CONTÍNUA
O ensino-aprendizagem de geografia no contexto da revolução técnico-científica-informacional: análise sobre as possibilidades do uso do Google Earth Pro
The teaching-learning of geography in the context of the technical-scientific-informational revolution: analysis on the possibilities of using Google Earth Pro
Percursos
Universidade do Estado de Santa Catarina, Brasil
ISSN-e: 1984-7246
Periodicidade: Cuatrimestral
vol. 23, núm. 51, 2022
Recepção: 30 Junho 2021
Aprovação: 25 Março 2022
Resumo: Desde a segunda metade do século XX, com a Revolução TécnicoCientífica-Informacional, a produção do espaço geográfico é cada vez mais caracterizada pelos usos das variáveis-chave técnica, ciência, informação, consumo e finanças. Na Educação, detidamente, o processo de ensino-aprendizagem é marcado pelas tecnologias digitais da informação e comunicação (TDIC). Diante disso, o docente não deve negligenciar o fato de que as TDIC fazem parte do cotidiano do estudante e, dessa maneira, podem ser usadas como estratégias para a amplificação da aprendizagem na esteira do destaque do discente enquanto protagonista do processo educacional. Para isso, é necessário que o docente conheça a cibercultura e participe dela, incluindo na sua prática profissional o uso das TDIC, de acordo com as possibilidades infraestruturais e socioeconômicas da escola e da comunidade envolvidas no processo educacional. Para o ensinoaprendizagem de Geografia na Educação Básica, especificamente, no Ensino Fundamental II, acreditamos que os usos das TDIC podem significar estratégias metodológicas para a compreensão de conteúdos fundamentais ao entendimento da dinâmica do espaço no que tange às variadas escalas geográficas. Dentre esses conteúdos, sublinhamos o da alfabetização cartográfica, que é a aprendizagem das noções de localização, organização e representação do espaço, como produto e condição das ações humanas e relações sociais. Sendo assim, neste trabalho, objetivamos analisar as possibilidades da utilização do software Google Earth Pro para o ensino-aprendizagem de Geografia no Ensino Fundamental II, notadamente, quanto ao entendimento da representação cartográfica do espaço geográfico. Concluímos que, para o ensino-aprendizagem de Geografia, esse software pode ser uma importante ferramenta didático-pedagógica, útil para o desenvolvimento de processo educacional dinâmico, ativo e contextualizado no que se refere a conteúdos como o da (re)produção do espaço e o da linguagem cartográfica.
Palavras-chave: ensino-aprendizagem de geografia, TDIC, Google Earth Pro.
Abstract: Since the second half of the 20th century, with the Informational-Scientifical-Technical Revolution, the production of geographic space is increasingly characterized by the uses of the financial, consumption, information, science, technical variable-key. In Education, thoroughly, the process of education learning is marked by digital technologies of information and communication (TDIC). Considering this, the professor must not neglect the fact that the TDIC are part of the student’s daily life and, thus, they can be used as strategies for the amplification of learning in the mat of prominence of the student while protagonist of the educational process. For that, it is necessary that the professor knows the cyberculture and is a part of it, including the use of TDIC in his or her work practices, according to the infrastructural and socioeconomic possibilities of the school and community involved in the educational process. For the education-learning of Geography in Basic Education, specifically in elementary school, we believe that the use of TDIC can translate into methodological strategies for the comprehension of fundamental contents to the understanding of space dynamic regarding the various geographic scales. Among these contents, we emphasize the cartographic literacy, which is the learning of localization, organization and space representation notions, as a product and condition of human actions and social relations. Thus, in this work we aimed to analyze the possibilities of the use of Google Earth Pro software for the educational learning of Geography in elementary school, notably, regarding the understanding of cartographic representation of the geographic space. We conclude that, for the education-learning of Geography, this software can be an important didactic-pedagogical tool, useful for the development of the contextualized, active and dynamic educational process, regarding contents such as the (re)production of the space and the cartographic language.
Keywords: teaching-learning of geography, TDIC, Google Earth Pr.
