Uso de metodologias ativas no ensino remoto: estudo longitudinal em um curso de engenharia de produção no nordeste brasileiro

Sandra Rufino
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil
Fernanda Barreto de Almeida Rocha Mariz
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil
Mariah Caroline Martins de Sousa
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil
Nivanio Jerônimo
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil

Revista de Estudos e Pesquisas sobre Ensino Tecnológico

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas, Brasil

ISSN-e: 2446-774X

Periodicidade: Frecuencia continua

vol. 9, e203423, 2023

educitec.revista@ifam.edu.br

Recepção: 13 Julho 2022

Aprovação: 31 Outubro 2022

Publicado: 06 Janeiro 2023



Resumo: O presente estudo possui como objetivo a investigação e a análise dos impactos do uso de metodologias ativas durante o ensino remoto em um curso de engenharia de produção em uma instituição de ensino superior. Mediante pesquisa do tipo survey descritiva, três questionários foram aplicados aos discentes e docentes do curso durante os períodos letivos realizados entre setembro de 2020 e abril de 2021. Diante dessa perspectiva, foi possível: a) mapear os principais fatores de influência no rendimento acadêmico associados à pandemia; b) identificar as metodologias com maior e menor afinidade pelos alunos; c) descrever as principais plataformas utilizadas; e, por fim, d) avaliar a percepção dos graduandos quanto ao auxílio das estratégias ativas de ensino no aprendizado. Como resultados, observou-se a influência da pandemia no desempenho acadêmico, com destaque para problemas associados à saúde mental dos discentes. Além disso, a metodologia Problem Based Learning foi a metodologia ativa de maior aceitação por parte dos alunos, enquanto a Sala de Aula Invertida apresentou a menor. Assim, a partir do reconhecimento das metodologias ativas como estratégias que auxiliam no processo de ensino-aprendizagem, o estudo permitiu a reflexão dos docentes do curso acerca das práticas adotadas nos períodos estudados.

Palavras-chave: Aprendizado ativo. Ensino remoto. Engenharia.

Abstract: This study aims to investigate and analyze the impacts of the use of active methodologies during remote teaching in a production engineering course in a higher education institution. Through a descriptive survey research, three questionnaires were applied to students and teachers of the course during the academic periods held between September 2020 and April 2021. From this perspective, it was possible to: a) map the main factors of influence on academic performance associated with the pandemic; b) identify the methodologies with greater and less affinity by students; c) describe the main platforms used; and, finally, d) assess the perception of undergraduates regarding the assistance of active teaching strategies in learning. As results, we observed the influence of the pandemic on academic performance, with emphasis on problems associated with the mental health of students. Moreover, the Problem Based Learning methodology was the most accepted active methodology by the students, while the Inverted Classroom had the lowest. Thus, based on the recognition of active methodologies as strategies that help in the teaching-learning process, the study allowed the teachers of the course to reflect about the practices adopted in the periods studied.

Keywords: Active learning. Online learning. Engineering.

Resumen: El presente estudio tiene como objetivo la investigación y el análisis de los impactos del uso de métodos activos durante la enseñanza remota en el curso de ingeniería de producción en una institución de educación superior. Por medio de búsqueda del tipo survey descriptiva, tres encuestas fueron aplicadas a los dicentes y docentes del curso durante los periodos lectivos realizados entre septiembre de 2020 y abril de 2021. Visto por esta perspectiva, fue posible: a) mapear los principales factores de influencia en el rendimiento académico asociados a la pandemia; b) identificar las metodologías con mayor y menor afinidad por los alumnos; c) describir las principales plataformas utilizadas; y, por fin, d) evaluar la percepción de los universitarios sobre la ayuda de las estrategias activas de enseñanza en el aprendizaje. Como resultados se ha visto la influencia de la pandemia en el desempeño académico, con destaque para problemas asociados a la salud mental de los dicentes. Además, la metodología Problem Based Learning fue el método activo de mayor aceptación por parte de los dicentes , mientras que las clases de aula invertida han presentado la menor. Así, a partir del reconocimiento de la metodología activa como estrategias que auxilian en el proceso de enseñanza-aprendizaje, el estudio permitió la reflexión de los docentes del curso acerca de las prácticas adoptadas en los períodos estudiados.

Aprendizaje activo. Enseñanza remota. Ingeniería.

Uso de metodologias ativas no ensino remoto: estudo longitudinal em um curso de engenharia de produção no nordeste brasileiro

Resumo

O presente estudo possui como objetivo a investigação e a análise dos impactos do uso de metodologias ativas durante o ensino remoto em um curso de engenharia de produção em uma instituição de ensino superior. Mediante pesquisa do tipo survey descritiva, três questionários foram aplicados aos discentes e docentes do curso durante os períodos letivos realizados entre setembro de 2020 e abril de 2021. Diante dessa perspectiva, foi possível: a) mapear os principais fatores de influência no rendimento acadêmico associados à pandemia; b) identificar as metodologias com maior e menor afinidade pelos alunos; c) descrever as principais plataformas utilizadas; e, por fim, d) avaliar a percepção dos graduandos quanto ao auxílio das estratégias ativas de ensino no aprendizado. Como resultados, observou-se a influência da pandemia no desempenho acadêmico, com destaque para problemas associados à saúde mental dos discentes. Além disso, a metodologia Problem Based Learning foi a metodologia ativa de maior aceitação por parte dos alunos, enquanto a Sala de Aula Invertida apresentou a menor. Assim, a partir do reconhecimento das metodologias ativas como estratégias que auxiliam no processo de ensino-aprendizagem, o estudo permitiu a reflexão dos docentes do curso acerca das práticas adotadas nos períodos estudados.

Palavras-chave: Aprendizado ativo. Ensino remoto. Engenharia.

Use of active methodologies in online learning: a longitudinal study in a production engineering course in northeastern Brazil

Abstract

This study aims to investigate and analyze the impacts of the use of active methodologies during remote teaching in a production engineering course in a higher education institution. Through a descriptive survey research, three questionnaires were applied to students and teachers of the course during the academic periods held between September 2020 and April 2021. From this perspective, it was possible to: a) map the main factors of influence on academic performance associated with the pandemic; b) identify the methodologies with greater and less affinity by students; c) describe the main platforms used; and, finally, d) assess the perception of undergraduates regarding the assistance of active teaching strategies in learning. As results, we observed the influence of the pandemic on academic performance, with emphasis on problems associated with the mental health of students. Moreover, the Problem Based Learning methodology was the most accepted active methodology by the students, while the Inverted Classroom had the lowest. Thus, based on the recognition of active methodologies as strategies that help in the teaching-learning process, the study allowed the teachers of the course to reflect about the practices adopted in the periods studied.

