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PATENTES DE MEDICAMENTOS E A INDÚSTRIA FARMACÊUTICA NACIONAL: ESTUDO DOS DEPÓSITOS FEITOS NO BRASIL
PHARMACEUTICAL PATENTS AND THE NATIONAL PHARMACEUTICAL INDUSTRY: A STUDY OF THE DEPOSITS MADE IN BRAZIL
Revista Produção e Desenvolvimento, vol.. 3, núm. 2, 2017
Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca

Articles

Revista Produção e Desenvolvimento
Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca, Brasil
ISSN-e: 2446-9580
Periodicidade: Frecuencia continua
vol. 3, núm. 2, 2017

Recepção: 03 Março 2017

Aprovação: 09 Junho 2017

Resumo: A lei dos Genéricos permitiu o crescimento das indústrias nacionais, porém o investimento em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (P,D&I) continuou, praticamente, nulo. Baseando-se neste cenário de fragilidade da indústria brasileira, realizou-se uma pesquisa em base de dados de documentos de patente, utilizando como metodologia, uma estratégia de busca, de acordo com a Classificação Internacional de Patente (CIP). Este levantamento, oriundo da análise dos documentos de patente obtidos, permitiu alcançar o objetivo do estudo, que foi apresentar a situação das indústrias farmacêuticas nacionais frente ao investimento em inovação. Os resultados encontrados sinalizam para a carência de investimentos em inovação no Brasil, permitindo concluir que o país é dependente das importações de medicamentos. Este fato posiciona as indústrias multinacionais em situação de superioridade, facilitando a prática de preços abusivos, já que estas se aproveitam da proteção patentária. Além disso, a falta de produção nacional coloca o paciente em risco, já que pode levar ao desabastecimento de determinados medicamentos importados.

Palavras-chave: pesquisa, desenvolvimento e inovação, patentes, mercado farmacêutico.

Abstract: The law of Generics allowed the growth of national industries, But investment in Research, Development and Innovation (P, D & I) remained practically null. Based on this scenario of fragility of the Brazilian industry, a research in database of patent documents, using as methodology, a search strategy, according to the International Patent Classification (IPC) was done. This survey, based on the analysis of the patent documents obtained, allowed us to reach the objective of the study, which is to introduce the situation of the national pharmaceutical industries in relation to investment in innovation. The results indicate the lack of investments in innovation in Brazil, allowing the conclusion that the country is totally dependent on the imports of medicines. This fact positions the multinational industries in a situation of superiority, facilitating the practice of abusive prices, since these take advantage of the patent protection

Keywords: Research, development and innovation, patents, pharmaceutical market.

INTRODUÇÃO

Empresas interessadas na competitividade do mercado, além de investirem em pesquisa, desenvolvimento e inovação (P,D&I), precisam avaliar a importância da propriedade intelectual (patente). As patentes são fontes de informação tecnológica e importante instrumento competitivo, em um mercado amplamente globalizado e acirrado. É considerada um ativo valioso, uma vez que garante o domínio da exploração monopolística de um produto ou processo, impedindo a entrada de concorrentes. ( FERREIRA, GUIMARÃES e CONTADOR, 2009; MAGALHÃES et al., 2013). O avanço tecnológico de um país pode ser dimensionado pelo número de pedidos de patentes, uma vez que o desenvolvimento das indústrias exige a modernização das técnicas, a criação de soluções, entre outros ( DI BLASI JÚNIOR; GARCIA e MENDES, 1998).

A criação da lei dos Medicamentos Genéricos ( Lei nº 9.787/1999) fortaleceu as indústrias nacionais e possibilitou o aumento de investimentos na área de pesquisa e desenvolvimento (P&D), as tornando capazes de criar inovações incrementais ( PIMENTEL et al., 2013). Entretanto, as informações tecnológicas descritas em documentos de patente, que são de utilização fundamental, não são exploradas de forma adequada. Esta falta de interesse por parte das indústrias brasileiras caracteriza a ausência da cultura de propriedade industrial na pesquisa e no desenvolvimento de novos produtos.

