Artículos originales de investigación
Earworms: Caracterizando uma imaginação musical cotidiana
Caracterizando una imaginación musical cotidiana
Epistemus
Universidad Nacional de La Plata, Argentina
ISSN-e: 1853-0494
Periodicidade: Semestral
vol. 12, núm. 2, 2024
Recepção: 31 Julho 2024
Aprovação: 19 Setembro 2024
Resumo: Earworms, ou Imaginação Musical Involuntária (Involuntary Musical Imagery, InMI), constituem uma das formas mais difundidas da imaginação musical, designando a experiência mental espontânea com fragmentos musicais, geralmente melódicos, familiares ao indivíduo e de maneira repetitiva. A terminologia InMI é imprecisa, pois pode englobar fenômenos diversos como obsessões ou alucinações, enquanto os earworms constituem uma experiência mais específica, cotidiana e não patológica, altamente prevalente, embora ainda compreendida de maneira incipiente. Este trabalho visa discutir (1) a literatura atual sobre o fenômeno, identificando consensos emergentes e pontos controversos, (2) certas limitações metodológicas, e (3) as interpretações generalistas correntes que associam a experiência a conceitos cognitivos correlatos. A partir de uma revisão narrativa das pesquisas teóricas e empíricas nos campos da cognição musical, psicologia e neurociências, os resultados mostram que tratar o fenômeno como mera rememoração involuntária valida alguns preditores intuitivos, como a exposição musical repetitiva e gatilhos associativos, mas obscurece nuances mnemônicas específicas à cognição musical. O artigo contribui para o entendimento interdisciplinar dos earworms, oferecendo insights sobre sua natureza enquanto uma manifestação cotidiana da musicalidade humana, indicando a existência de alguma especificidade cognitiva musical para a compreensão do fenômeno.
Palavras-chave: earworm, imaginação musical involuntária, InMI, memória musical.
Resumen: Earworms, o Imaginación Musical Involuntaria (Involuntary Musical Imagery, InMI), constituyen una de las formas más difundidas de la imaginación musical, designando la experiencia mental espontánea con fragmentos musicales generalmente melódicos, familiares al individuo y de manera repetitiva. La terminología InMI es imprecisa, ya que puede englobar fenómenos diversos como obsesiones o alucinaciones, mientras que los earworms constituyen una experiencia más específica, cotidiana y no patológica, altamente prevalente, aunque comprendida de manera incipiente. Este trabajo tiene como objetivo discutir (1) la literatura actual sobre el fenómeno, identificando consensos emergentes y puntos controvertidos, (2) ciertas limitaciones metodológicas, y (3) las interpretaciones generalistas corrientes que asocian la experiencia a conceptos cognitivos correlatos. A partir de una revisión narrativa de las investigaciones teóricas y empíricas en los campos de la cognición musical, la psicología y las neurociencias, los resultados muestran que tratar el fenómeno como una mera rememoración involuntaria valida algunos predictores intuitivos, como la exposición musical repetitiva y los desencadenantes asociativos, pero oscurece matices mnemónicos específicos a la cognición musical. El artículo contribuye al entendimiento interdisciplinario de los earworms, ofreciendo conocimientos sobre su naturaleza como una manifestación cotidiana de la musicalidad humana, indicando la existencia de alguna especificidad cognitiva musical para la comprensión del fenómeno.
Palabras clave: earworm, imaginación musical involuntária, InMI, memoria musical.
Abstract: Earworms, or Involuntary Musical Imagery (InMI), represent one of the most widespread forms of musical imagination, referring to the spontaneous mental experience of musical fragments that are generally melodic, familiar to the individual, and repetitive. The term InMI is imprecise, as it can encompass diverse phenomena such as obsessions or hallucinations, whereas earworms represent a more specific, everyday, and non-pathological experience that is highly prevalent, though still in an incipient stage of understanding. This paper aims to discuss (1) the current literature on the phenomenon, identifying emerging consensuses and controversial points, (2) certain methodological limitations, and (3) the current generalist interpretations that associate the experience with related cognitive concepts. Through a narrative review of theoretical and empirical research in the fields of musical cognition, psychology, and neuroscience, the results show that treating the phenomenon as mere involuntary recollection validates some intuitive predictors, such as repetitive musical exposure and associative triggers, but obscures mnemonic nuances specific to musical cognition. The article contributes to the interdisciplinary understanding of earworms, providing insights into their nature as a common manifestation of human musicality and suggesting the existence of some cognitive specificity in understanding the phenomenon.
Keywords: earworm, involuntary musical imagery, InMI, musical memory.
O earworm visa descrever uma experiência cotidiana e não patológica, cuja alta prevalência é evidenciada pela presença de equivalentes em diferentes idiomas, como Ohrwurm (alemão), Musique entêtante (francês) e Canzone tormentone (italiano) (Beaman y Williams, 2010). Esse fenômeno refere-se à manifestação mental espontânea e repetitiva de fragmentos musicais, geralmente melódicos e familiares ao indivíduo. Embora não uniforme, o termo earworm é preferível, pois outros correspondentes, como Involuntary Musical Imagery (InMI), podem ser imprecisos e englobarem um amplo espectro de experiências distintas, como obsessões, alucinações, insights musicais, sonhos musicais, mind-pops e sinestesia musical (Liikkanen, 2012a; Williams, 2015).
É possível identificar muitas semelhanças entre o fenômeno e menções ao verme de ouvido ou música chiclete em representações literárias. No conto The Imp of the Perverse, de Edgar Allan Poe (1845), por exemplo, o autor explicitamente reclama da experiência comum e intrusiva de se ter uma melodia persistente na mente, destacando sua natureza mnemônica. Mark Twain, em A Literary Nightmare (1876), descreve uma experiência similar, evidenciando o impacto do earworm em suas ações motoras. Ambos os relatos ressoam em muitos pontos com a literatura moderna, embora outros aspectos como a duração extensa dos episódios e a ideia de contágio, comuns nas descrições populares, são menos consistentes com os achados contemporâneos (ver Beaman, 2018). Ainda assim, essas representações pioneiras na literatura indicam que o fenômeno pode preceder a disseminação de tecnologias fonográficas, além de fornecerem um vislumbre das percepções iniciais e a relevância cultural ao longo do tempo.
Não é irrelevante, contudo, a possível intensificação dos earworms promovida pelos hábitos de escuta na cultura contemporânea (Dawkins, 1976; Szendy, 2008; Goodman, 2010). De fato, a própria condição de escuta musical reiterativa e engajada tem sido identificada como um fator relevante na propensão à experiência (Liikkanen, 2012a; Hyman et al., 2013; Jakubowski et al., 2017). Ainda assim, também têm sido observados outros aspectos cognitivos pertinentes ao fenômeno, como o conteúdo altamente idiossincrático relatado e a alta prevalência na população em geral, acompanhada de características individuais significativas em sua distribuição.
Este trabalho se propõe a mapear os fatores cognitivos que moldam essa forma específica de experiência musical, argumentando que a interpretação dos earworms como meras manifestações de memórias involuntárias pode não captar plenamente a complexidade desse fenômeno. Alguns dos métodos utilizados nesse campo serão brevemente discutidos, precedendo a apresentação dos consensos emergentes que, através de diversas fontes de pesquisa, têm reforçado essa interpretação. Em seguida, discutiremos alguns limites dessa perspectiva mais generalista, pontuando evidências que podem indicar alguma especificidade cognitiva musical associada a essa experiência.
Consensos emergentes sobre o earworm
Considerações metodológicas
A categoria psicológica da imaginação usualmente refere-se à experiência mental que ocorre na ausência de estimulação sensorial. Devido à natureza involuntária e, às vezes, efêmera dos earworms, há um desafio em elaborar métodos que possibilitem descrever, induzir ou manipular consistentemente os parâmetros desse fenômeno.
