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Os Desafios às Operações de Logística na Amazônia: fricção no abastecimento de unidades de fronteira
Hoplos Revista de Estudos Estratégicos e Relações Internacionais
Universidade Federal Fluminense, Brasil
ISSN: 2595-699x
Periodicidade: Semestral
vol. 4, núm. 6, 2020
Resumo: O propósito deste artigo é analisar a ação da fricção no abastecimento executado, sob a coordenação da 12ª Região Militar (12ª RM), em prol do Comando de Fronteira Solimões/8º Batalhão de Infantaria de Selva (CFSOL/8º BIS), unidade militar localizada na tríplice fronteira Brasil- Colômbia-Peru. Para isso, inicialmente, apresentar-se-á o conceito de logística e os seus níveis de atuação. Em seguida, abordar-se-á a relação entre a fricção e a logística executada nessa região. A partir desse ponto, analisar- se-á a sistemática empregada pela 12ª RM para prover o abastecimento ao batalhão e aos seus Pelotões Especiais de Fronteira (PEF) utilizando diversos modais de transporte militares e civis, com ênfase na ferramenta da logística baseada no desempenho. Finalizando, esse artigo aprofundará a análise sobre a ação da fricção nesse processo de abastecimento, identificando fatores e propondo sugestões para mitigar as ações desses fatores no abastecimento dessa OM, de modo a garantir a manutenção de níveis satisfatórios de segurança logística. A pesquisa baseou-se em revisão bibliográfica para delimitar os conceitos utilizados e em dados qualitativos, visando compreender a complexidade e os detalhes das informações. Dessa forma, busca-se atingir o objetivo proposto para o presente artigo.
Palavras-chave: Amazônia, Tríplice Fronteira, Logística, Abastecimento, Fricção.
Abstract: The purpose of this article is to analyze the action of friction in supply, under the coordination of the 12th Military Region (12th RM), in favor of the Solimoes Border Command/8th Jungle Infantry Battalion (CFSOL/8th BIS), military unit located on the Brazil-Colombia-Peru border. For this, the concept of logistics and its performance levels are presented. Then, make a relationship between friction and logistics performed in that region. From that point on, it will analyze systematic employed by the 12th RM for provide the supply to this battalion and its special border platoons (PEF), using different modes of transport for military and civilian, with strategies for using the performance based logistics. Finally, this article will analyze of friction action in this logistical supply process, identifying negative factors and proposing suggestions to mitigate actions of these factors in this battalion supply, in order to ensure the maintenance of satisfactory levels of logistical security. The research was based on a literature review to delimit the concepts used and qualitative information, aiming to understand the complexity and details of the information. Thus, we seek to achieve the objective proposed for this article.
Keywords: Amazon, Triple Border, Logistics, Supply, Friction.
1 Introdução
O ambiente amazônico pode ser caracterizado como uma região adversa em função dos seus fatores fisiográficos. As grandes extensões dos rios, os regimes pluvial e fluvial intensos, as elevadas temperaturas, dentre outros, são fatores que afetam o fluxo de abastecimento para as cidades, vilas, indústrias e unidades militares na região.
A região amazônica faz parte de diversas cadeias produtivas e de pesquisas importantes para o país (BECKER, 2004; IORIS, 2020). A Defesa do território encontra uma série de desafios próprios (MEDEIROS, 2020; FRANCHI et al., 2011) dentre os quais a manutenção das unidades militares ali presentes, e o suporte às diversas operações interagências que ocorrem anualmente (PAIM et al., 2019; Ferreira et al. 2017). Para se realizar qualquer operação militar, há a necessidade de se prever e prover um abastecimento eficiente para que os objetivos traçados sejam alcançados. A história militar demonstra que a ausência de um processo de abastecimento eficiente contribuiu para o fracasso de uma operação militar (MURRAY, 2011). Nos estudos sobre a guerra e as atividades militares, todos os problemas e entraves quanto à realização das atividades podem ser analisados sob a ótica do conceito de fricção criado pelo General prussiano Carl von Clausewitz (2010).
Em virtude disso, o objetivo deste trabalho é analisar a ação da fricção no abastecimento executado, sob a coordenação da 12ª Região Militar (12ª RM), em prol do Comando de Fronteira Solimões/8º Batalhão de Infantaria de Selva (CFSOL/8º BIS), de forma a facilitar a adoção de medidas eficientes para a manutenção e o incremento da eficiência desse apoio logístico em benefício dessa organização militar (OM). A escolha dessa temática é motivada pelos seguintes fatores: (i) pela relevância do conceito de fricção para as operações militares; (ii) pela importância do abastecimento para as operações militares; (iii) pela necessidade de se conhecer as dificuldades que afetam o abastecimento na Amazônia; e (iv) pela importância da região amazônica para os interesses nacionais e de defesa, de acordo com a Política de Defesa Nacional/Estratégia Nacional de Defesa (PND/END).
Embora Clausewitz (2010) tenha concebido o seu conceito de fricção atrelado à guerra, as operações de abastecimento de unidades militares em tempo de paz também estão suscetíveis à ação desse fenômeno. Na fronteira Brasil-Colômbia-Peru, os fatores de fricção que impactam a abastecimento vêm contribuindo para a adoção de novas práticas logísticas visando à manutenção do fluxo de abastecimento para o CFSOL/8° BIS.