A fragilidade da produção nacional acarreta a importação de fármacos e medicamentos. Como consequência, tem-se o déficit na balança comercial, que em 2011, na área da saúde, foi de US$ 10 bilhões, sendo US$ 2,6 bilhões decorrentes do déficit da importação de medicamentos, US$ 2,3 bilhões da importação de fármacos (insumos farmoquímicos) e US$ 500 milhões decorrentes da importação de vacinas (ABDI, 2013; TORRES-FREIRE, GOLGHER e CALLIL, 2014; VARGAS et al., 2012).

Estudos abrangendo um levantamento dos depósitos de patentes de medicamentos é importante e necessário para auxiliar o debate e a criação de novas políticas públicas, assim como fornecer informações para um possível aumento do acesso da população brasileira a medicamentos inovadores e de qualidade, produzidos nacionalmente, sem a dependência dos produtos importados. Além disso, acredita-se que a análise destas informações permite a identificação da existência, ou não, de avanço tecnológico no país, bem como avalia a necessidade de investimento nacional neste setor, para tentar diminuir a dependência brasileira pelo mercado externo.

MATERIAIS E MÉTODOS

Para a realização do presente estudo a metodologia foi realizada em 3 (três) etapas. Na primeira etapa, realizou-se a busca bibliográfica, de modo a identificar os conceitos básicos sobre patentes e indústria farmacêutica. Na segunda etapa, elaborou-se a estratégia de busca, a partir da Classificação Internacional de Patente (CIP) e realizou-se a busca dos documentos de patente. Finalmente, na última etapa, analisou-se os documentos de patente encontrados na referida busca.

Busca Bibliográfica

Na realização da busca bibliográfica, utilizou-se as seguintes palavras-chave:

  1. - Em português - patente, propriedade industrial, medicamento, indústria farmacêutica.

  2. - Em inglês - ?patent?, ?industrial property?, ?medicine?, ?pharmaceutical industry?.

Realizou-se pesquisas nas bases de dados: Google Scholar®, SciELO e Web of science, através do Periódicos da Capes.

Estratégia de busca de documentos de patente e definição da base de dados

A Classificação Internacional de Patentes (CIP) ? em inglês, International Patent Classification (IPC), foi estabelecida pelo Acordo de Estrasburgo, em 1971, e prevê um sistema hierárquico de símbolos para a classificação de Patentes de Invenção e de Modelo de Utilidade, de acordo com as diferentes áreas tecnológicas a que pertencem ( INPI, 2015). Nesse estudo, a CIP foi utilizada na recuperação dos documentos de patente relacionados a medicamentos.

Como a pesquisa executada foi na área farmacêutica e baseada em medicamentos, utilizou-se a classificação A61K nas pesquisas realizadas, onde:

  1. - A é a seção de necessidades humanas;

  2. - 61 é a classe de ciência médica ou veterinária e higiene; e

  3. - K é a subclasse de preparações para finalidades médicas, odontológicas e veterinárias.

Após a definição da classificação, optou-se por utilizar a base de dados Derwent Innovations Index®, da Thomson Reuters Scientific®, disponível no portal da Capes para busca dos documentos de patente. A estratégia foi inserir a classificação A61K* no campo de classificação, limitar um período de 10 anos (entre 2006 e 2016), visando encontrar documentos atuais. Já no campo de busca referente ao número da patente, para selecionar apenas documentos de patente depositados no Brasil, inseriu-se o símbolo BR*. Tanto no caso da classificação como no número do documento de patente, para evitar erros, foi necessário utilizar o operador de truncagem ?*?, para substituir a continuação da classificação e o número da patente.

Análise dos documentos de patente

Por fim, iniciou-se a análise dos documentos de patente resultantes da busca. A partir do resultado desta busca, selecionou-se, no item ?refinar resultados?, os campos considerados mais relevantes para o estudo. Logo, os campos selecionados referem-se as principais indústrias depositantes, as principais áreas do conhecimento e aos principais inventores.

