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Traços Populistas em Estratégias de Comunicação no Facebook: Uma Análise das Publicações de André Ventura e Eduardo Bolsonaro nas Campanhas Eleitorais de 2022
Jessica Sandes; Micaela Cabral; Aline Padilha
Jessica Sandes; Micaela Cabral; Aline Padilha
Traços Populistas em Estratégias de Comunicação no Facebook: Uma Análise das Publicações de André Ventura e Eduardo Bolsonaro nas Campanhas Eleitorais de 2022
Populist Traits in Communication Strategies on Facebook: An Analysis of the Posts by André Ventura and Eduardo Bolsonaro in the 2022 Electoral Campaigns
Rasgos Populistas en Estrategias de Comunicación en Facebook: Un Análisis de las Publicaciones de André Ventura y Eduardo Bolsonaro en las Campañas Electorales de 2022
Revista Comunicando, vol. 13, núm. 2, e024006, 2024
Associação Portuguesa de Ciências da Comunicação
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Resumo: O presente estudo examina as estratégias de comunicação de André Ventura e Eduardo Bolsonaro no Facebook durante os 45 dias que antecederam as eleições para deputado em 2022, em Portugal e no Brasil, respetivamente, com o objetivo de identificar e comparar traços populistas nas suas publicações. Utilizando uma análise de conteúdo temática mista foram analisadas 512 publicações, sendo 229 de Ventura e 283 de Bolsonaro. A análise qualitativa identificou unidades de significação nas publicações, enquanto a quantitativa buscou padrões que sustentassem essas observações. Os resultados indicam que ambos os candidatos adotaram estratégias populistas, com 66% das publicações de Ventura e 90% das de Bolsonaro contendo elementos populistas. Ventura focou-se no "enfrentamento com a oposição" e na construção da sua imagem como "português comum", utilizando ironia e sarcasmo para discutir temas como segurança pública e reforma da previdência. Bolsonaro, por sua vez, enfatizou a figura do "líder carismático" e o "enfrentamento com a oposição", abordando temas como corrupção, armamento e defesa das mulheres, reforçando constantemente a imagem do seu pai, Jair Bolsonaro. A análise comparativa revelou diferenças nas táticas de comunicação: Ventura adotou uma abordagem mais concisa e polarizadora, enquanto Bolsonaro utilizou narrativas prolixas e visuais simbólicos. Este estudo contribui para a compreensão de como o populismo é moldado e adaptado em diferentes contextos eleitorais e culturais, refletindo a crescente influência das redes sociais digitais na formação da opinião política e nos desafios éticos enfrentados pelos jornalistas em sociedades democráticas contemporâneas.

Palavras-chave: Comunicação Política,Campanha Eleitoral,Ascensão do Populismo,Redes Sociais Digitais,Facebook.

Abstract: The present study examines the communication strategies of André Ventura and Eduardo Bolsonaro on Facebook during the 45 days preceding the 2022 parliamentary elections in Portugal and Brazil, respectively, with the aim of identifying and comparing populist traits in their posts. Using a mixed thematic content analysis, 512 posts were analyzed, with 229 from Ventura and 283 from Bolsonaro. The qualitative analysis identified units of meaning in the posts, while the quantitative analysis sought patterns to support these observations. The results indicate that both candidates adopted populist strategies, with 66% of Ventura's posts and 90% of Bolsonaro's posts containing populist elements. Ventura focused on "confronting the opposition" and constructing his image as a "common Portuguese", using irony and sarcasm to discuss topics such as public safety and pension reform. Bolsonaro, in turn, emphasized the figure of the "charismatic leader" and "confronting the opposition", addressing issues such as corruption, gun rights, and women's defense, consistently reinforcing the image of his father, Jair Bolsonaro. The comparative analysis revealed differences in communication tactics: Ventura adopted a more concise and polarizing approach, while Bolsonaro used lengthy narratives and symbolic visuals. This study contributes to the understanding of how populism is shaped and adapted in different electoral and cultural contexts, reflecting the growing influence of digital social networks in shaping political opinion and the ethical challenges faced by journalists in contemporary democratic societies.

Keywords: Political Communication, Electoral Campaign, Rise of Populism, Digital Social Networks, Facebook.

Resumen: El presente estudio examina las estrategias de comunicación de André Ventura y Eduardo Bolsonaro en Facebook durante los 45 días que precedieron a las elecciones para diputado en 2022, en Portugal y en Brasil, respectivamente, con el objetivo de identificar y comparar rasgos populistas en sus publicaciones. Utilizando un análisis de contenido temático mixto, se analizaron 512 publicaciones, siendo 229 de Ventura y 283 de Bolsonaro. El análisis cualitativo identificó unidades de significación en las publicaciones, mientras que el cuantitativo buscó patrones que sustentaran esas observaciones. Los resultados indican que ambos candidatos adoptaron estrategias populistas, con un 66% de las publicaciones de Ventura y un 90% de las de Bolsonaro conteniendo elementos populistas. Ventura se centró en el "enfrentamiento a la oposición" y en la construcción de su imagen como "portugués común", utilizando ironía y sarcasmo para discutir temas como la seguridad pública y la reforma de la seguridad social. Bolsonaro, por su parte, enfatizó la figura del "líder carismático" y el "enfrentamiento a la oposición", abordando temas como la corrupción, el armamento y la defensa de las mujeres, reforzando constantemente la imagen de su padre, Jair Bolsonaro. El análisis comparativo reveló diferencias en las tácticas de comunicación: Ventura adoptó un enfoque más conciso y polarizador, mientras que Bolsonaro utilizó narrativas prolijas y visuales simbólicos. Este estudio contribuye a la comprensión de cómo el populismo se moldea y adapta en diferentes contextos electorales y culturales, reflejando la creciente influencia de las redes sociales digitales en la formación de la opinión política y en los desafíos éticos enfrentados por los periodistas en las sociedades democráticas contemporáneas.

Palabras clave: Comunicación Política, Campaña Electoral, Ascenso del Populismo, Redes Sociales Digitales, Facebook.