Este trabalho está baseado em dados qualitativos, motivo pelo qual a análise de conteúdo será empregada, tendo como autora de referência Lawrence Bardin (1977). A partir dos conceitos de fricção elaborados por autores clássicos e contemporâneos, adotou-se como método a elaboração de categorias de fricção com seus respectivos elementos, e a seleção das características que impactam as atividades de abastecimento. Tais procedimentos foram realizados através de pesquisas dos conceitos envolvidos nos manuais doutrinários do Exército Brasileiro (BRASIL, 2015; 2018; 2019); em autores clássicos das ciências militares, como Clausewitz (2010) e Jomini (2007); em s trabalhos contemporâneos de estudiosos da fricção, como Elward (2010); Keegan (1996); Malkki, Malkki (2011) e Watts (1996); em trabalhos de especialistas em logística no meio militar, como Kress (2002) e Pagonis e Krause (1992); e dentre outros. A partir disso foi conceitualizada a fricção e avaliado seus impactos nas operações de abastecimento. Em seguida, foram analisados os relatórios das viagens logísticas e de documentos que abordam o abastecimento logístico para as organizações militares de fronteira, especificamente o executado a favor do CFSOL/8º BIS pela 12ª RM, identificando os principais óbices nesse processo.
2 O conceito de Logística e seus níveis de atuação
Para se analisar a questão do abastecimento dessa organização militar do Exército na fronteira Brasil-Colômbia-Peru, faz-se necessário abordar a questão da logística primeiramente, pois ela é a base de qualquer abastecimento.
Reconhece-se que a logística está alicerçada em fatores físicos, relações quantitativas entre parâmetros e regras formais que representam a sua faceta científica. Contudo, é igualmente reconhecido que o ambiente da guerra requer dos comandantes militares habilidades, experiências e criatividade que transcendem aspectos da cientificidade.
A logística possui importância capital para uma operação militar, pois ela é um requisito crítico para a obtenção do êxito. Ao longo dos séculos, diversos estudiosos da guerra a abordaram em seus trabalhos relacionando-a como fator essencial para a vitória nos campos de batalha (KENNNEDY, 2014).
A compreensão da logística começou a ser abordada por Clausewitz (2010) e Jomini (2007), em meados do século XIX, para então chegar a autores mais contemporâneos, como Keegan (1996) e Kress (2002), e ao entendimento institucional do Exército Brasileiro consolidado nos seus manuais vigentes.
Jomini (2007) se destacou como um teórico da guerra que analisou a logística de forma pormenorizada em relação a outros teóricos da sua época. Ele reconheceu que um chefe deveria ser conhecedor dos vários ramos da arte da guerra, sendo a logística um deles e de grande importância na condução das batalhas. Ao mesmo tempo, destacou que a logística era um elemento-chave para o emprego de um exército na guerra, sendo a mesma responsável pela mobilidade da tropa para implementar a estratégia definida pelo comandante. Nesse sentido, Jomini definiu a logística assim:
[...] a logística é a arte de mover exércitos, compreendendo a ordem e os detalhes das marchas e acampamentos e de fornecimento de tropas. É a execução das estratégias e dos empreendimentos táticos [...] a estratégia decide onde atuar e a logística traz a tropa até a este ponto (JOMINI, 2007, p. 69).
Nessa mesma direção, Clausewitz no seu livro Da Guerra, apesar de não utilizar diretamente o termo “logística”, ele descreveu partes dessas atividades no Livro V, capítulo XIV - O Abastecimento afirmando: “Nas guerras modernas, a questão do abastecimento ganhou importância considerável [...]. Em primeiro lugar, porque os exércitos são muito mais vastos do que os da Idade Média, e até mesmo do que os da Antiguidade” (CLAUSEWITZ, 2010, p. 421).
Outros estudiosos da guerra continuaram analisando a logística pela sua relevância nos combates modernos. No século atual, Kress analisou a sua importância para o êxito no teatro de operações. Assim, esse autor definiu-a:
[...] a logística é uma disciplina que abrange os recursos que são necessários para manter os meios da operação militar para atingir os resultados desejados (objetivos) [...] A logística inclui o planejamento, gerenciamento, tratamento e controle desses recursos (KRESS, 2002, p. 7).
O referido autor também menciona que a logística possui níveis de planejamento e de execução similares aos da guerra, sendo eles estratégico, operacional e tático (KRESS, 2002).
Resumidamente, a logística estratégica se ocupa da construção e manutenção da infraestrutura nacional, incluindo as indústrias, serviços, rodovias, ferrovias, portos e aeroportos. A logística operacional se encarrega das linhas de comunicação1 que mantém o fluxo de suprimentos provenientes dos fornecedores externos e/ou internos com destino às tropas dos escalões mais avançados no teatro de operações. Por fim, a logística tática é a responsável pela manutenção do fluxo de suprimentos necessários às tropas no terreno. Dessa forma, a logística tática possui o encargo de sustentar o poder de combate militar, sendo um elemento essencial para a vitória. Kress (2002, p. 26) adicionalmente destaca que “a logística tática sustenta as tropas, fornece-lhes matérias-primas (munições e combustível) e mantém seus equipamentos em condições de emprego”.