REVISÃO DE LITERATURA

Propriedade industrial (patente)

No Brasil, a Lei 9.279 regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial e entrou em vigor em 1996, de modo que se adequasse às regras mínimas do acordo ADIPIC (TRIPS em inglês). Desde então, o país passou a conceder título de propriedade temporária (patente) aos inventores, autores ou outras pessoas físicas ou jurídicas detentoras de direitos sobre a criação, incluindo os produtos químico-farmacêuticos e seus processos de obtenção ( INPI, 2014; BRASIL, 1994; BRASIL, 1996).

Segundo a World Intellectual Property Organization (WIPO), a patente é um direito concedido a uma invenção, podendo ser um produto ou um processo que fornece uma nova maneira de realizar algo ou uma nova solução técnica para um determinado problema. O titular da patente tem exclusividade sobre a invenção e pode impedir que outros explorem comercialmente a invenção patenteada ( WIPO, 2017).

O detentor da patente tem o direito de impedir terceiros de produzir e comercializar seu produto ou processo, garantindo exclusividade de mercado por até 20 anos ( INPI, 2014).

A venda com monopólio, por um certo período de tempo (patente), foi instituída pela indústria farmacêutica, exatamente para gerar retornos financeiros que compensem os altos investimentos e os riscos envolvidos durante todo o processo de P&D do medicamento ( SANTOS e FERREIRA, 2012). A proteção patentária garante que as empresas detentoras da patente tenham exclusividade sobre o medicamento, o que acaba ocasionando práticas abusivas de mercado, devido à ausência de concorrentes.

Indústria farmacêutica e inovação

Os medicamentos podem tanto aliviar uma simples dor como ser fundamental para salvar vidas. Porém, para que este produto chegue ao seu destino final, o consumidor, é fundamental a realização de diversas pesquisas, desenvolvimento de processo de formulação, até atingir a escala industrial e o seu processamento final. A grande concorrência observada no setor farmacêutico está baseada na diferenciação do produto, a partir de investimento continuado em atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D), além da atuação do marketing ( OLIVEIRA, LABRA e BERMUDEZ, 2006).

A indústria farmacêutica necessita de grande investimento financeiro durante as várias etapas de desenvolvimento, até que seja possível colocar um produto inovador no mercado. Somada a esta necessidade, a execução de cada uma das etapas requer um certo tempo, além da incerteza que rodeia a obtenção do sucesso do produto ( MARINHO et al., 2008). A nível nacional, apesar de políticas que estimularam a criação de empresas privadas, não houve motivação para o desenvolvimento de fármacos inovadores e, muitas vezes, as indústrias ficaram apoiadas em institutos de pesquisa e universidades ( AVILA, 2004).

A inserção de medicamentos inovadores no mercado influencia na qualidade de vida, produtividade e longevidade da população. Em contrapartida, as indústrias farmacêuticas buscam o lucro, além de meios para garantir exclusividade na produção e comercialização destes produtos ( JANNUZZI, 2007).

O mercado farmacêutico é competitivo, concentrado e oligopolista, possuindo algumas particularidades. Como é o caso do surgimento de uma nova droga que gera grandes receitas para uma indústria; as fusões de empresas multinacionais, muitas vezes focadas em áreas diferentes; a exploração de países com potencial econômico e com grande mercado consumidor. É necessário investir em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (P, D&I) para se manter nesse mercado, já que as inovações tecnológicas são protegidas pelo sistema internacional de propriedade intelectual. Neste caso, mais especificamente, as patentes. ( SANTOS e FERREIRA, 2012).

A dimensão do mercado farmacêutico fica aparente quando se observa que 4,44 milhões de pessoas trabalham nas indústrias farmacêuticas globais, gerando despesas ? salários ? no valor total de US$ 91,3 bilhões, somente no ano de 2013 ( IFPMA, 2015).

