológico serão apresentados nove problemas que possibilitam mais do que uma resolução, problemas esses, da autoria dos autores deste artigo. A seleção destes problemas, que agora são objeto desta nossa análise, também teve em linha de conta a ideia de se abordar mais do que uma área temática da Matemática. Assim, os três primeiros problemas estão afetos ao tema da Geometria e Medida, os três seguintes ao tema dos Números e Cálculo e os três últimos ao tema da Lógica Matemática. Apresentaremos, para cada caso, várias resoluções possíveis, da nossa autoria, para ilustrarmos a riqueza pedagógica que estes problemas suscitam, quer ao nível da Comunicação Matemática como ao nível da Metacognição. Como consequência desta sugestão metodológica, estar-se-á a contribuir para o desenvolvimento metacognitivo de cada resolvedor, ao tomarem conhecimento dos seus processos cognitivos e usá-los adequadamente de modo a que possam promover a sua condição de resolvedores de problemas e de comunicadores de Matemática.

Palavras-chave: comunicação matemática, resolução de problemas, metacognição.

Abstract: The subject of mathematical communication has been an important aspect to be promoted in Mathematics classes in Portugal of this long time until the present date. Placing students on the condition that they can and should use valid communicative arguments to justify their decision making in solving mathematical tasks is something that has been promoted at the level of Portuguese educational policies, namely through the latest Basic Education Programs. Thus, this article aims precisely to contribute to an important reflection on this theme, proposing as something innovative that teachers seek to provide their students with problem solving that allow more than a valid solution, to the detriment of the problem solving with only one response. With this pedagogical intention there will certainly be conditions for students to effectively propose resolutions different from those of their colleagues, as well as to propose each of them more than a solution, having to always present the arguments that validate their decision-making. From the methodological point of view, nine problems will be presented that enable more than one resolution, problems that were authored by the authors of this article. The selection of these problems, which are now the subject of our analysis, also took into account the idea of ​​addressing more than one thematic area of ​​Mathematics. Thus, the first three problems are related to the theme of Geometry and Measurement, the next three to the theme of Numbers and Calculus and the last three to the theme of Mathematical Logic. We will present, for each case, several possible resolutions, of our authorship, to illustrate the pedagogical wealth that these problems raise, both at the level of Mathematical Communication and at the level of Metacognition. As a consequence of this methodological suggestion, it will also contribute to the metacognitive development of each student, as they become aware of their cognitive processes and use them properly so they can promote their problem solving condition and math communicators.

Keywords: mathematical communication, problem solving, metacognition.

Resumen: El tema de la comunicación matemática ha sido un aspecto importante para ser promovido en las clases de Matemáticas en Portugal desde largo tiempo hasta la fecha actual. Poner a los estudiantes en la condición de que puedan y deban usar argumentos comunicativos válidos para justificar su toma de decisiones en la resolución de tareas matemáticas es algo que se ha promovido a nivel de las políticas educativas portuguesas, a través de los últimos Programas de Educación Básica. Por lo tanto, este artículo apunta precisamente a contribuir a una importante reflexión sobre este tema, proponiendo como algo innovador que los docentes buscan brindar a sus alumnos la solución de problemas que permitan más que una solución válida, en detrimento de la resolución de problemas de una sola respuesta. Con esta intención pedagógica, ciertamente habrá condiciones para que los estudiantes propongan efectivamente resoluciones diferentes a las de sus colegas, así como para proponer cada uno de ellos más que una solución, teniendo que presentar siempre los argumentos que validan su toma de decisiones. Desde el punto de vista metodológico, se presentarán nueve problemas que permiten más de una resolución, problemas que fueron escritos por los autores de este artículo. La selección de estos problemas, que ahora son el tema de nuestro análisis, también tuvo en cuenta la idea de abordar más de un área temática de las matemáticas. Por lo tanto, los primeros tres problemas están relacionados con el tema de Geometría y Medición, los siguientes tres con el tema de Números y Cálculo y los últimos tres con el tema de Lógica Matemática. Presentaremos, para cada caso, varias posibles resoluciones, de nuestra autoría, para ilustrar la riqueza pedagógica que plantean estos problemas, tanto a nivel de comunicación matemática como a nivel de metacognición. Como consecuencia de esta sugerencia metodológica, también contribuirá al desarrollo metacognitivo de cada estudiante, al conocer sus procesos cognitivos y usarlos de manera adecuada para que puedan promover su condición de solucionadores de problemas y de comunicadores matemáticos.