Introdução
Desde a segunda metade do século XX, com a Revolução Técnico-CientíficaInformacional, a produção do espaço geográfico é cada vez mais caracterizada pelos usos das variáveis-chave técnica, ciência, informação, consumo e finanças (SANTOS, 1994; SILVEIRA, 2009). Na Educação, detidamente, o processo de ensino-aprendizagem é marcado pelas tecnologias digitais da informação e comunicação (TDIC). Diante disso, o docente não deve negligenciar o fato de que as TDIC fazem parte do cotidiano do estudante e, dessa maneira, podem ser usadas como estratégias para a amplificação da aprendizagem na esteira do destaque do discente enquanto protagonista do processo educacional. Para isso, é necessário que o docente conheça a cibercultura e participe dela, incluindo na sua prática profissional o uso das TDIC, de acordo com as possibilidades infraestruturais e socioeconômicas da escola e da comunidade envolvidas no processo educacional.
Assim, na formação docente - enquanto momento importante para a definição da prática profissional a ser desenvolvida pelo professor - devem-se levar em consideração as possibilidades de conexão da cibercultura com o processo educacional, sublinhando-se para a reflexão e a análise de conteúdos como o das metodologias ativas de ensinoaprendizagem e o dos usos de softwares e/ou jogos para a dinamização da Educação escolar conforme as intencionalidades do estudante.
Para o ensino-aprendizagem de Geografia na Educação Básica, especificamente, no Ensino Fundamental II, acreditamos que os usos das TDIC podem significar estratégias metodológicas para a compreensão de conteúdos fundamentais ao entendimento da dinâmica do espaço no que tange às variadas escalas geográficas. Dentre estes conteúdos, Castrogiovanni (2008) assevera o da alfabetização cartográfica, que é a aprendizagem das noções de localização, organização e representação do espaço, como produto e condição das ações humanas e relações sociais. Do mesmo modo, Passini (2012, p. 13) afirma que o referido conteúdo é essencial para a “[...] inteligência espacial e estratégia que permite ao sujeito ler o espaço [...], ou seja, interpretar e compreender por meio da leitura dos mapas, os eventos geográficos ocorridos na Terra”. Sendo assim, neste trabalho, analisamos as possibilidades da utilização do software Google Earth Pro para o ensino-aprendizagem de Geografia no Ensino Fundamental II, notadamente, quanto ao entendimento da representação cartográfica do espaço geográfico.
A escolha do citado software decorre do fato de ele ser de livre acesso e desenvolvido por uma das maiores empresas mundiais do ramo da computação: a norteamericana Google. Além disso, o Google Earth Pro evidencia vários elementos da linguagem cartográfica que são imprescindíveis para o estudante apreender a correspondente representação do espaço, os quais são conteúdos programáticos do processo educacional em Geografia no Ensino Fundamental II. Desse modo, é um software livre e de qualidade que pode ser utilizado para o ensino desses conteúdos de modos dinâmico e ativo - no que se refere à participação do estudante -, tendo-se em vista envolver tecnologias comuns ao cotidiano desse agente social no contexto da Revolução Técnico-Científica-Informacional.
Para o alcance do objetivo do trabalho, realizamos reflexão teórica sobre os desafios e as possibilidades da utilização das TDIC na Educação Básica, especialmente, no que tange ao ensino-aprendizagem de Geografia para o entendimento da representação cartográfica do espaço geográfico. Além disso, analisamos as potencialidades do Google Earth Pro para o desenvolvimento deste processo educacional.
Desafios e possibilidades da utilização das TDIC na educação básica
A história da humanidade evidencia o desenvolvimento social - nas suas diversas instâncias - conquistado por intermédio dos avanços tecnológicos, sendo que, conforme Kenski (2012, p. 22), define-se tecnologia como o “[...] conjunto de conhecimentos e princípios científicos que se aplicam ao planejamento, à construção e à utilização de um equipamento em um determinado tipo de atividade”. O desenvolvimento tecnológico estrutural causa mudanças na referida história, a ponto de podermos afirmar que cada período histórico é caracterizado por um determinado conjunto de técnicas. No contexto da Revolução Técnico-Científica-Informacional - em voga desde a segunda metade do século XX, sobretudo desde a década de 1970, quando as inovações tecnológicas correspondentes a esse período foram disseminadas em termos social e geográfico - são destacadas as TDIC, compreendidas por Barreto (1992, p. 12) como “[...] um conjunto organizado de todos os conhecimentos com elevado conteúdo de inovação”, ou, segundo Kenski (2012), como a síntese entre som, imagem e movimento, proporcionando-se a produção de informações e conhecimentos por meio das linguagens oral, escrita e audiovisual.
