Relato de experiência de estágio no PIBID: reflexão crítica a partir dos sentimentos e observações

1 Introdução

Ser professor não é nenhuma tarefa fácil, é uma enorme responsabilidade que se assume com a educação e o futuro de outras pessoas. Educar não é uma simples transmissão de conhecimento, mas sim tornar possível a sua compreensão dialogando com o mundo, é desenvolver o senso crítico, a criatividade e a valentia (FREIRE, 1997).

Nesse processo para se tornar professor, é de extrema importância que haja do graduando um contato com a escola durante sua formação. Durante o estágio é onde o estudante, que passou anos na escola, passa por rupturas emocionais e cognitivas, deixando de lado o olhar de aluno e salientando o papel do professor (ALMEIDA; PIMENTA, 2015).

Para Damásio (2000), os sentimentos e emoções são importantes ferramentas que nos influenciam nas tomadas de decisões. Essa condição gera uma importância em buscar compreender os sentimentos do graduando durante o estágio.

Também, Piconez (1991) cita que o estágio possibilita uma aproximação com a realidade escolar e permite, por meio da observação, coletar dados para uma reflexão crítica acerca da prática-teoria-prática.

Com isso, surge o Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) ofertado pelo Ministério da Educação (MEC) cujo objetivo é proporcionar a estudantes de graduação em licenciatura um primeiro contato com o ambiente escolar e seu contexto, além de estimular a prática docente (CAPES, 2020).

Assim, é de grande relevância entender qual a contribuição do PIBID na formação docente e como ela influencia nos sentimentos e percepções do graduando ao longo do programa. Diante disso, surge o objetivo do estudo de destacar a evolução dos sentimentos e observações do graduando no início e final do programa e relatar criticamente a experiência no estágio PIBID.

2 Metodologia

Trata-se de um relato de experiência desenvolvido por um graduando do curso de Educação Física que foi realizado em uma escola municipal por meio do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID). Para a elaboração da pesquisa utilizou-se das observações e sentimentos do graduando, além das experiências adquiridas.

O estágio foi realizado entre o período de 2018 a 2020, em uma escola municipal de ensino básico no município de Florianópolis, Santa Catarina. O tempo dispendido no estágio era de 36 horas mensais, sendo oito horas semanais realizadas em dois dias por semana.

Para contemplar as informações utilizadas no estudo, foram utilizados das vivências do graduando no ambiente escolar. Essas experiências contaram com elaboração de planos de ensino, ministração de aulas, elaboração de projetos com alunos e comunidade, assim como as participações em reuniões, debates e palestras com pais e professores da escola.

O estudo apresenta os principais sentimentos e observações do estagiário durante o início e final do programa. A pesquisa transcorre recorrendo a análises e a problematização, confrontando as ideias teóricas e a prática e assim, debatendo com a literatura e as opiniões de outros autores, relacionando com os aspectos sociais e culturais da comunidade escolar (LIMA; PIMENTA, 2006).

3 Resultados e Discussão

O estágio por meio do PIBID foi o primeiro contato do graduando com a escola na visão de professor. Pode-se dividir em duas particularidades: sentimentos e observações. E em dois momentos: início e final do estágio.

A relevância do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID)

O programa foi criado em 2007 visando incentivar a formação de docentes, além de melhorar a capacitação dos futuros professores (CAPES, 2020). Diante disso, o programa apresenta uma ótima iniciativa visto que são poucas as oportunidades de estágios de licenciatura durante a graduação.

O PIBID dentre seus pontos positivos, consegue oportunizar uma graduação em licenciatura mais completa, onde a teoria apresentada no curso se entrelaça com a prática vivenciada no estágio. A resolução de problemas somente por meio da teoria pode levar a utopia, deve-se encontrar a solução por meio do agir e pensar interligados (MARX; ENGELS, 2001).

Também, o contato desde cedo com a comunidade escolar possibilita ao graduando realizar uma reflexão crítica a respeito da teoria e prática, gerando indagações que servem para debates durante as aulas da graduação (LIMA; PIMENTA, 2006). Gauthier et al. (1998) apresenta a questão da formação acadêmica não considerar o contexto escolar. Por isso a importância de debates sobre conteúdos ensinados no meio acadêmico que são viáveis ou não com a realidade escolar.