Enquanto fonte de dados, o autorrelato desempenha um elemento central, frequentemente utilizado por meio de questionários, registros em diários e estudos de caso, seja isoladamente ou em combinação com outros desenhos experimentais. Uma preocupação constante no campo tem sido considerar os possíveis vieses, especialmente o retrospectivo, que podem estar presentes nesses estudos. Alguns pesquisadores utilizam enunciados que não revelam explicitamente o objeto de estudo aos participantes (Floridou et al., 2017) ou empregando métodos como o Experience Sampling Method (ESM), ou Avaliação Momentânea Ecológica (Bailes, 2015; Byron y Fowles, 2015; Floridou y Müllensiefen, 2015; Moeck et al., 2018). Esse método permite que os participantes relatem suas experiências imaginativas de forma remota, mas condicionada a solicitações pontuais do pesquisador, capturando assim as experiências transitórias dos earworms enquanto elas ocorrem ou o mais próximo possível.
Uma possível limitação do método ESM é que a consultas recorrentes podem levar os participantes a prestar uma atenção incomum aos seus estados internos, o que pode inflacionar a capacidade de discriminar episódios ou mesmo aumentar a probabilidade de experimentar earworms. No entanto, Kazumasa Negishi e Takahiro Sekiguchi (2020) discutem essa problemática em seu trabalho, analisando a variação temporal na ocorrência de episódios e procurando por eventuais picos ou tendências crescentes durante a coleta de dados, mas não encontraram evidências. Os pesquisadores sugerem que os relatos de experiências imaginativas musicais não parecem ser particularmente afetados pelo fato de os participantes terem que fornecer respostas de forma reiterada ao longo do período.
Muito do aprimoramento metodológico no estudo dos earworms tem sido alcançado através da adaptação de métodos existentes em campos paralelos, como destacado por Ira Hyman et al. (2015) e Lassi Liikkanen e Kelly Jakubowski (2020). Em áreas relacionadas, especialmente na pesquisa sobre a memória involuntária, os pesquisadores têm combinado abordagens baseadas em autorrelato com outros métodos experimentais, a fim de obter evidências objetivas e verificar as informações fornecidas pelos participantes (Mace, 2018; Berntsen, 2021).
Nesse contexto, a literatura existente apresenta trabalhos experimentais notadamente em menor quantidade, o que requer cautela devido à possibilidade de viés de publicação[1] (Liikkanen y Jakubowski, 2020). Ainda assim, é possível observar avanços na possibilidade de induzir episódios de earworms e manipular variáveis experimentalmente, contribuindo assim para um maior entendimento desse fenômeno. Algumas interpretações gerais, que até então se baseavam exclusivamente em questionários e diários, como o papel da exposição musical recorrente e recente, parecem estar em acordo com os resultados desses estudos (Liikkanen, 2012a; Floridou et al., 2018; Moeck et al., 2018).
Outros marcos importantes têm demonstrado que certos resultados baseados em autorrelatos podem ser consistentes com diferenças individuais mensuráveis através de neuroimagem. No estudo de Nicolas Farrugia et al. (2015), empregando ressonância magnética estrutural (RMI), a ocorrência frequente de episódios foi ligada à espessura cortical em áreas do córtex frontal e temporal direito, bem como no giro angular esquerdo e no cíngulo anterior. Os aspectos emocionais, como o desejo de supressão ou considerar a experiência útil, foram associados, respectivamente, ao volume de matéria cinzenta nos córtices temporopolar direito e parahipocampal.
Alguns desses estudos se baseiam na utilização de instrumentos de avaliação validados, como a Escala de Imaginação Musical Involuntária (The Involuntary Musical Imagery Scale, IMIS)[2], desenvolvida por Georgia Floridou et al. (2015). A escala se baseia em uma estrutura em quatro fatores, sendo a experiência subjetiva de valência (negative valence), demais aspectos particulares associados ao conteúdo ou contextos (personal reflections), a sensação ou incitação a movimentação corporal (movement) e a percepção de funcionalidade, benéficas ou não, da experiência (help). Os resultados obtidos com essa escala têm sido consistentes com estudos que utilizam a metodologia ESM. Além disso, a escala tem sido traduzida e aplicada em outros países não ocidentais como China (Jue et al., 2020) e África do Sul (Pitman et al., 2021), permitindo a realização de estudos interculturais —uma lacuna explorada ainda de forma incipiente no campo[3].
Em Michael Pitman, Thomas Geffen e Philippa Nettleton (2021), mais especificamente, os participantes responderam ao questionário IMIS mas adicionalmente foram introduzidos a definições de imaginação musical mais diversas que variaram desde uma mais geral, em relação a experiência musical de escutar algo na cabeça (sem distinção de ser voluntária ou não), a outras que se preocuparam em distinguir imaginação musical involuntária de earworms — contrário ao tratamento sinônimo do estudo original (Floridou et al., 2015). Isso permitiu que os participantes pudessem responder de maneira diferente a itens ancorados em cada definição, como a frequência autodeclarada desses fenômenos. Embora tenha sido observada uma correlação forte e positiva entre a frequência de earworms e a frequência da imaginação musical involuntária, constatou-se que apenas 36,8% da variação nas respostas restantes dos participantes foi compartilhada entre esses dois fenômenos. Isso indica uma influência significativa das definições apresentadas nos estudos de autorrelato, implicando que a experiência de earworms talvez não deva ser equiparada à experiência da InMI.
A falta de consenso terminológico de fato representa um desafio significativo para a replicação e generalização dos resultados na literatura (Williams, 2015; Liikkanen y Jakubowski, 2020). Contudo, apesar dessa fragilidade, alguns avanços têm sido alcançados. A próxima seção discutirá esses avanços, levando em consideração o uso sinônimo entre earworm e InMI, quando a definição de InMI se referir à experiência musical repetitiva —salvo exceções especificadas.
Características do earworm
Diferentes trabalhos tentam interpretar os resultados da literatura, enfocando as circunstâncias dos episódios, a reatividade emocional dos sujeitos, interpretando-os à luz da psicologia cognitiva, ou abordando lacunas ainda não respondidas (Williamson et al., 2012; 2014; Beaman, 2018; Arthur, 2023). Liikkanen e Jakubowski (2020), por exemplo, conduziram uma revisão sistemática sob o critério de empregar estudos empíricos, dentre abordagens quantitativas e qualitativas, alinhadas com a tradição da pesquisa psicológica. Ao analisar o conteúdo desses estudos, os autores identificaram quatro temas principais de pesquisa, que foram sugeridos então como representativos para caracterizar o fenômeno: a (1) Fenomenologia, que visa descrever a experiência em termos qualitativos e quantitativos, averiguando frequência, duração, fidelidade e valência emocional das experiências; a (2) Dinâmica dos episódios, explorando os preditores contextuais que influenciam o surgimento, a manutenção ou a evitação dessas experiências; (3) Diferenças Individuais sistemáticas observadas nas populações amostradas e (4) Características musicais intrínsecas identificadas a partir de parâmetros objetivos da linguagem musical que podem estar associados a essas experiências.
A caracterização do fenômeno a ser apresentada abrange a maioria dos estudos examinados nesta revisão, incorporando também outras investigações que extrapolam o escopo inicial dos autores. Entretanto, optamos por manter as categorias identificadas, uma vez que oferecem uma estrutura pragmática para a apresentação das evidências empíricas. Essas categorias também se revelam oportunas para a exposição das interpretações teóricas a serem discutidas em uma seção subsequente, destacando a sua utilidade prática no contexto desta análise.