Palabras clave: comunicación matemática, solución de problemas, metacognición.

Introdução

A resolução de problemas tem sido uma área forte de investigação na Educação Matemática em Portugal desde os últimos trinta anos. Na década de noventa do século passado, importantes estudos foram produzidos, como sejam os de Pires (1992), Boavida (1993), Porfírio (1993), Oliveira (1993), Vale (1993), Fonseca (1995) e Graça (1995). Esses estudos privilegiaram o campo da comunicação matemática e abordaram outros aspetos tão distintos, como (a) os processos de resolução de problemas, (b) as representações pessoais dos professores, (c) a formulação de problemas, (d) as conceções e as práticas dos professores e (e) a avaliação em resolução de problemas.

Também nesse período temporal foram realizados estudos em que se associava a temática da resolução de problemas ao tema da metacognição, de onde destacamos os de Borralho (1990), Santos (1993) e Afonso (1995).

A relevância a dar ao tema da resolução de problemas e à comunicação matemática teve o seu culminar no Programa de Matemática do Ensino Básico, de 2007, de onde se podem ler os seguintes objetivos gerais:

Os alunos devem ser capazes de resolver problemas. Isto é, devem ser capazes de:

• compreender problemas em contextos matemáticos e não matemáticos e de os resolver utilizando estratégias apropriadas;

• apreciar a plausibilidade dos resultados obtidos e a adequação ao contexto das soluções a que chega;

• monitorizar o seu trabalho e reflectir sobre a adequação das suas estratégias, reconhecendo situações em que podem ser utilizadas estratégias diferentes;

• formular problemas.

A resolução de problemas é uma actividade privilegiada para os alunos consolidarem, ampliarem e aprofundarem o seu conhecimento matemático. Neste processo, os alunos devem compreender que um problema matemático, frequentemente, pode ser resolvido através de diferentes estratégias e dar atenção à análise retrospectiva da sua resolução e apreciação das soluções que obtêm (PONTE; SERRAZINA; GUIMARÃES; BREDA; GUIMARÃES, SOUSA; MENEZES; MARTINS, OLIVEIRA, 2007, p. 6).

Os alunos devem ser capazes de comunicar as suas ideias e interpretar as ideias dos outros. Isto é, devem ser capazes de:

• interpretar enunciados matemáticos formulados oralmente e por escrito;

• usar a linguagem matemática para expressar as ideias matemáticas com precisão; • descrever e explicar, oralmente e por escrito, as estratégias e procedimentos matemáticos que utilizam e os resultados a que chegam;

• argumentar e discutir as argumentações de outros;

• organizar e clarificar o seu pensamento matemático através da comunicação.

Os alunos devem ser capazes de, oralmente e por escrito, descrever a sua compreensão matemática, os procedimentos matemáticos que utilizam, e explicar a sua argumentação, o seu trabalho e o seu raciocínio, bem como interpretar e analisar a informação que lhes é transmitida por diversos meios. Estas capacidades desenvolvem-se comunicando por uma variedade de formas e reflectindo sobre processo de comunicação (PONTE; SERRAZINA; GUIMARÃES; BREDA; GUIMARÃES, SOUSA; MENEZES; MARTINS, OLIVEIRA, 2007, p. 5).