Keywords: Active learning. Online learning. Engineering.

Uso de metodologías activas en la enseñanza remota: estudio longitudinal en un curso de ingeniería de producción en el noreste de Brasil

Resumen

El presente estudio tiene como objetivo la investigación y el análisis de los impactos del uso de métodos activos durante la enseñanza remota en el curso de ingeniería de producción en una institución de educación superior. Por medio de búsqueda del tipo survey descriptiva, tres encuestas fueron aplicadas a los dicentes y docentes del curso durante los periodos lectivos realizados entre septiembre de 2020 y abril de 2021. Visto por esta perspectiva, fue posible: a) mapear los principales factores de influencia en el rendimiento académico asociados a la pandemia; b) identificar las metodologías con mayor y menor afinidad por los alumnos; c) describir las principales plataformas utilizadas; y, por fin, d) evaluar la percepción de los universitarios sobre la ayuda de las estrategias activas de enseñanza en el aprendizaje. Como resultados se ha visto la influencia de la pandemia en el desempeño académico, con destaque para problemas asociados a la salud mental de los dicentes. Además, la metodología Problem Based Learning fue el método activo de mayor aceptación por parte de los dicentes , mientras que las clases de aula invertida han presentado la menor. Así, a partir del reconocimiento de la metodología activa como estrategias que auxilian en el proceso de enseñanza-aprendizaje, el estudio permitió la reflexión de los docentes del curso acerca de las prácticas adoptadas en los períodos estudiados.

Palabras clave: Aprendizaje activo. Enseñanza remota. Ingeniería.

Introdução

As atuais Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) dos cursos de engenharia buscam atender uma demanda de perfil para a sociedade e apontam para um egresso com formação humanista, crítica, reflexiva, voltada para o desenvolvimento e a sustentabilidade (BRASIL, 2019). Demanda-se, dos cursos de engenharia, um currículo pautado em competências que proporcionem uma formação integrada do profissional, unindo o saber teórico (conhecimento), ao saber fazer (habilidades), ao saber ser e ao saber conviver (atitudes). Para Daciolo (2022), há diferentes metodologias de ensino-aprendizagem que podem ser utilizadas para o desenvolvimento e estímulo de tais competências, entre as quais as metodologias ativas se destacam.

Nesse contexto, os desafios, identificados no processo de desenvolvimento de estratégias para ensino coerentes com o proposto pelos currículos e projetos pedagógicos, se intensificaram com a crise sanitária advinda pela pandemia do coronavírus, a qual impôs o isolamento social e resultou na suspensão de aulas presenciais. Como alternativa para o cenário, as instituições educacionais, objetivando atender a demanda de formação acadêmica, escolheram o ensino remoto como alternativa viável de curto prazo (ADEDOYIN; SOYKAN, 2020).

O ensino remoto é um formato de escolarização mediado por tecnologia que mantém as condições de distanciamento professor e aluno (CUSTÓDIO; CERQUEIRA, 2021; SALLES; SALLES, 2021). Para tanto, Couto e Cruz. (2020) apresentam a importância da estruturação do ciberterritório, local que permite relações e conexões virtuais, como premissa para isolamento social criativo no contexto da educação durante a pandemia. Os autores afirmam que, para alcançar transmissão e acesso no espaço cibercultural, é preciso que os envolvidos no processo tenham acesso a moradias adequadas e dignas, em espaços bem urbanizados, com renda suficiente e conexão de internet estável e veloz.

Além da provisão de recursos estruturais para auxílio, com a adoção das metodologias ativas como estratégia, o papel do professor é de ser um educador (BAZZO, 2007): nos novos parâmetros de ensino, ganha relevância nas dimensões de apoio, orientação, oferecimento de desafios, metodologias de trabalho e resolução em conjunto de problemas que auxiliem os estudantes a desenvolverem o conhecimento de forma autônoma, mas não solitária. Assim, para assegurar que o aluno assuma o papel de condutor do processo de aprendizagem com orientação docente, se faz necessária a reflexão e a avaliação periódica do uso das metodologias ativas para avaliação do impacto das estratégias no contexto em que os alunos estão inseridos (DIESEL; BALDEZ; MARTINS, 2017).

Diante dessa perspectiva, identificou-se a importância de avaliar a percepção dos alunos e docentes frente à adoção das metodologias para aprendizado ativo, durante o período remoto realizado no contexto pandêmico. Portanto, o presente estudo teve por objetivo investigar e analisar os impactos do uso de metodologias ativas durante o ensino remoto, em um curso de engenharia de produção no nordeste brasileiro. A pesquisa está estruturada em cinco seções, com início na introdução acerca da temática abordada, um tópico teórico para revisão das estratégias de aprendizado ativo, seguido pela apresentação da metodologia da pesquisa. A quarta seção apresenta os resultados e discussões provenientes do estudo aplicado e, por fim, a última seção traz as considerações finais e conclusões da pesquisa.

Estratégias de Aprendizado Ativo

As estratégias de aprendizado ativo, também chamadas de metodologias ativas, são fundamentadas pelos seguintes princípios: autonomia, reflexão, problematização da realidade, trabalho em equipe e inovação, com o aluno no centro e o professor, como mediador. O uso de tais metodologias deve ser refletido e avaliado diversas vezes, de forma que as atividades continuem a ser compatíveis com a realidade e impactem na aprendizagem dos estudantes (DIESEL; BALDEZ; MARTINS, 2017; SILVA, 2021).