Com o pensamento alinhado ao de Kress, Pagonis e Krause (1992) analisaram a logística operacional e tática. Com relação a essa, esses dois autores compartilham da ideia de Kress, ao afirmar que a logística tática tem a incumbência de manter a sustentabilidade das forças e o ritmo em desfavor do inimigo. Corroborando com isso, Pagonis e Krause destacaram que “no nível tático, a logística é usada para afetar a batalha em andamento” (PAGONIS; KRAUSE, 1992, p. 2).No caso em tela, é a logística tática que assegura o abastecimento CFSOL/8º BIS, contribuindo para a manutenção do seu poder de combate na tríplice fronteira Brasil-Colômbia-Peru.
A partir da leitura de Da Guerra e com o auxílio de autores modernos, supracitados, foram selecionadas as características que dialogam diretamente com as dificuldades logísticas encontradas na Amazônia ocidental, priorizando assim: (i) as condições meteorológicas do ambiente onde ocorre o apoio logístico para as atividades militares; (ii) as ocorrências com os equipamentos; (iii) o estado de conservação e as condições de navegabilidade das vias de transportes.
Com relação ao aspecto conceitual da logística, o Ministério da Defesa (MD) considera que ela está relacionada aos recursos, de toda a espécie, para garantir as ações decorrentes de uma estratégia. Para o Exército Brasileiro (EB), a logística está diretamente relacionada a execução e manutenção das operações militares. Salienta-se que tanto o MD quanto o EB empregam os níveis de atuação da logística abordados por Kress (2002) e Pagonis e Krause (1992).
O quadro 1 permite a compreensão dos conceitos de logística e logística militar, no âmbito do Ministério da Defesa e do Exército Brasileiro (EB), e dos seus respectivos níveis de atuação.
Diante disso, observa-se que o conceito de logística do MD é mais abrangente, por estar no nível estratégico, em comparação ao adotado pelo Exército Brasileiro, que está no nível tático voltado às operações militares. Quanto à logística militar, depreende-se que o conceito adotado pelo EB está alinhado com o do MD, caracterizando uma coerência doutrinária desse conceito em relação aos níveis da logística2.
3 A Fricção e a Logística
Em razão do foco deste artigo ser a ação da fricção no abastecimento executado pela 12ª RM em proveito do CFSOL/8º BIS, somente serão analisados os teóricos e estudiosos desse fenômeno, cujas categorias e seus elementos impactam o abastecimento logístico em uma operação/atividade militar.
Clausewitz foi o primeiro teórico que estudou profundamente a fricção. Nesse sentido, ele afirmou que: “Na guerra, [...]. As dificuldades acumulam-se e levam a uma fricção de que ninguém faz corretamente ideia se não viu a guerra” (CLAUSEWITZ, 2010. p. 83). Ao longo da sua obra, ele destacou a ação desse fenômeno sobre diversos elementos dos combates, frisando a sua ação sobre os indivíduos que compunha a máquina militar, por meio do medo, cansaço, limitação, pouco treinamento (CLAUSEWITZ, 2010, p. 83). Segundo ele, a fricção também surgia no ambiente, outra categoria da fricção, pela ocorrência do frio, da chuva ou do calor excessivo, afetando o abastecimento das tropas, pois os elementos dessa categoria degradavam as condições de consumo dos gêneros alimentícios e do uso dos materiais, reduzindo o poder de combate dessas forças.
A categoria de fricção “marchas” e seus elementos (condições das vias em péssimo estado de conservação e os terrenos montanhosos) tinham o condão de impactar a duração dos deslocamentos, contribuindo para que as tropas atingissem o seu ponto culminante logístico, caracterizado pelo ponto de uma operação a partir do qual a logística deixa de ter capacidade para responder, efetivamente, às necessidades da força apoiada por limitação de recursos ou outra restrição à liberdade de ação (BRASIL, 2018, p. 110).
Para Clausewitz, o abastecimento irregular das tropas e a ausência de locais com condições mínimas para abrigá-las influenciavam o poder de combate dos combatentes. Assim, a falta de abastecimento e de abrigo foram outros elementos dessa categoria de fricção tratadas por Clausewitz no capítulo XII – As marchas:
No teatro de guerra propriamente dito, a falta de abastecimento e de abrigo [...], e a obrigação de estar a todo o momento preparado para a batalha são a causa de esforços desproporcionados que destroem os homens, animais, veículos e roupas (CLAUSEWITZ, 2010, p. 409).
A ocorrência de acidentes envolvendo os meios de transportes é outra manifestação da fricção com impacto no abastecimento de uma Unidade Militar, uma vez que um acidente envolvendo um comboio de suprimentos poderia retardar a entrega de gêneros alimentícios ou de materiais militares, impactando o desencadear da operação militar. Nesse sentido, Moltke analisou os acidentes com os trens ferroviários como uma manifestação da fricção que impactava a guerra:
Para os cálculos de uma quantidade conhecida e desconhecida [...], vêm os terceiros fatos que escapam a toda a previsão: tempo, doença, acidentes ferroviários, mal- entendidos e delírios e todos os efeitos que o homem pode chamar de sorte, destino ou a vontade de Deus. (MOLTKE, 1993 [1871-81], p. 93).