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Traços Populistas em Estratégias de Comunicação no Facebook: Uma Análise das Publicações de André Ventura e Eduardo Bolsonaro nas Campanhas Eleitorais de 2022

Populist Traits in Communication Strategies on Facebook: An Analysis of the Posts by André Ventura and Eduardo Bolsonaro in the 2022 Electoral Campaigns

Rasgos Populistas en Estrategias de Comunicación en Facebook: Un Análisis de las Publicaciones de André Ventura y Eduardo Bolsonaro en las Campañas Electorales de 2022

Jessica Sandes
Universidade da Beira Interior, Departamento de Comunicação, Filosofia e Política, Covilhã, Portugal
Micaela Cabral
Universidade da Beira Interior, Labcom – Centro de Investigação em Comunicação e Artes, Covilhã, Portugal
Aline Padilha
Universidade da Beira Interior, Departamento de Comunicação, Filosofia e Política, Covilhã, Portugal
Revista Comunicando
Associação Portuguesa de Ciências da Comunicação, Portugal
ISSN: 2184-0636
ISSN-e: 2182-4037
Periodicidade: Semestral
vol. 13, núm. 2, e024006, 2024

Recepção: 29 Janeiro 2024

Aprovação: 13 Junho 2024

Publicado: 26 Julho 2024


1. Populismo Contemporâneo: Abordagens e Estratégias na Compreensão do Fenômeno Político

A ascensão do populismo como fenómeno político no século XIX coincide com o desenvolvimento do papel da imprensa e dos dilemas éticos enfrentados pelos jornalistas em sociedades democráticas em constante transformação. Coincide ainda com o advento das redes sociais digitais (RSD) como ferramentas de comunicação política, refletindo a crescente influência dessas plataformas na formação da opinião política.

O populismo inicialmente refletia a ideia de que o povo tinha o direito legítimo de reivindicar o poder e reformar as instituições governamentais para atender às suas necessidades. Isso está intimamente ligado com as mudanças na comunicação de massa e na interação dos jornalistas com o público, influenciando a cobertura jornalística, que buscava representar os cidadãos comuns e expor a corrupção e a injustiça no governo, sendo assim um filtro entre políticos e eleitores. No entanto, à medida que o populismo evoluiu e se tornou mais complexo, especialmente com a utilização das RSD pelos políticos, houve um aumento na polarização e fragmentação do discurso político. Isso permitiu que líderes populistas alcançassem e mobilizassem um público mais amplo e diversificado, sem filtro noticioso, e, por vezes, através de mensagens simplificadas e emocionalmente carregadas, contribuindo para desafios crescentes na esfera pública (Engesser et al., 2017; Kaltwasser et al., 2017; Ward, 2018).

Definir populismo, no entanto, é uma tarefa desafiadora devido à falta de consenso entre os estudiosos da área. É possível, contudo, categorizá-lo em três abordagens principais:

1. Político-estratégica: nesta perspetiva, o populismo é concebido como um fenómeno fundamentado na luta pelo controle do governo, em que um líder carismático obtém apoio direto de uma parcela significativa de eleitores. Geralmente, ocorre uma desvalorização das instituições governamentais democráticas por parte desses líderes (Weyland, 2001).

2. Estruturalista ou sociocultural: esta abordagem define o populismo pela perspetiva social, considerando as mobilizações populares e os sistemas de classe nas fases de desenvolvimento da sociedade. Pode ser avaliado em dois eixos – baixo e alto – e na perspetiva política – direita e esquerda, sendo particularmente útil para análises políticas (Ostiguy, 2020).

3. Ideacional: nesta perspetiva, o discurso populista divide o mundo em duas ideias antagônicas, em que o povo representa a pureza e a honestidade (o bem), enquanto uma elite corrupta representa aqueles que subverteram a vontade do povo, os egoístas (o mal). A política, assim, é vista como uma representação da "vontade do povo". Esta conceção ideacional é amplamente utilizada nos Estados Unidos da América e na Europa Ocidental e é considerada um conceito mais flexível e abrangente, associando frequentemente o populismo a outras ideologias como o nacionalismo ou socialismo, por exemplo (Hawkins, 2009; Hawkins & Kaltwasser, 2017; Mudde, 2004).

Neste estudo, optamos por adotar a abordagem maioritariamente ideacional do populismo, que enfatiza a dicotomia entre o bem e o mal, a amplificação da vontade do povo, a caracterização do opositor como inimigo e a reestruturação dos sistemas tradicionais (Mudde, 2004).

De acordo com Baumgartner (2021), os fundamentos do populismo repousam sobre três pilares essenciais: "1) o povo1, 2) a elite e 3) a vontade geral do povo" (p. 3). O povo é identificado como o elemento mais preponderante entre os três, uma vez que, numa democracia, é a coletividade que confere e, igualmente, pode revogar o poder. Laclau (2013) argumenta que o conceito abstrato de povo permite a sua manipulação, possibilitando que líderes populistas contemporâneos afirmem lutar por uma causa comum, embora, na realidade, não representem verdadeiramente as aspirações coletivas. Além disso, ignoram frequentemente a pluralidade existente na sociedade, retratando-se como iguais, representantes de um povo cansado da elite corrupta.

Enquanto o povo é considerado o conceito-chave, a elite emerge como o seu principal antagonista, com políticos populistas elegendo-a como responsável pelos principais problemas da sociedade. Esses líderes tendem a categorizar a elite conforme os seus próprios interesses, escapando ao paradigma de classes sociais marxistas e focando numa luta pela moralidade. Dessa forma, a elite pode englobar desde a classe artística até a imprensa tradicional, controlada pelas grandes emissoras de televisão, além de políticos ou partidos que se oponham ao populismo (Baumgartner, 2021).

O conceito de vontade geral do povo, por sua vez, é frequentemente corrompido por políticos populistas, que o utilizam para legitimar políticas autoritárias. O discurso populista gira em torno da suposta vontade geral do povo, mesmo que isso muitas vezes envolva a promoção de atitudes consideradas ilegais contra grupos minoritários, por exemplo. Vale ressaltar que uma das principais bandeiras dos políticos populistas é acabar com a imoralidade e a ilegalidade, embora, paradoxalmente, possam adotar tais práticas se isso lhes for conveniente (Baumgartner, 2021).

Esses três pilares exercem uma influência direta no populismo contemporâneo, que, aproveitando-se das crises do capitalismo, questiona a eficácia da democracia liberal e propõe a sua reformulação. A ascensão de políticos populistas de extrema-direita e nacionalistas é apresentada como uma alternativa à perceção de que a democracia falhou em cumprir as suas promessas normativas (Freitas et al., 2023; Scott, 2019).