Para Rehfeldt et al. (2019), os alunos não podem apenas aprender o conteúdo teórico, mas devem aprender a adaptar o conteúdo às situações e aos problemas do seu cotidiano. Ao contrário dos métodos convencionais de ensino, cuja noção de competência está fortemente baseada no conteúdo, nas metodologias ativas entende-se competência profissional como a capacidade de fazer julgamentos informados sobre o que é problemático em uma dada situação, saber identificar os problemas mais relevantes e saber como resolvê-los ou, ao menos, melhorar a situação (MARGETSON, 1999; NITZKE et al., 1999, RIBEIRO, 2008, SILVA, 2021). Essas metodologias fazem com que o aluno seja mais ativo, pois “ultrapassa o papel passivo de escutar, ler, decorar e repetir os ensinamentos do professor” (FREIRE, 2009, p. 5892) em sala de aula.

Observam-se diversas metodologias ativas existentes na literatura (ELMÔR et al., 2019; OLIVEIRA; FURTADO, 2019; ALCANTARA, 2020), e novas são criadas a todo momento. Além disso, as metodologias ativas também são, muitas vezes, utilizadas em conjunto a fim de promover o processo de ensino centrado no aluno, conforme as necessidades observadas pelo docente (ELMÔR et al., 2019).

As metodologias que aproximam teoria e prática, as quais permitem vivência e sentimentos nos estudantes, são as que conseguem maior aprendizado. De certo modo, todas as formas de aprendizagem ativa, centradas no processo e/ou alunos, e os métodos de ensino construtivistas atendem a esse propósito (ELMÔR et al., 2019; OLIVEIRA; FURTADO, 2019; ALCANTARA, 2020). O desafio é encontrar as metodologias ativas que funcionem bem no ensino remoto para os docentes e discentes em diferentes atividades curriculares ofertadas.

Dentre as várias estratégias, revisaram-se as metodologias ativas mais mencionadas nesta pesquisa com base nos conceitos apresentados por Elmôr et al. (2019) e Oliveira e Furtado (2019), como resumido no Quadro 01:

Quadro 01 – Descrição das metodologias ativas da pesquisa

Quadro 01 – Descrição das metodologias ativas da pesquisa
Descrição das metodologias ativas da pesquisa
Metodologia ativa Breve descrição
Aprendizagem baseada em problemas (Problem Based Learning - PBL) Alia a construção do conhecimento de forma ativa à solução colaborativa de problemas interdisciplinares. Os alunos precisam administrar os recursos disponíveis, definir prazos e trabalhar em grupo. Desperta o lado inventivo, crítico e colaborativo, além de desenvolver competências socioemocionais.
Aprendizagem baseada em times (Team Based Learning - TBL) Proporciona um ambiente cooperativo (às vezes com competição), que valoriza a produção coletiva (ensino e aprendizado). Tem em vista aumentar o interesse do aluno com aulas dinâmicas, voltadas para a realidade e a aplicação dos conhecimentos adquiridos.
Aprendizado na hora certa (Just in Time Teaching) Utiliza leitura ou vídeos e exercícios de aquecimento no momento pré-aula, para identificação das maiores dificuldades dos discentes. A aula é planejada com base nas lacunas identificadas com foco na correção e na aprendizagem de novos conceitos.
Casos de ensino Consiste na solução de problemas extraídos de situações reais. Os casos são acompanhados de questões que orientam a análise, podendo haver, ou não, a exigência de relatórios/apresentações.
Controvérsias construtivas Trabalha com equipes formadas por dois pares. A equipe realiza a discussão de um tema central sob duas vertentes, nas quais cada par defende teses concorrentes. Após apresentação dos argumentos, os papéis se invertem, fazendo com que a dupla defenda outra perspectiva. Para finalizar, é feita uma síntese com todas as questões e aplicado um teste individual.
Desafios em grupo Compreende em grupos que resolverão exercícios ou problemas em conjunto. Dois alunos de cada grupo responderão no quadro (publicamente) uma questão sem consulta a materiais, tendo apenas o suporte dos demais componentes do grupo. Isso se repete até que todos tenham ido ao quadro.
Exercícios em sala (In Class Exercises) Utiliza o trabalho em grupo para a resolução de exercícios, com compartilhamento de resultados e coleta de respostas para processo de avaliação formativa, além da exposição dialogada pelo docente de conceitos associados ao conteúdo.
Gamificação Usa elementos adaptados de jogos para maior engajamento. Os alunos assumem papel de jogador, seguindo regras estabelecidas pelo docente, por meio de atividades de interação, comunicação via feedbacks e desafios. Normalmente, são competitivos e há um ranking.
Grupos com tarefas diferentes Consiste na formação de equipes e na alocação de exercícios ou problemas diferentes sobre um tema central. Após a resolução, os grupos são mesclados de forma que cada novo grupo contenha um componente associado às diferentes questões para o compartilhamento do conhecimento.
Instrução por pares (Peer Instruction) Consiste no estudo prévio de materiais disponibilizados pelo professor e apresentação de questões conceituais em aula síncrona. Promove a aprendizagem por meio de rodadas de discussões entre os alunos e, com a análise dos resultados, é feita a explanação do conteúdo na aula.
Pensamento compartilhado em pares (Think pair share) Proporciona a reflexão acerca de um problema. Além de promover a discussão e o compartilhamento de respostas e possíveis soluções, a fim de formular ideias em dupla e compartilhá-las com os colegas da turma. Propicia a participação e o envolvimento do aluno.
Sala de aula invertida (Flipped Classroom) Consiste em disponibilizar material (leituras e/ou vídeos) para que o aluno estude antecipadamente (pré-aula) o conteúdo. Na aula, há a revisão e um aprofundamento do tema, desenvolvendo no aluno a autonomia e a autorregulação no processo de aprendizagem.
Fonte: Adaptado Elmôr et al. (2019) e Oliveira e Furtado (2019).

Fonte: Adaptado Elmôr et al. (2019) e Oliveira e Furtado (2019).

Metodologia

A pesquisa tem natureza aplicada, com objetivo exploratório e descritivo. Para investigar e analisar os impactos do uso de metodologias ativas, durante o ensino remoto em um curso de engenharia de produção, foi realizada uma pesquisa do tipo survey descritiva. Por meio desse levantamento, buscou-se compreender e descrever como a aplicação de metodologias ativas contribuíram para o processo de aprendizagem no ensino remoto, no âmbito da população em estudo (FORZA, 2002).

