CONTÍNUA

Educação polar e contação de histórias: as narrativas dos “Casos de Antártica”

Polar education and storytelling: the narratives of the "Antarctica Cases"

Carina Petsch
UFSM, Brasil
Natália Lampert Batista
UFSM, Brasil

Percursos

Universidade do Estado de Santa Catarina, Brasil

ISSN-e: 1984-7246

Periodicidade: Cuatrimestral

vol. 23, núm. 52, 2022

revistapercursos.faed@udesc.br

Recepção: 17 Outubro 2021

Aprovação: 26 Julho 2022



DOI: https://doi.org/10.5965/1984724623522022395

Resumo: A Antártica é um relevante continente a ser estudado, porém, muitas vezes, é carregado de mitos e de desinformações a seu respeito. Assim, contar histórias digitalmente (DST, em inglês) sobre a Antártica pode colaborar com o processo de ensino-aprendizagem, já que é necessário buscar dados para o desenvolvimento do enredo. Para tanto, os objetivos desta pesquisa são (i) apresentar a metodologia de criação de um curso de extensão sobre a Antártica, de forma totalmente remota; (ii) descrever o conteúdo dos vídeos elaborados - chamados de Casos de Antártica; e (iii) analisar os Casos de Antártica, elaborados pelos alunos, com o método DST. O curso de extensão foi desenvolvido em quatro encontros síncronos, contando com a participação de 25 alunos. Para a realização da proposta, foi organizado material audiovisual, teórico e jogos de revisão do conteúdo. A criação de Casos de Antártica pelos participantes ocorreu de forma assíncrona. As histórias apresentadas pelos participantes envolveram aspectos físicos do continente, a fauna local, aspectos migratórios e conceitos cartográficos, itens trabalhados durante o curso Casos de Antártica. Destaca-se o êxito no método adotado, embora o ensino remoto com sua sobrecarga de atividades tenha impossibilitado a finalização do curso para a maioria dos participantes. Por fim, o curso proporcionou a construção de conhecimento pelos cursistas, podendo contribuir com vivências e memórias que serão utilizadas na sua carreira docente e destinadas à efetivação do ensino polar nas escolas.

Palavras-chave: Antártica, ensino polar, ensino remoto.

Abstract: Antarctica is a relevant continent to be studied. However, it is often laden with myths and misinformation about it. Thus, Digital Storytelling (DST) about Antarctica can collaborate with the teaching-learning process, since it is necessary to seek data for the plot’s development. Therefore, the objectives of this research are (i) to present the methodology for creating an extension course on Antarctica, in a totally remote way; (ii) to describe the content of the videos produced – called Cases of Antarctica; and (iii) to analyze the Antarctic Cases, prepared by the students, with the DST method. The extension course was developed in four synchronous meetings, with the participation of 25 students. To carry out the proposal, audiovisual and theoretical material and content review games were organized. The creation of Antarctica Cases by the participants occurred asynchronously. The stories presented by the participants involved physical aspects of the continent, the local fauna, migratory aspects and cartographic concepts, items worked during the course Cases of Antarctica. The success of the method adopted stands out, although remote teaching, with its overload of activities, made it impossible for most participants to complete the course. Finally, the course provided the knowledge construction by the participants, who became able to contribute with experiences and memories that will be used in their teaching career and aimed at the realization of polar teaching in schools.

Keywords: Antarctica, polar teaching, remote teaching.

Introdução

A emergência da discussão polar se faz presente no século 21, visto que cresce a necessidade da humanidade de reconhecer o papel fundamental das regiões polares diante do sistema climático do planeta (SHABUDIN et al., 2016; ROWE et al., 2020). As mudanças climáticas que afetam todas as regiões do planeta têm, muitas vezes, vínculo direto com as regiões polares e isso precisa ser observado por estudantes e professores. Contudo, Walton et al. (2013) destacam que a educação polar na situação atual, ainda é escassa como um componente do currículo escolar na maioria dos países.

Petsch et al. (2020) observam que em alguns casos, percebe-se que o licenciando não está preparado para lidar com temáticas emergentes em sala de aula, especialmente em relação às mudanças climáticas e educação polar. Silveira et al. (2014) ressaltam que isso se deve ao fato que grande parte dos cursos de graduação em Geografia licenciatura não possuírem disciplinas referentes à Criosfera ou à geografia das regiões polares. Também é importante evidenciar a ausência dos polos e informações científicas confiáveis nos livros didáticos, e quando aparecem, essas informações são geralmente baseadas em dados das décadas de 1960 e 1970, o que faz com que grande parte do conhecimento do ambiente antártico e ártico seja proveniente de filmes, jornais e fotografias causando uma série de interpretações errôneas (SILVEIRA et al., 2014; PETSCH et al., 2017a).

Outro fator que deve ser debatido em relação à geografia polar é a fragmentação tão presente em vários setores da sociedade e que também transparece na educação (DEON; CALLAI, 2018). O ensino de geografia polar se caracteriza por ser tipicamente interdisciplinar, demandando a integração de diversas áreas do conhecimento (ROWE et al., 2020), o que também constitui um desafio a ser enfrentado nas estratégias de ensino aprendizagens. Para tanto, Beck (2014) aponta sobre a educação ambiental polar que “[...] os educadores muitas vezes não têm formação suficiente e/ou conhecimento sobre as complexidades das ciências que envolvem a temática, para ensiná-los com competência” (BECK, 2014 p. 218).