Fenomenologia
A natureza do earworm é considerada fenomenológica, uma vez que fundamentalmente se trata de “algo que é experienciado” (Beaman, 2018, p.3), e sua validade enquanto constructo pode ser apoiada em evidências como (1) a replicação de pontos-chave, como a prevalência dessa experiência relatada espontaneamente e por meio de questionários, e (2) a fidelidade da experiência em relação aos seus aspectos perceptuais, observada também em estudos experimentais (Liikkanen y Jakubowski, 2020).
Apesar da variabilidade metodológica e das críticas associadas a esse tipo de coleta, estudos que utilizam questionários retrospectivos têm evidenciado a alta prevalência dessas experiências de forma consistente (Beaman y Williams, 2010; Liikkanen, 2012a; Williamson et al., 2012; Müllensiefen et al., 2014; Floridou et al., 2015; Hyman et al., 2015). Na maior amostragem analisada, um estudo conduzido por Liikkanen (2012a) na Finlândia com 11.910 participantes revelou que mais de 90% dos respondentes relataram vivenciar episódios de forma semanal, enquanto pelo menos 33% indicaram experimentá-los diariamente.
Quando empregada a metodologia ESM, que permite a coleta de dados em tempo real, estudos apresentam estimativas mais conservadoras em relação à prevalência de episódios. Por exemplo, Georgia Floridou e Daniel Müllensiefen (2015) relataram uma taxa de aproximadamente 47% de episódios semanais, enquanto Negishi e Sekiguchi (2020) identificaram uma prevalência de cerca de 28% em seus respectivos participantes. Ainda assim, mesmo modestos, esses resultados sustentam a sugestão de que a experiência de earworm é de fato frequente no cotidiano, ao menos em culturas industrializadas.
Experienciar earworms pode remeter a uma característica mnemônica, no sentido de que os indivíduos têm consciência de que ocorre na mente e não nos ouvidos —fato que o diferencia, por exemplo, das experiências alucinatórias ou tinnitus (Beaman, 2018). Por outro lado, não se assemelha simplesmente a uma lembrança, mas antes uma reescuta sequencial, na qual as notas são respeitadas em ordem, preservando o ritmo e o andamento do evento musical original. Elizabeth Margulis descreve essa característica como “podendo parecer irresistível e enlouquecedoramente real” (2014, p. 75), enquanto Victoria Williamson e Sagar Jilka a descrevem como “comparável à experiência de escuta” (2014, p. 666).
Além dos relatos pessoais, evidências experimentais também corroboram a fidelidade da experiência de earworms, pelo menos em relação a alguns parâmetros. Jakubowski et al. (2015) conduziram um estudo comparativo entre os andamentos musicais relatados pelos participantes durante os earworms e as versões fonográficas de referência registradas por meio de acelerômetros de pulso[4]. Os resultados revelaram uma discrepância média de apenas 15%. Essa precisão foi novamente observada no estudo de Jakubowski et al. (2018), que comparou o conteúdo registrado dos episódios involuntários com a evocação voluntária dos participantes. Essas evidências apresentadas ressaltam a capacidade dos earworms de evocarem uma experiência vívida e fiel aos elementos musicais originais, reforçando sua natureza distintiva e o impacto que exercem na vivência dos indivíduos.
Em contraste com a crença popular, os estudos têm consistentemente revelado que a maioria dos participantes atribui uma valência neutra ou até mesmo positiva aos seus episódios de earworms. Isso sugere que relatos desagradáveis podem estar mais relacionados a fatores específicos, como não gostar do conteúdo do earworm ou a interferência direta com outras tarefas cotidianas. Pesquisas baseadas em questionários, por exemplo, demonstram que músicas preferidas são relatadas até três vezes mais frequentemente como earworms em comparação com músicas aversivas (Halpern y Bartlett, 2011; Liikkanen, 2012a; Beaty et al., 2013).
Trabalhos com registros em diários também confirmam esse viés de agradabilidade[5], possivelmente devido ao fato de que os earworms geralmente não interferem nas atividades cotidianas, conforme observado em 66% dos casos (Beaman y Williams, 2010). Estudos utilizando a metodologia ESM, vão além e associam uma maior probabilidade de prazer durante os episódios de earworms quando gatilhos são identificáveis (Floridou y Müllensiefen, 2015). Com base na literatura, Liikkanen e Jakubowski (2020) apontam que a avaliação subjetiva das experiências de earworms parece depender diretamente de dois fatores principais: a relação entre repetitividade e familiaridade das melodias e o modo de investigação dos gatilhos. Alguns trabalhos indicam que melodias menos familiares e menos adaptáveis ao gosto musical do indivíduo têm maior propensão à repetibilidade (Hyman et al., 2015), e que a repetitividade excessiva está associada a uma percepção negativa da experiência (Floridou y Müllensiefen, 2015; Williamson y Jilka, 2014; Hyman et al., 2015). Além disso, a dificuldade em identificar os gatilhos que despertam os earworms também foi relacionada a uma diminuição na agradabilidade da experiência (Floridou y Müllensiefen, 2015).
A duração dos episódios de earworms é um aspecto que ainda apresenta desafios e falta de convergência na literatura. A variação é alta, e isso se deve, em parte, à dificuldade em mensurar objetivamente o início e o fim da experiência, que está frequentemente associada a uma sensação de fade-ins e fade-outs na consciência (Jakubowski, 2020). Estimar a duração dos episódios pode ser problemático, especialmente quando baseado em relatos retrospectivos, e os resultados podem variar de acordo com a metodologia empregada.
Estudos que objetivaram a indução de episódios experimentalmente, solicitando que os participantes segurassem uma tecla de computador durante a experiência de earworm, encontraram uma duração média de cerca de 44 segundos ao longo de múltiplos episódios, monitorados durante 5 minutos (Moeck et al., 2018). Estudos baseados em relatos diários apresentaram uma ampla faixa de duração, variando de menos de 1 minuto a até 8 (Beaman y Williams, 2010), e 27 ou 36 minutos (Halpern y Bartlett, 2011), enquanto que pesquisas baseadas em questionários relataram que a maioria dos participantes percebeu os episódios como tendo uma duração de poucas horas, e os informes poucos minutos e poucos dias sendo mencionados em menor frequência (Hyman et al., 2015).
A diversidade de resultados encontrados na literatura é ampla devido à falta de uniformidade conceitual em relação à duração dos episódios de earworms. Não há uma especificação clara se a duração se refere ao tempo em que o fragmento musical se repete ou ao tempo total do episódio, ou seja, por quanto tempo a pessoa retém a música na mente (Beaman, 2018). Essas discrepâncias nas estimativas evidenciam a complexidade em determinar com precisão a duração dos episódios de earworms e destacam a necessidade de mais pesquisas para investigar esse aspecto.
Em síntese, o earworm é um fenômeno prevalente no cotidiano das pessoas, com relatos de ocorrência em aproximadamente 90% dos participantes em pesquisas com base em questionários e diários, além de ser observada em uma ampla faixa de indivíduos por meio de estudos utilizando ESM. As experiências tendem a receber atribuição positiva ou neutra quando questionadas diretamente, embora relatos espontâneos possam abranger uma gama mais ampla de emoções. A duração dos episódios é um aspecto ainda em debate na literatura, com resultados variados devido a diferenças metodológicas e à falta de consenso na definição e delimitação dos episódios em relação à repetitividade dos trechos musicais, sendo necessárias mais pesquisas para aprofundar nosso entendimento sobre esse aspecto do fenômeno.