Outros estudiosos mais recentes também analisaram a fricção sob uma ótica do impacto no fluxo de abastecimento de uma OM na guerra ou na paz.
Assim como Clausewitz, John Keegan (1996) em suas análises sobre a guerra contemporânea, identificou a categoria de fricção “ambiente” e seus elementos, como terreno, estações, tempo, clima e vegetação. Esses elementos possuíam o potencial de impactar no abastecimento por contribuir para a ocorrência de retardo dos comboios de suprimentos para as tropas, prejudicando a eficiência das ações militares. Ele destaca que:
[...] as limitações mais importantes à guerra sempre estiveram além da vontade e do poder do homem. Elas pertencem ao reino daquilo que o Estado-maior soviético costumava chamar de “fatores permanentemente em operação” e esses fatores – tempo, clima, estações, terreno, vegetação – sempre afetam, com frequência inibem e às vezes proíbem totalmente as operações militares (KEEGAN, 1996, p. 79).
Watts (1996) identificou a categoria de fricção – equipamentos e seus elementos ineficientes. Esses podiam influenciar o fluxo de abastecimento ao contribuir para a ocorrência de atrasos na chegada dos comboios de suprimentos para as tropas.
Toda operação militar está envolta num ambiente de incertezas, onde nem mesmo a tecnologia incorporada aos materiais de emprego militar (MEM) seria suficiente para anular essa incerteza, como materialização da fricção. Nessa direção, Elward destacou: “Quase duas décadas depois da Guerra do Golfo, apesar da abundância de computadores, comunicação, informações e tecnologias, os conflitos são repletos de nevoeiro e fricção” (ELWARD, 2010, p. 4). Assim, mais uma vez, pode-se atestar que as incertezas permanecem atuais nas operações militares, o que contribui para impactar o fluxo de abastecimento ao retardar a chegada de comboios de suprimentos, comprometendo a sustentabilidade logística das tropas. Malkki e Malkki (2011) também reconheceram o ambiente como categoria da fricção,
sendo que a ocorrência do mau tempo nesse ambiente seria um fator gerador da fricção nas operações militares. Eles salientaram que:
Baseado nas nossas análises, sugerimos que a noção de fricção compreende dois elementos de naturezas distintas e, consequentemente, de pesquisa: 1) os fatores, por exemplo: mau tempo, perigo, esforço físico, inteligência e 2) o efeito: restrição da nossa capacidade de julgamento (MALKKI; MALKKI, 2011, p. 45).
Alinhados com teóricos e estudiosos, como Clausewitz e Keegan, eles destacaram que o mau tempo (elemento da categoria de fricção ambiente) poderiam produzir efeitos no abastecimento das tropas, por contribuírem para a ocorrência de adiamento no recebimento de suprimentos, comprometendo a execução de uma operação militar.
Diante do que foi exposto, pode-se constatar que as categorias de fricção e os seus elementos, ainda impactam as atividades de abastecimento, produzindo efeitos sobre o material e o pessoal empregado nas operações/atividades militares. A seguir, veremos que, na Amazônia Ocidental, o impacto da fricção deve ser pensado proporcionalmente às dimensões e aos problemas existentes nessa região.
4 A cadeia de abastecimento logístico na Amazônia Ocidental
As atividades de logística na Amazônia Ocidental apresentam maior grau de dificuldade em comparação com essas atividades executadas pelo EB em outras regiões brasileiras, especialmente pela influência do ambiente em que são executadas, razão pela qual a logística deverá ser pautada pela flexibilidade, adaptabilidade, modularidade, elasticidade e sustentabilidade (BRASIL, 2018, p. 15).
A 12ª RM, sediada em Manaus, é subordinada ao Comando Militar da Amazônia (CMA). Possui o encargo de garantir o abastecimento para as OM localizadas no Acre, Amazonas, Rondônia e Roraima, e, em especial, para as unidades militares de Fronteira, como o CFSOL/8° BIS (MIRANDA, 2012, p. 111).
Para isso, esse Grande Comando Logístico conta com o apoio de outras organizações militares do Exército Brasileiro situadas em Manaus, como o Centro de Embarcações do Comando Militar da Amazônia (CECMA) e o 12º Batalhão de Suprimentos (12º BSup). Excepcionalmente, o 4º Batalhão de Aviação do Exército (4ºBAvEx) poderá ser empregado nessa atividade de abastecimento de unidades de fronteira. Além desses meios orgânicos do Exército, a 12ª RM coordena o emprego dos aviões de transporte de carga/pessoal da Força Aérea Brasileira (FAB) por meio do Plano de Apoio à Amazônia (PAA).