Nesse sentido, é preciso avançar nas discussões que envolvem os polos, preparando os professores em formação para trabalharem com essa temática. Buscando aliar a questão da curiosidade dos alunos em relação aos polos com a abordagem interdisciplinar necessária no tratamento da educação polar, e a demanda tecnológica vivenciada pelo período de ensino remoto, este artigo apresenta uma estratégia inovatória de educação polar voltada para a contação de histórias no âmbito digital.

A narrativa sempre foi uma parte importante da comunicação humana (SI et al., 2016; BOYD et al., 2020). Pensando na educação, a narrativa digital surge como uma ferramenta poderosa de ensino e aprendizagem que envolve professores e alunos (ROBIN, 2008). Malita e Martin (2010) destacam que, por meio da narração de histórias, os alunos são convidados a refletir sobre o que sabem e a questionarem sobre seu conhecimento. Dessa forma, as narrativas, sobretudo as digitais (DST1), constituem um campo emergente de estudo no ensino superior porque ajudam os alunos a pensarem criticamente e a compreenderem o conteúdo de maneira integrada (MCLELLAN, 2007; MALITA; MARTIN, 2010). Sendo assim, Malita e Martin (2010) e Kocaman-Karoglu (2016) afirmam que o propósito de uma história contada em formato digital é o mesmo da tradição oral ao buscar um efeito emocional e/ou comunicar uma mensagem ao seu público e pode ter o propósito de ensinar.

De forma genérica, a contação de histórias digital é uma prática inovadora multimodal que se refere a um arquivo audiovisual de 2 a 5 minutos combinando imagens, vídeos, efeitos sonoros, músicas e textos fomentando competências tanto comunicativas quanto digitais (LAMBERT, 2013; PRERADOVIC et al., 2016; DEL-MORAL-PÉREZ et al., 2019). Por prática inovadora multimodal, entende-se toda prática que preza pela multiculturalidade e pela multimodalidade nas aulas (ROJO, 2012; ROJO, 2013), ou seja, são práticas que buscam agregar os conhecimentos dos participantes, de modo a contribuir com a difusão de mensagens relevantes, a partir dos diferentes estilos de manifestação e de comunicação adotados pelos cursistas, bem como que agregam diferentes linguagens e mídias na sua produção, isto é, o vídeo, a imagem, a história em quadrinho, o texto escrito, entre outros (BATISTA, 2019).

Vários estudos demonstram resultados positivos em relação ao uso da contação digital de histórias (NIEMI; MULTISITA, 2016; PRERADOVIC et al., 2016; PRINS et al., 2017; SARITEPECI, 2021), sobretudo, na pandemia quando as tecnologias se fizeram presentes no cotidiano escolar (TORRES; VEIGA, 2020). Diante do exposto, os objetivos desta pesquisa são (i) apresentar a metodologia de criação de um curso de extensão sobre educação polar, de forma totalmente remota; (ii) descrever o conteúdo das histórias contadas em formato de vídeo - Casos de Antártica, e (iii) analisar os Casos de Antártica, elaborados pelos alunos, com o método DST.

Materiais e métodos

Contextualização do curso de extensão

Este artigo traz uma discussão descritiva e qualitativa acerca de um curso de extensão, realizado no período de setembro a dezembro de 2020, no formato online, denominado “Casos de Antártica”. O nome do curso faz uma alusão ao programa televisivo: “Casos de Família” (Figura 1) e foi escolhido por justamente retratar em cada episódio uma história diferente envolvendo uma narrativa, personagens e uma situaçãoproblema polêmica. Além disso, o tema foi escolhido para causar uma curiosidade inicial nos alunos, visto que a divulgação do curso foi realizada principalmente nas redes sociais (Figura 1). Também houve uma divulgação utilizando o e-mail da coordenação do curso de Geografia da Universidade Federal de Santa Maria.

Cartaz de divulgação do curso de extensão Casos de Antártica
Figura 1
Cartaz de divulgação do curso de extensão Casos de Antártica
Fonte: Autores, 2021.

Foram oferecidas 25 vagas e o curso teve carga horária total de 30 horas. As inscrições foram abertas para discentes dos cursos de Graduação em Geografia de todas as Universidades do Brasil, independente do semestre. A ferramenta Google Formulários foi utilizada para a inscrição dos participantes, na qual deveriam especificar de forma descritiva suas expectativas em relação ao curso e apontar sua instituição de origem.

Elaboração do material teórico e das histórias em formato de vídeo

Duas professoras de Geografia foram responsáveis pelo conteúdo e desenvolvimento das oficinas, enquanto uma bolsista de extensão também auxiliou na produção de material. Todo material utilizado no curso Casos de Antártica foi retirado de artigos científicos e sites oficiais como da National Aeronautics and Space Administration (NASA), Marinha do Brasil, Antarctica Digital Database (ADD), Comitê Científico de Pesquisa Antártica (SCAR) e Associação Internacional das Operadoras de Turismo Antártico (IAATO).