Pode-se classificar a abordagem da pesquisa como predominantemente qualitativa em função dos procedimentos utilizados para análise dos dados (BORREGO; DOUGLAS; AMELINK, 2009). Os dados foram obtidos mediante a aplicação de questionários estruturados com perguntas fechadas (múltipla escolha, dicotômica, resposta única, pergunta tipo matriz e ranking) e abertas, respondidas de forma voluntária e anônima pelos participantes, de modo que os instrumentos permitissem analisar de forma macro os aspectos relacionados à adoção das metodologias ativas, assim como, discutir sobre o processo de aprendizagem por meio dos comentários dos respondentes.

A pesquisa também pode ser classificada como participante, uma vez que os pesquisadores estavam envolvidos no processo avaliado e fizeram parte da amostra de respondentes deste estudo (PRODANOV; FREITAS, 2013). Os participantes do estudo foram discentes e docentes do curso de graduação em engenharia de produção de uma instituição de ensino superior (IES). Com duração média de 10 semestres para o turno vespertino e 12 semestres para o turno noturno, o curso possui cerca de 450 alunos matriculados, 24 docentes da área profissionalizante e, em média, 14 docentes de disciplinas básicas, além de estar localizado na região nordeste do país.

Com o advento da pandemia de Covid-19, a instituição suspendeu as atividades presenciais em março de 2020 e adotou o ensino remoto a partir de junho de 2020. Até abril de 2021, foram ofertados e concluídos três períodos letivos nessa modalidade. Logo, a pesquisa caracteriza-se como um estudo longitudinal de um ano, com três momentos de avaliação referentes a cada período letivo.

O primeiro período (P1) foi chamado pela instituição como suplementar excepcional e ocorreu entre junho e julho/2020. Pode ser considerado um período de adaptação, pois foi facultativo para docentes e discentes. O segundo período letivo (P2) retomou as atividades que haviam sido iniciadas presencialmente em fevereiro/2020 e suspensas com a pandemia. Em continuidade, as atividades remotas aconteceram entre setembro e dezembro/2020. Já o terceiro (P3) consistiu na oferta integral de disciplinas no formato remoto de janeiro a abril/2021.

Para o desenvolvimento da pesquisa, foram executadas as seguintes etapas: (a) planejamento inicial; (b) formulação e aplicação dos questionários; (c) análise dos resultados parciais; (d) avaliação final dos resultados. O planejamento inicial consistiu na revisão da literatura sobre os construtos de aprendizagem ativa, definição das fronteiras de análises e programação das etapas com a equipe de trabalho (FORZA, 2002).

O processo de formulação dos questionários contemplou a realização de testes pilotos. Uma amostra de docentes e discentes avaliaram a compreensão e objetividade das questões, o tempo de preenchimento e demais aspectos relacionados à qualidade do instrumento. Para os períodos 1 e 2, foram elaborados dois questionários, sendo um destinado para avaliar a perspectiva docente e outro para coleta de dados com discentes. No entanto, no terceiro período, foi desenvolvido, em parceria com o centro acadêmico, apenas o questionário para aplicação com os discentes. Diferentemente dos dois primeiros períodos (P1 e P2), o P3 teve como objetivo, além da perspectiva de compreender o uso de metodologias ativas no ensino à distância, investigar o impacto do aprendizado no contexto da pandemia do COVID-19 e do encurtamento do semestre.

Quanto ao encurtamento do período letivo, em decorrência da adaptação ao formato remoto de ensino, o P1 contou com 6 semanas, o P2 com 15 semanas e o P3 com 14 semanas, sendo que, em um semestre típico de aulas, 20 semanas estão disponíveis no calendário para planejamento pedagógico de atividades, sendo 18 semanas obrigatórias de aulas. Vale ressaltar que as aplicações dos instrumentos foram online e durante as últimas semanas de aula dos respectivos períodos letivos.

Para garantir o entendimento e identificação dos respondentes (docentes e discentes) acerca das várias metodologias ativas, a equipe de pesquisadores elaborou uma cartilha explicativa de cada estratégia de aprendizado ativo e disponibilizou o link de acesso nos questionários para consulta.

Após cada aplicação, realizou-se a análise dos resultados. As análises eram compartilhadas com os docentes do curso, com a coordenação, o colegiado e o grupo que compõem o Núcleo Docente Estruturante ao longo de cada questionário. A análise final foi apresentada para todos os docentes da área profissionalizante em planejamento do departamento em junho de 2021. As etapas (b) e (c) constituíram um processo interativo, uma vez que a análise dos resultados da aplicação anterior embasou ajustes e melhorias na construção do instrumento seguinte.

O Quadro 02 sintetiza os elementos de análise contemplados com as questões dos instrumentos aplicados. No primeiro período de aplicação, os elementos centrais de avaliação, tanto para discentes quanto para docentes, foram: (a) conhecimento prévio do respondente de metodologias/estratégias ativas de ensino; (b) motivação e engajamento; (c) aplicação das metodologias no período remoto; (d) avaliação de aprendizagem; (e) influência das metodologias no processo de aprendizagem.

Quadro 02 - Elementos de análise da pesquisa presentes nos questionários aplicados

Quadro 02 - Elementos de análise da pesquisa presentes nos questionários aplicados
Elementos de análise da pesquisa presentes nos questionários aplicados
ELEMENTOS DE ANÁLISE Perspectiva discente P1 1. Caracterização dos respondentes; 2. Conhecimento prévio de metodologias ativas (no ensino presencial); 3. Motivação e engajamento com as metodologias (presencial x remoto); 4. Identificação da aplicação de metodologias ativas nas disciplinas ofertadas; 5. Avaliação de aprendizagem das metodologias ativas aplicadas; 6. Influência do uso de metodologias ativas no processo de aprendizagem das disciplinas cursadas.
P2 Itens 1, 2, 3, 6 (iguais) 7. Análise por disciplinas: Identificação das metodologias ativas aplicadas; Avaliação de aprendizagem; Engajamento; Influência das metodologias usadas na aprendizagem; Uso de plataformas, sites e aplicativos. Importar lista
P3 Itens 1, 6 (iguais) 8. Impactos da pandemia no rendimento acadêmico; 9. Impacto da duração do período letivo no processo de aprendizagem; 10. Aspectos que influenciam a identificação do aluno com uma estratégia ativa; 11. Metodologias com maior e menor afinidade; 12. Percepção quanto à adequação do uso de metodologias ativas para o ensino remoto e presencial.
Perspectiva docente P1 1. Caracterização dos respondentes; 2. Aplicação prévia de metodologias ativas (no ensino presencial); 3. Identificação das metodologias ativas aplicadas no período remoto em análise; 4. Adaptações nas metodologias para o ensino remoto; 5. Processo de avaliação de aprendizagem das metodologias aplicadas; 6. Percepção quanto a influência do uso de metodologias ativas no processo de aprendizagem; 7. Dificuldades com as aplicações das metodologias no modelo remoto; 8. Processo de planejamento e desenvolvimento das metodologias.
P2 Itens 1, 2, 3, 6 (iguais) 9. Análise por disciplinas: Identificação das metodologias ativas aplicadas; Avaliação de aprendizagem; Dificuldades com as aplicações; Processo de planejamento e desenvolvimento de metodologias; Uso de plataformas, sites e aplicativos. Importar lista
P3 Não houve questionário para esse grupo.
Fonte: Dados da pesquisa (2021).