As TDIC marcam o cotidiano de agentes sociais e suas ações, abrangendo todas as instâncias da sociedade - economia, política, cultura, espaço - e ramos de atividades. Na Educação, a escola é mais e mais caracterizada pelos usos dessas tecnologias, fato que contribui para modificar o sentido do processo de ensino-aprendizagem e, consequentemente, as ações do professor e do estudante, assim como de todos os agentes envolvidos neste processo. Por isso, Kenski entende a escola como
[...] uma das instituições de memória social, coloca-se como ponto de recepção e de troca com as demais instituições culturais, visando promover a educação em um sentido amplo. Garantir a necessária adesão social a um projeto de convivência integrada com os outros espaços sociais e as mais recentes tecnologias essa é a necessidade educacional da nova era. (KENSKI, 2004, p. 40, grifo da autora)
Nessa perspectiva, Moran, Masetto e Behrens (2000) afirmam que a escola é uma das principais instituições da sociedade com caráter formador, pela sua capacidade de educar e ensinar. Outrossim, destacam que nesta instituição se enfrenta, desde a segunda metade do século XX, o desafio de alterar o desenvolvimento e a finalidade do processo educacional, devido à “transição do modelo de gestão industrial para o da informação e do conhecimento”. Assim, Silva, Porto e Medeiros (2017) sublinham a pertinência de se usar as TDIC no processo de ensino-aprendizagem, mirando a conexão deste com aspectos do cotidiano do discente e a de conteúdos programáticos com o espaço vivido por este agente social. Do mesmo modo, os autores afirmam que cabe ao professor a mediação do ensino-aprendizagem, com orientações ao estudante no sentido da compreensão de conteúdos, produção de conhecimentos e definição de conceitos. Eis as palavras dos autores:
com o advento das novas tecnologias torna-se necessário o uso de novos métodos de ensino, uma vez que o desenvolvimento tecnológico e científico possibilita a interação com o mundo inteiro, auxiliando o aluno em seu desenvolvimento cognitivo, bem como traz informações valiosas sobre qualquer indagação de forma simples e rápida. O professor então terá o papel de mediador, de modo a ensinar como filtrar informações, visto que em um momento em que temos a cada dia mais informações soltas aprender a utilizá-las a seu favor é imprescindível. (SILVA; PORTO; MEDEIROS, 2017, p. 96, grifo dos autores)
Conforme Kenski, o desenvolvimento do processo educacional considerando-se as possibilidades trazidas à tona pelos usos das TDIC requer “[...] a reorganização dos currículos, [...] [dos] modos de gestão e [...] [das] metodologias utilizadas na prática educacional [...]” (KENSKI, 2004, p. 92). Para tal, a autora realça a importância do docente como mediador do ensino-aprendizagem, chegando a asseverar que este agente social é “fundamental” para o alcance da aprendizagem pelo estudante. Todavia, Kenski (2004) também afirma que as ações dos outros agentes sociais envolvidos no processo educacional são imprescindíveis para que se alcance a aprendizagem com o desenvolvimento da Educação. O estudante deve assumir o protagonismo do processo e, com o apoio da sua família e a mediação do professor, buscar constantemente e eficazmente a aprendizagem contextualizada.
Desse modo, Kenski (2004) explica que - no contexto da Revolução TécnicoCientífica-Informacional e da Pedagogia Construtivista - o professor não é o único detentor de conhecimentos no desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem. O estudante é também agente deste processo, que tem entendimentos a serem considerados no educar e ensinar. O sucesso desse processo depende do compromisso do docente e do discente de cumprirem as suas funções na Educação: o professor orienta a produção de conhecimentos e a definição de conceitos e o estudante realiza atividades neste sentido; nisso, o intercâmbio de experiências e saberes entre docente e discente é salutar.