Os vídeos foram gravados utilizando o método DST (NIEMI; MULTISITA, 2016; PRERADOVIC et al., 2016; PRINS et al., 2017; SARITEPECI, 2021) tendo a presença de animais (personagens) de pelúcia da fauna polar, tanto do Ártico quando da Antártica, e espécies invasoras: como convidados tivemos o pinguim Wesley, Urso polar Geraldo, sapo Sapilson, os cães Capitão Floco e Assistente, blogueiras Boca Gelada e Rafa Gelimann; o leão marinho como a psicóloga Anahy; urso pardo como segurança do programa Casos de Antártica e Cristina foca sendo a apresentadora. O enredo da história sempre envolvia uma viagem até a Antártica e situações reais que se desdobravam dessa aventura, enfocando no cenário do continente. Em todas as histórias foram inseridas algumas informações falsas, visando aguçar a criticidade dos(as) participantes (serão apresentadas no item de resultados e discussões). Os aplicativos Inshot e Apower Edit foram utilizados na edição dos vídeos, para posterior disponibilização na plataforma YouTube.

Dinâmica do curso

A dinâmica dos encontros presenciais está representada na figura 2. As histórias previamente gravadas eram apresentadas no início do curso e se remetiam aos aspectos teóricos que seriam posteriormente trabalhados. Os participantes, ao final da apresentação teórica, eram convidados a participarem tirando suas dúvidas. No primeiro e segundo encontro, as atividades de revisão da parte teórica se basearam em um jogo desenvolvido no Kahoot (https://kahoot.it/), com perguntas de múltipla escolha, e um jogo de bingo, desenvolvido no Flippity (https://www.flippity.net/), respectivamente.

Dinâmica do curso Casos de Antártica
Figura 2
Dinâmica do curso Casos de Antártica
Fonte: Autores, 2021.

Em seguida, foi explicada a dinâmica assíncrona do curso, que foi realizada na plataforma EdModo (https://new.edmodo.com/), sendo constituída pela seguinte sequência: entre o primeiro e segundo encontro, deveriam escolher os personagens da sua DST; entre o segundo e terceiro encontro, seria a escolha do enredo da história; e até o término do curso deveria ser enviada a história completa. Os participantes ficaram livres na escolha de aplicativos e formas de representação da história.

A dinâmica do terceiro encontro sofreu algumas alterações em função da parte prática realizada e da disponibilização de dois vídeos. Um vídeo resumo do tema (chamada para o assunto de 3 minutos) e um vídeo tutorial da prática completa (de 19 minutos). Durante a realização da prática, os participantes desenvolveram as atividades no Google Earth envolvendo as coordenadas geográficas, escalas, proporção e fusos horários. Assim, eles foram convidados a acessarem a chamada no Google Meet pelo celular (caso não possuíssem dois monitores) para acompanhar as orientações e desenvolverem no seu computador as atividades propostas. Desse modo, a atividade seguiu a seguinte estrutura:

Retomada: realizou-se uma revisão de conceitos anteriores; Motivação: apresentou-se o vídeo curto para debate; Desenvolvimento: realização da atividade prática com o Google Earth; Síntese: desafio de caça-palavras sobre os conceitos abordados, em que cada cursista deveria achar as palavras ali existentes e debatê-las com o grupo; Encerramento da atividade: orientações para a palestra de encerramento da proposta.

O quarto encontro ocorreu no dia da Antártica (01 de dezembro), com um glaciólogo brasileiro Jefferson Cardia Simõesc com o tema “Por que estudamos a Antártica?”. A escolha da participação de um professor externo ocorreu justamente para fomentar a divulgação da pesquisa brasileira na Antártica e demonstrar histórias reais envolvendo a Antártica.

Apresentação dos resultados

Foi utilizado o software Excel para organização de gráfico referente à informação do formulário de inscrição. As histórias enviadas pelos alunos, via plataforma EdModo, foram copiadas para um arquivo Power Point para organização e disponibilização no artigo.

Resultados e discussão

Descrição dos participantes e perspectivas anteriores ao curso

Das 25 vagas oferecidas, tivemos inscritos de nove Universidades, de três estados brasileiros, sendo elas: UNIOESTE (3), UFSM (14), FURG (1), UEM (1), UFRRJ (1), UERJ (1), UFRGS (1), UFPEL (2) e UNESA (1). Quanto às expectativas em relação ao curso, uma participante cita a preocupação de estar entrando no curso de Geografia e estar se deparando com um dos primeiros contatos com essa ciência e também com o ensino remoto: “É tudo muito novo para mim, mas estou certa de que a interação com os demais acadêmicos e professores vai ser muito interessante”. O formato remoto, por um lado, permitiu a disponibilização de vagas para Instituições de todo o Brasil, o que configura uma troca rica de experiências entre os participantes, embora destaquemos, por outro lado, que nos deparamos com a ansiedade e inquietações dos alunos em relação a esse novo formato de interação. Ao final do texto, serão debatidas outras impressões acerca do formato online do curso.