Dinâmica ou preditores contextuais
A literatura sobre o fenômeno confirma a existência de alguns preditores intuitivos, como a exposição musical recente e reiterada, bem como gatilhos associativos, como palavras que remetem a letras de canções ou estados de humor (Liikkanen, 2012a; Williamson et al., 2012; Bailes, 2015; Liikkanen y Jakubowski, 2020). Além disso, aspectos menos evidentes também são explorados, como a correlação entre os movimentos corporais e os andamentos musicais dos earworms (Campbell y Margulis, 2015; Jakubowski et al., 2015, 2018). Além dos preditores, a literatura também discute estratégias de enfrentamento para lidar com earworm indesejados (Beaman y Williams, 2010; Liikkanen, 2012a; Beaman et al., 2015). Esses estudos contribuem para uma compreensão mais abrangente do fenômeno e destacam a importância de considerar múltiplos aspectos em sua investigação.
A literatura frequentemente explora preditores autorrelatados para entender os fatores que influenciam a ocorrência de earworms. Um estudo pioneiro realizado por Williamson et al. (2012) utilizou uma abordagem exploratória para descrever quatro categorias abstratas, relacionadas à exposição musical, gatilhos de memória, estados afetivos e estados de baixa atenção. Além disso, estudos de registro em diários (Halpern e Bartlett, 2011; Jakubowski et al., 2015) e ESM (Floridou y Müllensiefen, 2015) mostram que participantes relatam frequentemente a exposição recente, exposição reiterada, gatilhos mnemônicos e padrões musicais pegajosos como causas comuns, oferecendo uma compreensão inicial e subjetiva do fenômeno.
No contexto experimental, a realização de diferentes estudos têm fornecido evidências que atestam a possibilidade de induzir episódios imaginativos. Em Liikkanen (2012b), por exemplo, os participantes foram expostos a uma tarefa Cloze[6] envolvendo letras de canções populares, seguida de uma tarefa distratora e averiguação via ESM, obtendo uma taxa de indução de earworms de 68% dos participantes. De forma semelhante, Timothy Byron e Lucinda Fowles (2015) utilizaram melodias desconhecidas como estímulo, manipulando a possibilidade de familiarização (i.e., repetindo o estímulo de 2 a 6 vezes), resultando em uma taxa de indução de 80%. Além disso, outros experimentos mostraram que a estimulação musical implícita pode induzir earworms com duração de 8 a 24 horas subsequentes (Floridou et al., 2018; Moeck et al., 2018).
Mesmo excertos curtos de 30 segundos, executados duas vezes, podem ser suficientes para induzir episódios de earworms. O estudo de Philip Beaman et al. (2015) concentrou-se no papel do planejamento motor articulatório na possível supressão da experiência e obteve sucesso sistemático quando objetivou induzir episódios. Embora a maioria dos episódios não seja incômoda, um número significativo de pessoas utiliza estratégias reativas[7] para reduzir ou eliminar os earworms indesejados (Beaman y Williams, 2010; Liikkanen, 2012a; Williamson et al., 2014).
Uma possibilidade, então, é o uso da subvocalização como inibidora de episódios, como, por exemplo, o uso de mascar chicletes (Beaman et al., 2015). Essa hipótese é fundamentada na Teoria da Subvocalização das Imagens Auditivas (Smith et al., 1995), que sugere que subvocalizações concomitantes podem degradar a qualidade da representação verbal mnemônica. No estudo de Beaman et al. (2015), mascar chicletes reduziu consideravelmente a frequência de episódios de earworms, quando comparado a tarefas motoras intensivas, como bater os dedos, em ambas as capacidades imaginativas voluntárias e involuntárias.
Além da fidelidade perceptual mencionada anteriormente no estudo de Jakubowski et al. (2015), que utilizou um acelerômetro para medir os andamentos dos earworms, foi observado que cerca de 25% dos relatos ocorreram durante alguma forma de movimentação repetitiva no cotidiano. Outro estudo, conduzido por Stephanie Campbell e Elizabeth Margulis (2015), comparou a escuta musical passiva com diferentes condições de envolvimento motor, incluindo sussurrar, cantar, bater o pé ou movimentar-se junto com a música, revelando uma indução de earworms significativamente maior nos participantes que adotaram movimentação e vocalização durante a escuta musical. Embora tenha sido menos estudada, a relação entre o movimento corporal e a ocorrência de earworms revela indícios de que o movimento, especialmente o articulatório, desempenha um papel significativo na facilitação dessas experiências.
Por fim, outro aspecto relevante nas experiências com earworms é a influência de fatores cognitivos, como estímulos co-ocorrentes, atenção e carga na memória de trabalho[8]. No entanto, a limitação de rigor experimental e a variabilidade do contexto situacional nos estudos baseados em autorrelato podem dificultar a compreensão dessas relações. Alguns indícios sugerem que os earworms estão associados a estados de divagação mental (mind wandering), sonolência, solidão, cansaço, tédio, atividades de baixa carga cognitiva ou privação sensorial (Liikkanen, 2012a; Floridou y Müllensiefen, 2015).
Alguns estudos experimentais exploram o impacto da natureza da tarefa na ocorrência de episódios subsequentes. Essa diferença pode ser explicada pelo envolvimento de diferentes componentes da memória de trabalho. Por exemplo, o estudo de Hyman et al. (2013) constatou que em tarefas visuais como sudokue anagramas, todas de baixa dificuldade, a taxa de indução de earworms é significativamente menor em comparação com tarefas do tipo labirinto (maze). No entanto, ao manipular a carga cognitiva por meio da dificuldade da tarefa, os resultados parecem contraditórios: os episódios de earworms surgem tanto durante períodos de baixa carga cognitiva quanto durante atividades cognitivamente desafiadoras. Segundo os autores, em ambos os extremos do espectro, os indivíduos tendem a estar menos engajados em sua atividade principal, seja por tédio ou sobrecarga de uma tarefa difícil, o que pode levar a processos de pensamento dispersos que encorajam divagações mentais.
Por outro lado, o estudo de Floridou et al. (2017) mostrou uma tendência negativa significativa, cuja taxa de ocorrência de earworms foi reduzindo conforme maior dificuldade nas tarefas, embora não tenha havido diferença significativa entre as condições de dificuldade média e difícil. No entanto, para aprofundar essa questão, são necessários mais experimentos, tanto para a possível replicação dos resultados quanto para uma análise mais abrangente. É importante destacar que ambos os estudos relataram dificuldades em obter controles perfeitos, no que diz respeito à manipulação das respostas dos participantes à música e à manipulação da carga cognitiva. Assim, pesquisas adicionais são indispensáveis para uma compreensão mais sólida sobre a influência desses fatores cognitivos (ver também Liikkanen y Jakubowski, 2020, para discussão).
Em resumo, os avanços metodológicos têm permitido a indução confiável de earworms em contexto experimental, permitindo a manipulação sistemática de fatores que podem influenciar o início ou a sustentação dessas experiências. Na grande maioria dos casos, os indivíduos relatam ser capazes de identificar os gatilhos responsáveis por seus episódios, embora o caráter autorrelatado deixe em aberto o grau de confiabilidade dessas informações. Por meio de experimentos envolvendo o uso de tarefas distratoras, foi observado que o início dos episódios é consideravelmente sensível a influências de demandas contextuais específicas, como estados de baixa carga atencional (ociosidade) e a relação motora ainda parcialmente compreendida, como a eliciação de episódios a partir de movimentos repetitivos no cotidiano. Além disso, há uma maior propensão a episódios quando há envolvimento corporal e vocalização, indicando um papel compartilhado da articulação vocal e o impacto inibitório da subvocalização.
Diferenças individuais
Existe um debate em andamento em relação à possível associação entre gênero e a ocorrência de earworms. Algumas evidências são sugestivas, sugerindo uma maior prevalência de mulheres relatando experiências frequentes (Liikkanen, 2012a), enquanto outros estudos não encontraram diferenças tão significativas (Beaman y Williams, 2010; Hyman et al., 2013; Floridou et al., 2015). Essa tendência também pode ser observada em estudos experimentais que buscaram induzir episódios de earworms, com resultados tanto favoráveis (Liikkanen, 2012b; Campbell y Margulis, 2015) quanto contrários (Moeck et al., 2018). Essa questão permanece controversa e requer investigações adicionais para uma melhor compreensão da possível influência do gênero na experiência.