Nos questionários do P2, os elementos foram mantidos e, ainda, buscou-se um detalhamento por disciplina cursada/ministrada. No terceiro período, o questionário abordou perguntas que remetiam às metodologias ativas, sendo adicionadas outras questões sobre os impactos da pandemia e da duração do período letivo no rendimento acadêmico. As mudanças foram realizadas em função dos relatos e discussões com os professores e representantes dos alunos na apresentação dos resultados da aplicação anterior, visando aprimorar os questionários para uma melhor análise dos cenários vivenciados.

As taxas de respostas dos questionários com os discentes foram de 25,8%, 16,9% e 23,4% nos períodos 1, 2 e 3, respectivamente. Considera-se que a diminuição na taxa de resposta do segundo instrumento está relacionada ao aumento da extensão do questionário, em função da análise do uso das metodologias por componente curricular. Já as taxas de respostas dos docentes foram de 50% e 34,21% nos períodos 1 e 2, respectivamente. Por fim, os resultados obtidos ao longo das três aplicações que compreendem o estudo foram sistematizados, comparados e analisados neste artigo.

Ética na pesquisa

A pesquisa foi desenvolvida a partir da necessidade de mapeamento e acompanhamento das estratégias pedagógicas do curso aplicadas em um novo ambiente, o qual precisou ser construído emergencialmente devido ao afastamento social provocado pela pandemia. O instrumento de pesquisa foi idealizado, a partir das dificuldades apresentadas pelos alunos ao centro acadêmico e à coordenação de curso, bem como da preocupação dos docentes nos processos de aprendizado no ensino remoto. O levantamento dos dados se deu de forma voluntária e anônima por parte dos participantes (estudantes e docentes), que podiam desistir do preenchimento do questionário a qualquer momento da pesquisa. A cada fase da pesquisa, os resultados eram apresentados em reuniões do departamento e colegiado para docentes e representantes discentes, que analisavam os resultados e sinalizavam ações para as fases de pesquisa seguinte e para o plano de ação para mudanças da prática docente.

Resultados e Discussão

Conforme explicitado na metodologia, os questionários aplicados nos três períodos direcionaram a análise quanto à influência das metodologias ativas no processo de aprendizagem durante o ensino remoto, possibilitando uma percepção mais apurada acerca do que estava sendo vivenciado pelos alunos de engenharia de produção de uma IES. O questionário aplicado no período 3 contou com a formulação de novas questões, que não estavam presentes no P1 e P2. A mudança ocorreu em decorrência da observância de fatores, como o cenário pandêmico e a redução da carga horária de aulas, que poderiam interferir diretamente na percepção dos discentes quanto à aplicação de metodologias ativas no ensino remoto. Por conta disso, os resultados desta pesquisa abordarão de forma conjunta a análise de respostas do P1 e P2, enquanto o P3 será analisado com base na comparação dos demais períodos remotos sob a influência dos fatores supracitados.

A síntese das respostas permitiu: a) mapear os principais fatores de influência no rendimento acadêmico associados à pandemia; b) identificar as metodologias com maior e menor afinidade pelos alunos; c) descrever as principais plataformas utilizadas; e, por fim, d) avaliar a percepção dos graduandos quanto ao auxílio das estratégias ativas de ensino no aprendizado.

É importante relatar que, em função dos ajustes de calendários, os três períodos acadêmicos estudados tiveram duração mais curta do que o usualmente definido pela instituição em estudo. Assim, o período 1 (P1) possuiu o máximo de 180 horas curriculares, com duração de 6 semanas; o período 2 (P2) possuiu o limite de 380 horas curriculares, com duração de 15 semanas (sendo este a retomada do 1. semestre letivo do referido ano o qual teve 3,5 semanas anteriormente); e, por fim, o período 3 (P3) contou também com 380 horas curriculares e duração de 14 semanas. Vale salientar que, em um semestre típico de aulas, 20 semanas estão disponíveis no calendário para planejamento pedagógico de atividades, sendo 18 semanas obrigatórias de aulas.

Destacam-se ainda informações para descrição do perfil dos respondentes dos questionários. O questionário aplicado no P1 teve a participação total de 70 discentes de todos os períodos (exceto do 11º período do curso) e, em sua maioria, do turno vespertino (60%). Em seguida, para a coleta dos dados do P2, contou-se com a participação de 59 alunos, com exceção do 9º, 11º e 12º períodos e, assim como no primeiro período, prevaleceu a colaboração do turno da tarde (66%). Por fim, o questionário no P3 obteve 101 respostas. Nessa etapa da pesquisa, em comparação com as anteriores, contou-se com a participação de graduandos de todos os períodos, em sua maior parte do turno do vespertino (60%).

Os Gráficos 1, 2 e 3 abordam o número de disciplinas cursadas e carga horária dedicada aos estudos para os períodos 1 e 2.

Gráfico 1 – Quantidade de disciplinas cursadas no período
Quantidade de disciplinas cursadas no período
Quantidade de disciplinas cursadas no período
Dados da pesquisa (2021).

Quantidade de horas estudadas em P1
Gráfico 2 – Quantidade de horas estudadas em P1
Quantidade de horas estudadas em P1
Dados da pesquisa (2021).