Passados seis anos, o atual programa de Matemática do Ensino Básico (2013) voltou a enfatizar explicitamente o tema da comunicação matemática e o da resolução de problemas:

Comunicação matemática – Oralmente, deve-se trabalhar com os alunos a capacidade de compreender os enunciados dos problemas matemáticos, identificando as questões que levantam, explicando-as de modo claro, conciso e coerente, discutindo, do mesmo modo, estratégias que conduzam à sua resolução. Os alunos devem ser incentivados a expor as suas ideias, a comentar as afirmações dos seus colegas e do professor e a colocar as suas dúvidas. Sendo igualmente a redação escrita parte integrante da atividade matemática, os alunos devem também ser incentivados a redigir convenientemente as suas respostas, explicando adequadamente o seu raciocínio e apresentando as suas conclusões de forma clara, escrevendo em português correto e evitando a utilização de símbolos matemáticos como abreviaturas estenográficas (BIVAR; GROSSO; OLIVEIRA; TOMÓTEO, 2013, p. 5).

Resolução de problemas – A resolução de problemas envolve, da parte dos alunos, a leitura e interpretação de enunciados, a mobilização de conhecimentos de factos, conceitos e relações, a seleção e aplicação adequada de regras e procedimentos, previamente estudados e treinados, a revisão, sempre que necessária, da estratégia preconizada e a interpretação dos resultados finais. Assim, a resolução de problemas não deve confundir-se com atividades vagas de exploração e de descoberta que, podendo constituir estratégias de motivação, não se revelam adequadas à concretização efetiva de uma finalidade tão exigente. Embora os alunos possam começar por apresentar estratégias de resolução mais informais, recorrendo a esquemas, diagramas, tabelas ou outras representações, devem ser incentivados a recorrer progressivamente a métodos mais sistemáticos e formalizados. Em particular, no 1.º ciclo, solicita-se explicitamente que o número de passos necessários à resolução dos problemas vá aumentando de ano para ano. É fundamental que os alunos não terminem este ciclo de ensino conseguindo responder corretamente apenas a questões de resposta imediata. Estudos nacionais e internacionais recentes, como o Trends in International Mathematics and Science Study (TIMSS), mostram que, em 2011, 60% dos alunos portugueses do 4.º ano não conseguem ultrapassar esse patamar (Intermediate International Benchmark) (BIVAR; GROSSO; OLIVEIRA; TOMÓTEO, 2013, p. 5).

Mais recentemente (2017) surgiu uma obra de referência da Associação de Professores de Matemática, numa tradução para Portugal dos Princípios para a Ação do NCTM sobre o que deve ser feito para se assegurar a todos o sucesso em Matemática. Um desses princípios é, precisamente, “propor tarefas que promovam o raciocínio e a resolução de problemas” (APM., p. 17).

Os problemas propostos

Os nove problemas que a seguir analisamos, da autoria dos autores deste artigo, podem ser associados aos seguintes blocos temáticos: Geometria e Medida, Números e Cálculo e em Lógica Matemática. O critério que presidiu à sua seleção foi, precisamente, o facto de possibilitarem mais do que uma solução, permitindo, assim, a troca de opiniões entre resolvedores e o desenvolver o conhecimento que o indivíduo tem sobre os seus próprios processos cognitivos, tomando consciência da sua existência (metacognição) no que respeita às estratégias de resolução a utilizar e à mobilização de conhecimentos que as mesmas exigem.

As várias resoluções que iremos apresentar são da autoria dos autores deste artigo e visam evidenciar a riqueza pedagógica que estes problemas podem suscitar ao serem utilizados em contexto de sala de aula ou em contexto da formação inicial ou contínua de professores de Matemática. As resoluções apresentadas não esgotam a riqueza pedagógica destes recursos de aprendizagem, porque outras resoluções poderão surgir quando implementados e explorados em contexto formativo ou de sala de aula de Matemática.