Estudos que investigam a relação entre traços de personalidade e a ocorrência de earworms, por outro lado, revelam uma maior consistência nos resultados. Embora haja alguma variação, é possível observar uma razoável conformidade na associação entre episódios de earworm e fatores do Big Five[9], como abertura à experiência e neuroticismo (Floridou et al., 2012; Beaman y Williams, 2013; Beaty et al., 2013; Cotter et al., 2016).
Além disso, alguns desses trabalhos também exploraram possíveis associações com transtornos de personalidade esquizotípica. Katherine Cotter et al. (2016) descobriram uma associação fraca, embora estatisticamente significativa, entre a escala esquizotípica e a frequência dos episódios de earworms. Por sua vez, Beaman e Williams (2013) identificaram uma relação positiva entre esquizotipia e o grau de incômodo experimentado durante os episódios, incluindo interferência nas atividades diárias, controle sobre os episódios e maior duração dos mesmos.
A relação entre earworms e alucinações musicais, contudo, não é tão direta como se supunha inicialmente. Existem diferenças fenomenológicas marcantes, desafiando a noção de que as alucinações musicais são simplesmente uma forma extrema dos earworms, como um continuum entre experiências cotidianas e patológicas (Beaman, 2018; Liikkanen y Jakubowski, 2020). Um estudo realizado por Peter Moseley et al. (2018) envolveu 44 pessoas com alucinações musicais dentre 270 participantes, e os resultados indicaram que as alucinações musicais são menos comuns entre músicos, menos controláveis, menos repetitivas e menos relacionadas a conteúdo lírico-verbal em comparação aos earworms. Além disso, de forma geral, as alucinações musicais estão menos associadas a estados emocionais intensos, embora exista certa variabilidade dependendo das diferentes populações investigadas, especialmente entre pacientes psiquiátricos ou neurológicos.
A possibilidade de uma maior incidência de episódios em músicos também tem sido objeto de discussão. Alguns estudos indicam que estudantes de música relatam uma maior prevalência desses episódios em comparação a não músicos (Liikkanen, 2012a; Beaty et al., 2013; Hyman et al., 2013). Hyman et al. (2013), mais especificamente, observaram que além de uma frequência maior há também uma propensão para um detalhamento mais aprofundado nos relatos, conforme esperado em indivíduos com mais experiência musical, embora a amostragem do estudo tenha sido relativamente pequena. No entanto, outros estudos não encontraram diferenças significativas entre músicos e não músicos (Beaman y Williams, 2010; Müllensiefen et al., 2014; Campbell y Margulis, 2015; Moeck et al., 2018), havendo até mesmo trabalhos que indicam uma correlação negativa entre o treinamento musical e a frequência de episódios de earworms (Floridou et al., 2015).
Essa discrepância de resultados tem sido interpretada em relação a um possível fator subjacente, provavelmente mais influente: o engajamento ativo com a música. Diversos estudos indicam que a prática e a audição musical cotidiana, assim como o hábito de cantarolar sozinho, estão positivamente associados à frequência de earworms (Liikkanen, 2012a; Williamson e Müllensiefen, 2012). Uma evidência que sustenta essa concepção é o fato de que uma maior habilidade imaginativa intencional em músicos, relacionada à discriminação de alturas e precisão rítmica, aprimorada conforme o nível de expertise, não está associada a uma maior frequência de experienciar earworms (Weir et al., 2015).
Em síntese, o treinamento musical parece prolongar a duração dos episódios de earworms, mas não necessariamente aumentar sua frequência. A falta de relação entre a habilidade imaginativa em músicos e a frequência dos episódios sugere que um preditor mais sólido seja o engajamento ativo e recorrente, e não necessariamente uma atuação musical formal. A possível diferenciação entre os gêneros ainda é inconclusiva, enquanto a correlação entre traços de personalidade, como abertura à experiência e neuroticismo, é mais consistente. Diferenças fenomenológicas marcantes, em especial a tendência menos repetitiva que ocorre em alucinações musicais, sugerem que os earworms podem ser considerados uma forma de cognição cotidiana, não clínica.
Características musicais intrínsecas
Estudar as características musicais objetivas que fazem uma música se tornar um earworm pode ser desafiador devido ao caráter altamente idiossincrático do fenômeno, representado em melodias que são familiares particularmente ao indivíduo que as relata. Além disso, como mencionado anteriormente, vários fatores situacionais também influenciam a probabilidade de uma música se tornar um earworm em detrimento de outras. Em certa medida, é possível questionar a possibilidade de identificar os elementos objetivos que tornam esse fenômeno pegajoso. No entanto, a revisão da literatura também proporciona insights pertinentes que nos levam a reavaliar a importância dessa investigação.
O caráter de alta idiossincrasia é verificado nos estudos em geral pelo fato de apresentarem uma baixa redundância da amostragem nas músicas relatadas entre os indivíduos (Beaman y Williams, 2010; Liikkanen, 2012a; Jakubowski et al., 2015, 2017). Estes aspectos demonstram que a familiaridade desempenha um papel relevante na ocorrência de earworms, uma vez que a maioria das pessoas também reconhece diretamente os conteúdos musicais de suas experiências, sendo mais raros os relatos de melodias originais (Liikkanen, 2012a; Williamson et al., 2012). Isso parece se confirmar quando a exposição e indução é realizada experimentalmente, confirmando a familiaridade como um fator robusto (Byron y Fowles, 2015).
Uma associação potencialmente relevante está relacionada às preferências musicais individuais, as quais também têm sido apontadas como um fator influente na ocorrência de earworms (Beaman y Williams, 2010; Hyman et al., 2015 e Liikkanen, 2012a). A combinação de familiaridade e gosto musical pode sugerir uma perspectiva mnemônica do fenômeno earworm, em que exposições prévias e repetidas desempenham um papel significativo. No entanto, é essencial salientar a existência anteriormente comentada de casos com melodias menos familiares, assim como episódios envolvendo conteúdo musical totalmente original. Essa variabilidade nas experiências de memória musical involuntária deve ser considerada e não pode ser negligenciada.
Outro aspecto relevante a ser considerado é a predileção por conteúdos verbais, especialmente refrões. Estudos experimentais conduzidos por Beaman (2018) revelaram que as canções têm uma tendência quase duas vezes maior de induzir earworms em comparação com composições instrumentais. Em um questionário realizado por Liikkanen (2012a), foi observado que essa preferência por conteúdos verbais pode ocorrer tanto em músicas na língua nativa quanto em línguas estrangeiras. Além disso, análises de diários mostraram que aproximadamente 83% dos earworms relatados continham letras (Halpern y Bartlett, 2011), o que está em concordância com os episódios induzidos experimentalmente por Campbell e Margulis (2015), nos quais 90% desses episódios também eram fragmentos de refrões.
É possível que esses achados simplesmente reflitam o fato da presença massiva de canções populares nos hábitos contemporâneos de escuta musical. No entanto, a proeminência dos refrões talvez possa indicar também a existência de peculiaridades rítmico-prosódicas e melódicas além das letras. Um estudo pertinente que procurou se concentrar na análise melódica de canções foi realizado por Jakubowski et al. (2017).