Gráfico 3 – Quantidade de horas estudadas em P2
Quantidade de horas estudadas em P2
Quantidade de horas estudadas em P2
Dados da pesquisa (2021).

Sobre os resultados apresentados no Gráfico 1, o período 1 possuiu uma carga horária curricular menor (180 h) permitida ao aluno, fazendo com que a quantidade de disciplinas cursadas fosse limitada em até 4 disciplinas. Para os períodos letivos posteriores, a quantidade de disciplinas cursadas voltou à carga padrão (380 h).

Com relação aos dados relacionados aos Gráficos 02 e 03, sobre o tempo total que os alunos dedicavam semanalmente para os estudos, além dos horários de aula das disciplinas, é possível identificar a redução das horas investidas para além da sala de aula, considerando como justificativa o aumento da carga horária. A adição de mais componentes curriculares ao P2 proporcionou a diminuição das horas dedicadas ao aprendizado, estando a maioria dos alunos enquadrados no grupo que investe apenas entre 1 e 3 horas de estudo para todas as disciplinas. Esse elemento não foi analisado no questionário referente ao P3. Diante das discussões dos resultados com os representantes dos alunos e docentes, optou-se por omitir tal questionamento, uma vez que o comportamento em P2 se aproxima da realidade dos discentes do curso em função da ausência da limitação de carga horária de disciplinas cursadas.

Além da compreensão do perfil dos graduandos no que concerne aos períodos letivos, a pesquisa visou compreender o ambiente de estudo enquanto espaço propício para a realização da prática discente, sendo tais condições associadas à infraestrutura do lar; à interferência de terceiros durante as aulas; à disponibilidade de internet veloz e estável; e à disponibilidade de dispositivos de hardware e software para acompanhamento das atividades, dados observados no Gráfico 4.

Qualidade do ambiente de estudo
Gráfico 4 – Qualidade do ambiente de estudo
Qualidade do ambiente de estudo
Dados da pesquisa (2021).

Pode-se afirmar que a maioria dos estudantes, em ambos os períodos de aplicação do questionário, considera o seu ambiente como propício para estudo, enquanto uma pequena parcela dos respondentes considera o seu ambiente impróprio ou pouco propício. Destaca-se, portanto, a importância de um ambiente favorável como facilitador da educação ativa no formato remoto, como discutido por Couto e Cruz. (2020). Para os alunos com problemas de infraestrutura (rede de internet e computador) a universidade contemplou, em edital, os alunos com maior vulnerabilidade econômica.

Os Gráficos 5 e 6 apresentam o estudo associado à intelecção das metodologias ativas durante o ensino e a motivação comparada ao presencial, respectivamente:

Contato com as metodologias ativas
Gráfico 5 – Contato com as metodologias ativas
Contato com as metodologias ativas
Dados da pesquisa (2021).

Motivação com o uso de metodologias ativas
Gráfico 6 – Motivação com o uso de metodologias ativas
Motivação com o uso de metodologias ativas
Dados da pesquisa (2021).

Com o Gráfico 5, observa-se que a maioria dos discentes teve contato com as metodologias ativas (P1, 89% e P2, 80%), o que reflete o estágio de maturação da utilização das metodologias no espaço da sala de aula presencial e virtual por parte dos docentes da graduação da IES em questão, considerando a maioria das respostas positivas em relação ao contato prévio com o método ativo de ensino.

Analisando o contato dos graduandos com as estratégias de ensino ativo, e a sua motivação ao comparar o uso das metodologias ativas nos períodos remoto e presencial, observa-se, no Gráfico 6, que a motivação do uso no remoto em comparação ao presencial não é expressiva (abaixo de 50%) e há redução do índice de P1 para P2.

Parte da motivação dos graduandos pode estar associada à duração dos períodos P1 e P2, e à retomada das aulas no modo remoto após quarentena obrigatória como medida de contenção da pandemia. Após três meses em isolamento e sem atividades pedagógicas em andamento, os discentes do curso retomaram as aulas em junho de 2020 como participantes de um período de caráter suplementar, experimental e voluntário. Com duração de 06 semanas, o ciclo letivo contou com a carga horária máxima de 180 h, sendo o habitual de 420 h para alunos do turno noturno e de 450 h para alunos do vespertino. Ademais, como característica, em caso de reprovação ou desistência nas matérias matriculadas, não haveria interferência nos índices acadêmicos. O contexto apresentado pode corroborar com a maior motivação ou permanência desta, quando comparado ao formato presencial, uma vez que os graduandos estavam com uma maior expectativa para retomada do período letivo.

Ainda em relação às características dos períodos e a sua contribuição para motivação, o P2 teve duração de 15 semanas, assumiu caráter obrigatório de matrícula e teve influência nos índices acadêmicos do estudante. Enquanto o P1 não exigiu a oferta de todas as disciplinas e a participação efetiva de todos os docentes, o P2 contou com a retomada das disciplinas que haviam tido as suas atividades suspensas em março/2020. Esse fator pode ter ocasionado um menor tempo de experimentação dos docentes quanto a adaptação ao formato remoto de ensino, considerando que nem todos lecionaram durante o P1.

Em contrapartida, os percentuais de desmotivação também merecem destaque, uma vez que uma parcela dos estudantes possui predileção pela aplicação das estratégias ativas no formato presencial de ensino, o que pode estar atrelado às condições de espaço físico e recursos disponíveis, bem como apresentado anteriormente, e aos impactos do ensino remoto no contexto pandêmico. Por conseguinte, o questionário aplicado durante o P3, pode corroborar com informações ao apresentar os dados advindos do questionamento associado aos principais fatores que influenciaram o rendimento acadêmico dos graduandos.

Do total de 101 respondentes, 74,9% afirmaram que problemas associados à saúde mental influenciaram diretamente no rendimento acadêmico; 30,7% associaram a queda de desempenho à redução de renda pessoal e/ou familiar; 23,8% a problemas pessoais de saúde associado a sequelas do Covid-19 e/ou de terceiros; 9,9% relacionaram-na ao desemprego pessoal e/ou familiar; e, por fim, 6,9% dos respondentes declararam que o rendimento acadêmico não foi influenciado pelo cenário imposto pela Covid-19.