Em linhas gerais, a sistemática do abastecimento prestado pela 12ª RM ao CFSOL/8º BIS segue o seguinte fluxo: os comboios logísticos fluviais do CECMA ou de operadores civis, e as aeronaves da FAB ou civis empregadas para transporte logístico dos suprimentos solicitados pelo batalhão (CFSOL/8º BIS) partem de Manaus com destino à 16ª Brigada de Infantaria de Selva (16ª Bda Inf Sl) localizada em Tefé, cerca de 522 quilômetros de Manaus. Em Tefé, a 16ª Base Logística de Selva (BaLog) transporta, via fluvial, a maioria dos suprimentos logísticos destinados ao 3° Pelotão Especial de Fronteira (PEF), localizado em Japurá, em função desse PEF está mais próximo de Tefé, enquanto os demais suprimentos destinados ao batalhão seguirão, por via fluvial ou aérea, para Tabatinga e de lá para os demais PEF do batalhão, sob a coordenação dessa organização militar.3
Para fazer frente às adversidades existentes no abastecimento e a fim de maximizar a eficiência dos recursos logísticos, é desejável que haja um elevado grau de integração entre as logísticas militar e civil, considerando-se a divisão das tarefas em função das capacidades de cada segmento, da normatização e padronização de procedimentos e da eliminação de redundâncias. (BRASIL, 2018, p. 17).
Nessa perspectiva, a 12ª RM vem adotando práticas de gestão logística civil, como a contratação de meios de transporte civis, como aeronaves de pequeno porte e embarcações tipo balsa e rebocadores, visando a manutenção do fluxo de abastecimento para o CFSOL/8º BIS. Cabe destacar que a terceirização de tarefas logísticas permite que empresas especializadas ampliem a sua eficiência e eficácia na prestação dessas tarefas (BRASIL, 2018, p. 18).
Essa prática está alinhada com o conceito da logística baseada no desempenho4 resultando na redução de custos operacionais e no emprego de recursos com maior eficiência. A ideia básica desse conceito é remunerar o operador logístico privado baseado no seu desempenho. Nesse sentido, Randall (2013) salientou que: “o PBL faz parte de uma família de estratégias, como a performance baseada na contratação e pagamento pelo desempenho, cuja essência é uma mudança de compra de produtos e serviços para a compra pelo desempenho”.
Assim, o abastecimento executado pela 12ª RM em favor do CFSOL/8º BIS possui as vertentes aérea e fluvial. Passaremos a analisá-las pormenorizadamente.
4.1 Modal aéreo: o Plano de Apoio à Amazônia (PAA) e o emprego de meios aéreos civis
O PAA é executado pela FAB por meio do gerenciamento do Comando de Operações Aeroespaciais (COMAE) e da coordenação do Comando de Preparo (COMPREP), tendo por finalidade transportar suprimentos às Brigadas de Infantaria de Selva, aos Comandos de Fronteira e seus respectivos Pelotões Especiais de Fronteira, contribuindo para mitigar os óbices logísticos nessa região.
Para enfrentar essa realidade, a FAB vem utilizando aviões de transporte de carga/pessoal, especificamente, o C-105 Amazonas e o C-98 Caravan. A aeronave C-105 Amazonas é um meio aéreo novo, com tempo médio na FAB de 10 (dez) anos. Possui capacidade de carga de 4.000 (quatro mil) quilos, aproximadamente, ou 40 (quarenta) passageiros. (FLORES JR., 2015, p. 1290). O C-98 Caravan vem sendo empregado nessas missões de abastecimento em complemento ao C-105, destacando que a sua pequena capacidade de carga (900 seiscentos) quilos é compensada pela sua elevada aptidão para pousar em praticamente todas as pistas de pouso existentes na Amazônia.
Todavia, como é de conhecimento público, a atual conjuntura de restrição orçamentária da FAB tem colaborado para a diminuição do emprego dos seus meios aéreos em apoio ao PAA, impactando na sustentabilidade logística do CFSOL/8º BIS e dos seus PEF. Nesse contexto de restrição de meios e recursos orçamentários, a adoção do mecanismo da logística baseada no desempenho (PBL) pela 12ª RM tem se mostrado uma ferramenta eficiente na manutenção do fluxo de abastecimento para o CFSOL/8º BIS. Para isso, tem utilizado os meios aéreos civis com a finalidade de garantir a manutenção dos níveis mínimos de segurança logística dessa OM. A decisão por esse serviço se justifica por ser mais econômico, pois o custo da hora de voo de uma aeronave civil é menor do que o de uma aeronave militar. A diferença de custos se dá por diversos fatores como tecnologia embarcada, consumo elevado do combustível de aviação, entre outros. Além disso, as aeronaves civis possuem maior flexibilidade para a realização dos voos, fator necessário em se tratando das dificuldades naturais/logísticas existentes na Amazônia e dispõe de seguro para a carga transportada, garantindo o recebimento de indenização em caso de quaisquer eventos que a danifiquem.
De forma pormenorizada, a 12ª RM contrata o serviço de transporte aéreo de carga, por meio de processo licitatório, com o objetivo de prover o abastecimento da 16ª Bda Inf Sl, do CFSOL/8° BIS e dos seus respectivos PEF. Nos últimos tempos, a aeronave Gran Caravan vem sendo empregada nesse serviço por possuir considerável capacidade de carga (cerca de 1.300 quilos ou 9 (nove) passageiros), ser econômica quanto ao custo da hora de voo e pela sua aptidão para pousar em praticamente todas as pistas de pouso existentes na Amazônia. Como resultado, as aeronaves da FAB ficam disponíveis para transportar materiais de emprego militar mais sensíveis por possuírem maior volume de carga5.