Nesse estudo, os pesquisadores realizaram uma comparação entre as características dos earworms frequentemente relatados e outras canções populares presentes no Chart Billboard[10] britânico. O critério empregado na validação e seleção de earworms foi considerar as canções em que pelo menos 3 participantes, num total de 3.000, indicassem a mesma música em um levantamento prévio. Utilizando uma abordagem computacional que analisou 82 características estruturais, os resultados revelaram que as melodias dos earworms geralmente seguem padrões de contorno globais em forma de arco[11], mas também deve apresentar uma configuração altamente incomum em pontos em que este padrão é subvertido. Além disso, as canções que se tornam earworms tendem a ter um andamento musical mais acelerado em comparação com as não-earworms (Jakubowski, et al., 2017).
A investigação dos parâmetros acústico-musicais ainda está em estágio inicial, e existem lacunas significativas no estudo de aspectos extra melódicos, como timbre, textura e volume do fonograma (loudness), que podem desempenhar um papel na predisposição de uma música se tornar um earworm (Jakubowski, et al., 2017; Beaman, 2018). É importante destacar que a importância desses estudos transcende considerações meramente comerciais relacionadas a uma Hit Song Science. Mais do que isso, esses trabalhos podem lançar luz sobre o conteúdo musical em suas propriedades objetivamente compartilhadas, em contraste e complemento aos traços e fenômenos psicológicos individuais ou outras características idiossincráticas (Liikkanen y Jakubowski, 2020).
Em síntese, a experiência de earworms tende a ser altamente idiossincrática, com variações significativas entre os indivíduos em relação às músicas relatadas. A familiaridade e as preferências musicais são fatores comuns associados ao fenômeno, embora seja necessário considerar a possibilidade de viés amostral, uma vez que episódios com músicas menos conhecidas e conteúdos originais também são relatados. Além disso, é observado que as canções, especialmente os refrões, têm maior probabilidade de induzir earworms do que as peças instrumentais. No entanto, ainda há uma lacuna de pesquisas que analisem o conteúdo musical em termos de suas propriedades objetivas, em contraposição a fatores psicológicos ou contextuais.
Discussão: o earworm enquanto um fenômeno cotidiano e suas implicações
A abordagem mnemônica extramusical
A alta prevalência do earworm favorece a reestruturação da concepção tradicional de uma cognição típica (Liikkanen y Jakubowski, 2020). Contrariando uma tendência histórica na psicologia, que considera o pensamento e a memória deliberada como norma, as experiências cognitivas espontâneas foram frequentemente relegadas a descrições de pensadores, artistas ou tratadas como sintomas de distúrbios, o que resultou em um viés na sua abordagem (Berntsen, 2021).
A literatura reflete consistentemente a influência dessa mudança de perspectiva em relação aos fenômenos involuntários. Na esteira de Dorthe Berntsen (1996) e outros pesquisadores no âmbito da chamada memória involuntária, Hyman et al., por exemplo, defendem que “pensamentos involuntários e intrusivos podem ser uma característica marcante da experiência, e não necessariamente uma resposta a memórias traumáticas” (2013, p. 214). Beaman (2018, p. 8), por sua vez, discute os earworms em relação a constructos cognitivos intrusivos e sugere que é razoável supor que eles sejam uma forma de lembrança musical desencadeada de maneira similar a outras lembranças involuntárias. Não é incomum que earworms, especialmente quando sob o termo imaginação musical involuntária (InMI), seja abertamente enquadrada enquanto uma das subcategorias das chamadas Memórias Involuntárias Semânticas (Liikkanen, 2012a; Floridou et al., 2018).
Memórias involuntárias são recordações que surgem espontaneamente na mente e são frequentemente estudadas em duas formas principais: as memórias involuntárias autobiográficas (MIA), que se referem a eventos pessoais específicos (Mace, 2018; Berntsen, 2021), e as memórias involuntárias semânticas (MIS), que envolvem informações gerais, conhecimentos e conceitos. As MIS são caracterizadas por não possuírem significado autobiográfico e poderem se manifestar como palavras, imagens ou músicas, ocorrendo tanto de forma repetitiva quanto em episódios únicos. Na literatura, a modalidade auditiva é a forma mais comumente estudada desses tipos de memória (Floridou et al., 2018).
Diversas semelhanças corroboram essa aproximação, além da correlação existente, apesar de modesta, entre indivíduos que frequentemente experimentam earworms e sua propensão a notar outros tipos de memórias involuntárias (Hyman et al., 2015). A veracidade e fidelidade perceptual das recordações involuntárias se assemelham às observadas nos earworms (Mace et al., 2011; Jakubowski et al., 2015). Os episódios musicais involuntários também parecem evocar uma resposta emocional mais intensa, em comparação às evocações deliberadas, algo semelhante ao observado nas MIAs (Berntsen y Hall, 2004; Jakubowski et al., 2018). Essas experiências geralmente são identificáveis em seus gatilhos, sendo mais prevalente os fatores externos, o que também é comum nos earworms (Berntsen, 1996, 2021; Williamson et al., 2012; Jakubowski et al., 2015) —embora seja uma tendência diferente das memórias semânticas (Kvavilashvili y Mandler, 2004).
Outro aspecto que fortalece a interpretação dos earworms como memórias involuntárias é a presença consistente do efeito de recência. O efeito refere-se à tendência de lembrarmos com maior facilidade e precisão de conteúdos que foram expostos recentemente, em comparação com estímulos mais antigos. Em outras palavras, em muitas tarefas a memória parece ter uma maior eficiência na retenção de estímulos recentes, fenômeno que pautou discussões diversas ao longo do desenvolvimento da psicologia experimental (Cowan, 2005, p. 13-15).
Em autorrelatos, a exposição recente é considerada um dos principais preditores para a ocorrência de earworms (Williamson et al., 2012), tendência também observada em muitos estudos experimentais (Liikkanen, 2012b; Hyman et al., 2013; Byron y Fowles, 2015). Alguns pesquisadores discutem a ideia de que essa ativação recente das memórias musicais desempenha um papel importante na recorrência da experiência.
O efeito possivelmente explicaria a predominância da familiaridade e valência positiva na experiência. Embora seja possível ter episódios com excertos menos familiares e agradáveis, geralmente as pessoas gostam dos seus earworms, pois tendem a ser músicas que elas apreciam, aumentando, assim, a propensão de ocorrência dessas memórias. Nesse sentido, mesmo quando expostos a excertos musicais considerados desagradáveis, esses trechos podem se tornar earworms se estimulados de forma reiterada (Hyman et al., 2015). Müllensiefen et al. (2014), por sua vez, sugerem que indivíduos altamente engajados na escuta musical ativam suas memórias musicais com mais frequência e recentemente, tornando essas memórias mais preparadas para a reativação involuntária, seja de forma espontânea ou associativa, por meio da propagação da ativação em outras redes semânticas.
Liikkanen (2012b) também discute uma ideia similar, considerando a ativação prolongada das memórias, com base na propagação de ativação em redes de memória de longo prazo descrita por Lia Kvavilashvili e George Mandler (2004). O autor pondera, no entanto, que a ativação recente de memórias cria também um certo reforçamento transitório, e nenhum dos componentes sozinhos é suficiente. Em outras palavras, “não é apenas a música mais recente que temos em mente, as músicas de ontem também contam” (Liikkanen, 2012b, p. 231).
Abordar earworms em sua perspectiva mnemônica também pode influenciar a investigação de suas causas e funcionalidades. Uma das primeiras proposições que tangenciaram explicações teóricas menos descritivas surgiu no trabalho de Hyman et al. (2013), que levantaram a hipótese da influência do efeito zeigarnik na propensão das melodias que se tornam earworms. O efeito zeigarnik é um fenômeno psicológico que se refere à tendência de lembrarmos de tarefas incompletas com mais facilidade do que das tarefas concluídas. No experimento (estudo 2), os autores manipularam a duração dos estímulos musicais apresentados aos participantes, supondo que nos casos de exposição incompleta poderia haver diferenças na indução subsequente de episódios. No entanto, nenhuma evidência foi encontrada para apoiar essa hipótese.