Além do descontentamento com o atual sistema democrático, o crescimento do populismo pode ser associado às transformações no sistema mediático. As redes sociais digitais tornaram-se canais primordiais de comunicação para os políticos, conforme observa Gerbaudo (2018). Essas plataformas proporcionam comunicação massificada e direta com eleitores/seguidores, e os políticos populistas utilizam-nas para comunicarem em pé de igualdade, transmitindo a mensagem de que fazem parte do povo.

No âmbito das plataformas digitais, o populismo emprega uma variedade de estratégias com o intuito de consolidar a sua narrativa maniqueísta, delineando a confrontação entre o “bem” (representado pelo povo) e o “mal” (personificado na elite), bem como entre o “nós” (o povo) e o “eles” (a elite). Para atingir tal propósito, os líderes populistas, além de desacreditarem a imprensa tradicional, adotam uma comunicação simplificada, recorrendo a imagens, vídeos amadores e memes. Essa abordagem visa transpor as fronteiras entre política e entretenimento, efetivamente contribuindo para a espetacularização do cenário político. A utilização de recursos estilísticos populistas busca suscitar emoções intensas, tais como revolta, tristeza, raiva e descontentamento, direcionadas contra a elite (Cesarino, 2020).

2. A Ascensão do Discurso Populista nas Redes Sociais Digitais

A introdução das plataformas sociais digitais na esfera política gera divergências quanto ao impacto da comunicação política online nas democracias ocidentais. Enquanto alguns autores olham para a internet como um ambiente democrático que facilita o acesso à informação e promove debates entre cidadãos e políticos, fomentando a democracia (Aalberg & Curran, 2013; Kean, 2013; Papacharissi, 2014). Outros a veem como uma facilitadora da manipulação da opinião pública devido à propagação de notícias falsas, resultante da falta de um filtro informativo adequado (Coleman & Blumler, 2009; Figueiras, 2019; Rheingold, 1994).

Conforme as reflexões de Figueiras (2019), a web 2.0, apesar da complexificação do sistema comunicacional, proporciona aos candidatos a consecução de objetivos políticos tradicionais, como gerir a própria visibilidade, restabelecer a conexão direta com os eleitores e monitorar as suas manifestações espontâneas, além de influenciar a produção noticiosa. Assim, as redes sociais digitais são consideradas instrumentos de campanha, ferramentas de monitoramento e fontes de informação (Figueiras, 2019).

No papel de instrumento de campanha, o ambiente online desempenha um papel crucial ao informar, envolver e mobilizar o público. Nesse contexto, a construção de uma relação emocional e duradoura entre candidatos e eleitores é essencial para fortalecer os laços. Adicionalmente, as plataformas digitais têm sido exploradas como meios para difamar ou desacreditar adversários políticos (Cacciotto, 2011; Figueiras, 2019; Gross & Johnson, 2016).

Na função de ferramenta de monitoramento, destaca-se o reconhecimento de informações relevantes sobre comportamentos e preferências dos cidadãos por meio da datificação – a mensuração de dados online, obtidos nas RSD e no Google. Essas informações, transformadas digitalmente, adquirem importância significativa para embasar estratégias e discursos políticos, contribuindo para a comunicação política (boyd & Crawford, 2012; Figueiras, 2019; van Dijck, 2017).

Quanto à sua utilidade como fonte de informação, as redes sociais digitais são percebidas como um meio de conexão e sociabilidade com os eleitores, sem a filtragem do jornalismo tradicional, sendo também empregues pelos políticos para influenciar os veículos de notícias. O investimento em estratégias digitais pode moldar a cobertura política dos meios de comunicação convencionais, destacando que quanto melhor se adaptarem às inovações tecnológicas para influenciar a sua mediatização, maior será a probabilidade de obterem visibilidade positiva (Figueiras, 2019).

As RSD permitem uma comunicação bidirecional entre políticos e cidadãos, ampliando a escala de alcance desses conteúdos. Neste estudo, iremos centrar-nos no Facebook, principal plataforma global de media social até 2022, com 2,9 bilhões de utilizadores ativos, segundo o relatório Global Digital 2022, realizado pela We Are Social em parceria com a Hootsuite (2022). O Facebook já foi uma ferramenta de destaque nas eleições de líderes políticos, oferecendo funcionalidades que facilitam a comunicação política e eleitoral, reduzindo a distância entre político e eleitor. Observadores destacam, por exemplo, o crescimento do populismo contemporâneo em líderes como Jair Bolsonaro (Brasil), Viktor Órban (Hungria) e Donald Trump (EUA), que utilizaram anúncios pagos no Facebook em campanhas eleitorais, estabelecendo uma comunicação direta com os eleitores (Canavilhas, 2009; Ituassu et al, 2019; Lilleker, 2006; Martins, 2018; Mello, 2020).

No Brasil e em Portugal, políticos como Jair Bolsonaro e o seu filho Eduardo Bolsonaro, e André Ventura atribuem à “elite corrupta” – representada por partidos específicos – a responsabilidade pelos problemas sociais, e utilizam as RSD como ferramentas estratégicas de comunicação política. A nossa pesquisa visa, portanto, mapear traços de discurso populista nas estratégias de comunicação utilizadas no Facebook durante as campanhas de André Ventura e Eduardo Bolsonaro nas eleições para deputados, em 2022, explorando o conceito populista nessas narrativas digitais.

3. Populismo em Foco: Análise das Estratégias de Comunicação de Eduardo Bolsonaro e André Ventura no Facebook na Campanha Eleitoral de 2022

A ascensão do populismo tem marcado o cenário político contemporâneo, personificada por líderes carismáticos que exploram as dinâmicas sociais e comunicacionais para consolidar o seu poder (Dias & Fernandes, 2020). No Brasil, Jair Bolsonaro e o seu filho, Eduardo Bolsonaro, emergiram como figuras-chave desse movimento, promovendo uma narrativa que busca representar o “povo” contra a suposta elite corrupta. De maneira similar, em Portugal, André Ventura, líder do partido Chega, desempenha um papel destacado ao adotar estratégias que desafiam as estruturas políticas convencionais e se apresenta como o defensor das demandas populares (Teixeira, 2023). Esta análise propõe-se a examinar as estratégias comunicacionais desses líderes no Facebook, durante os períodos eleitorais de 2022, procurando verificar se mensagens de cunho populista foram intensificadas a partir do uso estratégico da referida rede social digital.