Por se tratar de um contrato celebrado entre a 12ª RM e a empresa vencedora da licitação, haverá um fiscal de contrato com a responsabilidade de zelar pelo seu estrito cumprimento. Vale ressaltar que, o custo por esse serviço seguirá o estágio normal da despesa, garantindo que o pagamento somente será executado somente após a entrega da carga no destino final, caracterizando a eficiência e a economicidade desse serviço.
Dessa forma, pode-se afirmar que o emprego da ferramenta “PBL” vem reduzindo os custos finais das viagens logísticas pelo emprego de meios privados, contribuindo para assegurar a sustentabilidade logística da tropa desdobrada na fronteira, e consequentemente, reduzindo as demandas de manutenção preventiva e corretiva dos meios aéreos da FAB empregado no PAA.
4.2 Modal fluvial: o Centro de Embarcações do Comando Militar da Amazônia (CECMA) e o emprego de meios FLUVIAIS civis
O transporte fluvial é o principal modal de transporte na Amazônia devido às características naturais da região, à pouca infraestrutura rodoviária e aos custos de transporte aéreo. Conforme assevera Euzébio:
O transporte fluvial regular de carga e passageiros pelo rio Solimões no trecho Tabatinga-Manaus constitui-se na logística fundamental para o abastecimento das cidades de Tabatinga, Letícia e arredores. [...]. De pequenas a grandes lojas de varejo, oficinas e comércios, instituições públicas, escolas, hospitais, forças armadas, etc. (EUZÉBIO, 2015, p.10)
Nesse contexto, a 12ª RM coordena o apoio logístico para o CFSOL/8º BIS executado pelo CECMA utilizando-se dos seus meios de transporte fluvial orgânicos compostos por empurradores, ferry-boats, balsas frigorificadas e balsas para o transporte de carga em geral no trecho Manaus-Tabatinga, com escala em Tefé. Com o objetivo de garantir maior efetividade e continuidade do abastecimento para o CFSOL/8º BIS, a 12ª RM vem adotando a mesma prática de contratação de operadores civis para o transporte logístico fluvial, por meio de licitação pública, em complemento ao apoio logístico prestado pelo CECMA.
Além do custo inferior em comparação ao de uma viagem logística realizada pelo CECMA, a 12ª RM obtém outras vantagens nesse processo, como maior flexibilidade para remessa da carga por possuir maior disponibilidade de datas para isso, além do fato da carga a ser transportada estar coberta por seguro, garantindo o recebimento de indenização em caso de danos à carga transportada.
Diante do exposto, pode-se inferir que a adoção da ferramenta da “logística baseada no desempenho” vem reduzindo custos finais das viagens logísticas e promovendo maior flexibilidade ao processo de abastecimento, incrementando a eficiência desse processo em favor do CFSOL/8º BIS e garantindo maior segurança logística para as atividades executadas por essa OM.
5 A ação da fricção no abastecimento executado pela 12ª Região Militar em proveito da OM de fronteira
A fricção é um fenômeno presente nas operações militares e em qualquer ambiente operacional (CLAUSEWITZ, 2010). Partindo dessa premissa, pode-se afirmar que a sua presença na Amazônia é algo recorrente, pois a complexidade dessa região geográfica contribui para a manifestação da fricção na logística executada pela 12ª RM a favor do CFSOL/8º BIS.
Em virtude da natureza exuberante, os fatores hidrográficos são uma das causas da fricção na Amazônia. Nessa direção, Ferreira (2018) afirma que a navegabilidade das embarcações na Amazônia é dependente dos níveis dos rios que estão sujeitos ao regime das cheias e vazantes que caracterizam o ciclo das águas amazônicas.
Assim, essa realidade fluvial define as condições mínimas de navegabilidade do principal modal de transporte na região, impactando o abastecimento do CFSOL/8° BIS. Nesse sentido, Bueno et al. (2013, p. 4-5) destacam que:
Os rios apresentam variações de profundidade e condições de calado ao longo do ano, de acordo com as cheias épocas de seca. O rio Amazonas pode apresentar condições de atracação continentais, com profundidades de até 26 metros. Mas no rio Madeira as profundidades em seus terminais são determinadas pelo regime das águas, que variam entre 2,5m e 17,5m.
A fricção nesse caso se configura pela restrição/dificuldades de navegabilidade restritivas dessa via de transporte fluvial (categoria de fricção “marchas”), em determinadas épocas do ano, decorrente do regime da vazante dos rios, podendo impactar diretamente o abastecimento, pelo fato dos rios serem a principal via de transporte na região.
Atualmente, a baixa disponibilidade de horas de voo (HDV) das aeronaves da FAB é outro fator gerador da fricção que afeta o abastecimento logístico na Amazônia Ocidental por contribuir para a diminuição do volume de suprimentos transportados para o CFSOL/8º BIS6. A fricção, nessa situação, se configura pelas carências logísticas que essa OM poderá vir a sofrer com o não abastecimento regular pelas aeronaves da FAB, podendo ocasionar a falta de suprimentos necessários à manutenção de suas atividades rotineiras e/ou missões. Em razão dessa realidade cada vez mais comum, a 12ª RM vem contratando aeronaves civis de pequeno porte para complementar o apoio aéreo prestado pela FAB, de modo a garantir a provisão do batalhão e dos seus PEF.