Essa possibilidade também foi explorada no estudo de Campbell e Margulis (2015), que investigaram a hipótese do envolvimento motor imaginário (subvocalização) e sua influência na indução de earworms, comparando a continuidade mental de melodias interrompidas com o contexto de escuta musical passiva. De maneira semelhante, Callula Killingsly et al. (2021) examinaram o efeito de tarefas fonológicas durante a escuta musical e em silêncio, argumentando que os earworms podem ser caracterizados como um canto mental automático. Enquanto o primeiro estudo não encontrou evidências que corroborassem o efeito zeigarnik, o último indicou alguma propensão maior à ocorrência de episódios, mas apenas em estímulos previamente considerados pegajosos pelos próprios participantes, levando em conta parâmetros como a facilidade de cantarolar as músicas e a sensação de familiaridade.
Abordar o efeito zeigarnik experimentalmente pode ser desafiador devido à dificuldade de reproduzi-lo em um contexto ecológico[12], além de muitos fatores parecerem impactar o efeito: é menos provável de ocorrer quando o sujeito está, de certa forma, envolvido emocionalmente na tarefa, e é mais provável de ocorrer quando a interrupção das tarefas não parece fazer parte de intenção avaliativa e quando o sujeito tem um nível genuíno de autoconfiança nas tarefas interrompidas, ou seja, não estima ser impossível ou além de sua capacidade (Denmark, 2010).
No contexto musical, a própria segmentação do excerto, delimitada pelos pontos de interrupção escolhidos pelo pesquisador, pode hipoteticamente impactar na execução da tarefa. Isso ocorre porque a compreensão das estruturas musicais (e consequente percepção de interrupção) que resultam nos agrupamentos temporais durante o processamento perceptual é fortemente influenciada pela aprendizagem cultural do indivíduo, sendo assim, idiossincrática (Snyder, 2000, p. 33). É preciso considerar, ainda, que nem todo contexto naturalístico de escuta musical é regido por interrupções ou mesmo interferência atencional, o que por si só dificulta avaliar a abrangência do efeito zeigarnik[13] em explicar a causalidade dos earworms.
Ainda assim, apesar deste aspecto pouco conclusivo, o impacto significativo do efeito recência nos estudos pode favorecer o argumento de que não há nada excepcional que justifique ou explique a experiência dos earworms além das teorias cognitivas já existentes. Beaman (2018), principalmente, propõe que uma abordagem teórica mais simples seja considerá-los como um fenômeno cotidiano, com a distinção sendo a reação emocional atribuída pelas pessoas durante a experiência. A identificação de características musicais objetivas, por exemplo, embora seja uma questão mais incipiente na literatura, poderia estar se mostrando elusiva justamente devido à alta idiossincrasia inerente à exposição recente de cada indivíduo. O autor também destaca que vários fenômenos cognitivos, inicialmente vistos como extraordinários, foram reinterpretados ao longo da história com base em teorias que descrevem uma cognição típica padrão, como as flash-bulb memories[14] e a experiência de insight.eureka (Beaman, 2018).
Apesar de muitas tendências esperadas nos fenômenos da memória serem observadas nos earworms (Liikkanen, 2012b), é importante destacar que nem todas se confirmam. Na literatura da memória de trabalho, por exemplo, é amplamente documentada a observação dos efeitos de recência e primazia (Baddeley y Hitch, 1993; Cowan, 2005), este último referindo-se à tendência de lembrar melhor os primeiros elementos de uma sequência de estímulos. Esses efeitos são frequentemente observados em tarefas que envolvem a listagem de elementos, especialmente aqueles de curta duração. Contudo, apenas a recência pôde ser observada em pesquisas experimentais, nenhum dos trabalhos encontrando evidência para a primazia (Liikkanen, 2012b; Byron y Fowles, 2015; Moeck et al., 2018).
Mas por que a música? E por que a repetitividade?
Earworms são considerados a manifestação mais prevalente de memória involuntária para alguns autores (Liikkanen, 2012a; Floridou et al., 2018; Liikkanen y Jakubowski, 2020), e abordá-los nesses termos, consequentemente, carrega o ônus de explicar as razões pelas quais as experiências musicais parecem ser tão mais salientes. Algumas razões são apontadas na literatura, mas a profundidade dessas discussões ainda é pouco explorada, com argumentos divergentes em certos aspectos.
Uma possibilidade de partida seria questionar a própria afirmação inicial com ceticismo, na medida em que (1) é possível que a suposta prevalência maior de memórias involuntárias musicais seja falsa, enviesada pelo fato de que experiências musicais tendem a se externalizar no corpo, favorecendo seu reconhecimento ao serem cantaroladas ou acompanhadas por movimentação corporal ao ritmo da música imaginada (Jakubowski et al., 2015; Floridou et al., 2018). De forma contrária, essa prevalência musical pode ainda (2) ser um produto colateral da presença generalizada na vida cotidiana, o que facilitaria então processos de codificação e subsequente lembrança espontânea (Floridou et al., 2018), e, mais ainda, (3) estar relacionada à repetição, que é inerente à música, algo que se assemelha à experiência subsequente de cognições musicais igualmente repetitivas (Margulis, 2014; Floridou et al., 2018), podendo ainda ser reativada devido à resposta emocional, positiva ou negativa, que é eliciada concomitantemente (Beaman, 2018).
Nesse sentido, autores como Beaman (2018) argumentam que a persistência da experiência musical do earworm está condicionada à reflexão do indivíduo, assemelhando-se a qualquer memória que se reativa por meio desse processo, intensificada em um ciclo repetitivo devido à natureza musical. Como resultado, é plausível que uma reação emocional inicialmente neutra passe por transformações com base na avaliação subsequente da experiência. A reação emocional pode transformar-se com a avaliação subsequente: avaliações positivas podem reativar a experiência voluntariamente, enquanto avaliações negativas podem, ironicamente, intensificar a recorrência ao tentar evitá-la, conforme postulado pela teoria do processo irônico de Daniel Wegner (1994), a qual tais esforços podem inadvertidamente intensificar a recorrência da imaginação musical indesejada.
Outra abordagem sugere a implicação de recursos cognitivos da memória de trabalho que lidam com informações verbais e auditivas, como o loop fonológico, o qual além de armazenar informações sensoriais por curtos períodos, é dotado de subcomponente articulatório que reproduz verbalmente informações na mente através de repetição subvocal, interiormente articuladas, mantendo assim ativas certas representações de informações como palavras ou números. De tal forma, é plausível que a repetição intrínseca na música desencadeie uma interação recíproca com esse componente, perpetuando a experiência sensorial ao evitar sua degradação temporal (Floridou et al., 2018), embora não seja suficientemente claro o porquê de estímulos musicais se sobressaírem a outras memórias sequenciais. Mais ainda, há uma objeção que argumenta que essa questão ainda deve ser aprofundada, não sendo suficiente “simplesmente atribuir a culpa ao estímulo musical que carrega a repetição inerente” (Arthur, 2023, p. 10).
Contudo, é importante ressaltar que relacionar a repetição intrínseca na linguagem musical à ocorrência na experiência do earworm não ocorre de forma completamente infundada. É possível atribuir alguma validade a essa associação com base em observações fenomenológicas e considerações cognitivas, especialmente em relação à natureza da representação mental e ao subsequente funcionamento mnemônico.
Margulis (2014), especialmente, discute a distinção entre a repetitividade musical e verbal, destacando a qualidade psicológica que gera estranhamento, desconforto ou até medo em repetições literais ocorridas na verbalização, resultando em uma espécie de apagamento da característica humanóide. Assim, a repetitividade que acomete a linguagem verbal é apenas pontual, e mesmo como recurso expressivo objetiva perturbar e ser notável; a música, por sua vez, bem como outros contextos sensório-motores do cotidiano, a repetição e automaticidade muitas vezes sequer é notada como tal.