Os usos das TDIC podem significar estratégias metodológicas para o desenvolvimento dinâmico e contextualizado da Educação, cuja finalidade deve ser, de acordo com Moran, Masetto e Behrens (2000), a formação para o exercício da cidadania mirando o bem-estar social. Sendo assim, tratando das novas tecnologias e da mediação pedagógica, os autores afirmam que
[...] professores e alunos precisam aprender a aprender como acessar a informação, onde buscá-la e o que fazer com ela. Não se trata de formar os alunos tendo em vista um pensamento oportunista e neoliberal que venha atender somente às exigências do mercado de trabalho, mas de buscar uma formação sintonizada que venha prepará-los para conquistar uma melhor qualidade de vida. (MORAN; MASETTO; BEHRENS, 2000, p. 71)
Além disso, Moran, Masetto e Behrens (2000) defendem que o uso das TDIC na Educação provocou a transição do paradigma da sociedade industrial para o da sociedade digital, com os seguintes rebatimentos no processo educacional: aquele paradigma “era baseado na transmissão do professor, na memorização dos alunos e numa aprendizagem competitiva e individualista. [...] a linguagem oral e a escrita [...] [eram] contempladas num processo de repetição” (MORAN; MASETTO; BEHRENS, 2000, p. 73). Em contrapartida, na sociedade digital a “[...] prática docente [é] assentada na construção individual e coletiva do conhecimento. Em tal situação, o professor precisa saber que pode romper barreiras mesmo dentro da sala de aula, criando possibilidades de encontros presenciais e virtuais que levem o aluno a acessar as informações [...]” (MORAN; MASETTO; BEHRENS, 2000, p. 74).
No paradigma da sociedade industrial, o ensino era restrito ao espaço escolar, considerando-se o estudante um mero espectador do conhecimento transmitido pelo professor. Assim, a Educação era enfadonha, repetitiva e fragmentária quanto às matérias de ensino e às dimensões do racional e do emocional - com a sobreposição daquele sobre este. Na sociedade digital, o estudante é o protagonista do processo de ensino-aprendizagem; é agente ativo da produção de conhecimentos e da definição de conceitos, contando, para isso, com a mediação do docente. Por meio da utilização das TDIC, as informações podem ser acessadas e compreendidas em diferentes espaços, possibilitando-se, consequentemente, a aprendizagem não só no espaço escolar. O diálogo e a descoberta são pilares deste processo educacional (MORAN; MASETTO; BEHRENS, 2000).
No livro “Tecnologias e ensino presencial e a distância”, Kenski (2004) realça que o sucesso do processo educacional com a utilização das TDIC depende do empenho do professor e do estudante, fato que pode se tornar um desafio, caso, por exemplo, não haja a necessária mediação pedagógica e/ou o apoio familiar ao desenvolvimento de atividades pelo discente. Outrossim, a autora chama a atenção para a necessidade da existência de boa estrutura tecnológica em escolas e residências, com o acesso de modo suficiente à computador, internet e demais equipamentos e/ou serviços imprescindíveis à recomendação, orientação e realização de atividades virtuais.
Do mesmo modo, Kenski (2004) afirma que é pertinente implementar “uma nova lógica para o ensino” por meio das [TDIC] [...], alterando-se o projeto pedagógico que fundamenta o processo de ensino-aprendizagem, mirando fazer com que o uso de tecnologias não seja um simples modismo ou discurso vazio de significado; ao contrário, que represente a transformação do processo educacional na esteira da aprendizagem, sublinhando-se o protagonismo do estudante e a importante mediação do docente. Com este sentido, a autora afirma que
as novas tecnologias orientam para o uso de uma proposta diferente de ensino, com possibilidades que apenas começamos a visualizar. Não se trata, portanto, de adaptar as formas tradicionais de ensino aos novos equipamentos ou vice-versa. Novas tecnologias e velhos hábitos de ensino não combinam. (KENSKI, 2004, p. 63)
Além disso, a formação inicial e continuada do docente deve ser caracterizada pela discussão de competências e a prática de habilidades acerca dos usos das TDIC na Educação, possibilitando-se que o professor reflita sobre as potencialidades desses usos, saiba operar TDIC e, desse modo, possa planejar o desenvolvimento do processo educacional nessa perspectiva. Acerca disto, Kenski explica que
[...] não basta fornecer aos professores o simples conhecimento instrucional e breve de como operar com os novos equipamentos para que se possa ter condições suficientes para fazer do novo meio um precioso auxiliar na tarefa de transformar a escola. Fica evidente também que, pela complexidade do meio tecnológico, as atividades de treinamento e aproximação entre docentes e tecnologias devem ser realizadas o quanto antes. (KENSKI, 2004, p. 67-68)
Para Kenski (2004), a formação docente adequada para o trabalho com as TDIC proporciona ao professor uma práxis profissional confortável, isto é, eficaz quanto a domínios e capacidades pertinentes ao ensino-aprendizagem de conhecimentos e conceitos de maneira ativa e crítica, cujo foco seja a formação discente para o exercício da cidadania com o pilar do bem-estar social.