De acordo com Gadelha ( 2003), a indústria farmacêutica se caracteriza como um oligopólio diferenciado, baseado em inovação, pois o lançamento de novos produtos é prioritário em relação às economias de escala e custos de produção. A principal fonte de diferenciação é a pesquisa e o desenvolvimento. Torna-se necessário o lançamento de novos medicamentos a cada patente expirada, pois, quando finalizado o prazo de proteção, os produtos farmacêuticos ficam expostos à concorrência de medicamentos genéricos e similares.

A importância da descoberta de novos medicamentos é observada no estudo realizado pela IFPMA ( 2015), onde afirma que as indústrias investiram US$ 141,6 bilhões em P&D em 2014.

O Quadro 1 apresenta os 10 (dez) primeiros colocados no ranking mundial de inovação, além do Brasil. Destaca-se Suíça, Suécia e Reino Unido nas primeiras posições. Já o Brasil, aparece na 69º posição, atrás de países como Chile, Colômbia, Uruguai, Grécia e Vietnam.

Quadro 1
Ranking de inovação de 2016

Elaboração própria com dados de Cornell University, Insead e Wipo (2016).

No mundo, existem mais de 10 mil indústrias farmacêuticas, porém cerca de 100 (cem) destas são responsáveis por 90% dos produtos farmacêuticos. As maiores multinacionais exportadoras estão nos Estados Unidos, Suíça, Alemanha, Grã-Bretanha e Suécia. As cinco maiores empresas farmacêuticas, que concentram grande parte do faturamento mundial são a Pfizer®, com vendas de US$ 56,427 bilhões, seguida da Novartis®, com vendas de US$ 51,632 bilhões. Em terceiro lugar do ranking em vendas fica a Merck & Co®, com vendas de pouco mais de US$ 40 bilhões, em quarto lugar a Sanofi®, que alcançou US$ 39,478 bilhões em vendas. A quinta é a Astrazeneca®, com US$ 36,974 bilhões em vendas, no ano de 2011 ( SANTOS e FERREIRA, 2012; OLIVEIRA, LABRA e BERMUDEZ; 2006).

O mercado farmacêutico mundial atingiu cerca de US$ 1,1 trilhão, em 2015 e a expectativa é que atinja o valor de US$ 1,3 trilhões, em 2018. Os principais países emergentes foram responsáveis por 28% das vendas globais de produtos farmacêuticos em 2015, contra 12% em 2005 ( IFPMA, 2015; INTERFARMA, 2014).

A indústria farmacêutica nacional

Na década de 30, ocorreu a consolidação da indústria farmacêutica no Brasil. Entre os anos de 40 e 50, as empresas multinacionais começaram a intensificar suas instalações no país, fazendo com que as importações de medicamentos diminuíssem, já que a produção começou a ser interna. Na década de 90, em função dos crescentes investimentos em P,D&I de novos medicamentos, a concorrência entre os grandes laboratórios se intensificou ( SANTOS e FERREIRA, 2012).

O desenvolvimento tecnológico tem contribuído para que questões relacionadas aos medicamentos ganhem apoio governamental e da sociedade. Atualmente, podem ser encontrados, comercialmente, produtos para quase todos os quadros clínicos. Além disso, os medicamentos são cada vez mais seguros e eficazes, levando ao aumento da expectativa e qualidade de vida ( OLIVEIRA, LABRA e BERMUDEZ, 2006). Entretanto, vários fatores influenciaram o comportamento do setor farmacêutico brasileiro nos últimos anos, tais como a desvalorização da moeda nacional, entre os anos de 1999 e 2004, e a entrada dos medicamentos genéricos, em 2000.

Os levantamentos referentes às patentes de medicamentos e às indústrias farmacêuticas nacionais mostram que o investimento em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação no país, tanto por parte das indústrias nacionais como das internacionais, é reduzido. Inclusive, parece não haver chances de desenvolvimento de indústrias brasileiras, capazes de competir no mercado com as líderes multinacionais ( AVILA, 2004).

