Dossiê
Democracia racial, corrupção e patrimonialismo nas raízes da imaginação nacional bolsonarista
Racial democracy, corruption and patrimonialism at the roots of the Bolsonar national imagination
Intellèctus
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Brasil
ISSN-e: 1676-7640
Periodicidade: Semestral
vol. 21, núm. 1, 2022
Recepção: 01 Fevereiro 2022
Aprovação: 11 Julho 2022
Resumo: Este artigo traça alguns contornos da imaginação nacional bolsonarista a partir de um caso motivador: um crime ocorrido no sul do Brasil no final de 2020. Para tanto, analisamos alguns discursos do presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, e de membros significativos do seu governo, como Hamilton Mourão e Sérgio Camargo, em reação à acusação da opinião pública de que o assassinato de um homem negro por dois seguranças de um supermercado em Porto Alegre teria sido motivado por racismo. Partimos do princípio de que a semântica contida nesses discursos tem lastro nas reflexões históricas do pensamento político e social brasileiro. Em sua diversidade, a narrativa construída pela ideologia bolsonarista em reação ao episódio da morte de “Beto” apresenta o artifício de recuperar algumas formas de representação do passado brasileiro, em especial ao atualizar o mito da democracia racial e ao dar centralidade à problemática da corrupção como “verdadeiro problema nacional”. Nossa hipótese é que a apropriação dessas tópicas acaba solidificando determinada forma de imaginação política do Brasil, que tanto implica uma adesão social ao discurso bolsonarista quanto estimula determinadas formas de ação de grupos e sujeitos na realidade prática.
Palavras-chave: Bolsonarismo, imaginação nacional, democracia racial, corrupção, patrimonialismo.
Abstract: This article analyzes the national bolsonarist imagination from a motivating case: a crime that occurred in southern Brazil at the end of 2020. To this end, we analyze some speeches by the President of Brazil, Jair Bolsonaro, and significant members of his government, like Hamilton Mourão and Sérgio Camargo, in reaction to public opinion's accusation that the murder of a black man by two security guards at a supermarket in Porto Alegre was motivated by racism. We start from the principle that the semantics contained in these discourses is based on the historical reflections of Brazilian political and social thought. In its diversity, the narrative constructed by the bolsonarista ideology in reaction to the episode of the death of “Beto” presents the artifice of recovering some forms of representation of the Brazilian past, in particular by updating the myth of racial democracy and by giving centrality to the problem of corruption. as “a real national problem”. Our hypothesis is that the appropriation of these topics ends up solidifying a certain form of political imagination in Brazil, which both implies a social adhesion to the bolsonarist discourse and stimulates certain forms of action by groups and subjects in practical reality.
Keywords: Bolsonarism, national imagination, racial democracy, corruption, patrimonialism.
Introdução
Na noite de 19 de novembro de 2020, João Alberto, homem negro de 40 anos, foi espancado até a morte por dois seguranças brancos na porta de uma unidade do supermercado Carrefour em Porto Alegre, no sul do Brasil. Segundo a polícia, “Beto”, como era conhecido por familiares e amigos, teria se envolvido em um desentendimento com funcionários e por isso foi retirado à força do estabelecimento. Já no estacionamento, como mostram as câmeras de vigilância da loja, foi agredido pelo policial militar Giovane Gaspar e pelo segurança Magno Braz, que desferiram socos e chutes e asfixiaram a vítima, que não resistiu às agressões e morreu no local..
O crime gerou reações imediatas em todo o país. No dia seguinte, Dia da Consciência Negra, manifestantes foram às ruas em diversas regiões para protestar. Em vários estados, como Rio de Janeiro, Minas Gerais, Fortaleza, Bahia e São Paulo, grupos se organizaram, fizeram passeatas, ocuparam supermercados, bloquearam saídas de clientes nos caixas e demonstraram publicamente sua indignação não só com esse episódio, mas com o assassinato sistemático de negros e negras no país. A morte de João Alberto reaqueceu os debates sobre o racismo estrutural brasileiro e sobre a cor e a origem social daqueles que constantemente são privados do seu direito de viver (ALMEIDA, 2019; MBEMBE, 2020.). Segundo o informativo “Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil”, divulgado em 2019 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), entre 2012 e 2017 a população negra teve 2,7 vezes mais chances de ser vítima de assassinato do que os brancos. No período, houve também aumento da taxa de homicídios por 100 mil habitantes da população preta e parda: de 37,2 para 43,4.
A morte de “Beto” gerou também reações de figuras públicas importantes do cenário nacional. Sérgio Camargo, então presidente da Fundação Cultural Palmares, instituição pública voltada para promoção e preservação da arte e da cultura afro- brasileiras, publicou em suas redes sociais declaração em que negou que o caso tenha relação com o "racismo estrutural" brasileiro. Para ele, o que existe no país é um “racismo circunstancial”, isto é, “há alguns imbecis que cometem o crime”. E sentenciou: “a estrutura onipresente' que dia e noite oprime e marginaliza todos os negros, como defende
a esquerda, não faz sentido nem tem fundamento" (CAMARGO, 2020a.). Em outra publicação, Sérgio chamou João de “marginal” e disse que o homem morto pelos seguranças não “representava os homens honrados do Brasil” (CAMARGO, 2020b.).
Camargo não negou a existência do racismo na sociedade brasileira, mas o atrelou às circunstâncias e a ações individuais e isoladas. O mesmo não se pode dizer das falas do vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB) e do presidente Jair Bolsonaro (então sem partido). Em entrevista à imprensa, Mourão lamentou o crime, mas procurou desvinculá- lo da questão racial:
Lamentável, né? [...] Em princípio, é segurança totalmente despreparada para a atividade que ele tem que fazer [...] Para mim, no Brasil não existe racismo. Isso é uma coisa que querem importar aqui para o Brasil.