A – Problemas de Geometria e Medida:


Figura 1
A ampulheta como medidor de tempo
autores (2019)

O problema da Figura 1 poderá ser resolvido utilizando-se, por exemplo, uma argumentação do tipo: usam-se as ampulhetas de 8 minutos e de 2 minutos em simultâneo e quando a de 2 esgotar sabemos que faltam 6 à de 8 e põe-se o bolo no forno. Assim que terminar os 6 minutos (da ampulheta do 8) vira-se a de 5 e no final perfaz 11 minutos. Mas esta não é a única resposta possível, face ao desafio colocado. Outra possibilidade poderia ser a seguinte: usam-se a de 5 e a de 2. Quando faltarem 3 minutos à de 5 põe-se o bolo no forno e a seguir conta-se com a dos 8 minutos. O total será 11 minutos.

Eis outra possibilidade de resposta: usa-se a de 2, duas vezes simultaneamente com a de 5. Depois usa-se 1 minuto restante da de 5, a de 2 e por fim a de 8. O total será 11 minutos.

Não se usando a ampulheta dos 8 minutos, o problema também é possível ser resolvido com a utilização apenas das outras duas ampulhetas. Vejamos: usa-se três vezes a de 2 minutos e, de seguida, uma vez a de 5 minutos, o que dá um total de 11 minutos gastos.

O mesmo também é possível se não se usar a ampulheta dos 2 minutos e apenas se usarem as restantes ampulhetas: antes de se ligar o forno, colocam-se as duas ao mesmo tempo. Quando passarem 5 minutos liga-se o forno pelos 3 minutos que faltam da de 8 e depois usa-se novamente a de 8.

Este tipo de problema possibilita que em contexto de sala de aula estas ou outras propostas de resolução possam ser apresentadas por vários estudantes, gerando-se a necessidade de justificarem as suas propostas e, simultaneamente, analisarem se as que são propostas pelos colegas são ou não igualmente válidas.

Em termos metacognitivos, este problema desafia o próprio resolvedor a “dialogar” consigo mesmo, no sentido de analisar se a sua resolução é ou não única, é ou não válida, antes mesmo de a apresentar à restante turma e ao docente.


Figura 2
Haverá algum intruso?
autores (2019).

O problema da Figura 2 também poderá gerar várias respostas, pois cada um dos elementos do conjunto pode ser intruso, dependendo do critério que se utilize para se fazer essa avaliação, seja ele a altura das figuras, a cor das mesmas, a forma de cada uma ou o seu contorno. Assim, quanto à cor, a figura vermelha é a única que não é verde; quanto à forma, o círculo é o único que não é triângulo, em termos de contorno só há uma figura que não tem linha de contorno bem definida e quanto à altura, apenas existe uma figura mais pequena que as demais. Assim, este problema possibilitava esta resposta completa ou cada um dos 4 aspetos em separado.

Além destes aspetos, também era possível avançar com a ideia da distância das figuras à pessoa que as observa, havendo apenas uma posicionada a uma maior distância do observador do que as outras.

Dado que há apenas uma figura que, aparentemente, não é referenciada como sendo intrusa, que é a primeira do lado esquerdo, esta também poderá ser considerada intrusa precisamente por isso mesmo, isto é, todas as outras destoam das demais em alguma coisa menos esta. Assim sendo, será legítimo que cada uma das cinco figuras possa ser considerada intrusa, o importante é que quem as propuser como tal, seja capaz de justificar muito bem a sua tomada de decisão. Obviamente que com esta postura de resolvedor estar-se-á a promover a capacidade de comunicação matemática.


Figura 3
Os Canteiros do Sr. Relvas
autores (2019)

O problema da Figura 3 é mais um problema que permite mais do que uma resposta. Uma delas é mencionarem-se os elementos n.º 23 e o n.º 4, sendo que os 6 canteiros resultantes não mantêm todos a forma original. O mesmo se passa se os elementos de madeira selecionados forem o n.º 7 e o n.º 21 ou o n.º 6 e o n.º 12.