O investimento em P,D&I para a produção de medicamentos no Brasil é insignificante. Apesar da alta margem de lucro, não há investimento tecnológico nas indústrias, sejam estrangeiras ou nacionais. As multinacionais desenvolvem tecnologias em seus países de origem e as importam para os demais, impedindo qualquer projeto inovador em outros países ( QUEIROZ, 2005; OLIVEIRA, LABRA e BERMUDEZ, 2006).

As indústrias farmacêuticas nacionais não investiram em inovação e não puderam competir nesse mercado acirrado e globalizado. As indústrias farmacêuticas brasileiras investiram apenas 1,27 % da sua receita líquida em P&D, entre os anos de 2003 e 2005 ( KLEIN, 2011). O setor privado brasileiro investe 0,5 % do PIB em P&D, percentual muito pequeno se comparado a União Europeia (1,15 % do PIB), a média dos países membros da OCDE (1,58 % do PIB) e aos Estados Unidos (2 % do PIB) ( TORRES-FREIRE; GOLGHER e CALLIL, 2014).

No Gráfico 1, elaborado pela Interfarma (2016), representa-se o déficit na balança comercial brasileira, que em 2015 foi de, aproximadamente, US$ 4,8 bilhões.


Gráfico 1
Déficit na balança comercial brasileira (em US$ milhões)
INTERFARMA (2016).

Segundo a Associação dos Laboratórios Farmacêuticos Nacionais ( 2014), o déficit na balança comercial está relacionado à aquisição de medicamentos mais complexos e de alto valor, que não são produzidos no Brasil e precisam ser importados. Só em 2013, as importações na área avançaram 8,5%, enquanto as vendas para o exterior evoluíram apenas 2%.

Apesar do progresso na produção científica brasileira, com aumento da quantidade e qualidade das publicações nos últimos anos, o número de depósitos de patentes brasileiras ainda é muito pequeno, representando apenas 0,2% dos depósitos mundiais. Essa situação pode estar relacionada ao isolamento dos pesquisadores nas universidades, à falta de experiência dos pesquisadores com o sistema patentário ou as normas de promoção acadêmica que valorizam somente a publicação de trabalhos científicos ( SENNES, 2011). Para incentivar o investimento das indústrias nacionais em novos produtos e patentes, foram criados programas governamentais, como a Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE) ( 2003), a Lei da Inovação ( No 10.973, de 2 de dezembro de 2004), além da criação do Grupo Executivo do Complexo Industrial da Saúde ? GECIS (2008) e do investimento em Laboratórios Públicos Oficiais.

A International Federation of Pharmaceutical Manufacturers & Associations ( IFPMA) mostra a relevância do mercado farmacêutico nacional, que em 2014 atingiu U$$ 26,35 bilhões na comercialização de medicamentos e empregou 105.253 pessoas ( IFPMA, 2015).

O Gráfico 2, elaborado pelo Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos no Estado de São Paulo ( SINDUSFARMA), apresenta o mercado farmacêutico brasileiro entre os anos de 2003 e 2014. Verifica-se a evolução das vendas de medicamentos nesse período, atingindo aproximadamente US$ 27 bilhões, em 2013 ( SINDUSFARMA, 2014).


Gráfico 2
Mercado Farmacêutico no Brasil entre os anos de 2003 e 2014
SINDUSFARMA (2014).

No Brasil, há anos ocorre o domínio das multinacionais, porém, a lei dos genéricos serviu para impulsionar as indústrias nacionais, que passaram a copiar os medicamentos sem patentes ( SANTOS e FERREIRA, 2012). Estas indústrias nacionais de genéricos foram incorporadas por grandes organizações, já que passaram a representar parcela significativa de mercado. A aquisição da Medley® pelo grupo francês Sanofi?Aventis® e da Teuto® pela multinacional norte americana Pfizer® são exemplos de incorporações.