[...] Eu digo para vocês o seguinte, porque eu morei nos EUA: racismo tem lá. [...] na escola em que eu morei lá, o 'pessoal de cor' andava separado. Eu nunca tinha visto isso aqui no Brasil. [...] Isso no final da década 60. [...] [Lá] o pessoal de cor sentava atrás do ônibus, não sentava na frente do ônibus. Isso é racismo. Aqui não existe isso. Aqui você pode pegar e dizer é o seguinte: existe desigualdade. Isso é uma coisa que existe no nosso país (MOURÃO, 2020, grifos nossos)
O discurso de Mourão estabelece uma distinção entre Brasil e Estados Unidos da América em relação à questão racial. Na percepção do vice-presidente, nos EUA a diferença entre negros (nos termos dele, “pessoas de cor”) e brancos seria ostensiva e institucional, marcada por uma segregação visível. Para ele, o caso brasileiro seria diferente: aqui, mesmo que tenha havido escravidão, no cenário pós-abolição e ao longo do século XX o país caminhou para um apaziguamento dos antagonismos raciais, atenuando os possíveis conflitos ocasionados pelas chagas do escravismo. Tratar o caso de “Beto” como crime de racismo, aos olhos do vice-presidente, portanto, significaria importar dos EUA um discurso não adequado à nossa realidade e, com isso, incorrer em erro analítico que gera “divisionismos” sociais.
Já Bolsonaro se manifestou em dois momentos: primeiro, no dia 21 de novembro, em discurso por videoconferência na Cúpula do G20. Antes de se ater às questões pertinentes ao encontro, que debatia primordialmente a situação econômica e a crise sanitária mundiais, repetiu o discurso que havia feito nas redes sociais horas antes e comentou indiretamente o crime do Carrefour:
O Brasil tem uma cultura diversa, única entre as nações. Somos um povo
miscigenado. Brancos, negros e índios edificaram o corpo e o espírito de um
povo rico e maravilhoso. Em uma única família brasileira podemos contemplar uma diversidade maior do que países inteiros.
Foi a essência desse povo que conquistou a simpatia do mundo. Contudo, há quem queira destruí-la, e colocar em seu lugar o conflito, o ressentimento, o ódio e a divisão entre raças, sempre mascarados de "luta por igualdade" ou "justiça social".
[...] Existem diversos interesses para que se criem tensões entre nós. Um povo unido é um povo soberano.
[...] Como homem e como Presidente, enxergo todos com as mesmas cores: verde e amarelo! Não existe uma cor de pele melhor do que as outras. O que existem são homens bons e homens maus; e são as nossas escolhas e valores que determinarão qual dos dois nós seremos.
Aqueles que instigam o povo à discórdia, fabricando e promovendo conflitos, atentam não somente contra a nação, mas contra nossa própria história. (BOLSONARO, 2020a, grifos nossos)
No dia anterior, 20 de novembro, essa ideia já tinha sido parcialmente mobilizada em postagem no Twitter, onde o presidente afirmou que o país tinha “problemas muito mais complexos que vão além das questões raciais”, como a “corrupção moral, política e econômica”. Segundo ele, “não adianta dividir o sofrimento do povo brasileiro em grupos”, porque “problemas como o da violência são vivenciados por todos, de todas as formas” (BOLSONARO, 2020b.). Nos dois exemplos, Bolsonaro desenha a imagem do Brasil como um país livre de conflitos de raças e sem “divisionismos étnicos”. Nessa perspectiva, nosso povo, por ser miscigenado, teria aptidão essencial à harmonia. Brancos, negros e indígenas teriam contribuído para criar uma “única família brasileira”, que, mesmo naturalmente diversa, não se nutre de ódio e nem é impelida à hostilidade. Para ele, como também para Mourão, os assassinatos de negros, em sua grande maioria, são frutos unicamente das escolhas que esses “homens maus” (os próprios assassinados) teriam feito ao longo de suas vidas. As reivindicações dos movimentos de luta antirracista que tinham tomado as ruas no calor da morte de “Beto”, nessa visão, não seriam somente ilegítimas, como também contribuiriam para a criação de discórdias e atentariam contra a unidade do país.
As reações de Camargo, Mourão e Bolsonaro se ancoram em duas visões disseminadas na esfera pública: que o Brasil é um “paraíso racial”, com uma sociedade que, do ponto de vista étnico, vive em relativa estabilidade; e que um dos maiores problemas do país é, na verdade, a corrupção e o patrimonialismo, isto é, a usurpação dos bens públicos por interesses privados. Nesse artigo, pretendemos investigar como essas representações, que à primeira vista se apresentam apenas como visões de um evento específico do presente, têm raízes profundas nas produções intelectuais e na imaginação política brasileira (SANTOS, [1978] 2017.). Longe de pretender buscar uma
caracterização específica do bolsonarismo, pretende-se examinar como o discurso sobre o que caracteriza o Brasil - "harmonia racial” e “corrupção” - é mobilizado em estreita ligação com as tópicas da “democracia racial” e do “patrimonialismo”, formuladas em determinado momento de nossa história intelectual, transformando-se em instrumentos através dos quais se sondou a realidade brasileira, e como agora são recuperadas pela visão de mundo bolsonarista.
Na primeira parte, vamos discutir algumas das interpretações da questão racial brasileira formuladas sobretudo na primeira metade do século XX. Foi nesse contexto que o debate intelectual sobre o povo e a nação brasileira se afastou das leituras usuais do século XIX que associavam a dificuldade da formação da nação à presença do negro e à “mistura de raças”, entendida à época como degeneração. A partir da virada do século, com mais força depois da década de 1930, articulou-se uma visão da brasilidade como harmonia, na qual a mestiçagem representaria elemento central da construção da ordem democrática e fator de diferenciação do país na ordem internacional. Esse passou a ser, inclusive, um topos do pensamento conservador brasileiro, que se encontra, de um jeito ou de outro, em autores como Alberto Torres (1915, 1941, 1982a e 1982b), Oliveira Vianna (1939, 1956, 1982) e Gilberto Freyre (2006), por exemplo.
Adiante, na segunda parte, veremos como, em paralelo à discussão sobre a questão racial, floresceu também um conjunto de debates sobre o caráter do Estado brasileiro em meio à complexificação da dinâmica do processo de desenvolvimento socioeconômico nacional e internacional. Especialmente depois dos anos 1940 e 1950, a recepção do pensamento weberiano possibilitou a reinterpretação da questão da natureza do Estado brasileiro à luz da problemática do patrimonialismo, da corrupção e da indistinção entre privado e público, elementos tidos como centrais para a autocompreensão do possível atraso do país no cenário mundial da época.