A vontade de aprender sobre o continente foi a mais citada (11 participantes). A preocupação com a questão da docência, depois de formados, foi citada por cinco participantes (Figura 3), sendo que uma destaca: “Espero entender mais sobre a Antártica e fazer disso um recurso para práticas pedagógicas mais diferenciadas” e outro assevera “Adquirir conhecimentos para futuramente ministrar aulas com qualidade aos alunos, e trazer realidades próximas ao mundo deles”. Dois alunos relatam a ausência ou escassez do tema nos currículos de graduação, ao refletirem que é a primeira vez que se deparam com um curso sobre a temática: “É a primeira vez que faço um curso sobre a Antártica, meus conhecimentos são bem limitados”.

Resposta dos participantes em relação à sua expectativa com o curso
Figura 3
Resposta dos participantes em relação à sua expectativa com o curso
Fonte: Autores, 2021.

Ressaltamos que a educação polar com foco na Antártica demanda uma abordagem interdisciplinar (ROWE et al., 2020), o que não confere somente à Geografia o papel de discutir sobre o tema. Porém, a Geografia é umas das Ciências que precisa se apropriar da discussão sobre o continente. Destacamos isso, em função das interpretações sistêmicas que podem ser oferecidas pelo professor de Geografia, pela análise espacial que pode demonstrar as relações estabelecidas com o continente e, por fim, a relação sociedade-natureza, na qual mudanças no continente poderão representar alterações expressivas na sociedade global.

Veiga (2002, p. 86) enfatiza que a formação inicial do futuro professor deve fornecer “[...] uma sólida bagagem nos âmbitos científico, cultural, social, pedagógico para o exercício profissional, ao passo que a formação continuada se centra nas necessidades e situações vividas pelos docentes” (VEIGA, 2002, p. 86). Caso o professor em formação não tenha a discussão sobre a educação polar em seu currículo, debatido por Walton et al.(2013), Silveira et al. (2014) e Petsch (2019), ele pode cair em um ciclo de repetição de informações desatualizadas, preocupação levantada pelos participantes. Menezes (2019, p. 69) reflete que “[...] em muitos casos ocorre que o professor, quando se depara com uma situação do trabalho sobre a qual não foi preparado na formação universitária, desenvolve uma ação semelhante à dos seus professores do ensino básico”.

A questão das curiosidades e do ânimo dos graduandos em relação ao curso também esteve presente em suas expectativas iniciais (seis participantes), sendo que um participante relata “quando recebi o e-mail, achei o assunto muito interessante, logo de cara”. Uma participante define-se como “apaixonada” pela Antártica e outro relata que é um "local incrível". Um participante cita que gostaria de fazer seu trabalho de conclusão de curso acerca da temática. Nesse viés, os educadores polares contam com um fator que é um grande aliado em projetos e aulas a respeito do continente: a curiosidade e a motivação para aprender sobre esse ambiente misterioso. Beck (2014, p. 217) ressalta que “as regiões polares continuam a despertar nossa curiosidade e imaginação, juntamente com um senso de aventura e medo do desconhecido, proporcionando ingredientes perfeitos para educação e divulgação ao público em geral”. Os fatores curiosidade e encantamento com o continente constituem uma estratégia pedagógica lúdica e atraente, principalmente para o desenvolvimento de histórias. Contudo, a imaginação ligada ao continente é responsável também por uma série de fantasias, invenções de criaturas místicas, dados errôneos e/ou desatualizados (XAVIER et al., 2016). É preciso explorar essa curiosidade com cuidado, para que não se desenvolva uma educação polar fantasiosa e mística, pautada em histórias de “conto de focas2”.

Primeiro Caso de Antártica e elaboração dos vídeos: urso fugindo do Ártico

O tempo de produção dos vídeos foi de aproximadamente 3 a 4 horas, considerando a escrita da narrativa, a filmagem, edição e publicação do vídeo. Também foi necessário criar um tutorial para ser disponibilizado para os participantes com as informações falsas colocadas nos vídeos (Quadro 1). Diante disso, consideramos uma estratégia metodológica que demanda do(a) professor(a) que venha a fazer uso dessa prática, um considerável tempo para organização, além do conhecimento necessário para a elaboração do vídeo que, conforme Beck (2014), quando se trata de educação polar é necessário buscar referencial atualizado. Sendo assim, para adaptação e repetição, os vídeos produzidos nesse curso podem ser amplamente utilizados em outros contextos escolares, diminuindo essa etapa inicial de produção de conteúdo audiovisual.

Resumo das informações falsas. Caso o vídeo seja utilizado por outro docente, é fundamental deixar pontuado o que é falso no contexto do vídeo. Em verde, são as informações identificadas como falsas; em vermelho, aquelas que passaram despercebidas e, em amarelo, aquelas que foram questionadas
Quadro 1
Resumo das informações falsas. Caso o vídeo seja utilizado por outro docente, é fundamental deixar pontuado o que é falso no contexto do vídeo. Em verde, são as informações identificadas como falsas; em vermelho, aquelas que passaram despercebidas e, em amarelo, aquelas que foram questionadas
Fonte: Autores, 2021.