As indústrias de genéricos nacionais começam a repetir, de forma mais comedida, o que fizeram grandes indústrias internacionais de genéricos, como a israelense Teva® e a indiana Ranbaxy®, que aproveitaram o crescimento de suas receitas e começaram a desenvolver drogas inovadoras. Alguns grupos nacionais perceberam essa oportunidade e estão acumulando competências e experiência para inovar. ( PALMEIRA FILHO et al, 2012).

As indústrias farmacêuticas brasileiras faturam mais do que as multinacionais, impulsionadas, principalmente, pelo mercado de genéricos, como observado no Gráfico 3. Como algumas indústrias nacionais participam de programas de financiamento público, puderam modernizar suas instalações e elevar a capacidade de produção, não ficando restritas apenas ao segmento de genéricos. Também foi possível investir em inovação e adquirir espaço no segmento de medicamentos de referência (produtos originais), alcançando 18% do mercado ( ALANAC, 2014). Essas iniciativas são válidas, porém ainda é necessário um maior investimento em P, D&I.


Gráfico 3
Evolução da participação nas vendas do varejo farmacêutico, em %
Elaboração própria utilizando dados da ALANAC (2014).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Ao realizar-se a busca de documentos de patente na base de dados selecionada - Derwent Innovations Index® - utilizando-se a estratégia previamente definida, obteve-se 22.530 documentos de patentes depositados no Brasil.

Analisando as principais indústrias depositantes de patentes, elaborou-se o Gráfico 4, onde se observa que a Roche® aparece como a indústria que mais depositou patentes no Brasil, durante o período pesquisado (1.707 depósitos). Em seguida, aparece a Novartis®, com 1.277 depósitos. A terceira indústria que mais realizou depósitos no Brasil foi a Sanofi®, com 1.069 depósitos. Em sequência, aparece a Wyeth®, com 912 depósitos, seguido da Astra Zeneca®, com 505 depósitos.


Gráfico 4
Principais indústrias depositantes de patente
Elaboração própria com dados do Derwent®.

A cadeia produtiva da indústria farmacêutica está distribuída em quatro estágios evolutivos, a saber:

  1. 1º: Pesquisa e desenvolvimento (P&D);

  2. 2º: Produção de farmoquímicos;

  3. 3º: Produção de medicamentos;

  4. 4º: Marketing e comunicação ( CAPANEMA, 2004).

A situação ilustrada no Gráfico 4, com o domínio das indústrias multinacionais é explicado por Capanema (2004), que afirma que as grandes multinacionais operam nos quatro estágios, incluindo P&D. As indústrias nacionais operam, somente, no 3º e 4º estágios. Com isso, a taxa de inovação é baixa nas indústrias nacionais, com as atividades direcionadas para a produção de medicamentos ( CAPANEMA, 2004).

Entre os 100 primeiros depositantes, não se observa nenhuma indústria nacional. Destaca-se a presença de 3 (três) universidades brasileiras: a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) com 200 depósitos de patente, a Universidade de São Paulo (USP), que possui 123 pedidos de patente e a Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) apresentando 87 pedidos de patente.

Segundo Torres-Freire, Golgher e Callil ( 2014), devido à falta de interesse em inovação das indústrias brasileiras, a maioria dos pesquisadores nacionais trabalha em universidades e institutos de pesquisa e não no setor privado, como ocorre nos países desenvolvidos.

No Gráfico 5, apresenta-se as principais áreas do conhecimento relacionadas aos documentos de patente encontrados. Uma vez que a pesquisa se refere a uma classificação de preparações para finalidades médicas, odontológicas e higiênicas, as áreas com maior número de depósitos de patente não trazem grandes novidades, são elas: Química, com 22.265 depósitos de patente e farmacologia, com 18.641 depósitos. Ressalta-se que um documento de patente pode ser listado em mais de uma área do conhecimento.

O domínio da área química é apresentado por Kontoravdi, Samsatli e Shah ( 2013) e Vargas et al. ( 2012) que afirmam que os medicamentos sintéticos (síntese química) são dominantes na terapia de algumas doenças, representando 67 % das aprovações terapêuticas da Europa e correspondem a 5 dos 10 medicamentos mais vendidos no mundo.