Por outro lado, no caso de os canteiros resultantes continuarem a manter o formato dos canteiros originais, então, também aqui há várias possibilidades de resposta, pois podem ser: (a) os elementos n.º 20 e n.º 8; (b) os elementos n.º 5 o n.º 22, (c) o n.º 5 e o n.º 18, (d) o n.º 8 e o n.º 18 e (e) o n.º 8 e o n.º 22.

Trata-se, pois, de um problema muito rico, que obriga à necessidade de se analisarem as várias figuras planas que, ao nível do espaço são representações dos canteiros do Sr. Relvas. A justificação de, no final, os canteiros ficarem ou não com o formato original também é necessário ser referido e justificado. Além de tudo isto, uma vez mais os resolvedores terão de ter a capacidade de avaliarem as outras propostas de resolução a serem apresentadas, provenientes de outros estudantes, e assumir que poderão ser tão válidas quanto as que por si forem apresentadas.

B – Problemas de Números e Cálculo


Figura 4
Olhando mais do que que uma vez, descobrimos coisas novas
autores (2019)

Uma vez mais, o problema da Figura 4 é propício à apresentação de mais do que uma resposta possível para a sua resolução. O intruso poderá ser o 100, por ser o único cuja soma dos dígitos que o forma não pertencer à sequência numérica resultante das somas dos dígitos que formam os outros números:

1 + 2 + 5 = 8

2 + 1 + 6 = 9

6 + 4 = 10

Por outro lado, alguém poderá responder que o 100 é o número intruso, mas devido a outra razão, ser o único que não é um número cúbico. De facto, os restantes três números são números cúbicos:

64 = 4 x 4 x 4

125 = 5 x 5 x 5

216 = 6 x 6 x 6

Dependendo da criatividade do resolvedor, poderão surgir sugestões mais ou menos complexas do ponto de vista do conhecimento matemático envolvendo os números e o cálculo. Assim, duas respostas bem simples e, igualmente corretas, seriam as que referissem que o 64 é o único número que na sua composição não contempla o algarismo 1, ou o 125 por ser o único número ímpar.

Já uma resposta mais complexa, que denota o conhecimento dos tipos de números, designadamente os figurados, seria a seguinte: Pode ser o 216, já que se ordenarmos os números por ordem crescente, é o único número cuja diferença para o anterior não é um número quadrado. De facto:

125 – 100 = 25 = 5 x 5

100 – 64 = 36 = 6 x 6

Por outro lado, também poderia ser referido o 125 como sendo o intruso, por ser o único que não é divisível por 4.

Em síntese, o confronto desta variedade de respostas possíveis face ao problema colocado permitiria, uma vez mais, gerar o debate de ideias, a análise metacognitiva das propostas dadas por cada resolvedor e permitiria, em última análise, o desenvolvimento da capacidade de se comunicar matematicamente.


Figura 5
Descoberta Numérica
autores (2019)

O problema da Figura 5 tira partido do conhecimento de vários conceitos matemáticos, como seja o conceito de “parte de”, número ímpar, média aritmética, número ordinal e permite estabelecer a diferença entre algarismo e número.

Apresentamos algumas respostas possíveis, dependendo da interpretação dada à posição do 1.º algarismo. Se este for colocado à esquerda, as respostas possíveis poderão ser as seguintes: (a) 204682 e (b) 202886. Dado que nada é referido sobre a possibilidade ou não de se repetirem algarismos, então a opção (b) também é válida. Se o 1.º algarismo for o da ordem das unidades do número, então poderá haver as seguintes soluções: (c) 286402 e (d) 688202. Neste problema valerá a pena solicitar justificação para a colocação do último algarismo, porque ele depende da opção que se tomar para o 3.º e para o 4.º algarismo. Haverá, pois, a necessidade de, em particular, se justificar qual o número a colocar na 6.ª posição.


Figura 6
À Procura da Soma 30
autores (2019).