No primeiro encontro, o vídeo possuía como contexto espacial da narrativa, a Antártica, embora também seja citado o trajeto da suposta viagem do urso polar Geraldo até o continente antártico. O enredo vivido pelos personagens trata da invasão da casa do pinguim Wesley, pelo urso Geraldo. Durante esse Caso de Antártica, a apresentadora Cristina Foca e a psicóloga Anahy questionam o urso polar sobre possibilidades de o mesmo sobreviver no continente antártico trazendo fatos científicos. O urso Geraldo conta como o ambiente antártico é diferente daquele de sua terra natal, o Ártico.

A possível viagem do urso polar foi uma das informações que os participantes identificaram como sendo falsa, indicando a necessidade de transposição de uma área tropical e devido à longa distância. A questão dos iglus, bastante presente em filmes e documentários passou despercebida pela maioria dos participantes, o que ocorre, segundo Petsch et al. (2017a), em função do imaginário criado pela mídia, apresentando o cenário polar como igual para os dois hemisférios. Também foram inseridos elementos midiáticos na história, como a propaganda da Coca-Cola com urso polar e a origem do Guaraná Antártica, e ambos não foram questionados pelos alunos. Por outro lado, questões envolvendo a moradia e o turismo no continente chamaram a atenção dos alunos, que duvidaram das informações. O mesmo ocorreu com a questão da pesca e do consumo de krill.

Na sequência da oficina, foram apresentados dados sobre as características ambientais do continente: tamanho da Antártica; Manto de gelo, Plataforma de gelo, Gelo marinho (oscilação sazonal), retração de Geleiras e Áreas livres de gelo; espessura e movimento do gelo; transformação de neve para gelo; aumento de nível do mar; icebergs (porque não afundam e o iceberg A68); vegetação, questões climáticas e geologia. No término da apresentação de slides foi exibido um site que transmite imagens ao vivo do continente. As câmeras pertencem ao programa antártico australiano e estão instaladas em quatro diferentes bases científicas3, o que permitiu aos alunos observarem o continente em tempo real.

As estratégias aqui apresentadas, tanto para o primeiro encontro quanto para os demais, foram pensadas nos pressupostos de Costella (2019, p. 53) que aborda que a construção da visão de um espaço que jamais foi visitado ou vivenciado pelos professores em formação “[...] depende da forma como este espaço foi contextualizado pelo outro, que pode ser a televisão, as fotografias, as escritas, mas principalmente a capacidade do professor em oportunizar a ideia sobre os objetos apresentados”. Sendo assim, além de diferentes recursos utilizados, consideramos que o uso de câmeras ao vivo permite que os graduandos vejam as dinâmicas temporais, características ambientais, possam acompanhar a rotina das estações australianas e construam a visão desse espaço com uma maior riqueza de detalhes. Dialogando com Costella (2019), a Antártica pode representar um espaço que é distante fisicamente dos professores em formação, mas não é mais ausente. Foram criadas memórias para que os alunos associassem à Antártica.

Por fim, tivemos um jogo de múltipla escolha sobre os assuntos debatidos nesse encontro. Ainda assim, os alunos tiveram algumas dificuldades ao diferenciar os continentes, o que denota como os papéis das mídias e das informações falsas são difíceis de serem desconstruídos (e.g. a questão dos iglus, temperatura no continente antártico e áreas livres de gelo). É a visão da Antártica como um continente homogêneo, repleto de neve, frio e pinguins (Petsch et al., 2017b). Os alunos se mostraram bastantes perplexos ao observarem como a sazonalidade e continentalidade interferem diretamente na temperatura média do ar, assim como em diferentes ambientes, tendo inclusive porções livres de gelo no verão.

Segundo Caso de Antártica: blogueiras fazendo vlogs

Assim, como no primeiro encontro, foi apresentado um vídeo, agora relacionado a duas blogueiras, Rafa Gelimann e Boca Gelada, que supostamente estariam indo fazer turismo e vlog no continente e realizar a exploração de recursos para produção e venda de cosméticos na Estação Antártica Comandante Ferraz (EACF). As informações falsas, bem como a explicação estão inseridas no quadro 2. A questão de haver um presidente, governador ou prefeito da Antártica foi levantada como informação falsa, pois os participantes nunca ouviram sobre eleições no continente. Passaram despercebidas as informações falsas sobre a bioprospecção e comércio de produtos na EACF. Embora, grande parte das informações falsas tenham gerado debate como a mineração no continente e a preservação ambiental; assim como a questão de interação com os animais, bem como a presença de hotéis no continente, gerando discussão sobre o turismo antártico.

Resumo das informações falsas. Em verde, são as informações identificadas como falsas; em vermelho, aquelas que passaram despercebidas e, em amarelo, aquelas que foram questionadas
Quadro 2
Resumo das informações falsas. Em verde, são as informações identificadas como falsas; em vermelho, aquelas que passaram despercebidas e, em amarelo, aquelas que foram questionadas
Fonte: Autores, 2021.