As alterações nos equipamentos das embarcações do CECMA é outro fator que colabora para a manifestação da fricção nos rios amazônicos, uma vez que esses eventos tendem a causar delongas na chegada dos comboios logísticos, impactando o abastecimento para as unidades supridas.
Para amparar essas informações, foi realizada uma pesquisa nos documentos oficiais relativos ao assunto, sendo analisados: (i) os relatórios das viagens logísticas realizadas no ano 2016; (ii) os diários de bordo das embarcações com dados sobre as viagens logísticas realizadas no ano de 2016 e (iii) a relação das principais panes/alterações ocorridas nas viagens logísticas por eixo nos anos de 2011 a 2016, observando-se as seguintes alterações:
Doc. | Mês/Ano | Alterações verificadas |
Relatório de viagem logística | Março-Abril 2016 | - A alavanca da madre do leme precisa ser substituída tendo em vista a embarcação ter deficiência no curso das manobras de navegação e atracações da embarcação. |
Março-Abril 2016 | - O sistema elétrico da cabine de comando encontra-se com variação na tensão da corrente ocasionando a queima dos fusíveis, lâmpadas e holofotes. | |
Agosto - Setembro 2016 | - A bomba injetora do propulsor apresentou vazamentos (2x). - O propulsor apresentou falha na partida mesmo após os bornes das baterias terem sido substituídos. - O sistema elétrico necessita ser refeito tendo em vista que o equipamento de sonda apresentou mal funcionamento e o equipamento radio Cobra Marine MR F55B-D NR Série W306005231 parou de funcionar devido a um curto circuito na fiação. - O equipamento rádio portátil Marine HX 290 NR Série J62B211714 retornou com o botão de mudança de frequência quebrado não sendo possível identificar a causa da quebra. | |
Novembro Dezembro – 2016 | - O relé de partida da caixa top precisou ser substituído. - O sistema de alimentação do holofote parou de funcionar, desse modo foi feito um ajuste para que o holofote funcionasse com energia elétrica e não mais com a bateria 12 V. - A mangueira de alimentação do propulsor apresentou vazamentos. | |
Diário de Bordo | Março-Junho 2016 | - As juntas do cabeçote apresentaram vazamento de óleo, ocasionando a paralisação da turbina do motor. - A embarcação colidiu com galhos de árvores na margem do rio provocando danos na estrutura do telhado da embarcação. - A embarcação colidiu com uma praia, o que provocou o seu encalhamento na areia. |
Agosto-Setembro 2016 | - A mangueira de combustível do propulsor apresentou vazamentos (3x). - A bomba injetora do propulsor apresentou vazamentos (3x). - GPS/sonda apresentou defeito. - O equipamento Cobra Marine MR F55B-D NR Série W306005231 parou de funcionar devido a um curto circuito na fiação. - A correia da bomba do hidráulico rompeu-se. - O motor de popa inundou devido a um forte temporal. |
Das informações apresentadas acima, constatou-se a existência de 3 categorias de fricção (ambiente, marchas e equipamentos), caracterizadas pelos seus elementos: temporais/chuvas; condições de navegabilidade das vias fluviais (condições das vias em péssimo estado de conservação); e equipamentos ineficientes, respectivamente. Sendo que essa última constituiu a principal causa da fricção verificada nas viagens logísticas realizadas pelo CECMA, em 2016, respondendo, por cerca de 86,95% das ocorrências da fricção nesse eixo de transporte (Tabela 1), resultando no atraso na chegada dos comboios fluviais de abastecimento em Tefé, Tabatinga e nos PEF, com potencial de impactar no abastecimento das guarnições militares localizadas nesses locais.
Categorias de Fricção | Elementos das Categorias de Fricção | Frequência | Percentual (%) |
Equipamentos | Equipamentos ineficientes | 20x | 86,95% |
Marchas | Condições de navegabilidade das vias fluviais | 2x | 8,70% |
Ambiente | Temporal | 1x | 4,35% |
Procurou-se analisar as alterações nos equipamentos (categoria de fricção Equipamentos) constante na Tabela 2, relacionando-os com as condições de navegabilidade dessa via de transporte fluvial (categoria de fricção Marchas) em função dos períodos de cheia e vazante. Tudo isso com o objetivo de mensurar a quantidade de dias em que o comboio fluvial interrompeu o seu movimento a fim de reparar essas avarias, resultando em atrasos na chegada desse comboio no seu respectivo destino.
Para isso, observou-se que das alterações nos equipamentos relatadas em 10 (dez) viagens logísticas no eixo do rio Solimões, nos anos de 2011 a 2015 (Tabela 2), 3 (três) foram realizadas no período da vazante e 7 (sete) no período da cheia do rio Solimões. É possível afirmar que isso ocorreu com o propósito de aproveitar o maior calado do rio nesse período, reduzindo a probabilidade de encalhamento das embarcações em bancos de areia/praias. Ressalta-se que em relação ao rio Solimões, o período da vazante ocorre de julho a dezembro e o da cheia, de dezembro a junho (SOUZA; ALMEIDA, 2010, p. 6-7). Essa informação reveste-se de relevância, pelo fato de esse rio ser uma via essencial para o abastecimento do CFSOL/8º BIS.