Entre os pontos negativos, ou que mais carecem o programa, destaca-se a falta de cursos de capacitação e aperfeiçoamento. No momento que o graduando chega na escola, nos primeiros semestres da graduação, são poucas as informações e conhecimento acerca do programa e do ensino-aprendizagem.

Os sentimentos de despreparo e medo destacam-se nos primeiros meses e isso pode ser um dos principais fatores para a evasão do curso de licenciatura. Porém, Freire (1997) cita que não devemos deixar o medo nos persuadir a desistir ou não enfrentar o desafio sem luta e sem esforço.

Um estudo de revisão constatou que promover a autorregulação das emoções em estudantes de cursos de licenciatura pode auxiliar na sua futura prática docente, aprendendo a lidar com as distintas expressões das emoções pessoais e dos alunos, que emergirão durante as aulas. (PELLISSON; BORUCHOVITCH, 2021).

Contudo, ao analisarmos todos os pontos do programa, é visível a sua importância para a formação de futuros professores. Ele proporciona um melhor preparo ao graduando no seu futuro local de trabalho, desenvolvendo-o em aspectos racionais e emocionais.

Os sentimentos e observações durante o estágio

Ao analisarmos o contexto inicial do estágio, surgem os sentimentos de medo, nervosismo, receio e insegurança (Quadro 1) devido ao primeiro contato com a escola no papel de professor. Segundo Pompeu e Archangelo (2011), professores citam o sentimento de medo perante a falta de autoridade na sala de aula. Durante o estágio esses sentimentos surgem principalmente pela falta de relação professor-aluno, assim como a incompreensão dos alunos do papel do estagiário (Quadro 2).

Essa falta de reconhecimento do estagiário por parte dos alunos leva o estagiário, quando a frente da turma, recorrer a aulas com conteúdo que os alunos gostem, não considerando o que eles realmente precisam naquele momento, isso tudo para conquistar a admiração dos alunos.

Esse é um dos problemas que o estagiário enfrentou durante os primeiros meses, porém esse fator foi importante, pois estabeleceu o vínculo de professor-aluno. Estudos têm mostrado que ao estabelecer uma relação positiva com os alunos, através do diálogo e relações afetivas, ocorre uma melhora do ambiente de ensino-aprendizagem, assim como melhora das atitudes dos alunos (VERAS; FERREIRA, 2010; BELO; OLIVEIRA; SILVA, 2021).

Também, manifestam-se os sentimentos de incerteza, despreparo e desmotivação, sentimentos que refletem a situação acadêmica do estagiário que ainda se encontra nas primeiras fases do curso. Esse fato destaca ainda mais a importância da elaboração de um curso de capacitação aos estagiários.

Para Veiga, Leite e Duarte (2005), a capacitação possibilita contornar as dificuldades encontradas na escola, desenvolver as habilidades dos professores e propagar as experiências positivas. Com um curso capacitativo, o processo para compreender a cultura da comunidade, políticas pedagógicas e como se relacionar com os alunos seria mais rápido e poderia possibilitar ao estagiário que não houvesse sentimento de insegurança, desmotivação e despreparo.

Contudo, ao longo desses dois anos de estágio, ocorreu uma evolução positiva dos sentimentos e desenvolvimento profissional. Ao pensar nos sentimentos estabelecidos no final do estágio, surgem a compreensão, afeição, tranquilidade, encantamento e gratidão.

Essa mudança de sentimento ocorre devido ao processo construtivo de vínculo com os alunos e demais professores. Ao conquistar o respeito dos alunos e estabelecer a relação professor-aluno, a preocupação com as aulas transcorre ao conteúdo necessário para o desenvolvimento dos alunos e não uma aula para agradá-los.

Também, o sentimento de responsabilidade se destaca. Ao entender a importância da profissão e o quanto ela impacta na vida das pessoas, gera uma reflexão sobre o papel do professor na escola, um tema pouco debatido durante a graduação e que deveria ser destacado. Para Freire (1996), o processo de ensino ocorre para o professor e para o aluno, enquanto o professor o ensina ele também aprende. Segundo ele, o professor deve ser crítico, desenvolvendo também esse pensar nos alunos através do diálogo e do afeto.

Outros aspectos alcançados ao final do estágio foram o entendimento da política pedagógica da escola e a identificação cultural da escola e comunidade. Segundo Vygotsky (1995), a cultura é fundamental para o desenvolvimento psicológico do aluno, a cultura é um produto da vida social e atividade social do ser humano.