Posteriormente, foram discutidos assuntos como o tratado antártico, treinamento pré-Antártico, EACF, as pesquisas brasileiras realizadas no continente, turismo na Antártica e também um jogo online de bingo com a temática teórica debatida durante o curso. Percebeu-se que os assuntos ligados ao turismo chamaram a atenção dos alunos durante a revisão, principalmente a questão dos valores e da logística de viagem para o continente. Os participantes conseguiram associar a questão do tratado Antártico com a questão turística, científica e exploratória.

No segundo encontro, seis participantes e uma professora ministrante do curso apresentaram a atividade que foi realizada no formato assíncrono. Todos foram além de somente designar os personagens e já apresentaram cenários e possíveis enredos. O método DST despertou um interesse nos alunos que lhes permitiu avançar nas atividades propostas. O mesmo resultado com o método DST também foi alcançado por Del-Moral Pérez et al. (2019), que destacam a afinidade dos alunos com o uso das ferramentas digitais como principal responsável pelo resultado alcançado.

As descrições e comentários estão expostos a seguir. A participante A, utilizou uma amiga como personagem principal (Figura 4A). A viajante chamada Sinfonilda, amava o filme Titanic, e por isso resolveu ir ao continente antártico. Lá a personagem conhece Cristina Foca e vem até o Brasil para conhecerem o país tropical. Os conceitos abordados nessa história envolvem a questão turística e migração de animais antárticos. A presença de alunos e também de personagens dos vídeos, demonstra a importância da contação de história. O aluno como personagem principal, acaba se envolvendo com a história e pesquisando sobre o assunto.

Histórias produzidas pelos participantes
Figura 4
Histórias produzidas pelos participantes
Fonte: Autores, 2021.

A participante B utiliza um personagem dos Casos de Antártica, o pinguim Wesley, em sua narrativa (Figura 4B). Wesley, caminhando pelo continente antártico, encontra uma mulher que é pesquisadora (Geógrafa e Psicóloga) e pede ajuda a ela para traçar uma rota para o urso Geraldo voltar ao Ártico e ajudá-lo a superar os traumas da sobrevivência em um ambiente diferente. Essa narrativa trabalha com a presença de pesquisadores no continente, além de aliar a importância da Geografia para mapeamento do continente. A participante C tem como personagem principal uma baleia jubarte que percorre vários oceanos do hemisfério Sul (Figura 4C). Trata-se de um adolescente tachado pela família como irresponsável. Os conceitos a serem trabalhados envolvem a migração de baleias e cadeia alimentar da Antártica.

A participante D aborda que sua personagem, a pinguim Tônia, perde sua filha Roberta que, ao ir para alto mar procurar anchovas, acaba sendo levada por correntes marítimas até o Brasil (Figura 4D). Após oito meses, Roberta retorna à Antártica, porém namorando uma capivara. O enredo se dá na presença da capivara que não se adapta ao ambiente e não procura alimento. Os conceitos que podem ser trabalhados aqui se associam a correntes marítimas e alimentação da fauna antártica. Essa abordagem se relaciona também com os conteúdos de Biogeografia e dos impactos (fictícios no caso) de espécies invasoras em um ecossistema diferente, segundo a autora da história.

O participante E traz um pesquisador como personagem principal, que visa a estudar o relevo antártico e os minerais presentes no continente (Figura 4E) remetendo à questão da Geologia e Geomorfologia. O participante F traz como personagem principal uma ave antártica, que observa todos os animais (Figura 4F). Em questão de dias, o conflito entre Wesley e Geraldo já havia sido espalhado para todo o continente, trazendo o aspecto da localização e orientação cartográfica. A narrativa do participante F é interessante para se trabalhar com a localização de flora e fauna no continente e tipos de aves que vivem no ambiente antártico.

Uma das ministrantes da oficina apresentou uma história envolvendo um casal de bonecos de neve que vão até a CVG, o Centro de Viagens Geladas, buscando um pacote turístico para o continente antártico, para visitar o pinguim Wesley (Figura 4G). Ao descobrir que no verão de 2020, temperaturas acima de 20°C foram registradas, os bonecos de neve desistem e resolvem fazer uma live com o pinguim. Os dados que podem ser trabalhados a partir dessa narrativa são variações sazonais e locais na temperatura registrada na Antártica, questão cultural do boneco de neve, turismo na Antártica, internet e outras tecnologias associadas às bases científicas do continente.

Destaca-se que o fato das participantes da oficina também assumirem o papel de alunas, ao fazerem as mesmas atividades propostas aos participantes, confere uma posição de igualdade no ambiente, fomentando um ambiente de troca. Dessa maneira, a oficina tornou-se um espaço de construção colaborativa de saberes e de aprendizados, fomentando as interações entre todos os participantes.

A diversidade de personagens e enredos apresentados confirma que a estratégia didática de DST foi válida dentro do contexto da educação polar. Isso vai ao encontro do que foi exposto por McLellan (2007), que o potencial da DST se estende muito além dos campos de estudos de comunicação e mídia. Assim sendo, é importante realizar testes e experiências de diferentes métodos de aprendizagem no âmbito da educação polar, visto que ainda é pouco desenvolvida dentro da Geografia Escolar brasileira.