O problema da Figura 6 relaciona-se com o tema da decomposição do número em parcelas. No caso vertente, a soma procurada é o valor 30. Usando-se a malha numérica existente no enunciado do problema e partindo-se do pressuposto que só é possível unir dois algarismos adjacentes, então eis algumas respostas possíveis usando-se apenas 5 parcelas:

1 + 8 + 7 + 9 + 5

2 + 5 + 8 + 6 + 9

2 + 6 + 8 + 9 + 5

5 + 4 + 7 + 9 + 5

5 + 8 + 2 + 6 + 9

5 + 8 + 6 + 2 + 9

Usando-se 6 parcelas, de entre as respostas corretas possíveis, destacamos as seguintes:

1 + 2 + 7 + 8 + 3 + 9

1 + 5 + 4 + 7 + 8 + 5

1 + 5 + 8 + 9 + 5 + 2

1 + 7 + 8 + 3 + 2 + 9

2 + 6 + 8 + 2 + 3 + 9

2 + 7 + 6 + 2 + 8 + 5

2 + 7 + 6 + 8 + 2 + 5

5 + 1 + 4 + 7 + 8 + 5

5 + 1 + 8 + 2 + 5 + 9

5 + 1 + 8 + 2 + 9 + 5

5 + 2 + 1 + 7 + 6 + 9

Com o recurso à decomposição do 30 em 7 parcelas há mais algumas respostas corretas, das quais destacamos as seguintes:

1 + 2 + 6 + 7 + 3 + 9 + 2

1 + 2 + 7 + 6 + 3 + 2 + 9

1 + 2 + 7 + 6 + 3 + 9 + 2

2 + 1 + 6 + 7 + 3 + 2 + 9

Fica, pois, evidente que este problema é excelente para o desencadear de troca de opiniões e das respetivas justificações das tomadas de decisão que tiverem que ser feitas.

C – Problemas de Lógica Matemática


Figura 7
A próxima peça será…
autores (2019).

O problema da Figura 7 implica dar resposta à frase “se …, então…”, pelo que se trata de um bom exemplo para que os resolvedores expliquem como pensaram. Eis algumas respostas corretas que este problema poderá admitir:

– 4 e 5, pois o 4 dá continuidade à sequência 2, 3,.. e o 5 dá continuidade à sequência 1, 3, …

– Outra possibilidade poderia ser uma peça cuja soma dos dois valores numéricos aí existente fosse 9, pois a soma das pintas da 1.ª peça é 3, a soma das pintas na 2.ª peça é 6, pelo que a terceira peça poderia ser (1,8); (8,1); (2,7); (7,2); (3,6); (6,3) ou (4,5); (5,4).

- Do modo análogo, a soma das pintas da 3.ª peça poderia ser 12, dobrando esta soma a soma da 2.ª peça, pois a soma da 2.ª peça dobra a soma da 1.ª peça. Assim, a peça seria formada pelo 6 e 6.

- Existe, também, a possibilidade de ser a peça 5 e 4, sendo o 5 a soma de 2 com 3 e 4 a soma de 1 com 3 ou a peça 6 e 3, sendo o 6 o produto de 2 por 3 e o 3 o produto de 1 por 3.

– Contudo se se imaginar que o número de pintas na parte de cima da peça é o número dessa posição da peça anterior mais uma unidade e o número de pintas do monominó de baixo é soma de todas as pintas da peça anterior, então a peça seguinte poderá ser a peça 4 e 6.

Haja, pois, criatividade por parte dos resolvedores e outras soluções possíveis serão suscetíveis de ocorrer e estarem, igualmente, corretas.


Figura 8:
Os Mealheiros do João e da Joana
autores (2019)

O problema da Figura 8 poderá ter uma resolução teórica, baseada no domínio de procedimentos de cálculo algébrico, como evidenciamos a seguir:

Dado que 10 é o dobro de 5, poder-se-á inferir que a quantidade de notas do João é um múltiplo de 5, isto é, 5x. Por sua vez a quantidade de notas do mealheiro da Joana será um múltiplo de 20, isto é, 20y.