Gráfico 5
Principais áreas do conhecimento dos documentos de patente encontrados na pesquisa
Elaboração própria com dados do Derwent®.

Já a terceira e quarta áreas do conhecimento com maior número de depósitos - polímeros (5.968 depósitos) e biotecnologia (4.483 depósitos), respectivamente - referem-se a novas tecnologias, sendo a biotecnologia utilizada nos últimos anos no desenvolvimento de novos medicamentos, os quais resultam da engenharia genética.

Segundo Madeira ( 2013), a biotecnologia é uma fonte importante de novos medicamentos para o tratamento de doenças complexas e de grande incidência, como mal de Alzheimer e diversos tipos de câncer. Além disso, informa que os investimentos em inovação tecnológica estão cada vez mais migrando do setor de química fina (síntese) para as áreas biotecnológica e nanotecnológica, tanto nos países desenvolvidos como em desenvolvimento.

A área de conhecimento relacionada à agricultura possui 2.628 depósitos de patente. Os documentos de patente dessa área do conhecimento estão relacionados principalmente a produtos de origem natural utilizados no tratamento de doenças, como extratos de planta.


Figura 1
Principais inventores
Elaboração própria com dados do Derwent®.

Além disso, alguns inventores estão representados por apenas uma letra, como J, que possui 117 documentos de patente depositados e M, com 87 documentos de patente depositados.

Não foi possível afirmar quem são os principais inventores, a partir da estratégia de busca e da base de dados escolhidas, uma vez que os nomes dos inventores aparecem em abreviaturas muito amplas, como Lee e Li Y, entre outros, conforme apresentado na Figura 1. Sendo assim, diferentes inventores aparecem com a mesma denominação, sendo difícil definir quais documentos de patente se referem a cada inventor.

CONCLUSÃO

A partir da análise dos documentos de patentes encontrados, percebe-se a ausência de indústrias farmacêuticas nacionais entre as principais indústrias depositantes de patente no país. Este cenário é dominado pelas indústrias multinacionais, que dominam não só as tecnologias, como também o mercado.

Apesar do desinteresse das indústrias nacionais em inovar no setor farmacêutico, percebe-se a presença de algumas universidades brasileiras (UFMG, USP e UNICAMP). Assim, é possível concluir que as universidades e os Institutos de Ciência e Tecnologia, a partir do desenvolvimento de tecnologias a nível laboratorial, poderiam trabalhar em parceria com as indústrias nacionais, que possuem condições de promover o aumento de escala e a produção final do medicamento.

Ao analisar as principais áreas do conhecimento abordadas nos documentos de patente, nota-se o predomínio dos medicamentos produzidos por síntese química, porém algumas áreas inovadoras, que exigem conhecimentos tecnológicos avançados, como a biotecnologia, aparecem entre as 5 áreas mais exploradas. Com isso, países que não desenvolveram estas novas tecnologias ficaram dependentes das indústrias multinacionais, que investem em P&D nestas áreas.

Sendo assim, o atual estudo salienta a necessidade das indústrias farmacêuticas nacionais, tanto privadas como públicas, investirem em pesquisa e desenvolvimento de novos produtos e processos farmacêuticos. A falta de inovação neste setor faz com que o país fique dependente do mercado externo ? indústrias farmacêuticas multinacionais, submetendo-se a preços abusivos, além de ficar sujeito ao desabastecimento de medicamentos, deixando a população usuária em constante risco.

Dentre as perspectivas futuras desta pesquisa, está uma nova análise utilizando outras bases de dados, com o intuito de identificar os principais inventores que não ficaram aparentes. E, além disso, acredita-se que a abordagem de uma determinada classe de medicamentos de ampla utilização, como por exemplo, antineoplásicos e/ou antibióticos, forneceria importantes e novas informações na área proposta.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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