Por fim, a ideia é observar como o discurso bolsonarista após o crime do Carrefour, formulado por alguns de seus personagens centrais, como Sérgio Camargo, Hamilton Mourão e Jair Bolsonaro, se apropria, voluntária ou involuntariamente, dessa imaginação política construída nos quadros intelectuais brasileiros para moldar uma visão de mundo a partir da qual os atores operam ou devem operar na realidade prática cotidiana. Seja por uma releitura empenhada, arregimentada por quadros ligados ao governo, ou pela recepção não deliberada destas formas de representar os problemas nacionais, a questão central aqui é entender menos os contornos singulares do discurso
bolsonarista e mais algumas de suas raízes intelectuais, que fundamentalmente exploram múltiplos dilemas exaustivamente tratados no debate público brasileiro ao longo do tempo.
Democracia racial e racismo
Em O genocídio do negro brasileiro, Abdias do Nascimento traz referência muito significativa do que se pensava, durante a ditadura militar, acerca das relações raciais no país. Trata-se de um texto de divulgação oficial, publicado pelo historiador folclorista Dante de Laytano na série “Cadernos de folclore”, um projeto do MEC chamado “Campanha de Defesa do Folclore”. Cito a passagem em questão:
a entrada do negro no Brasil foi simultânea com a descoberta do país. Ele conhecia a escravidão, cultivava-a, e praticava-a como um sistema político. A escravidão era praticada na própria África. Os próprios africanos transplantaram-na para a América. (LAYTANO apud NASCIMENTO, 2016: 60, grifos do autor)
Nota-se nesse trecho, para além do desrespeito à humanidade africana, a produção de uma história que beneficia as elites e isenta a população branca de responsabilidade racial. É uma história que recria o horizonte da sociedade brasileira numa estrutura harmônica, onde a humanidade e a natureza encontram a forma da convivência sublime. Ou ainda, é o mito que os intelectuais de 1930 criaram como modelo social do futuro, que a ditadura de 1964 recriou num retrato virtuoso do país sob regime militar e que Bolsonaro reproduz a partir de sua perspectiva individual e da lembrança subjetiva de sua mocidade. Essa imagem emerge na pena de Laytano e na fala de Bolsonaro para figurar esse Brasil racialmente democrático: o país livre de preconceitos e tensões raciais.
A passagem do folclorista referenciada acima se assemelha muito à colocação de Jair Bolsonaro no Programa Roda Viva, em 2018, durante a campanha presidencial. Perguntado sobre a dívida histórica do Estado brasileiro com a população negra, o presidenciável respondeu não ter escravizado ninguém (isentando-se de sua branquitude) e afirmando que os portugueses não ocuparam o continente africano, sendo a escravidão no Brasil e o tráfico no Atlântico fruto de relações puramente comerciais entre europeus e africanos (BOLSONARO, 2018.). Um desrespeito à humanidade africana tal qual cometera Laytano, em 1971. Se a crença de Bolsonaro nessa harmonia social foi
desenvolvida durante o regime militar, que se apropriou de um imaginário no qual havia no país uma vocação para a democracia percebida na ausência de tensões raciais, então podemos nos perguntar: onde e quando esse imaginário nasceu? Ou ainda, como essa concepção foi sistematizada numa ideia sociopolítica que pretendia descrever a sociedade brasileira?
Na historiografia, é consensual que os movimentos de ideias que elaboraram um entendimento da sociedade brasileira como uma experiência racialmente harmônica e que apontaram no sentido do conceito político de democracia se tornaram substanciais na década de 1930 (GUIMARÃES, 2019; MELO, 2020; COSTA, 2010; PAIXÃO, 2014.).
No entanto, anterior à democracia racial e elemento importante para sua conceitualização, a compreensão de se viver num paraíso racial já era comum em muitos intelectuais abolicionistas, como demonstra Célia Maria Marinho de Azevedo.
A ideia de que no Brasil havia se constituído uma sociedade paradisíaca em termos raciais, desde o início de sua colonização, foi desenvolvida por abolicionistas dos dois lados do Atlântico já nas primeiras décadas do século XIX, como parte de um largo esforço comparativo. (...) A comparação entre os Estados Unidos e o Brasil visava, em especial, firmar o contraste entre inferno racial e paraíso racial (AZEVEDO, 1996: 158).
Segundo Azevedo, o abolicionismo no Brasil assimilou essa imagem de paraíso racial para caracterizar uma vivência harmônica entre os muitos brasileiros que se diferenciariam entre si. A sensação de inexistência de ódio racial vivida por parte da elite cosmopolita brasileira foi apreendida pelos modernistas dos anos de 1920 e 30 como fator que indicava o caminho do progresso..
Foi por volta da década de 1920 que a democracia racial entrou no léxico político brasileiro como termo para designar uma certa capacidade que o país dispunha de assimilar outras etnias. Em 1923, Menotti Del Picchia publicava em sua coluna no “Correio Paulistano” que havia no Brasil uma “expressão nova de democracia”, caracterizada pelo “phenomeno racial”. Segundo o modernista, “estudando-se a organização ethnica brasileira, encontramo-nos em frente á mais avançada das democracias raciaes do universo” (PICCHIA, 1923: 4). A democracia racial é vista aqui como decorrência da miscigenação. Existia nesse período entre alguns intelectuais latino- americanos a crença de que nações mestiças possuíam uma predisposição democrática, enquanto aquelas nas quais as etnias não se misturavam guardavam um senso
aristocrático.. Picchia compara o fenômeno político brasileiro com a sociedade estadunidense, ressaltando a peculiaridade da democracia de cá que teria abolido as “scisões de cores”.
Essas imagens de suspensão das linhas de cores de pele e do paraíso racial, na década de 1930, foram mobilizadas na reflexão que Gilberto Freyre desenvolveria em Casa-Grande & Senzala (1933), ensaio que serviria de farol para o pensamento social da época. Neste livro, o autor aprofundaria e tornaria mais sofisticada a análise que muitos intelectuais que o antecederam fizeram para representar de modo idílico e promissor o cenário sociopolítico nacional. Em Casa-Grande & Senzala, Freyre enfatiza os conflitos e os contrastes da identidade brasileira – é importante salientar esse aspecto da obra que dá destaque à tensão racial e às violências na formação do Brasil. Alfredo Cesar Melo afirma que “é sabido que Freyre enxerga o núcleo vital da cultura brasileira na dualidade confraternizante entre senhor e escravo, bacharel e analfabeto, cultura europeia e cultura africana etc.”, e que para Freyre “o melhor do Brasil viria dessa zona de confraternização e intercomunicação entre opostos sociais em permanente equilíbrio” (MELO, 2020: 114). Para Melo, Casa-Grande & Senzala desenvolveu um pacto intelectual-pedagógico para promover uma identidade nacional. Ademais, pensamos que o ensaio-farol de Freyre teria se valido daquelas visões edênicas para sistematizar determinadas ideias acerca da sociedade brasileira.