4. Método e Técnicas de Investigação

A pesquisa é centrada na análise das publicações nas páginas oficiais de Facebook dos políticos de extrema-direita André Ventura e Eduardo Bolsonaro. André Ventura (@AndreAmaralVentura) é do partido Chega, de Portugal, e Eduardo Bolsonaro (@bolsonaro.enb) é do Partido Liberal, do Brasil. O estudo tem como objetivos específicos: (1) conhecer as estratégias adotadas pelos candidatos nesta rede social; (2) identificar a utilidade do Facebook nessas campanhas eleitorais; e (3) observar convergências e divergências em tais estratégias. Assim, pretendemos responder a seguinte pergunta de investigação: mensagens de cunho populista foram potencializadas a partir do uso estratégico do Facebook nas campanhas de André Ventura e Eduardo Bolsonaro, em 2022?

Para alcançar esses objetivos, dividimos o estudo em dois momentos: o primeiro, buscou identificar a presença de discurso populista nas publicações, enquanto o segundo explorou os propósitos subjacentes à utilização do Facebook durante as campanhas eleitorais para deputados. Em ambos os momentos, a abordagem metodológica será uma análise de conteúdo mista, a fim de identificarmos padrões que permitirão a melhor compreensão das estratégias comunicacionais dos candidatos.

Na investigação qualitativa, optamos por uma análise temática, permitindo a classificação das unidades de significação presentes nas publicações, conforme Bardin (1977) e Vala (1986). Desta forma, identificamos padrões e tendências, e adotamos dimensões descritivas e interpretativas, que permitem uma compreensão reflexiva que surge de questionamentos diante do objeto de análise, utilizando assim um conjunto de conceitos teóricos e analíticos que se combinam para formular conclusões. Os indicadores das tendências identificadas na abordagem quantitativa oferecem suporte aos dados observados qualitativamente de maneira simultânea (Reis, 2017).

5. Caracterização das Unidades de Análise

A presente análise abrange todas as publicações realizadas nas páginas oficiais do Facebook de André Ventura e Eduardo Bolsonaro durante os 45 dias que antecederam a votação eleitoral para deputados, em Portugal e no Brasil — de 15 de dezembro de 2021 a 30 de janeiro de 2022; e de 16 de agosto a 2 de outubro de 2022 —, respetivamente. O conjunto de dados considera todas as 512 publicações feitas nas duas páginas durante este período, sendo 229 de André Ventura e 283 de Eduardo Bolsonaro.

Definimos como publicação tanto imagens, sejam estáticas ou em vídeo, podendo ser ou não acompanhadas por uma legenda, quanto textos, os quais podem ou não ser acompanhados por imagens. As imagens representam os elementos visuais, enquanto as legendas são utilizadas para classificar, avaliar ou descrever essas imagens de forma textual. Nenhuma publicação foi excluída desta análise.

Embora as imagens estáticas se mostrem mais propícias para categorização e análise, permitindo um foco mais preciso na construção visual das mensagens, sem a influência de elementos presentes em vídeos, como trilha sonora e movimentos de câmara, que podem interferir na análise visual (Kress & van Leeuwen, 1996), optamos por incluir uma análise sistêmica dos vídeos, por meio de critérios pré-definidos (descritos no tópico seguinte). Tal decisão visa preservar a robustez da análise, dado que o número de vídeos nas publicações de Eduardo Bolsonaro somava 63% do total de publicações (das 283 publicações, 178 continham vídeo), enquanto nas publicações de Ventura, das 229, 14% eram vídeos (32 publicações). Esta pesquisa desconsidera todos os indicadores de envolvimento, como comentários e gostos.

6. Procedimento para a Recolha e a Análise dos Dados

Procuramos compreender as particularidades das publicações realizadas por André Ventura e Eduardo Bolsonaro sob a perspetiva do utilizador, ou seja, analisando-as do ponto de vista do público. O nosso desafio consiste em identificar características implícitas nas mensagens por meio de análises documentais, visando desvendar o sentido e o significado subjacentes a cada publicação.

Com o intuito de obter uma compreensão abrangente e confiável do fenómeno em estudo, optamos por empregar a análise temática, uma abordagem que considera a totalidade do conteúdo analisado, possibilitando a classificação das unidades de significado presentes numa mensagem. Para estruturar o nosso método de análise, nos baseamos nas diretrizes propostas por Bardin (1977), seguindo um processo de codificação que compreende três etapas distintas: (1) seleção da unidade de análise (recorte); (2) definição das regras de contagem (enumeração); e (3) seleção das categorias (classificação). Este procedimento foi aplicado tanto na identificação dos traços populistas quanto na determinação das finalidades subjacentes ao uso do Facebook.

As categorias de classificação para a identificação de conceitos populistas foram estabelecidas com base nas reflexões dos autores Laclau (2013) e Baumgartner (2021). Esses critérios incluem:

Esses critérios constituem a base analítica para a compreensão e identificação dos fenómenos populistas, fornecendo uma estrutura conceitual robusta para a análise sistemática dessas manifestações políticas. Desta forma, concebemos o modelo de análise para a primeira etapa da investigação apresentado na Tabela 1.

Tabela 1
Modelo de análise para identificação do populismo nas publicações

Adaptado de Mudde (2004) e Laclau (2013)

Para analisar as finalidades do Facebook como ferramenta de comunicação política, inspiramo-nos nos critérios de um estudo sueco sobre o uso do Instagram por partidos políticos (Filimonov et al., 2016). Mesmo que a plataforma social digital seja diferente, entendemos que as finalidades indicadas em tal estudo também podem nortear critérios de análises para outras redes sociais online. Esses critérios — criados para investigar a comunicação eleitoral de partidos políticos durante as eleições de 2014, na Suécia — compreendem quatro finalidades, adaptadas na nossa pesquisa. Estas são: (1) transmissão, envolvendo a divulgação de mensagens políticas, considerando o posicionamento político de cada candidato; (2) mobilização, que se refere à motivação de apoiantes para ação, identificando chamadas para ação ou participação em eventos de campanha; (3) personalização, relacionada à presença exclusiva do candidato, membros do partido e outras figuras públicas nas imagens das publicações, sendo analisada em termos de destaque para o político, o partido, outras figuras públicas ou a população; e (4) privatização, adaptada para "aproximação", abordando o contexto em que o político é retratado ou divulga algum posicionamento, se é de forma profissional, com tratamento de imagens e auxílio gráfico ou de forma amadora, se colocando de forma semelhante ao público. Assim, criamos o modelo de análise – onde todos os indicadores serão observados em cada publicação selecionada – para a segunda fase da investigação apresentado na Tabela 2.