Destarte, os usos das TDIC na Educação não devem ser impostos ao docente e discente, nem mesmo considerados uma estratégia comercial para persuadir mais matrículas para uma determinada escola. Ao contrário, tais usos requerem reflexão, habilidade e compromisso dos agentes sociais envolvidos no processo educacional. As ações do professor e do estudante são determinantes para o sucesso desse processo, pois, não é a tecnologia em si que transforma a Educação, mas sim os seus usos, tendo-se em vista o fato de a tecnologia ser um produto social, que reflete os nossos interesses e condiciona as nossas ações e relações. Em essência, quando falamos dos usos das TDIC no processo educacional, estamos tratando da mediação pedagógica e da correspondente realização de atividades necessárias.
O ensino de geografia por meio das TDIC
A Geografia é uma matéria de ensino imprescindível para proporcionar que o estudante apreenda o seu espaço de vivência e as relações deste com outras escalas geográficas (CAVALCANTI, 1998). Com essa compreensão, o discente pode, inclusive, ser crítico quanto a problemas existentes no lugar, assim como pode sublinhar as potencialidades desse espaço no que tange às instâncias social, cultural, econômica e ambiental. O uso das TDIC no ensino desta matéria pode ser importante para a efetivação da referida aprendizagem, pelo fato das tecnologias em questão caracterizarem o conteúdo do espaço e o cotidiano do professor e do estudante no período da Revolução Técnico-Científica-Informacional.
Neste contexto, os objetos de aprendizagem continuam sendo possibilidades para o docente apoiar o processo de ensino-aprendizagem, tendo-se em vista o fato destes serem definidos como instrumentos digitais ou físicos que podem ser (re)utilizados ou referenciados como suporte ao processo educacional (BALBINO, 2007). Destes objetos, destacamos o smartphone devido ao seu uso no cotidiano de muitos brasileiros nos dias atuais, marcando o dia-a-dia do professor e do discente. Quando esse agente social não tem um smartphone, algum familiar possui e, dessa maneira, tal equipamento pode ser manuseado com certa frequência pelo estudante. Igualmente, o computador é um objeto de aprendizagem presente em escolas públicas nacionais e em residências de docentes e discentes, cuja utilização, sobretudo, se associada à internet, pode significar inúmeras estratégias ou ações para o desenvolvimento do ensino-aprendizagem. Acerca disso, Sancho afirma que
[...] o computador e suas tecnologias associadas, sobretudo a internet, tornaram-se mecanismos prodigiosos que transformam o que tocam, ou quem os toca, e são capazes, inclusive de fazer o que é impossível para seus criadores. Por exemplo, melhorar o ensino, motivar os alunos ou criar redes de colaboração. Daí vem a fascinação exercida por essa tecnologia sobre muitos educadores, que julgam encontrar nela a nova pedra filosofal que permitirá transformar a escola atual. (SANCHO, 2006, p. 17)
O uso dessas tecnologias é favorável para a participação ativa do estudante no processo educacional e, destarte, para se ultrapassar o ensino tradicional e implementar o ensino-aprendizagem contextualizado e dinâmico conforme as variáveis-chave do período técnico-científico-informacional. No que se refere à Geografia, o processo educacional pode transformar a perspectiva mnemônica, simplória e enfadonha do seu ensino tradicional (LACOSTE, 1988), colocando-se em baila um processo focado nos interesses do estudante, portanto, na aprendizagem. Sancho (2006) afirma o seguinte sobre a discussão:
muitas crianças e jovens crescem em ambientes altamente mediados pela tecnologia, sobretudo a audiovisual e a digital. Os cenários de socialização das crianças e jovens de hoje são muito diferentes dos vividos pelos pais e professores. O computador, assim como o cinema, a televisão e os videogames, atrai de forma especial a atenção dos mais jovens que desenvolvem uma grande habilidade para captar suas mensagens. (SANCHO, 2006, p. 19)
O trabalho com as TDIC envolve a utilização conjunta de dados, imagens e sons, o que, segundo Moran, Masetto e Behrens (2000), exige maior concentração do estudante durante a aula e/ou a realização de alguma atividade recomendada e orientada pelo docente. Assim, diferencia-se o ensino tradicional do ensino-aprendizagem ativo, pois, aquele era centrado no professor e na transmissão e repetição de conteúdo, enquanto este é fundamentado na aprendizagem por intermédio da compreensão de conhecimentos e da definição de conceitos.