A Joana só pode retirar dois terços das suas notas quando tiver no mínimo 3 notas e nessa altura ficaria no mealheiro apenas uma nota (20€). Este valor corresponde a metade da poupança do João, o que nos leva a concluir que a sua poupança seria de 40€. De facto esta poupança seria possível apenas com notas de 5€ e 10€.

Poder-se-á então concluir que a poupança mínima do João seria 40€ (dobro de 20€) e a poupança da joana seria 60€ (triplo de 20€).

O mesmo será verdade se o valor total do dinheiro do João for 80 euros e o da Joana for 120 euros, pois metade de 80 é igual a um terço de 120. Por este motivo, o mealheiro do João poderia ter 80 euros e o da Joana 120 euros.

Seria interessante se os alunos concluíssem que este problema terá sempre solução se a quantidade de dinheiro do mealheiro do João for um múltiplo de 40 e a quantidade de dinheiro do mealheiro da Joana for um múltiplo de 60 euros.

O Quadro 1 permite estabelecer a respetiva relação algébrica entre os dois montantes:



Quadro 1

Relação entre o dinheiro do João e da Joana

autores (2019)

Em síntese, trata-se de um problema com um número infinito de soluções, possibilitando um debate interessante entre as várias propostas de solução que poderão surgir.


Figura 9
As Gaiolas do Sr. João
autor (2019)

O problema da Figura 9 é mais um problema que permite a existência de várias soluções, pois os números de aves da 1.ª e da 2.ª gaiolas estarão sempre dependentes do número de aves existentes na 3.ª gaiola. Sabendo-se, ainda, que 2 (x + 3) + (x + 3) + x, sendo x o número de aves existentes na 3.ª gaiola, tem de ser um número quadrado e que existem apenas 8 números quadrados maiores que 1 e menores que 100 (4, 9, 16, 25, 36, 49, 64, 81), então 4x + 9 terá de ser um desses números quadrados. Isto implica que o número quadrado tenha de ser o quadrado de um número ímpar, maior que 3.

Assim, existem 3 possíveis soluções, os quadrados de 5, 7 e 9:

(a) – a 3.ª gaiola tem 4 aves;

– a 2.ª gaiola tem 7 aves;

– a 1.ª gaiola tem 14 aves.

Total de aves: 4 + 7 + 14 = 25, que é o quadrado de 5.

(b) – a 3.ª gaiola tem 10 aves;

– a 2.ª gaiola tem 13 aves;

- a 1.ª gaiola tem 26 aves.

Total de aves: 10 + 13 + 26 = 49, que é o quadrado de 7.

(c) – a 3.ª gaiola tem 18 aves;

– a 2.ª gaiola tem 21 aves;

– a 1.ª gaiola tem 42 aves.

Total de aves: 18 + 21 + 42 = 81, que é o quadrado de 9.

Em síntese, este problema possibilita rever o conceito de número quadrado e desenvolve a capacidade de os resolvedores relacionarem logicamente as premissas entre si, de modo a que possam comunicar as suas tomadas de decisão.

Considerações finais

O conjunto dos nove problemas analisados permite, de facto, que se possa concluir que poderão ser desencadeadores de resoluções diversas por parte de quem os tentar resolver. Em contexto de sala de aula de Matemática poderão permitir a troca de opiniões entre colegas, sendo que cada um deve ser encorajado a justificar as suas resoluções, quer seja oralmente, quer seja por escrito. Cabe aos professores incutir nos estudantes o hábito de metacognitivamente avaliarem as suas resoluções e motivá-los para procurarem identificar se os problemas lhes possibilitam a obtenção de mais do que uma solução. Este tipo de atitude poderá contribuir para que os estudantes possam aumentar e desenvolver o conhecimento que têm sobre os próprios processos cognitivos, bem como tomarem consciência desses processos (VALENTE, 1989).