Tabela 2
Modelo para análise das finalidades do Facebook

Adaptado de Filimonov et al. (2016)

Ressaltamos que as categorias foram predefinidas com base na nossa revisão bibliográfica, e ajustadas após a recolha manual de todas as publicações de André Ventura e Eduardo Bolsonaro. Realizamos uma pré-análise em sete publicações de cada candidato, selecionadas aleatoriamente para confirmar a existência ou não das categorias identificadas. Todas as publicações foram contabilizadas manualmente e documentadas em formato de print num arquivo Word, e analisadas em Excel.

1. construção da identidade coletiva: refere-se à identificação da formação de uma identidade coletiva unificada por meio do discurso e da liderança carismática;

2. articulação de reivindicações diversas: caracteriza-se pela busca ativa pela articulação de reivindicações provenientes de grupos sociais diversos, visando à criação de um bloco político coeso;

3. presença de um líder carismático: reconhece o líder como uma figura central capaz de mobilizar as massas em torno de uma causa comum;

4. rutura com estruturas políticas tradicionais: concebe o populismo como uma resposta à inadequação das estruturas políticas tradicionais, resultando assim numa rutura significativa com o status quo;

5. enfrentamento com a oposição: Considera o tom do discurso confrontacional, estratégias de deslegitimação e impacto na polarização social.

7. Populismo em Foco: Análise e Discussão dos Resultados

Iniciamos a nossa análise pela identificação dos traços populistas de cada candidato. Posteriormente, fizemos uma comparação entre as possíveis estratégias populistas de André Ventura e Eduardo Bolsonaro.

7.1. André Ventura e o Populismo

Realizamos uma análise das estratégias populistas adotadas pelo candidato André Ventura durante os 45 dias que antecederam a votação eleitoral de 2022, em Portugal — de 15 de dezembro de 2021 a 30 de janeiro 2022. A partir da avaliação de 229 publicações do Facebook, das quais 14% incluíam vídeos, identificamos que 66% das publicações apresentaram traços populistas, evidenciando a natureza marcante dessa abordagem na estratégia comunicacional do candidato.

As publicações que não continham traços populistas foram identificadas como predominantemente informativas, destacando os registos do candidato em eventos de campanha. É notável que, mesmo nas publicações não populistas, Ventura busca manter uma presença constante, reforçando a identidade do partido Chega por meio de imagens e menções, mas sendo a personificação do partido e colocando-se como o único capaz de transformar a realidade que, na sua visão, está permeada pela corrupção em Portugal.

De entre os conceitos populistas identificados, o "enfrentamento com a oposição" destacou-se como o mais recorrente, seguido por "rutura do sistema tradicional", "demandas", "líder carismático" e "vontade do povo". Parte significativa das publicações que envolviam o enfrentamento com a oposição estava acompanhada de propostas para atender às demandas do eleitorado, evidenciando uma estratégia dupla na construção da narrativa política.

A análise revela que o candidato utiliza recursos retóricos como ironia, sarcasmo e humor ácido para criticar os seus opositores, enquanto se posiciona como a única solução para os problemas de Portugal. Ventura autodefine-se como representante do "português comum" e "português de bem", incorporando essas identidades na sua estratégia de comunicação.

As demandas apresentadas por Ventura abrangem temas variados, como prisão perpétua, segurança dos policiais e professores, abolição das portagens, reconhecimento aos ex-combatentes, redução de subsídios para aumentar pensões e aposentadorias dos idosos, além de salários dos portugueses.

O candidato utiliza a hashtag #PorPortugalPelosPortugueses para reforçar a sua mensagem e posiciona-se contra as minorias. Expressões como "direita mariquinhas", "desmascarar" e "fazer o sistema tremer" são utilizadas para denotar a sua postura combativa.

Desta forma, apresentamos, de seguida, na Figura 1, os resultados conquistados nesta primeira fase da investigação.


Figura 1
Resultado da análise sobre os traços populistas da comunicação de André Ventura

Em suma, a análise das estratégias populistas adotadas por André Ventura revela uma abordagem marcante e diversificada nas suas publicações durante a campanha eleitoral. A predominância de traços populistas, presentes em 66% das análises, evidencia a eficácia dessa estratégia na comunicação do candidato. Ventura, ao apresentar-se como o "português comum" e "português de bem", utiliza uma série de conceitos populistas, destacando-se o enfrentamento com a oposição como ponto central nas suas publicações. O uso de recursos retóricos, como ironia e sarcasmo, aliado às demandas apresentadas, contribui para reforçar a sua imagem como líder carismático e defensor das questões prioritárias para a população.

7.2. Eduardo Bolsonaro e o Populismo

Investigamos as estratégias populistas empregadas por Eduardo Bolsonaro nas publicações do Facebook durante os 45 dias que antecederam as eleições de 2022 no Brasil, abrangendo o período de 16 de agosto a 2 de outubro. Foram analisadas 283 publicações (sendo 63% vídeos), das quais 90% apresentaram traços populistas. As publicações não populistas eram predominantemente informativas, divulgando entrevistas do candidato ou do seu pai, Jair Bolsonaro, então candidato à presidência do país.

Vale ressaltar que em nenhuma publicação houve menção ao Partido Liberal (PL), filiação de Eduardo e Jair. A comunicação optou por usar as cores da bandeira do Brasil como distintivo visual e utilizar apenas as figuras dos candidatos. Assim, a campanha de Eduardo Bolsonaro foi uma extensão da campanha do seu pai, destacando-o como o único capaz de erradicar a corrupção e cuidar do Brasil. A estratégia envolveu também a promoção de candidatos a deputado de outros Estados, com publicações gráficas listando os seus nomes, números para voto e os seus respetivos Estados.

Os conceitos populistas identificados incluem "líder carismático", seguido por "enfrentamento com a oposição", "vontade do povo", "rutura do sistema tradicional" e "demandas". Notamos que uma parte significativa das publicações que envolviam o traço “líder carismático” também foram acompanhadas da “vontade do povo”. Além disso, a estratégia comunicacional de Eduardo Bolsonaro incorporou ironia, sarcasmo e humor ácido para confrontar adversários, ao mesmo tempo, em que se colocava como representante do "homem comum".