Freyre produziu uma história íntima e nostálgica do patriarcado. O estudo sobre a formação da família brasileira traz desde o título que as tensões raciais, sociais e existenciais das pessoas que fizeram o Brasil passaram do estranhamento e contraste para a constituição única de um povo. De um lado, o mundo da casa-grande, do colonizador português que nos trópicos construía certa extensão da Europa; de outro, a esfera da senzala enquanto ambiente de transformação da empresa colonial – um empreendimento violento. Ao longo da obra – e de outras obras também – o autor apresenta um exame do quanto seus antepassados tiveram o distanciamento de outros povos diminuídos a partir da experiência da miscigenação. Sobre isso, o autor fala já no prefácio do livro:
A miscigenação que largamente se praticou aqui corrigiu a distância social que de outro modo se teria conservado enorme entre a casa-grande e a mata tropical; entre a casa-grande e a senzala. O que a monocultura latifundiária e escravocrata realizou no sentido de aristocratização, extremando a sociedade brasileira em senhores e escravos, com a uma rala e insignificante lambujem
de gente livre sanduichada entre os extremos antagônicos, foi em grande parte contrariado pelos efeitos sociais da miscigenação (FREYRE, 2006: 33).
O autor observa nessas dinâmicas de aproximação o vestígio do que ele concebe como a contribuição brasileira para a história das democracias, qual seja, a do “equilíbrio de antagonismos”. Para ele, “considerada de maneira geral, a formação brasileira tem sido um processo de equilíbrio de antagonismos” (FREYRE, 2006: 116). Toda a tensão e violência dos embates iniciais entre os povos e culturas que geraram o Brasil foram se convertendo em práticas de moderação das posições antagônicas. É nesse exercício que a nação é forjada. É da interação nem sempre branda das culturas africanas, europeias e indígenas, do jesuíta com o fazendeiro, da igreja com o senhor, do grande proprietário com o pária (para ficarmos em alguns dos exemplos fornecidos pelo próprio autor) e, sobretudo, do senhor e o escravo, – que nem sempre com sucesso se equilibraram – que a vida política nacional tomou substância.
Por trás dessa história da formação da família brasileira existe a pretensão de demonstrar ao leitor a passagem de um estado conflituoso para um conciliador e cada vez mais harmônico graças à interação entre “água e azeite”, para usar a imagem famosa de Ricardo Benzaquen (2004). Fala-se na intrusão e na desorganização da vida social e econômica dos indígenas, considera-se o choque das culturas (que o autor trata com adjetivos como adiantadas e atrasadas), menciona-se o estupro e o massacre contra as populações africanas arrastadas para o Brasil. Diz de tudo isso como um ponto de partida, era a guerra por começo. Depois viria a paz como um ponto de virada, era o nascimento da cultura brasileira.
Essa era a leitura que se fazia na década de 1930 e 40 a respeito da constituição da vida social no Brasil, em certa medida inaugurada pela obra de Gilberto Freyre (2006). O conceito de democracia racial, amplamente difundido no período da segunda guerra mundial, entrou em declínio no começo dos anos de 1950. Entre os inúmeros fatores que levaram a isso, podemos destacar dois: as pesquisas realizadas no âmbito das discussões sobre raça na UNICEF (MAIO e SANTOS, 2010.); e o imaginário histórico do desenvolvimentismo (GUIMARÃES, 2017.). Na década de 1950, o conceito de democracia racial se tornou antiquado, ou seja, nem explicava a estrutura social brasileira, nem impulsionava intelectuais e políticos a projetar um horizonte de expectativa na medida do conceito.
Na década de 1960, quando começaram as críticas mais sofisticadas à democracia racial, parte daquele imaginário que o conceito carregava foi resgatado por intelectuais ligados ou próximos ao regime militar ditatorial.. Principalmente no que diz respeito ao efeito nostálgico que a imaginação reacionária apreendeu nas discussões da década de 1930 e 40: o orgulho da nação que havia se constituído deixando para trás a desordem e a violência. A democracia racial é um imaginário que caracteriza uma importante fração da compreensão nacional que os pensadores próximos à ditadura militar brasileira (Freyre e Laytano, por exemplo) desenvolveram. Talvez seja possível até mesmo pensar que era parte da disciplina militar na formação de novos oficiais, ensinada como elemento central da história política do Brasil. Talvez, por se formarem sob influência desse ideário, não é sem razão a postura de Bolsonaro, Mourão e companhia, como veremos na parte final deste texto.
Não é de se estranhar, por fim, que o próprio “mito da democracia racial” ainda vigore em certos traços da imaginação social brasileira. Trata-se da ideia de que nosso povo, por ser “misturado” no plano biológico, teria “interrelações raciais democráticas” também em âmbito social, numa sociedade cujas bases teriam sido erigidas sobre uma ordem essencialmente democrática e igualitária (HASENBALG, 1996; JOAZE, 2002.). A ideia do Brasil como “paraíso racial”, portanto, tem um lastro importante no passado, mas ainda encontra morada em alguns discursos do presente.
Corrupção e patrimonialismo
No âmbito da produção intelectual brasileira, a palavra “corrupção” foi analisada em relação íntima com o termo “patrimonialismo”, em especial ao longo do século XX. Nesse período, o patrimonialismo adquiriu ao menos duas acepções centrais: uma para explicar a premissa de que as relações entre sociedade política e sociedade civil no Brasil são marcadas pela apropriação do público pelo privado. Por conta disso, a nação padeceria de um grande mal de origem que a afetaria por inteiro: a corrupção. Na outra, os patrimonialistas ou corruptos, ao se apropriarem do público, o transformam em um aparelho a reproduzir apenas seus desejos. Nessa perspectiva, o Estado também seria hipertrofiado e viveria apenas em função de interesses particulares, voltado exclusivamente à manutenção da corrupção, ignorando a sociedade como um todo.