Ainda nesse sentido, associando os impactos da pandemia ao rendimento acadêmico, os alunos avaliaram, por meio de uma escala de concordância, a afirmação: “Ser diagnosticado(a) com COVID-19 e/ou conviver com algum parente próximo infectado(a) pelo vírus afetou diretamente o meu rendimento acadêmico”. Nesse sentido, 40% dos alunos concordaram totalmente com a afirmação; 27,1% dos participantes concordaram parcialmente; 12,9% não concordaram nem discordaram da afirmação; 11,4% discordaram parcialmente e 8,6% dos participantes discordaram totalmente. Compreende-se, dessa forma, que a maioria dos graduandos participantes da pesquisa associa o seu desempenho nas disciplinas cursadas no período remoto à influência e impactos da pandemia do Coronavírus, seja por fatores ligados diretamente ao diagnóstico e/ou sequelas da doença, ou por questões associadas aos fatores externos relacionados ao cenário, como impactos econômicos e de saúde mental.

A partir de tal compreensão, a análise da percepção das metodologias ativas utilizadas durantes os períodos letivos, deve considerar o cenário pandêmico como fator de interferência na experiência acadêmica dos discentes durante o P1, P2 e P3. Destarte, durante a aplicação do questionário no P3, cujo foco esteve pautado na relação entre metodologias ativas e os impactos da Covid-19 no rendimento acadêmico, buscou-se compreender a avaliação dos discentes em relação ao auxílio proporcionado pela utilização das estratégias ativas para ensino.

Na aplicação durante esse período, foi realizado o levantamento das metodologias com maior recorrência na percepção pelos graduandos, além da identificação das disciplinas com maior e menor afinidade consideradas pelos participantes da aplicação. Dentre as metodologias apresentadas, 27% dos alunos identificaram a utilização da Sala de Aula Invertida como estratégia ativa de ensino nas disciplinas cursadas no período em análise; 24% identificaram a utilização de Casos de Ensino; 19% constataram o uso da In Class Exercises; 19% os Desafios em Grupo; e, por fim, a metodologia Problem Based Learning, com identificação por 13% dos participantes. Em menores porcentagens de identificação, foram citadas as metodologias: Think Pair Share, Team Based Learning, Controvérsia Construtiva, Peer Instruction, Just In Time Teaching e Grupos com Tarefas Diferentes.

No entanto, por mais que fossem identificadas pelos discentes, nem todas as metodologias ativas utilizadas pelo corpo docente geraram afinidade entre o grupo. Assim, com base na avaliação dos respondentes quanto às metodologias com maior afinidade temos o Problem Based Learning com 60,4%, e com menor afinidade Sala de Aula Invertida com 50,5%, como observado no Gráfico 7:

Gráfico 7 – Metodologias ativas e relação de afinidade por parte dos alunos
Metodologias ativas e relação de afinidade por parte dos alunos
Metodologias ativas e relação de afinidade por parte dos alunos
Dados da pesquisa (2021).

Para que tais metodologias ativas de ensino fossem aplicadas durante o período remoto, o corpo docente utilizou plataformas e recursos, os quais também foram alvo de análise na aplicação do questionário aplicado no P2. Dentre as opções, 28% dos respondentes indicaram a utilização do Google Meet; 21,8% do SIGAA – Sistema Integrado de Gestão das Atividades Acadêmicas; 11,8% do WhatsApp; 10,5% utilizaram o Discord; e 8,3% o Multiprovas – plataforma de avaliações integrada ao sistema da universidade. Além dessas ferramentas, foram citadas, em menor percentual, a plataforma Socrative, Kahoot, Youtube, Google Classroom, Zoom, Telegram, Nearpod, Miro e o Jamboard.

A utilização desses recursos representa os esforços investidos pelo corpo docente em adaptar o ensino e as estratégias ativas, anteriormente implementadas apenas em formato presencial, para o formato remoto de ensino. Mesmo que parte dessas ferramentas fossem utilizadas durante o ensino presencial, a diversidade de softwares apresentada representa a busca por programas e sistemas que facilitem tanto a aplicação das metodologias ativas quanto a comunicação com os discentes, a realização de atividades, as simulações e melhor interface teórico-prática, buscando sempre tornar o aluno o condutor do processo de ensino-aprendizagem.

Como forma de avaliar a percepção dos graduandos quanto ao auxílio das metodologias ativas no desenvolvimento educativo, os questionários aplicados em P1, P2 e P3 refletiram acerca do impacto dessas estratégias durante o ensino remoto, conforme apresentado no Gráfico 8.

Gráfico 8– Percepção dos graduandos quanto ao auxílio das metodologias ativas
Percepção dos graduandos quanto ao auxílio das metodologias ativas
Percepção dos graduandos quanto ao auxílio das metodologias ativas
Dados da pesquisa (2021).

Pode-se observar com o gráfico 07 que, apesar de a maioria dos alunos indicaram que as estratégias ativas de ensino auxiliaram a aprendizagem, o índice vai reduzindo ao longo de cada período: P1 (71%), P2 (61%) e P3 (47,5%). Essa queda pode estar associada às seguintes características dos períodos letivos P2 e P3 quando correlacionadas a outras perguntas do formulário:

● redução das semanas de duração em comparação com um período regular;

● P2 e P3 foram obrigatórios para discentes e docentes, para P1 era facultativo e não implicava nos índices acadêmicos do discente;

● impactos na percepção do discente por causa das influências da Covid 19 em sua saúde mental e física com a permanência da Covid (fator explicado no Gráfico 8);

● queda no rendimento acadêmico impactado pelos três fatores anteriormente apresentados.

Quando se analisa o grupo de estudantes que não souberam definir se houve auxílio e dos que não acreditam haver auxílio por parte das metodologias, percebe-se, em sua maior parte, o indicativo de que esses consideram o contexto da pandemia no país e os seus efeitos na sociedade como fator de influência direta no rendimento acadêmico. Para exemplificar tal diagnóstico, destaca-se que, dentre os participantes do grupo, há uma expressiva parcela de respostas indicando o desenvolvimento de problemas associados à saúde mental, bem como ansiedade e depressão, problemas de saúde associados às sequelas da Covid-19, sendo estes pessoais ou de parentes próximos, e a redução da renda pessoal ou da família. Para aprofundar a análise, utilizou-se como base a avaliação das respostas pelo período do curso do qual o graduando participou.