A dinamicidade e a atratividade para a atenção do estudante, proporcionadas pelo uso das TDIC na Educação, podem ser aspectos positivos para o desenvolvimento do ensino-aprendizagem, particularmente, para o processo educacional em Geografia, buscando-se o entendimento da (re)produção do espaço nas diversas escalas geográficas e conforme as instâncias da sociedade, economia, política, cultura e ambiente. Para tal, o uso das TDIC pode ser associado à Cartografia, enquanto conhecimento imprescindível para o desenvolvimento do raciocínio espacial e da compreensão do mundo e do lugar. Com esse sentido, Castellar assim destaca a importância da Cartografia para a Geografia:
a cartografia, então, é considerada uma linguagem, um sistema código de comunicação imprescindível em todas as esferas da aprendizagem em geografia, articulando fatos, conceitos e sistemas conceituais que permitem ser e escrever as características do território. Nesse contexto, ela é uma opção metodológica, que implica utilizá-la em todos os conteúdos da geografia, para identificar e conhecer não apenas a localização dos países, mas entender as relações entre eles, compreender os conflitos e a ocupação do espaço. (CASTELLAR, 2005, p. 215)
A conjunção entre TDIC e Cartografia no ensino-aprendizagem de Geografia pode resultar em um processo eficaz para a aprendizagem contextualizada e ativa das dinâmicas do espaço no mundo e no lugar, pois, de acordo com Moura (2008, p. 08) “o uso de programas de cartografia computadorizados, [...] pode melhorar a aprendizagem, pois permite que as aulas possam ir muito além da descrição e explicação da organização espacial”. Essa conexão de saberes e tecnologias pode significar a reflexão e a análise das dimensões do espaço geográfico - território, região, paisagem, lugar - levando-se em consideração as diferentes dinâmicas e interações espaciais - o que remete para os conceitos de escala e rede geográfica. Do mesmo modo, para a compreensão da representação cartográfica do espaço é necessário que o estudante tenha domínio de conteúdos da Cartografia, como localização e orientação, escalas, fuso horário, movimentos da Terra e tipos dessa representação.
Assim, Passini (2012) afirma a pertinência de o professor de Geografia lançar mão do trabalho com softwares que proporcionem ao estudante a compreensão da representação cartográfica do espaço e das dinâmicas deste considerando-se o jogo de escalas geográficas. Isso visando a aprendizagem ampla e com significados, caracterizada por conteúdos, conhecimentos e conceitualizações de modo contextualizado, dinâmico e ativo quanto à ação do discente. Com essa perspectiva, passamos a analisar as possibilidades do software Google Earth Pro para o ensino-aprendizagem de Geografia.
As possibilidades do Google Earth pro para o ensino-aprendizagem de geografia no Ensino Fundamental II
No contexto da Revolução Técnico-Científica-Informacional, avanços vêm sendo realizados no desenvolvimento das Geotecnologias e da Cartografia, fazendo da representação cartográfica do espaço um aspecto mais preciso, comunicativo e condizente com a realidade representada. Assim, sublinhamos o Google Earth Pro como software que pode ser usado no ensino de Geografia para o entendimento de conteúdos relacionados à (re)produção do espaço e ao letramento cartográfico.
De acordo com informações disponíveis na internet1 e com o trabalho de Ferreira, Lino e Cardoso (2018), afirmamos que o Google Earth Pro é um programa gratuito desenvolvido pela Google - empresa estadunidense -, com o objetivo de apresentar um modelo tridimensional do Globo a partir de um mosaico de imagens de satélite em 3D. Assim, o software evidencia a representação cartográfica do espaço nas diversas escalas geográficas do mundo ao lugar, possibilitando a observação das características sociais e naturais de diferentes espaços do planeta Terra.
Na tela inicial do Google Earth Pro (Figura 1), no lado direito, são apresentadas quatro abas: “pesquisar”, na qual se deve digitar o nome do espaço que se deseja localizar ou as suas coordenadas geográficas (Figura 2); “lugares”, por meio da qual são mostradas imagens de pontos turísticos do espaço localizado; “camadas de imagens geográficas”, que evidencia limites, marcações, estradas, construções, oceanos e os tipos de clima do espaço; e “órgãos de consciência ambiental”, que mostra a existência desses órgãos no espaço buscado. Na parte superior da tela são disponibilizadas 13 funções de exploração do Globo, o qual é mostrado no centro da tela. Do lado esquerdo, há uma bússola que gira o Globo em várias direções, além de uma régua que amplia ou diminui a escala cartográfica. Na parte inferior são mostradas as coordenadas geográficas do espaço representado; evidencia-se também a altitude do ponto em que o cursor do mouse está posicionado.