Por isso, é comum a ideia de que a corrupção, no Brasil, é endêmica e parasitária, responsável pela degradação do tecido político nacional e um entrave para o pleno desenvolvimento do Brasil. Ao dar lastro a ações pouco técnicas, o patrimonialismo afetaria fortemente a própria construção da ordem democrática brasileira. O corrupto patrimonialista cria privilégios, vantagens e captura o aparato estatal. A falta de hospitais, escolas públicas, infraestrutura etc seriam o resultado não de má gestão ou ineficácia administrativa, mas do “assalto” às verbas públicas que seriam utilizadas em tais empreendimentos. Junto disso, entende-se que setores do empresariado nacional, mesmo quando envolvidos diretamente nos casos de corrupção que assolam o Estado, são apenas vítimas da máquina burocrática estatal operada por “políticos inescrupulosos”.
Essa discussão sobre a apropriação do público pelo privado e da “captura do Estado” se expressa de forma mais acabada, portanto, na ideia de patrimonialismo, frequentemente examinada pelo repertório intelectual brasileiro no século XX. Segundo Rubens Goyatá (2003: 155), “patrimonialismo é a substantivação de um termo de origem adjetiva: patrimonial, que qualifica e define um tipo específico de dominação”. Esse conceito foi e continua sendo mobilizado por diversos intelectuais, pensadores e figuras políticas das mais variadas tendências ideológicas para explicar e compreender os problemas sociopolíticos do Brasil. Segundo Werneck Vianna (1999), é possível apontar duas grandes vertentes interpretativas na história do pensamento brasileiro. A primeira, presente nas obras de Raymundo Faoro (2012) e Simon Schwartzman (1982), de verniz liberal, apresenta a concepção de “patrimonialismo de Estado” (VIANNA, 1999.), segundo a qual os problemas nacionais teriam origem estatal e institucional, em especial porque existe uma subordinação da sociedade civil pelo Estado. Já a segunda perspectiva, encontrada em partes das obras de Florestan Fernandes (1975) e Maria Sylvia de Carvalho Franco (1997) de matriz socialista, pode ser identificada como um “patrimonialismo de sociedade civil”, segundo a qual a questão central é a apropriação do aparelho de Estado pelas classes dominantes, criando uma autocracia burguesa no país.
No pensamento social brasileiro, a noção de patrimonialismo foi operada primeiramente tanto por Sérgio Buarque de Holanda quanto por Raymundo Faoro. Em Os donos do poder: formação do patronato brasileiro, livro publicado originalmente em 1958, Faoro desenvolve uma argumentação para legitimar sua posição em relação ao que denomina “estamento burocrático” (FAORO, 2012.), um dos elementos centrais da sua
concepção de patrimonialismo.. No livro, o autor aborda a história de Portugal nos séculos XIV e XV, período de formação da Dinastia de Avis, para explicar a gênese do Estado patrimonial que teria chegado ao Brasil. Segundo Faoro, por conta das guerras de reconquista, e posteriormente da Revolução de Avis (1383-1385), teria se formado uma relação entre o rei português e um determinado “grupo de membros cuja elevação se calca na desigualdade social” (FAORO, 2012: 61). Essa aliança da monarquia portuguesa com determinado grupamento, chamado por ele de “estamento burocrático”, serviu para construir e gerir o Estado centralizado, criando suas leis e justificativas do poder real, submetendo assim a nobreza e a burguesia aos seus ditames.
Para o autor, essa forma de gerir o Estado e a sociedade, assim como a existência desse estamento, foram trasladados para o Brasil tanto no período colonial quanto com a vinda da família real portuguesa em 1808 e a consequente criação do Estado Nacional brasileiro a partir da Independência em 1822. Nas palavras do autor:
De Dom João I a Getúlio Vargas, numa viagem de seis séculos, uma estrutura político-social resistiu a todas as transformações fundamentais. [...] O capitalismo politicamente orientado [...] moldou a realidade estatal, sobrevivendo, e incorporando na sobrevivência, o capitalismo moderno, de índole industrial, racional e técnica e fundado na liberdade do indivíduo - liberdade de negociar, de contratar, de gerir a propriedade sob a garantia das instituições (FAORO, 2012: 819).
Como é possível observar, há uma estrutura político-social de longa duração que tem sua gênese em Portugal do século XIV e que perdura no Brasil até pelo aquele momento, década de 1950. Nessa perspectiva, os males brasileiros têm origem lusitana, e o caráter próprio da colonização portuguesa teria sido o principal responsável por fazer surgir, no país, um tipo específico de relação entre os espaços público e privado. Para Faoro, o Estado aqui teria se formado já na lógica patrimonialista, dando origem a uma economia de tipo controlado, atravancando assim a construção de um capitalismo industrial avançado e uma sociedade baseada em valores liberais, democráticos e representativos (FAORO, 2012; CARVALHO, 1997.).
A partir de uma aproximação entre patrimonialismo e tradicionalismo, Faoro indica que a relação de apropriação do bem público pelo privado seria recorrente num
mundo ainda dominado pelo cenário rural, onde o cerne da economia estaria voltado para a agroexportação e a sociedade estaria baseada em relações mais carismáticas. Pela lógica, uma possível mudança no eixo político econômico, advindo da industrialização e da urbanização, criando desta maneira novas relações sociais, superaria o mandonismo, o clientelismo e o patrimonialismo como um todo. Contudo, o autor demonstra que no Brasil essas práticas não foram superadas, apesar da mudança econômica vista a partir da década de 1930, que na prática, para ele, foi uma transformação apenas dos atores políticos mais centrais no processo. Nesse caso, nosso capitalismo “seria, pois, politicamente orientado, uma modalidade patológica de acesso ao moderno, implicando uma modernização sem prévia ruptura com o passado patrimonial” (VIANNA, 1999: 36). A ideia da permanência da estrutura patrimonial aponta para a noção de que o Estado brasileiro tem um mal de origem, e que é por conta dessa gênese que não se consegue criar uma sociedade desenvolvida no país. O aparelho de Estado, com sua burocracia patrimonial, impede o desenvolvimento da sociedade civil. A despeito das possíveis mudanças políticas operadas ao longo de nossa história, a forma de gestão do Estado e a relação da camada dirigente com a sociedade pouco se alteram, e o estamento
burocrático continuaria a existir e a controlar o Estado.
Outro autor que faz uma reflexão sobre a apropriação do público pelo privado no Brasil é Sérgio Buarque. Em Raízes do Brasil, livro publicado originalmente em 1936 e reeditado com alterações em 1947 e 1955, a reflexão sobre o patrimonialismo se liga à própria discussão sobre as origens do Brasil e do brasileiro e suas características centrais.