Um estudo identificou que a troca de experiências com a comunidade possibilita uma reflexão por ambas as partes, apresentando a realidade escolar, o papel do professor, a didática e as dificuldades apresentadas para a comunidade e também possibilita um debate com a contribuição dos familiares nas práticas docentes (REALI; TANCREDI, 2005).

Por fim, surge o sentimento de estar inapto diante de uma profissão muito importante na sociedade. Podemos perceber que a experiência possibilitou uma contribuição para a formação, porém ao somar as experiências no estágio e os conhecimentos adquiridos no curso, estas ainda não possibilitam uma confiança para assumir o papel de professor.

No momento em que estamos diante da realidade escolar, mas estamos sendo orientados no curso a lecionar em uma utopia, não estamos aprendendo o que realmente contribui para a formação do professor. O PIBID possibilitou realizar essa reflexão e entender que precisa haver um maior diálogo entre universidade e escola.

Entre os pontos fortes da pesquisa pode-se destacar a longevidade do graduando no programa, que durou 2 anos, e a experiência ocorrer em uma escola pública, onde geralmente apresentam-se as maiores dificuldades no setor educacional. Dos pontos fracos é citável o fato de ser apenas o relato de um graduando, destacando apenas os sentimentos e observações do mesmo.

4 Considerações finais

O presente estudo teve como objetivo destacar a evolução dos sentimentos e observações do graduando no início e final do programa e relatar criticamente a experiência no estágio PIBID. Os resultados evidenciaram que o programa visivelmente contribuí para a formação docente. É notória a evolução profissional durante os dois anos de estágio, podemos observar isso ao comparar os sentimentos e as observações no início e no final do estágio. Observou-se que com a melhoras das situações mencionadas no Quadro 2, consequentemente observou-se uma melhora dos sentimentos (Quadro 1).

Entende-se que as emoções se entrelaçam com as observações destacadas. Os sentimentos, profissionalismo e relações observadas sofreram uma evolução positiva, porém foi um processo longo, desenvolvido em dois anos.

Seria interessante possibilitar um curso de capacitação voltado ao contexto da escola em que o estagiário está inserido, possibilitando uma melhor adaptação ao ambiente onde o estagiário do PIBID trabalhará, assim facilitando o processo de adaptação e quem sabe minimizando os sentimentos de medo, nervosismo e insegurança.

Assim, entendemos que os sentimentos são importantes nas tomadas de decisões e na maneira como observamos a sociedade. As construções dos sentimentos durante o estágio podem facilmente manipular nas decisões de como refletimos a profissão do educador.

É preciso, por meio de debates e experiências, proporcionar uma ótima experiência no PIBID ao graduando, desenvolvendo seus sentimentos positivos em relação ao ambiente escolar, facilitando suas vivências com alunos, professores, servidores e comunidade.

Também, seria relevante incluir nos cursos de licenciatura uma disciplina que trabalhe a teoria e a prática. Através de uma relação entre escola e universidade, proporcionar debates e reflexões críticas com os graduandos e professores das escolas a respeito das teorias ensinadas e sua realidade, na prática.

Ainda, possibilitar a inclusão da comunidade nesses debates. Entender as ideias e reflexões dessas pessoas que também fazem parte do ambiente escolar poderá facilitar no desenvolvimento de uma melhor didática e no processo de ensino-aprendizagem.

É de extrema importância entendermos diferentes experiências de graduandos no PIBID, considerando diferentes regiões do país e em cursos distintos. Isso facilitaria entender em uma maior proporção os principais sentimentos e desafios encontrados pelos futuros docentes, permitindo até identificar as principais causas das evasões dos cursos de licenciatura.

Por fim, devemos proporcionar cada vez mais a inclusão do futuro professor de maneira antecipada no ambiente escolar, possibilitando-o uma melhor adaptação ao ambiente já no contexto de professor e desenvolvendo seu senso crítico.

Referências

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BELO, Priscila Alves de Paula; OLIVEIRA, Rayssa Melo de; SILVA, Renato Carneiro da. Reflexos da relação professor-aluno para a aprendizagem no contexto formal de ensino. Rev. Pemo, Fortaleza, v. 3, n. 2, e323880, 2021. Disponível em: https://doi.org/10.47149/pemo.v3i2.3880. Acesso em: 26 set 2022.

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