De forma resumida, sua tese se baseia na diferença em que estes conteúdos são representados na mente, fundamentada na Teoria do Traço Difuso, de Reyna e Brainerd, (1995), que busca explicar o fenômeno das falsas memórias. Segundo tal abordagem, nossa memória parece ser capaz de registrar conteúdos operando a partir de dois modos paralelos e independentes, um voltado a características semânticas (gist), que expressam a essência e significado de uma informação, e outro voltado para literalidade e aspectos de superfície (verbatim). Enquanto que os traços de superfície mais literais (verbatim), característicos do que extraímos de estímulos musicais, decaem rapidamente, os de semântica (gist) conseguem perdurar períodos mais longos, o que parece explicar, por exemplo, o fato de fazermos uso de paráfrases e sinônimos na evocação de narrativas, sem prejuízos grandes semânticos, ou as razões de nossas memórias verbais apresentarem maior fidelidade (literalidade), quando as exposições aos conteúdos são apresentadas sob forma prosódica-musical, como em canções ou poesia (Calvert y Tart, 1993).
Nesse contexto, a repetitividade em música pode denotar alguma condição, não necessariamente excludente, naturalizada na própria linguagem musical, que visa garantir a apreensibilidade através de um processo que tende mais à literalidade, nota por nota, em vez de algum resumo semântico atemporal —ao menos na maior parte dos indivíduos. Consequentemente, abordagens teóricas mais parcimoniosas, que interpretam a experiência do earworm com base em predisposições cognitivas mais gerais (business-as-usual), precisam considerar, no mínimo, a especificidade observada na maneira como a memória musical se apresenta em seus modos de representação e consequente dinâmicas associadas.
Lacunas e implicações teóricas
Na revisão de Liikkanen e Jakubowski (2020), dois desafios metodológicos se destacam. O primeiro é o viés de publicação, com apenas 8 dos 33 trabalhos experimentais selecionados, especialmente na eliciação de episódios. A ausência de resultados negativos questiona a generalização de conclusões, derivadas apenas de estudos bem-sucedidos. Outro desafio está relacionado ao viés amostral, em que grande parte dos estudos ainda se concentra em populações conhecidas como WEIRD (Western, Educated, Industrialized, Rich, and Democratic), caracterizadas por representar uma fatia restrita da diversidade humana. Os autores ponderam o fato de que esse contexto não é atípico, alinhando-se com tendências observadas na pesquisa psicológica em geral, e o fato de que pelo menos metade dos estudos selecionados pelos autores (54%) estruturaram sua amostragem em populações não restritas a universitários. É positiva, ainda, a existência de trabalhos como o de Liikkanen et al. (2015), pesquisa baseada em Big Data analisando discursos na rede social Twitter, que conseguiram apurar indivíduos de 173 países diferentes, embora restrita aos usuários que se expressam em inglês.
É possível questionar, ainda, o quão severa seriam as implicações do viés WEIRD, uma vez que diversas capacidades mentais parecem exibir um forte componente cultural (Henrich et al., 2010)[15], embora haja uma lacuna na literatura em relação à presença ou ausência de episódios de earworms durante a infância, a qual fomentaria abordagens bioculturais ou, no mínimo, insights valiosos para compreender o desenvolvimento da musicalidade infantil —visto que comportamentos musicais espontâneos são observados desde a tenra idade. Uma questão especialmente crucial nesse contexto é avaliar se ambas as capacidades para imaginação musical voluntária e involuntária emergem concomitantemente, alimentando assim a hipótese de alguma funcionalidade para o earworm (Liikkanen y Jakubowski, 2020, p. 19).
Sendo um fenômeno cognitivo aparentemente prevalente na população em geral, o earworm parece ilustrar uma capacidade humana universal de engajamento musical (Huron, 2001; Fitch, 2015; Varella, 2018). Esforços recentes, embora incipientes, gradualmente ampliam a abrangência de amostras não ocidentais, investigando o fenômeno em populações como China (Jue et al., 2020) África do Sul (Pitman et al., 2021) e Japão (Negishi y Sekiguchi, 2020).
Atestar uma funcionalidade última, no entanto, ainda é uma tarefa árdua, pois a questão parece atada ao debate adaptativo sobre a musicalidade, isto é, se esta constitui uma propensão mental[16] ou um mero subproduto de outras competências —na qual conteúdos musicais figurariam, então, apenas como coincidência. Em que pese o debate em aberto, carecendo ainda de consenso ou provas empíricas definitivas, é pertinente apontar o fato de que evidências sobre a musicalidade humana são muito anteriores a outros subprodutos, como a escrita, a busca de prazer não-adaptativa (abuso de substâncias) e demais cheesecakes[17], atendendo, ainda, a diversas outras características típicas das adaptações mentais[18] (Varella, 2018).
Mesmo na recusa de uma propensão especializada, experiências mentais espontâneas/divagantes, podem ser produto de um mecanismo cognitivo orientado a aumentar nossa eficiência mnemônica (Mills et al., 2018), podendo nos conferir, assim, vantagens adaptativas que complementam os benefícios da capacidade para o pensamento voluntário e autorregulado (Sripada, 2018). Não está claro, no entanto, se isto é aplicável a imaginação musical —se a ausência de episódios indicaria uma menor eficiência mnemônica, por exemplo— havendo ainda a possibilidade não excludente de sua funcionalidade expressar um mecanismo inconsciente de regulação emocional (Liikkanen e Jakubowski, 2020).
Abordagens generalistas, como a hipótese do efeito zeigarnik, não esgotaram todas as considerações, como as diferenças individuais, embora obscureçam especificidades mnemônicas do estímulo musical. Pode ser útil, contudo, reconhecer as potencialidades em ambas as perspectivas, especializada e generalizada, não refletindo necessariamente uma postura ambígua ou indecisa, mas antes uma abordagem verdadeiramente prudente em relação à complexidade intrínseca do fenômeno dos earworms. A complementaridade entre essas visões pode ampliar significativamente nossa compreensão sobre esse fenômeno multifacetado, permitindo uma compreensão mais abrangente e aprofundada no futuro.
Considerações finais
Os earworms têm despertado interesse interdisciplinar devido à sua intrincada complexidade e capacidade ímpar em evocar vivências musicais vívidas, assemelhando-se, em certa medida, às memórias autobiográficas. Com uma presença cotidiana observada em grande parte da população, alguns desafios ainda persistem na definição precisa do termo e características como a duração desses episódios. Avanços metodológicos proporcionam insights sobre influências contextuais, e a relação entre earworms e alucinações musicais ou distúrbios revela nuances fenomenológicas distintas. A idiossincrasia das experiências, aliada à preferência musical e a ainda escassa análise de propriedades musicais, constituem áreas promissoras para pesquisas futuras.
Abordar o fenômeno como uma manifestação de memória involuntária não apenas estimulou, mas também validou a confirmação de preditores intuitivos, como a exposição musical recente e repetitiva, e a presença de gatilhos associativos, como palavras que evocam letras de músicas ou estados afetivos. Contudo, essa abordagem impõe limitações ao restringir-se a investigar causas subjacentes distais[19], ao mesmo tempo em que a aparente universalidade do fenômeno pode indicar um indício relevante para a ideia de uma musicalidade adaptativa, isto é, uma propensão mental evoluída.
Mais ainda, nuances mnemônicas específicas à música acabam sendo obscurecidas quando comparadas à linguagem verbal, especialmente nos modos de representação e processamento do estímulo. Essas considerações enfatizam a complexidade dos earworms, demandando uma exploração mais profunda, tanto de uma perspectiva cognitiva generalista quanto considerando especificidades da mente musical.
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Notas