No Brasil, onde imperou, desde tempos remotos, o tipo primitivo da família patriarcal, o desenvolvimento da urbanização - que não resulta unicamente do crescimento das cidades, mas também do crescimento dos meios de comunicação, atraindo vastas áreas rurais para a esfera de influência das cidades - ia acarretar um desequilíbrio social, cujos efeitos permanecem vivos ainda hoje (HOLANDA, 2014: 145).
Esse desequilíbrio seria a base da relação conflituosa entre público e privado no Brasil. A formação brasileira no período colonial, calcada na família patriarcal e no latifúndio, teria dado origem a uma sociedade na qual o público é visto apenas como uma extensão da gestão da família de um grande “senhor de terras”. Com a sociabilidade construída em torno destas relações eminentemente subjetivas, o personalismo e a afetividade passaram a compor a própria estrutura do Estado, construída ao longo do século XIX. Mesmo com as mudanças político-econômicas vivenciadas pelo país posteriormente, como urbanização, industrialização, constitucionalização e a própria
lógica do Estado de direito, o autor identifica que a hipertrofia do privado sobre o público permaneceu se reproduzindo socialmente e ganhando novos contornos ao longo do tempo.
Muito dessa relação problemática apontada por Sérgio Buarque estaria ligada à “cordialidade brasileira”. Na hipótese do historiador, nosso país, construído sobre raízes ibéricas, configurou um modelo societário de “fundo emotivo”, no qual vigora certa dificuldade de adaptação a padrões legais e à ordem pública e certa atração por códigos particulares da esfera privada. A cordialidade indica relações sociais pautadas na intimidade e na afetividade, distantes do universo formal e impessoal gradativamente formado em espaços de urbanidade.
Na interpretação de Sérgio Buarque de Holanda, o homem cordial vive muito perto de tudo o que lhe é familiar, protegido por seu clã e por seus parentes, envolto em uma bolha que o separa do espaço público, no qual não seria uma criatura singular, mas se tornaria, simplesmente, um cidadão como outro qualquer. A entrada no mundo da Pólis, ou seja, da política, em que o indivíduo se torna cidadão e passa a responder a uma ética que o leva a ser responsável por si mesmo, autônomo e independente dos laços de proteção da família, é um dos principais dramas que se passam em Raízes do Brasil6 (MONTEIRO, 2016: 230).
Essa compreensão da cordialidade em Sérgio Buarque (2014) nos remete à visão atual que identifica nos brasileiros traços sociais de aversão à formalidade e à norma, nisso incluído o típico desprezo pela distinção entre público e privado. Esse habitus teria possibilitado a “captura do Estado” por um “funcionalismo patrimonial”, que exerce uma gestão política voltada para seu interesse particular. Decorre disso, por conseguinte, a sistematização da corrupção e, portanto, da transformação do Estado em um amontoado de interesses particulares. Em certo sentido, a operação que atualiza a tese do “homem cordial”, portanto, mais do que indicar que a sociedade brasileira é “afeita ao jeitinho”, aventa a hipótese de que determinado grupamento social, embora não represente uma classe específica, se nutre e se beneficia do Estado patrimonial, reproduzindo seus próprios interesses e de seus assemelhados.
Se em Faoro o foco está centrado no estamento burocrático que captura o Estado e através dele mantém a reprodução de seus interesses de dominação e apropriação, em Sérgio Buarque o nosso problema de formação está na relação entre indivíduo e sociedade, notadamente no caráter do “homem cordial”. Nessa perspectiva, a visão é de
que há uma incapacidade de os brasileiros de se incorporarem a um ordenamento racional e imparcial voltado para o bem comum. A identificação desse “mal de origem” da cordialidade lastreia os discursos, de ontem e de hoje, que indicam a existência de uma corrupção generalizada intrínseca à vida social brasileira. Em outros termos, a corrupção por aqui seria “endêmica”, e o país sempre submisso à lógica do “jeitinho”, à informalidade e às más administrações por conta da sua própria formação social e cultural.
No caso da perspectiva mais imediatamente ligada a Faoro, o problema do patrimonialismo e da corrupção não está subsumido à caracterização da “identidade” brasileira, posto que se assenta na própria demarcação política dos limites entre o que é público e o que é privado. Se a questão estaria ligada mais diretamente ao Estado e ao estamento, então o problema, portanto, é também mais intensamente de ordem estatal, por isso só poderia ser resolvido a partir de uma reforma político-institucional (VIANNA, 1999: 36), isto é, através não somente da abertura econômica, mas também da retirada do controle do Estado sobre determinadas atividades e do fortalecimento da autonomia da sociedade civil.
Para Rodrigo Perez Oliveira (2018a), a discussão sobre o problema do patrimonialismo encontrou abrigo especialmente no ideário liberal-conservador brasileiro ao longo do século XX. Na visão do autor, foi o Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) quem, a partir dos anos 1990, sintetizou melhor essa percepção. No “transformismo tucano”, a tópica da corrupção foi mobilizada como forma de viabilizar, em primeiro lugar, um projeto político que tinha na agenda privatista neoliberal seu principal fundamento. Anos depois, nos anos 2000, o partido retomou a crítica ao Estado como componente retórico fundamental do discurso de oposição aos governos petistas, que teriam capturado e parasitado a máquina pública em benefício próprio.
Com as interpretações de Faoro e Sérgio e com outras leituras “liberal- conservadoras”, dentre as quais destacamos o PSDB nos anos 1990, forjaram-se visões que suscitaram profundas discussões políticas sobre os possíveis entraves ao desenvolvimento de uma ordem democrática no país. Também aqui, como no caso da democracia racial que vimos na seção anterior, em alguns casos ainda vigora atualmente a percepção de que nossa sociedade é essencialmente corrupta e que o Estado, pelo seu tamanho excessivo e pela relação de devassidão que estabelece com alguns atores, partidos e grupos em específico, é um dos principais responsáveis pelo nosso atraso. Não
deveria causar estranheza, por isso, que discursos como o do Bolsonarismo, que apontam tanto para a privatização e o desmonte do aparato estatal quanto para a “moralização da sociedade”, limpando possíveis “esquemas”, lastreado por essa visão de longo prazo, ressoe como música aos ouvidos de setores importantes da nossa vida nacional.