Dentre as várias possibilidades ofertadas pela utilização do Google Earth Pro no ensino-aprendizagem de Geografia, nos deteremos aos conteúdos referentes à alfabetização cartográfica, como escala cartográfica, orientação, localização e legenda.
Explorando a aba “pesquisar”, pode-se navegar por diferentes escalas geográficas2, desde a continental até a do espaço onde o estudante está - a sua casa, escola ou rua, por exemplo. Além disso, no lado esquerdo da tela do Google Earth Pro, é possível aumentar ou diminuir o zoom da visualização da representação cartográfica do espaço, o que também é condizente com a questão da escala geográfica. Na parte inferior da tela, observa-se a escala cartográfica3 da representação do espaço, na forma da escala gráfica, aspecto que permite a abordagem dos diferentes tipos dessa escala e do seu significado no contexto da representação cartográfica do espaço. Na figura 3, mostramos a representação do estado do Rio Grande do Norte no software, destacandose os comandos da busca por localidades, do zoom da representação espacial e da escala gráfica.
Manuseando a função “régua”, o estudante pode traçar uma linha reta entre dois ou mais pontos no espaço, visualizando a distância entre os pontos. Assim, o professor pode trabalhar o conteúdo da escala cartográfica, ensinando, inclusive, a realização de cálculos acerca dessa distância. Além disso, é possível ensinar e aprender os conteúdos de orientação e localização, trabalhando-se os pontos cardeais, colaterais e subcolaterais por meio da rosa dos ventos, destacando-se espaços vivenciados pelo estudante. Na figura 4, mostramos pontos destacados na representação cartográfica do espaço de Mossoró (RN), por meio da utilização do Google Earth Pro.
Além disso, o destaque de pontos na representação cartográfica de um dado espaço pode servir para o ensino-aprendizagem de símbolos cartográficos, os quais, segundo Guerrero (2012), servem para identificar objetos e ações na referida representação, ajudando o leitor do mapa na localização de lugares, como museu, biblioteca, hotel, escola, restaurante, hospital. Tais símbolos devem ser dispostos no mapa e devidamente descritos na sua legenda.
Acessando-se a função “grade” no Google Earth Pro, o Globo fica caracterizado pelas coordenadas geográficas (meridianos e paralelos) (Figura 5), possibilitando, dessa maneira, a abordagem dos conteúdos de localização e orientação, pontos cardeais, latitude e longitude (Figura 6), fuso horário e movimento de rotação da Terra.
Em suma, asseveramos as possibilidades do Google Earth Pro para o ensinoaprendizagem de Geografia, pois, por meio das funções disponibilizadas neste software podem ser estudados diversos conteúdos concernentes à (re)produção do espaço e à Cartografia, os quais são orientados pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para o nível do Ensino Fundamental II.
Considerações finais
O Google Earth Pro é um software de livre acesso, produzido e disponibilizado pela empresa estadunidense Google, uma das líderes mundiais do ramo das inovações tecnológicas virtuais. O programa possibilita a observação e a análise da representação cartográfica do espaço com imagens de alta qualidade e com ferramentas de diversas manipulações desta representação.
Assim, para o ensino-aprendizagem de Geografia, este software pode ser uma importante ferramenta didático-pedagógica, útil para o desenvolvimento de processo educacional dinâmico, ativo e contextualizado no que se refere a conteúdos como o da (re)produção do espaço e o da linguagem cartográfica.
Desse modo, neste trabalho, apresentamos reflexões sobre o processo educacional em Geografia por intermédio do uso das TDIC e análises acerca das possibilidades colocadas em tela neste sentido pelo Google Earth Pro. Em essência, nosso esforço é uma abordagem que deve ser aprofundada, mediante considerações substanciais do ensino-aprendizagem de Geografia no contexto da Revolução TécnicoCientífica-Informacional, evidenciando estratégias metodológicas que podem ser usadas mirando-se a aprendizagem enquanto pilar fundamental da Educação.
Referências
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Notas