Além disso, no ensino remoto, no qual é muito difícil ter interação com os alunos, o método DST se mostrou de grande valia. Alguns alunos mais receosos e tímidos para realizarem interações no formato síncrono, deixaram a criatividade fluir para a construção dos personagens e narrativas. Malita e Martin (2010) ressaltam que o método da DST permite que os alunos desenvolvam ou fortaleçam uma infinidade de habilidades, muito além da comunicação.

A tarefa assíncrona consistia em desenvolver a história iniciada no segundo encontro, construindo mais elementos da narrativa, buscando respaldo do conteúdo teórico apresentado nos primeiros encontros.

Terceiro encontro: perdidos no Saara

No terceiro encontro, utilizamos as geotecnologias, tal como o Google Earth, para “visitarmos” o continente gelado e um vídeo explicativo de como utilizar a ferramenta. A terceira história dos Casos de Antártica contava com os personagens Sapilson (que saía da Universidade X com o desejo de conhecer o mundo), Capitão Floco e Assistente (dois cachorros que viajam o mundo de navio). No enredo, o sapo falante se esqueceu de estudar a localização dos polos e, ao tentar ir para a Antártica, acaba no Deserto do Saara. Ao longo de sua viagem, conhece o Capitão e seu companheiro de viagem que lhe ensinam a se localizar utilizando o Google Earth, levam-no ao continente antártico e depois o trazem novamente para a Universidade X. Na explicação são abordados conceitos como orientação, escala, paralelos, meridianos, latitude, longitude, ângulos formados pelas linhas imaginárias, entre outras informações para a localização da Antártica e do Ártico no globo terrestre. Como atividade de revisão foi realizado um jogo de palavras cruzadas online.

Observa-se que os conceitos que envolvem a localização no espaço, bem como a cartografia, normalmente, são temas que geram dificuldade entre os estudantes, pois muitas vezes a abordagem é bastante superficial desde a Educação Básica, o que repercute na dificuldade com o tema também durante a graduação. Ademais, poucos são os cursos superiores de Geografia que possuem em seus currículos o debate sobre a Cartografia Escolar (RICHTER, 2017). Obviamente que essas temáticas vêm sendo muito discutidas e têm ganhado cada vez mais espaços nos cursos de formação de professores. Todavia, ainda é preciso observar tais temas e evidenciar que a cartografia dos polos ainda é, muitas vezes, negligenciada nas práticas pedagógicas escolares e de formação docente.

Em relação ao encontro anterior, três histórias avançaram em seus enredos. A história da Capivara Carlos e da pinguim Roberta (Figura 5A), que foi apresentada anteriormente somente com parte escrita, foi elaborada a partir de história em quadrinho e dá um desfecho na narrativa. A mãe de Roberta a convence de que o melhor a ser feito é permanecer na Antártica e que a capivara Carlos deve voltar para o Brasil. A capivara argumenta que o clima tropical seria bom para os dois, além de que os humanos poderiam alimentá-los, sem a necessidade de caçar. A história continua o debate sobre migrações e a relação dos animais com o ser humano.

Histórias produzidas pelos participantes
Figura 5
Histórias produzidas pelos participantes
Fonte: Autores, 2021.

Na história do Geraldo (Figura 5B), após ter encontrado uma psicóloga pesquisadora, o urso resolve utilizar a bússola para encontrar o caminho de volta. Contudo, em função do medo de se perder, não quer fazer a viagem sozinho, então o pinguim Wesley o coloca dentro de um cruzeiro de turismo e o envia de volta. A participante ainda questiona sobre a possibilidade de os animais serem levados como “presentes” do continente, o que remete à discussão sobre o Tratado Antártico. A história da baleia-jubarte Tom (Figura 5C) avança em questões mais pessoais, já que o personagem gostava de viajar pelos oceanos sem assumir as responsabilidades familiares na Antártica.

Outros dois participantes enviaram a história. Luisa, um lobo-marinho está passando por uma fase rebelde e gostaria de se aventurar com seu amigo Clebinho por águas mais ao norte da Antártica (Figura 5D). Novamente, as questões migratórias se fazem presentes. A última história (Figura 5E) se remete a um pinguim que deixou o continente antártico e, ao acessar a internet, descobre que a terra é plana. Aqui, o participante faz menção ao terceiro encontro, quando a questão da cartografia é abordada. Os demais participantes ou não enviaram a história ou não deram continuidade ao enredo apresentado no encontro anterior.

É necessário pensar em diferentes escalas de análise para o continente antártico, pois “[...] nenhum estudo pode ficar restrito ao âmbito espacial em que está acontecendo. No sentido de que nada acontece de forma isolada” (CALLAI, 2005, p. 239). Pensar na Antártica em movimento, interagindo com o sistema climático global. Isso se fez presente em várias histórias, nas quais os participantes citaram a questão das correntes marítimas, da migração dos animais e de alterações que podem ser provocadas pela presença humana no continente. As narrativas podem ser usadas para desenvolver interações educacionais significativas, relevantes e memoráveis (ADAMSON et al., 2021).