Raízes da imaginação nacional bolsonarista
Essas visões de mundo que se abrigam no bolsonarismo são acolhidas no imaginário de setores importantes da sociedade brasileira. Mario Stoppino (1998: 585) entende que o “conjunto de ideias e de valores respeitantes à ordem pública”, que têm por objetivo primordial “orientar os comportamentos políticos coletivos”, formam uma ideologia. As ideias que circulam na sociedade são capazes não somente de construir um nexo social, mas também de emoldurar visões valorativas do mundo, transformando-se em ideologia. Nesse sentido, por produzir interpretações do país e leituras da realidade social e por incrementar formas de ação na vida prática, solidificando uma cultura política própria com traços característicos específicos, é possível definir o Bolsonarismo como uma ideologia, na acepção heterodoxa do termo com a qual trabalhamos aqui.
Nossa proposta aqui é indicar como alguns dos elementos que compõem a ideologia bolsonarista - a ideia de que o país tem uma sólida harmonia racial em seu tecido social e a percepção de que a corrupção é elemento atávico que impede o pleno desenvolvimento da nação - têm um lastro histórico importante na cultura intelectual e no pensamento político e social brasileiro. Essa visão de mundo que nega o racismo estrutural e dá centralidade ao problema do patrimonialismo e da apropriação do público pelo privado, ao mesclar-se a outros elementos importantes – como o obscurantismo, o reacionarismo e o conservadorismo – faz do bolsonarismo uma forma singular de ler e interpretar a história nacional brasileira, catalisando certos modos de ação no presente e pavimentando perspectivas e horizontes de futuro.
Como vimos, esses elementos se apresentam não somente nas falas e pronunciamentos do atual presidente do Brasil, mas também no discurso de membros da cúpula do governo e de figuras que ajudaram a erigir o “mito bolsonarista”. É importante pensar, aliás, que o bolsonarismo não foi construído apenas por Jair Bolsonaro, mas também por outros atores importantes do cenário republicano brasileiro. Nesse sentido, um dos maiores artífices dessa ideologia foi Sérgio Moro, principal articulador da
chamada “Operação Lava Jato”, criada em 2014, arrogando-se a missão de “combater a corrupção no país”. Até 2021, quando Jair Bolsonaro encerra a operação, a “Lava Jato” cumpriu mais de mil mandados de busca e apreensão, prisão temporária, prisão preventiva e condução coercitiva, todos ligados a possíveis crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e propina. Por conta de suas atuações ao longo dos anos, e por ocupar uma posição decisiva no xadrez político nacional, ordenando a prisão do então candidato à presidência Luiz Inácio Lula da Silva em abril de 2018, às vésperas da disputa eleitoral daquele ano, Moro foi convidado por Jair Bolsonaro para compor o governo como Ministro da Justiça, cargo que ocupou entre 2019 e 2020.
Sergio Moro e a “Lava Jato” exerceram papel decisivo na construção do bolsonarismo. Através de um ativismo judicial, o então juiz federal atuou fortemente na desestabilização do sistema político tradicional, abrindo espaço para o aparecimento de uma figura considerada ‘outsider’ e ‘mítica’: Jair Bolsonaro (PEREIRA; SILVA, 2021: 152). Moro, defensor de uma visão de justiça e de ação judicial baseadas em aspectos espetacularizados e atualistas, mobilizou fortemente uma retórica neoliberal e privatista, calcada, inclusive, numa leitura enviesada das reflexões de Raymundo Faoro sobre o conceito de patrimonialismo e a crítica ao sistema político e ao Estado. Nesse sentido, portanto, as atuações do ex-ministro comportaram um duplo caráter: ao mesmo tempo que possibilitou diretamente a vitória de Bolsonaro, através do caos institucional proporcionado pela operação lava-jatista, sobretudo com a prisão do principal líder da oposição, também atribuiu legitimidade ao governo na medida em que se tornou Ministro da Justiça, se apresentando como baluarte do combate à corrupção, atuação que seria orientada por um princípio “não político” e “técnico” (PEREIRA; SILVA, 2021: 154).
No dia 1º janeiro de 2019, no discurso de posse no Planalto, Bolsonaro tratou do tema da corrupção, que havia ocupado parte fundamental das suas peças de campanha eleitoral no ano anterior. Nas palavras do já presidente, “a corrupção, os privilégios e as vantagens precisam acabar. Os favores politizados, partidarizados devem ficar no passado, para que o Governo e a economia sirvam de verdade toda Nação”. Em aceno ao Congresso, solicitou ajuda aos parlamentares na “missão de restaurar e reerguer a nossa pátria, libertando-a definitivamente do jugo da corrupção [...]” (BOLSONARO, 2019). Nessa fala, evidencia-se a percepção de que nosso “atraso” estaria ligado ao fato de que, aqui no Brasil, a corrupção abrangeria todas as relações sociais, impedindo o
funcionamento correto das instituições, atrapalhando o crescimento econômico e afetando o bem-estar da população.
Essa hipótese é verificada no momento atual, em que o governo é açodado, por exemplo, por escândalos de corrupção no Ministério da Educação (MEC) envolvendo o pastor-ministro Milton Ribeiro e diversos outros líderes religiosos. Com a divulgação do caso, Bolsonaro teve uma dupla reação: primeiro, negou a existência dos fatos, afirmando categoricamente que não havia corrupção em seu governo; com o avanço das investigações, porém, passou a defender a ideia de que “esses casos esporádicos” mostram que “não existe corrupção endêmica no governo” (SOARES; NORBERTO, 2021). Esse discurso reafirma nossa hipótese: a ideologia bolsonarista reivindica para si a missão de desmontar o caráter corrupto da política e da sociedade brasileira. A tópica anticorrupção, portanto, é uma das bases do “mito político” erigido em torno do bolsonarismo.
Também em 2018, Bolsonaro, então pré-candidato à Presidência, declarou que “aqui no Brasil não existe isso de racismo, tanto é que meu sogro é Paulo Negão e quando eu vi a filha dele não queria saber quem era o pai dela” (RAMOS, 2018). A fala se deu em resposta às indagações dos jornalistas sobre o parecer de Raquel Dodge, então Procuradora-Geral da República, que defendia que o STF aceitasse denúncia contra Bolsonaro por crime de racismo. A queixa-crime se referia à fala dele no Clube Hebraica, no Rio de Janeiro, em abril de 2017, quando declarou: “Eu fui num quilombo. O afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada. Eu acho que nem para procriador eles servem mais” (DOLZAN, 2017).