Foi possível identificar que os alunos do 5º ao 8º período percebem, em sua maior parte, o uso das metodologias ativas como contribuintes para construção do conhecimento, enquanto os discentes do 1º ao 4º período possuem uma maior dificuldade de identificação dos métodos ativos durante o ciclo letivo. Tal fator pode ser justificado pelo menor uso das metodologias ativas nas matérias de ciclo básico da engenharia, enquanto as disciplinas específicas e profissionalizantes, cursadas pelos alunos mais avançados na trajetória curricular, estão mais alinhadas com o projeto pedagógico do curso e as orientações de metodologias das DCN’s. Ainda, destaca-se a baixa adesão do formulário por graduandos do 9º ao 12º período, o que impossibilitou uma análise mais assertiva acerca da percepção desses discentes quanto ao uso das estratégias ativas.

Outra justificativa para a redução da percepção positiva está na avaliação do impacto da redução do semestre. Considerando a redução de 18-20 semanas, do período presencial tradicional, para 13-14 semanas, durante o período remoto no cenário pandêmico, os alunos foram questionados quanto ao prejuízo associado a essa mudança em relação à absorção do conteúdo durante o ciclo letivo. Como resultado, em sua maioria, os graduandos indicaram sentirem-se muito prejudicados ou prejudicados pela redução imposta no período letivo, o que pode estar associado aos menores prazos para conclusão das atividades propostas, dificuldade de planejamento e falta de identificação com a metodologia proposta pelo docente.

Em relação à afinidade com as metodologias propostas, foi possível identificar um comportamento semelhante entre os respondentes do grupo em análise, uma vez que a maioria dos participantes indicou não se identificar com o escopo de atividades da metodologia Sala de Aula Invertida. Conforme os depoimentos e comentários coletados na pesquisa, a falta de afinidade justifica-se pela sensação do aluno de falta de acompanhamento docente durante a realização das atividades; dificuldade de compreensão do cronograma de aulas e menor assimilação do conteúdo. Tal percepção destaca a importância de constante planejamento e avaliação do uso das metodologias ativas por parte dos docentes a fim de que essas impactem positivamente na aprendizagem dos alunos, como destacado por Diesel, Baldez e Martins (2017).

Em contrapartida, evidencia-se que esses mesmos alunos possuem afinidade com a metodologia ativa Problem Based Learning, o que pode indicar o potencial positivo da adoção dessa estratégia de aprendizagem ativa. Como enfatizam Elmôr et al. (2019), o uso das metodologias ativas pode ser combinado segundo as necessidades do componente a fim de promover o ensino centrado no aluno.

Considerações finais

Diante do objetivo de investigar e analisar os impactos do uso das metodologias ativas durante o ensino remoto no contexto pandêmico em um curso de engenharia de produção, a presente pesquisa aplicou questionários para três períodos letivos realizados entre setembro de 2020 e abril de 2021. A partir das respostas dos discentes e docentes do curso aos formulários foi possível: a) mapear os principais fatores de influência no rendimento acadêmico associados à pandemia; b) identificar as metodologias com maior e menor afinidade; c) descrever as principais plataformas utilizadas; e, por fim, d) avaliar a percepção dos graduandos quanto ao auxílio das estratégias ativas de ensino.

Por conseguinte, pode-se destacar como principais influências no rendimento acadêmico, considerando o contexto pandêmico, os problemas associados à saúde mental, com maior percentual de indicação pelos discentes; a redução da renda pessoal ou familiar; e, por fim, os problemas de saúde associados a sequelas da Covid-19. Além disso, foi possível identificar a maior aceitação da metodologia Problem Based Learning, seguida por Casos de Ensino e Desafios em Grupo, e a menor aceitação da Sala de Aula Invertida como estratégia de ensino ativa, seguida pela estratégia de Grupos com Tarefas Diferentes, a qual também indicou uma menor afinidade pelos discentes.

Ainda, como resultado do estudo, percebe-se o uso da tecnologia da informação e comunicação como elemento chave na construção do espaço para fomento do conhecimento, uma vez que foi necessário adaptar as atividades propostas pelas disciplinas ao formato remoto de ensino, realizadas por intermédio de plataformas digitais e recursos tecnológicos. Ademais, evidencia-se a indicação dos alunos em sua maioria quanto a resposta positiva acerca do uso das metodologias, a qual aponta o uso das estratégias ativas de ensino como elemento de auxílio para o processo de ensino-aprendizagem.

Durante o desenvolvimento da pesquisa, foram identificadas limitações que restringiram em partes a análise dos resultados. Na aplicação dos questionários, o P1 e o P2 não contaram com a participação de graduandos de todos os semestres, limitando a análise da percepção das metodologias ao longo da trajetória dos alunos no curso. A duração do isolamento físico imposto pela pandemia e a perduração do ensino remoto influenciaram cada vez mais as respostas dos participantes.

Além do ponto apresentado, os três formulários não seguiram a mesma estrutura, havendo adição de perguntas à medida que a pesquisa e os períodos letivos avançavam, e não houve a aplicação com os docentes no terceiro período. Entretanto, apesar dessas diferenças, foi possível desenvolver uma análise qualitativa e quantitativa sem prejuízos à integridade dos dados e resultados da pesquisa.

Em suma, enfatiza-se a importância da realização deste estudo como contribuinte para o planejamento e a revisão dos processos para uso das metodologias ativas. Os resultados dos questionários foram apresentados para a coordenação, colegiado, núcleo docente estruturante do curso e professores da área profissionalizante em seu planejamento para o período 2021.1, como forma de compartilhar a percepção discente e proporcionar espaços de reflexão de práticas e do uso dos instrumentos para os períodos seguintes.

Nesse sentido, como oportunidades de trabalhos futuros, sugere-se a avaliação do auxílio das metodologias e da percepção dos alunos quanto ao seu uso no formato híbrido de ensino, a considerar a adoção desse modelo como estratégia de retomada às aulas presenciais na IES estudada. Para mais, ainda considerando o retorno e a transição das aulas para o formato presencial, bem como as novas DCNs, propõem-se como pesquisa futura a análise das habilidades e competências desenvolvidas com o uso das metodologias ativas no processo de aprendizagem discente.

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