Deixamos aqui o desafio de a totalidade ou alguns destes problemas poderem ser explorados em contexto de sala de aula de Matemática no sentido de se recolher informação sobre qual ou quais e quantas serão as resoluções que os alunos apresentam, bem como os argumentos que utilizam para justificarem essas mesmas resoluções.

Referências

AFONSO, Paulo. O Vídeo como recursos didáctico para a identificação e desenvolvimento de processos metacognitivos em futuros professores de matemática durante a resolução de problemas. Lisboa: APM, 1995.

APM. Princípios para a Ação. Assegurar a todos o sucesso em Matemática. Lisboa: Autor, 2017.

BIVAR, António; GROSSO, Lisboa; OLIVEIRA, Pedro; TIMÓTEO; Maria. Programa de Matemática para o Ensino Básico. Lisboa: Ministério da Educação e Ciência, 2013.

BOAVIDA, Ana. Resolução de problemas em educação matemática. Contributo para uma análise epistemológica e educativa das representações pessoais dos professores. Lisboa: APM, 1993.

BORRALHO, António. Aspectos metacognitivos na resolução de problemas de Matemática: proposta de um programa de intervenção. Lisboa: APM, 1990.

FONSECA, Lina. Três futuros professores perante a resolução de problemas: Concepções e processos utilizados. Lisboa: APM, 1995.

GRAÇA, Maria. Avaliação da resolução de problemas: Contributo para o estudo das relações entre as concepções e as práticas pedagógicas dos professores. Lisboa: APM, 1995.

OLIVEIRA, Maria. Os professores de Matemática e as resoluções de problemas. Três estudos de caso. Lisboa: APM, 1993.

PIRES, Maria. Processos de resolução de problemas. Uma abordagem à construção de conhecimento matemático por crianças do ensino primário. Lisboa: APM, 1992.

PONTE, João; SERRAZINA, Lurdes; GUIMARÃES, Henrique; BREDA, Ana; GUIMARÃES, Fátima; SOUSA, Hélia; MENEZES, Luís; MARTINS, Maria; OLIVEIRA, Paulo. Programa de Matemática do Ensino Básico. Lisboa: Ministério da Educação, 2007.

PORFÍRIO, Joana. A resolução de problemas na aula de Matemática: uma experiência no 7.º ano de escolaridade. Lisboa: APM, 1993.

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VALENTE, Maria. A Metacognição. Revista de Educação, 1 (3), p. 2-6, 1989.

Notas

[1] Doutor em Tecnologia Educativa pela Universidade de Salamanca (Espanha). Professor-Adjunto da Unidade Tecnico-Científica de Ciências, Desporto e Artes da Escola Superior de Educação - Instituto Politécnico de Castelo Branco - Portugal. Endereço para correspondência: pjmafonso@gmail.com.
[2] Licenciada em Biologia, Ramo Científico e Ramo Educacional e Curso de Formação Avançada do programa de doutoramento em Educação: área de especialização em Didática das Ciências Professor-Adjunto da Unidade Tecnico-Científica de Ciências, Desporto e Artes da Escola Superior de Educação - Instituto Politécnico de Castelo Branco – Portugal. Endereço para correspondência: dolores.alveirinho@ipcb.pt
[3] Mestre em Supervisão e Avaliação Escolar pelo Instituto Politécnico de Castelo Branco. Docente de Matemática e Ciências da Natureza do Agrupamento de Escolas Afonso de Paiva – Castelo Branco – Portugal. Endereço para correspondência: jmsmfilipe@gmail.com.
[4] Mestre em Educação Pré-Escolar e Ensino do 1.º Ciclo do Ensino Básico pelo Instituto Politécnico de Castelo Branco. Docente na Escola Superior de Educação de Castelo Branco de Castelo Branco e na Escola Tecnológica e Profissional Albicastrense – Portugal. Endereço para correspondência: nunomiguelsantos88@gmail.com.

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