Eixo | Alterações (categoria de fricção Equipamentos) | Método de solução da Pane/Alteração | Período/ano | Tempo para solução (em dias) | ||
Solimões (Manaus-Tabatinga) | Interrupção de funcionamento de geradores das câmaras frigoríficas. | Manutenção dos geradores com revisão do motor a combustão e do sistema elétrico. | Cheia (2011) | 5 | ||
Aumento da frequência de | ||||||
Vazamento de óleo no motor. | abastecimento de óleo, interrupção do uso do motor e | Cheia (2013) | 5 | |||
serviço de retífica. | ||||||
Entortamento e | Substituição | do | material | Cheia (2014) | 7 | |
desalinhamento de hélice. | danificado. | |||||
Quebra do sistema de propulsão (pane na bomba injetora, bico e cabeçote). | Substituição danificados. | dos | materiais | Cheia (2014) | 7 | |
Emborcamento de EPG e | Utilização de balde na função de | |||||
perda de tanque de | reservatório improvisado de | Cheia (2015) | 1 | |||
combustível. | combustível. | |||||
Vazamentos na tubulação | Revisão do sistema hidráulico. | Cheia (2015) | 1 | |||
do sistema hidráulico. | ||||||
Corte da mangueira de | ||||||
Ruptura de mangueira de combustível. | combustível para a sua redução/adaptação e posterior | Vazante (2016) | 1 | |||
substituição. | ||||||
Pane no relé de partida da caixa top (central). | Retirada de relé danificado e remessa do material via serviço de encomenda por lancha rápida. | Vazante (2016) | 2 | |||
Entupimento de filtro de combustível. | Retirada da peça danificada e remessa do material via serviço de encomenda por lancha rápida. | Vazante (2016) | 2 | |||
Tempo total de interrupção do movimento do comboio fluvial (em dias) | 31 dias |
Analisando a tabela acima, pode-se inferir que as condições de navegabilidade dessa via de transporte fluvial (categoria de fricção Marchas) pouco influenciou nas alterações verificadas nos equipamentos das embarcações do CECMA. Além disso, constatou-se que essas alterações (categoria de fricção Equipamentos) foram responsáveis por 31 (trinta e um) dias de interrupção do comboio fluvial, com média de 3,44 dias de parada por viagem, resultando em atrasos com potencial de impactar no abastecimento das unidades militares dependentes desse comboio logístico fluvial. Dessa forma, essa aferição corrobora com informação da tabela 1 de que as alterações nos equipamentos das embarcações são a principal causa de fricção identificadas no eixo Manaus-Tabatinga-Manaus, passível de impactar na manutenção do fluxo logístico para o CFSOL/8º BIS e seus PEF.
Das análises realizadas, depreendem-se os seguintes resultados: (i) a fricção é um fenômeno presente na logística na Amazônia Ocidental; (ii) as categorias de fricção e seus elementos são identificados no abastecimento na Amazônia Ocidental; e (iii) o atraso na chegada dos comboios fluviais do CECMA aos seus destinos é a principal consequência da fricção na sistemática de abastecimento nessa região.
Dessa forma, como contribuições para amenizar os efeitos da fricção no processo de abastecimento logístico analisado, sugere-se: (i) em um primeiro momento, incrementar os recursos orçamentários para a contratação de meios de transportes civis (aeronaves e embarcações) pela 12ª RM, baseada na logística de desempenho, (ii) em um segundo momento, disponibilizar recursos orçamentários do Comando do Exército para o Comando da Aeronáutica para fins de aquisição de horas de voo para a execução do PAA, e (iii) intensificar a execução das diagonais de manutenção preventiva das embarcações do CECMA com o objetivo de reduzir a probabilidade de alterações nos equipamentos dessas embarcações durante as viagens logísticas realizadas para abastecer as organizações militares situadas ao longo do rio Solimões.
Portanto, diante da implementação dessas medidas, existe a possibilidade da ação da fricção e os seus efeitos sobre o abastecimento logístico do CFSOL/8º BIS e dos seus PEF ser mitigada, o que resultaria na manutenção satisfatória dos níveis de segurança logística dessa OM.
6 Considerações finais
O escopo deste trabalho objetivou analisar a ação da fricção no abastecimento logístico executado pela 12ª RM em benefício do CFSOL/8º BIS e dos seus PEF.
Em síntese, a existência de um sistema de abastecimento eficiente é essencial para a superação dos desafios logísticos existentes, que por sua vez, irão proporcionar melhores condições de sustentabilidade das tropas do CFSOL/8º BIS e, ao mesmo tempo, fortalecer a presença do Estado Brasileiro nessa região estratégica para a defesa nacional.
Conforme constatado no presente artigo, a presença da fricção, suas categorias e seus elementos, em especial no trecho compreendido entre Manaus e Tabatinga, no Amazonas, possui o condão de impactar o abastecimento logístico para o CFSOL/8º BIS.
Por todo o cenário de fricção presente nessa região, a manutenção do fluxo logístico para as tropas situadas nessa área deve ser objetivo permanente a ser atingido pelos atores envolvidos nesse processo. Isso se justifica em razão da necessidade do planejamento logístico conduzido pela 12ª RM considerar todos os meios de transporte de carga existentes que possam garantir a consecução desse propósito, assegurando a plena capacidade logística em prol da defesa e proteção da soberania nacional na fronteira amazônica ocidental.
Referências
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Notas