Quarto encontro: histórias reais

No último encontro, a palestra4 com o professor e glaciólogo brasileiro teve 210 visualizações até 08/10/2021, O desenvolvimento das redes entre educadores e os cientistas têm o potencial de fornecer aos educadores, tópicos e informações confiáveis (BECK et al., 2014; SHABUDIN, et al., 2016). Nesse sentido, pesquisas que relacionam o continente ao Brasil, precisam sair das Universidades e periódicos e serem pensadas para a educação básica, a partir do diálogo entre pesquisadores e educadores polares.

Embora, destaque-se que o uso do método DST em âmbito acadêmico pode gerar certos receios aos docentes, uma vez que pode remeter somente à ideia da educação infantil, e conforme Burlingame (2018), na academia, contar histórias é um ofício decadente. Contudo, todos nós somos contadores de histórias e é possível misturar narração, ciência e reflexões pessoais (NESH, 2014; BURLINGAME, 2018), conferindo aos Casos de Antártica maior identidade, já que abordaram traços de histórias vividas/criadas pelos alunos, ao mesmo tempo em que usaram dados científicos. Os enredos tornaram o imaginário mais fluido e permitiram uma aproximação teórica e conceitual de um espaço que produz curiosidades, mas que muitas vezes é visto apenas pelo viés do senso comum.

Todos os participantes do curso Casos de Antártica se mostraram animados e empolgados com a palestra do glaciólogo. Tivemos um total de 15 perguntas que foram realizadas pelo chat do YouTube, envolvendo debates já levantados durante o curso como mudanças climáticas, Tratado da Antártica e pesquisa brasileira no continente. Como a palestra foi aberta a todos interessados, algumas perguntas se referiam também a questões mais simples relacionadas a aspectos físicos da Antártica.

Conclusões

Nosso curso apresentou resultados satisfatórios, já que no encontro final os participantes conseguiram relacionar vários assuntos debatidos nos encontros anteriores, realizando perguntas diretamente para um glaciólogo. Ainda que de forma modesta, o curso demonstrou encaminhamentos que poderão ser seguidos nos próximos anos, permitindo pensar a Antártica, ao promover estratégias de formação de professores mais articuladas com dados atuais e capazes de despertar o interesse sobre o tema de forma lúdica e interativa.

Destacamos que a união da curiosidade antártica e o fascínio pelas tecnologiastiveram resultados significativos nas atividades pedagógicas voltadas para a contação de histórias. Isso porque, para construir o cenário do continente antártico, todos os recursos sensoriais são bem-vindos, e são auxiliados por tecnologias, para dar vida ao enredo e potencializar o ensino polar. A diversidade de assuntos apresentados, assim como os personagens, demonstrou que os alunos recorreram ao material apresentado durante a oficina, embora a questão da presença humana não tenha sido muito explorada. As atividades desenvolvidas levaram ao entendimento da complexidade do continente antártico, fazendo os participantes perceberem que há muito mais do que gelo, pinguins e frio. Esse é o papel da Geografia Escolar, fazendo pensar e descobrir o mundo.

Também ressaltamos que o ensino remoto, com maior frequência, exige a conquista do aluno, isto é, que desperte seu interesse para a atividade a ser desenvolvida em frente à tela e o estimule e motive a aprender. O discente, para se sentir motivado a ponto de ligar sua câmera e abrir seu microfone, ou digitar dúvidas no chat, precisa ser envolvido pela temática e estratégias de aprendizagem adotadas. Para o curso em questão, tivemos a participação significativa de todos discentes presentes, confirmando a validade desse método no formato remoto. Porém, tivemos uma alta taxa de desistência, com mais de ⅔ dos alunos não concluindo o curso, o que pode ter maior ligação com a sobrecarga de atividades dos discentes do que a questão da curiosidade e motivação. Como aspecto positivo da realização do curso de maneira remota, cita-se a questão da participação de sete Instituições de Ensino Superior diferentes, localizadas em três estados brasileiros, o que confirma uma maior divulgação científica e da educação polar, em quesitos de abrangência espacial, com a execução do curso de forma remota.

Para finalizar esse item, questionamos: então, como fomentar uma educação polar significativa? Nossos resultados corroboram o que foi exposto por Schloesser e Gold (2020), ao apontarem materiais com dados atuais e voltados para a educação, materiais interdisciplinares e que levam em questão a abordagem sistêmica. Para o contexto do Brasil, acrescentamos: a urgente necessidade da tradução de materiais; a elaboração de atividades pedagógicas e materiais didáticos com dados atuais e conexões com o Brasil e por fim, fóruns de debate que possam unir os interessados em refletir sobre o assunto, somando esforços e construindo canais de divulgação que tenham pronunciado engajamento.

Referências

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Notas

1 DST se refere a Digital Storytelling, ou em português, contação de histórias digitalmente.
2 Nos remetemos a histórias infantis de conto de fadas.
3 Disponível em https://www.antarctica.gov.au/antarctic-operations/webcams/
4 Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=GQBLXtKndB0&t=1s
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