O enfrentamento com a imprensa nacional, a divulgação do seu livro Jair Bolsonaro: O Fenômeno Ignorado, e o posicionamento contra o "sistema", enfatizando a legitimação pelo povo, foram elementos-chave. A utilização de eventos mundiais, como a morte da rainha Elizabeth, na Inglaterra, e movimentos políticos em outros países, a exemplo do Chile e Argentina, serviu como contexto para abordar temas como democracia e prosperidade.

As demandas apresentadas por Eduardo Bolsonaro foram ínfimas nas suas publicações, apenas incluíram o apoio ao armamento como forma de segurança; defesa das mulheres, uma vez que o seu pai era chamado de machista e misógino; e valorização da religião, sempre ancoradas na figura de Jair Bolsonaro. O candidato explorou extensivamente o recurso de diretos para se aproximar do público, discutindo política e reforçando a sua posição contrária à oposição, principalmente a Luiz Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores (PT), que era o maior rival do seu pai naquela eleição.

Assim, exibimos na Figura 2 os resultados obtidos durante a fase inicial da pesquisa.


Figura 2
Resultado da análise sobre os traços populistas da comunicação de Eduardo Bolsonaro

Em síntese, a análise das estratégias populistas revela uma abordagem intensa e diversificada. Com 90% das publicações apresentando traços populistas, o candidato construiu uma campanha fortemente vinculada à imagem do seu pai. A utilização de conceitos como "líder carismático", "enfrentamento com a oposição" e "vontade do povo" foi acompanhada por estratégias de confronto, ironia e humor ácido para descredibilizar adversários, enquanto Eduardo se autodefinia como representante do "homem comum".

7.3. Populismo: André Ventura versus Eduardo Bolsonaro

Ambos os candidatos incorporaram conceitos populistas, com destaque para "enfrentamento com a oposição", "líder carismático", e "vontade do povo", utilizando estratégias de confronto e criação de narrativas que os aproximavam das suas respetivas bases eleitorais. No entanto, André Ventura adotou uma postura mais centrada em propostas e demandas, fundamentando o seu discurso em informações divulgadas pela imprensa.

Já Eduardo Bolsonaro enfatizou a extensão da imagem do seu pai, Jair Bolsonaro, utilizando assim uma imagem de líder carismático que representa o povo brasileiro, explorando eventos globais e diversificando as suas formas de comunicação, com destaque para a aproximação com o público e para o entretenimento, a partir de diretos e compartilhamento de assuntos-satélite.

Na Figura 3, apresentamos uma análise comparativa do André Ventura e Eduardo Bolsonaro.


Figura 3
Resultado da análise comparativa sobre os traços populistas dos candidatos

Esta comparação conclui que houve presença significativa de conceitos populistas em ambas as comunicações eleitorais e destaca a adaptabilidade das estratégias populistas em contextos eleitorais distintos, evidenciando nuances na abordagem comunicativa de André Ventura e Eduardo Bolsonaro, elementos cruciais para compreender as dinâmicas do populismo contemporâneo nas eleições.

8. Facebook em Foco: Análise e Discussão dos Resultados

A segunda parte da nossa análise destina-se a perceber e compreender quais foram finalidades do Facebook na comunicação estratégica eleitoral de cada candidato. Depois, faremos uma comparação entre as estratégias de André Ventura e Eduardo Bolsonaro, na referida plataforma social digital.

8.1. A Comunicação de André Ventura no Facebook

A análise da comunicação de André Ventura no Facebook revela uma estratégia marcada pela concisão e consistência, é o que observamos ao analisar a Figura 4. Na categoria “transmissão”, o candidato adota uma abordagem predominantemente negativa ao referir-se à oposição política e ao sistema tradicional, evidenciado pela predominância em suas publicações (49%). Em contrapartida, destaca-se um posicionamento mais positivo ao abordar o seu partido, o Chega, apresentando demandas por meio de propostas em 32% das publicações.

No âmbito da mobilização, Ventura emprega entretenimento ao partilhar fotos de eventos de campanha, limitando-se a informar a sua presença em diferentes localidades do país, com 15% de publicações nesse formato. Surpreendentemente, convoca o público à ação em apenas 2% das publicações, ressaltando a importância do voto para a mudança no país.

No que diz respeito à personalização, o candidato utiliza a sua própria imagem para representar o partido Chega, embora essa estratégia seja empregada de maneira explícita apenas uma vez. Em aproximação, destaca-se ainda a estratégia de partilha de notícias, por meio de links ou prints, evidenciando uma abordagem menos profissional na apresentação visual das postagens. A ausência de tratamento de imagens e formalidades digitais contribui para a construção da imagem de Ventura como alguém genuíno e alinhado com a população.


Figura 4
Resultado da análise das finalidades do Facebook de André Ventura

A análise reflete uma comunicação estratégica, com pontos fortes na polarização de posições políticas, na personalização, mas também aponta para a falta de profissionalização visual, o que pode ser interpretado como uma estratégia de autenticidade frente aos eleitores. Além disso, a estratégia informal de partilha de notícias, sem grande profissionalização, destaca Ventura como alguém conectado à realidade da população, culminando numa abordagem comunicacional impactante.

8.2. A Comunicação de Eduardo Bolsonaro no Facebook

A análise da comunicação de Eduardo Bolsonaro no Facebook aponta para uma estratégia marcada por um discurso prolixo, conforme Figura 5. A sua abordagem comunicativa estende-se aos detalhes, nuances e ramificações, resultando em mensagens menos claras e mais desafiadoras de serem compreendidas.

No que diz respeito à categoria “transmissão”, destaca-se um posicionamento negativo, com 31% das publicações voltadas principalmente para o enfrentamento com a oposição de Lula da Silva. Em contrapartida, observa-se um posicionamento positivo em 16% das publicações, referindo-se ao seu pai, Jair Bolsonaro.

Na mobilização, o candidato utiliza o entretenimento em 22% das publicações, destacando a sua participação em eventos de campanha, principalmente os de Jair Bolsonaro, acompanhados de mensagens patriotas ou de enfrentamento com a oposição e ao sistema tradicional. Além disso, houve 18% das publicações destinadas à convocação para ação, seja para assistir e partilhar os diretos que fez frequentemente na sua página no Facebook ou para participar de eventos de campanha. A ênfase na convocação para votar no dia da eleição não é proeminente.