As representações da democracia racial, da corrupção e do patrimonialismo como elementos fundantes da formação brasileira têm raízes profundas no universo intelectual nacional. Essas ideias, mesmo que elaboradas em contextos distintos, acabaram se solidificando no imaginário social e político da sociedade. Através de uma apropriação deliberada ou involuntária, essas visões reaparecem no presente de forma atualizada e acabam por sustentar discursos e ideologias, como é o caso do Bolsonarismo. Mais do que isso, essa forma de imaginar politicamente a nação, seja pela defesa de uma harmonia das raças, seja pela constatação de que a corrupção é parasitária, mostra que determinadas ideologias operam tanto em vínculo direito com o passado, “na medida em que múltiplos acontecimentos do dia, semana ou ano anteriores unem-se numa exploração racional prima facie do que sucedeu”, quanto em contato direto com o “futuro, no sentido de que
estabelece o limite das alternativas de ação dentro do qual as pessoas se movimentarão e escolherão” (SANTOS, 2017: 85).
Não se trata de defender a ideia de que o produto do pensamento de determinados intelectuais automaticamente se torna senso comum e é manejado por sujeitos a partir de interesses orientados. Nem sempre esse processo é deliberado e traçado de modo objetivo. É preciso atentar-se para o fato de que entre a produção de ideias e a circulação de determinadas formulações críticas na sociedade há uma mediação importante, operada principalmente por indivíduos e instituições, que acabam por transformar, deliberadamente ou não, o próprio conteúdo do enunciado difundido. Nos casos específicos da “democracia racial” e do “patrimonialismo”, tratam-se de duas categorias que, embora apareçam no discurso bolsonarista transmutadas em outros termos, comportam, em si mesmas, diferenças e clivagens em relação às próprias formulações iniciais do século XX que apresentamos no início desse texto. A atualidade específica das semânticas que os vocábulos invocam é perpassada, sobretudo, pelo alargamento de suas veiculações públicas pelos grandes meios de comunicação de massa, como TV 's, jornais, sites etc. Com usos e desusos específicos do passado, voltados certamente a seus interesses, esses veículos amplificaram, nos últimos anos, as temáticas da corrupção e do racismo nos noticiários, dando lastro à transformação das percepções coletivas e à própria apropriação bolsonarista.
Contudo, é preciso também indicar que, conforme aponta Michael Freeden (apud LYNCH, 2016, p.81), determinadas ideias, crenças, visões, opiniões e leituras políticas “exibem um padrão recorrente” e “possuem grupos significativos como seus portadores”, influindo nos “arranjos políticos e sociais de uma comunidade”. Por isso, é fundamental compreender que a ideologia bolsonarista opera em sentido duplo: estabelece uma leitura negacionista e revisionista do passado histórico brasileiro (MELO, 2020), à luz de enunciados de síntese historiográfica (OLIVEIRA, 2018b), ao mesmo tempo que busca orientar, a partir de uma linguagem própria, a percepção da realidade dos sujeitos em dado presente, movendo-os em direção aos seus interesses específicos.
“Democracia racial”, “Corrupção” e “Patrimonialismo”, assim, são categorias centrais na solidificação do imaginário bolsonarista. Por lançarem luz ao passado brasileiro, demarcam pontos específicos de nossa história em que se teriam erigido tanto os aspectos positivos de nossa civilização (harmonia de raças) quanto os elementos atávicos da nossa formação (corrupção). Ao mesmo tempo, lançadas as bases dessa visão
específica da sociedade brasileira, o bolsonarismo se permite criar balizadas e parâmetros que vão orientar as ações práticas do governo através de políticas públicas. É por isso que, em 2019, no primeiro ano de presidência, o governo foi o responsável por reduzir em 70% os gastos em ações de combate ao racismo no país..Ao mesmo tempo, Bolsonaro declarou recentemente, no final de 2020, que o fim da Operação Lava Jato representava, na realidade, o fim da corrupção no país, “obra divina” que seu governo teria conseguido realizar, conforme “promessa de campanha”.
As reações do bolsonarismo ao “crime do Carrefour”, conforme narramos no início deste artigo, apresentam-se como elementos-chave para a compreensão das raízes profundas do imaginário autoritário que vigora atualmente, mas também indicam, em grande medida, o que há de novo nessa ideologia, isto é, o que é próprio do nosso tempo. Para o bolsonarismo, em suas múltiplas facetas (Mourão, Camargo, Bolsonaro etc.), o assassinato de um homem negro desarmado em um ambiente privado, um ato filmado, mais que gerar comoção ou demandar do poder público ações efetivas de combate à violência, foi a oportunidade de ouro para reafirmar teses consolidadas não só nas diversas tradições intelectuais conservadoras brasileiras, mas também no imaginário social nacional. Interessou-nos pouco aqui, como pode ser visto pela nossa exposição, entender por que meios essas ideias chegaram aos agentes centrais do Bolsonarismo. Poderíamos até arriscar algumas hipóteses preliminares, como a de que a tópicas da “democracia racial”, do "patrimonialismo" e da “corrupção” permeiam os manuais históricos das escolas militares da década de 1960 e 1970, momento em que Bolsonaro e Mourão foram formados. Mas isso nos levaria a crer numa apropriação consentida, além de insistir na hipótese, de todo frágil, de que determinadas visões de mundo se formam e se difundem apenas pelo crivo e pelo esforço personalista de alguns sujeitos específicos. Ao investirmos na ideia de imaginação política - que pressupõe apropriações e recepções de ideias e discursos - é possível entender como uma das ideologias mais robustas da atualidade têm raízes profundas, ligadas à própria maneira pela qual intelectuais do passado já haviam representado nossa formação. Especificamente no caso “Beto”, os discursos, ao afirmarem que a singularidade brasileira reside na democracia racial e que nosso grande entrave é a corrupção, fazem com que o bolsonarismo articule em torno de si uma cadeia de afetos (SAFATLE, 2015) – como ressentimento, raiva e
ódio - que emoldura uma sensibilidade própria do Brasil, relacionando passado, presente e futuro de forma bastante singular. Estruturado em torno desse lastro histórico, a mais forte ideologia autoritária brasileira solidifica em torno de si uma imaginação social, ao passo que amplia sua capacidade de mobilizar, do ponto de vista prático, ações políticas na arena pública.
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Notas