Quanto à personalização, reafirmamos que a campanha de Eduardo Bolsonaro é percebida como uma extensão da campanha do pai, uma vez que a própria figura é destaca como candidato a deputado federal apenas em duas publicações, enquanto Jair Bolsonaro recebe destaque como candidato à Presidência da República em 11% das publicações.

A diversidade nas formas de comunicação visual é evidente, variando entre criações gráficas, imagens amadoras partilhadas de outras redes sociais, vídeos caseiros e notícias partilhadas para o enfrentamento com a oposição, destacando a flexibilidade e a informalidade na abordagem comunicativa de Eduardo Bolsonaro. Essa estratégia busca retratá-lo como uma figura comum, integrada ao povo brasileiro.


Figura 5
Resultado da análise das finalidades do Facebook de Eduardo Bolsonaro

Em síntese, a análise aponta para uma comunicação detalhada, polarizada entre opositores e apoiantes, com ênfase na personalização relativamente à campanha do pai, e uma abordagem visual diversificada e informal para estabelecer uma conexão mais próxima com o eleitorado.

8.3. A Comunicação no Facebook: André Ventura versus Eduardo Bolsonaro

A análise comparativa das estratégias de comunicação no Facebook de André Ventura e Eduardo Bolsonaro revela abordagens distintas, refletindo nuances nas estratégias de construção de imagem e envolvimento com o público. Enquanto Ventura opta por uma comunicação concisa e consistente, priorizando posicionamentos polarizados e personalização, Bolsonaro adota uma abordagem mais prolixa, explorando detalhes e ramificações nas suas mensagens. Em transmissão, Ventura destaca-se por seu posicionamento predominantemente negativo, sobretudo em relação à oposição política e ao sistema tradicional, contrastado por um enfoque positivo ao apresentar propostas para seu partido, o Chega. Por sua vez, Bolsonaro concentra-se numa narrativa de confronto com a oposição, especialmente Lula da Silva, enquanto reserva espaço considerável para destacar positivamente o seu pai, Jair Bolsonaro, candidato à presidência.

No aspeto da mobilização, ambos os candidatos utilizam estratégias de entretenimento, sendo Ventura mais centrado em fotos de eventos de campanha, enquanto Bolsonaro mescla entretenimento com mensagens patrióticas e de enfrentamento. A convocação para ação apresenta uma disparidade notável, com Ventura conclamando o público a votar para mudar o país no dia da eleição, enquanto Bolsonaro enfatiza a participação em eventos e compartilhamento de diretos, deixando em segundo plano o convite direto para votação.

No tocante à personalização, Ventura utiliza a sua imagem para representar o partido Chega de maneira explícita, ao passo que Bolsonaro tem a sua campanha mais fortemente associada à figura de Jair Bolsonaro e nunca menciona o Partido Liberal. Em aproximação, a diversidade nas formas de comunicação visual também se destaca, com Ventura adotando uma abordagem menos profissional nas imagens partilhadas, sugerindo autenticidade, enquanto Bolsonaro diversifica entre criações gráficas, imagens amadoras e vídeos caseiros, buscando uma conexão informal com o público.

Ambos os candidatos utilizam estratégias que buscam estabelecer uma identificação com o eleitorado, seja por meio da polarização de posições, personalização ou abordagens visuais que sugerem autenticidade. Contudo, as suas ênfases e escolhas estratégicas revelam diferentes nuances nas suas abordagens de comunicação política no Facebook.

9. Considerações Finais

A análise das estratégias de comunicação de André Ventura e Eduardo Bolsonaro no Facebook durante os 45 dias que antecederam a votação eleitoral para deputados em Portugal e no Brasil, em 2022, proporciona uma ampla compreensão das abordagens populistas adotadas por esses líderes políticos na referida rede social digital. Ambos os candidatos buscaram consolidar as suas imagens de poder por meio de estratégias que exploraram as dinâmicas sociais e comunicacionais, destacando-se como defensores da vontade do povo.

Em resposta à nossa pergunta de investigação — “Mensagens de cunho populista foram potencializadas a partir do uso estratégico do Facebook nas campanhas de André Ventura e Eduardo Bolsonaro, em 2022?” — concluímos que o conjunto das análises sobre as abordagens populistas e as finalidades do Facebook nos permitiu confirmar que o uso de estratégias populistas foi amplamente trabalhado e divulgado nas páginas de ambos os candidatos. Assim, essas estratégias foram potencializadas na plataforma digital durante a campanha eleitoral.

Verificamos ainda que, além de serem potencializadas, as estratégias populistas adotadas podem ser distintas, sendo moldadas pelo perfil do candidato, o público-alvo e as especificidades de cada país, em termos sociais e culturais. Identificamos que ambos os candidatos enfatizaram o elemento "enfrentamento com a oposição" para transmitir os seus posicionamentos, predominantemente negativos, utilizando estratégias repletas de ironia, sarcasmo e humor ácido.

Embora as estratégias apresentassem diferenças, ambas seguiram uma abordagem consistente com a visão de Cacciotto (2011) e de Gross e Johnson (2016), que enfatizam o uso das redes sociais digitais como ferramentas com potencial para difamar ou desacreditar opositores. Ventura apoiou-se na construção de uma imagem sólida para seu partido, explorando a retórica populista para atrair eleitores descontentes com o sistema político estabelecido e desacreditando adversários políticos. Por outro lado, Eduardo concentrou-se em desacreditar a imprensa brasileira e adotou uma narrativa de confronto direto com a oposição, especialmente contra Lula da Silva, enquanto reservava espaço considerável para destacar positivamente seu pai, Jair Bolsonaro, então candidato à presidência.

Ventura ainda investiu, maioritariamente, em publicações na defesa das supostas demandas da população e na apresentação de propostas, numa comunicação concisa e consistente, fundamentando o seu discurso, na maioria das vezes, em informações divulgadas pela imprensa. Esta abordagem reflete o argumento de Laclau (2013) de que o conceito abstrato de povo permite manipulação por líderes populistas, que afirmam lutar por uma causa comum, que por vezes não representam verdadeiramente as aspirações coletivas.

Por outro lado, Eduardo Bolsonaro concentrou-se principalmente nos elementos de "líder carismático", com uma comunicação mais prolixa e de maior dificuldade de entendimento para o público em geral. O candidato brasileiro construiu uma campanha fortemente vinculada à imagem de seu pai, Jair Bolsonaro. Essa estratégia alinha-se com a ideia de que políticos populistas categorizam a elite conforme seus próprios interesses, escapando ao paradigma de classes sociais marxistas e focando numa luta pela moralidade (Baumgartner, 2021).

Além disso, a comunicação de Eduardo diversificou-se em várias formas, com destaque para o confronto com a imprensa, a divulgação de seu próprio livro sobre o pai e a produção massiva de transmissões ao vivo. Este uso estratégico do Facebook possibilitou uma comunicação massiva e direta com eleitores, transmitindo a mensagem de que fazem parte do povo (Gerbaudo, 2018).

A estratégia de produção de conteúdo em formato de diretos, por exemplo, reforçou a imagem de "líder carismático" de Eduardo Bolsonaro por meio da mobilização, com chamadas para ação, como "assistir” e “partilhar". Este é mais um elemento que diferencia as estratégias dos candidatos, uma vez que Ventura limitou-se a entreter o público através da divulgação de eventos de campanha por meio de fotos e textos simples, que continham a identificação do local em que esteve presente e um agradecimento à presença do público. Quanto à personalização, outra diferença entre o português e o brasileiro, Ventura investiu na divulgação de seu partido, colocando-se como a personificação da agremiação, enquanto Eduardo, em sua maioria das publicações, associou sua imagem a Jair Bolsonaro, sem mencionar o partido. Essas diferenças estratégicas podem ser interpretadas à luz das reflexões de Figueiras (2019) sobre a utilização das redes sociais digitais como ferramenta de mobilização e envolvimento do público. A abordagem de Ventura parece procurar um apelo mais direto à ação política, enquanto Bolsonaro prefere uma comunicação mais ampla, buscando não apenas o voto, mas também a participação contínua do eleitorado em eventos presenciais e online.

A diversidade nas formas de comunicação visual destaca-se, com Ventura adotando uma abordagem menos profissional nas imagens partilhadas, sugerindo autenticidade, enquanto Bolsonaro diversifica entre criações gráficas, imagens amadoras e vídeos caseiros, buscando uma conexão informal com o público. No entanto, ambos os candidatos utilizam estratégias para estabelecer uma identificação com o eleitorado, seja por meio da polarização de posições ou abordagens visuais que sugerem autenticidade. Contudo, ressaltamos que as ênfases e escolhas estratégicas revelam diferentes nuances em suas abordagens de comunicação política no Facebook.

Em suma, a partir da análise das estratégias de comunicação, identificamos que a comunicação de Ventura e Eduardo os apresentou como uma alternativa à perceção de que a democracia falhou em cumprir suas promessas normativas, em consonância com a análise de Freitas et al. (2023) e Scott (2019) acerca da ascensão de políticos populistas de extrema-direita e nacionalistas. O nosso estudo oferece, assim, uma contribuição para a compreensão das complexidades do populismo contemporâneo, destacando a importância de analisar não apenas os traços populistas em si, mas também as estratégias de comunicação adotadas em plataformas digitais como o Facebook. A adaptação dessas estratégias para diferentes contextos eleitorais e a interação entre líderes políticos, plataformas digitais e eleitores revelam dinâmicas que moldam o cenário político global.

As limitações deste estudo incluem uma amostra restrita que se concentra exclusivamente em publicações específicas no Facebook de dois candidatos durante um período delimitado: o da campanha eleitoral. Esta escolha pode não abranger outras nuances relevantes em períodos fora da eleição. Além disso, a análise adotou critérios pré-definidos, o que pode inadvertidamente excluir aspetos pertinentes não contemplados na seleção. A omissão da análise de indicadores de envolvimento, como comentários e gostos, restringe a compreensão da interação dos seguidores e a recetividade das mensagens. Reconhecemos que a abordagem predominantemente qualitativa limita a generalização dos resultados, enquanto a falta de exploração da perceção dos eleitores e entrevistas reduz a compreensão dos impactos percebidos. Uma análise comparativa mais abrangente entre diferentes candidatos e partidos poderia enriquecer os resultados obtidos. Essas limitações identificadas oferecem oportunidades claras para aprimoramentos em futuras investigações.

Contribuição das autoras

Jessica Sandes realizou conceitualização, investigação, metodologia, curadoria de dados, análise formal, redação do rascunho original e revisão e edição. Micaela Cabral realizou investigação, metodologia, curadoria de dados, análise formal, redação do rascunho original e revisão e edição. Aline Padilha realizou metodologia e análise formal.

Notas Biográficas

Jessica Sandes é mestre em comunicação estratégica: publicidade e relações públicas pela Universidade da Beira Interior, em Portugal, e graduada em comunicação social com habilitação em jornalismo pelo Centro Universitário Jorge Amado, no Brasil. Atuou como repórter, assessora de imprensa e coordenadora de comunicação política no Brasil, e também é investigadora na área de comunicação política, com foco em estratégias de campanhas eleitorais em redes sociais digitais e na utilização das emoções na política.

Micaela Cabral é doutoranda em ciências da comunicação da Universidade da Beira Interior e mestre em comunicação estratégica: publicidade e relações públicas pela mesma universidade. É bolseira de investigação da Fundação para Ciência e Tecnologia, realizando estudos relacionados a políticas para igualdade de género nas tecnologias da informação e da comunicação em Portugal, ativismo tecnológico, comunicação em rede e comunicação estratégica.

Aline Padilha é mestre em comunicação estratégica: publicidade e relações públicas pela Universidade da Beira Interior e é investigadora na área de assessoria em comunicação, com foco em medição de resultados como estratégias comunicacionais.

Material suplementar
Referências
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Notas
Notas
1. Negrito da obra original.
Tabela 1
Modelo de análise para identificação do populismo nas publicações

Adaptado de Mudde (2004) e Laclau (2013)
Tabela 2
Modelo para análise das finalidades do Facebook

Adaptado de Filimonov et al. (2016)

Figura 1
Resultado da análise sobre os traços populistas da comunicação de André Ventura

Figura 2
Resultado da análise sobre os traços populistas da comunicação de Eduardo Bolsonaro

Figura 3
Resultado da análise comparativa sobre os traços populistas dos candidatos

Figura 4
Resultado da análise das finalidades do Facebook de André Ventura

Figura 5
Resultado da análise das finalidades do Facebook de Eduardo Bolsonaro
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