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Orquestração Instrumental e Engenharia Didática: um contributo para o ensino de funções reais de uma variável real
Revista de Estudos e Pesquisas sobre Ensino Tecnológico
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas, Brasil
ISSN-e: 2446-774X
Periodicidade: Frecuencia continua
vol. 8, e174422, 2022
Resumo: Devido à pandemia da COVID-19, as aulas de diversas universidades do país estão se adequando ao cenário de ensino remoto, fazendo emergir a necessidade de estudos de metodologias de ensino, até então, pensadas para o modelo de aulas presenciais. Desse modo, este trabalho tem o objetivo de apresentar uma orquestração instrumental realizada por meio remoto para o ensino de funções reais de uma variável real. Trata-se de uma pesquisa qualitativa de caráter descritivo, tendo como metodologia norteadora a Engenharia Didática e numa perspectiva de complementaridade, apoia-se na Teoria dos Registros das Representações Semióticas e na Teoria das Situações Didáticas, com o escopo de descrever e estruturar as situações de ensino. A orquestração foi vivenciada junto a 24 discentes da disciplina de Cálculo de um curso de Licenciatura em Matemática, na Universidade Federal do Amazonas. Os dados do estudo apontam que a exploração de recursos tecnológicos, o uso do Geogebra, a exigência da entrega de listas de exercícios como atividade pós-aula e envio de resumos como atividade pré-aula contribuíram para a aprendizagem dos discentes. Além disso, a ênfase na conversão de registros de representação nas situações propostas e o estímulo constante para que os discentes participassem ativamente das aulas foram outros fatores que muito contribuíram para a aprendizagem dos discentes.
Palavras-chave: Educação Processo de Ensino-Aprendizagem. Ensino..
Abstract: Due to the COVID-19 pandemic, the classes of several universities of the country are suiting themselves to the scenario of remote teaching, bringing out the need of studies about teaching methodologies thought, until now, for face-to-face classes. Thus, this study aims to present an instrumental orchestration made by remote mode for the teaching of real functions of one real variable. It is a descriptive qualitative research, which has Didactic Engineering as guiding methodology and relies on the Theory of Registers of Semiotic Representations and on the Theory of Didactical Situations as a complement with the scope of describing and building the teaching situations. The orchestration was applied to 24 students of the Calculus subject of a Mathematics degree course at the Federal University of Amazonas. The study data show that the exploration of technological resources, the use of Geogebra, the requirement to deliver lists of exercises as after-class activity and the delivery of summaries as pre-class activity contributed to the students' learning. In addition, the emphasis in the conversion of representation of registers at the proposed situations and the constant encouragement for students to actively participate in classes were other factors which contributed a lot to their learning.
Keywords: Education Teaching-Learning Process. Teaching..
Orquestração Instrumental e Engenharia Didática: um contributo para o ensino de funções reais de uma variável real
Instrumental Orchestration and Didactic Engineering: a contribution to the teaching of real functions of one real variable
Resumo
Devido à pandemia da COVID-19, as aulas de diversas universidades do país estão se adequando ao cenário de ensino remoto, fazendo emergir a necessidade de estudos de metodologias de ensino, até então, pensadas para o modelo de aulas presenciais. Desse modo, este trabalho tem o objetivo de apresentar uma orquestração instrumental realizada por meio remoto para o ensino de funções reais de uma variável real. Trata-se de uma pesquisa qualitativa de caráter descritivo, tendo como metodologia norteadora a Engenharia Didática e numa perspectiva de complementaridade, apoia-se na Teoria dos Registros das Representações Semióticas e na Teoria das Situações Didáticas, com o escopo de descrever e estruturar as situações de ensino. A orquestração foi vivenciada junto a 24 discentes da disciplina de Cálculo de um curso de Licenciatura em Matemática, na Universidade Federal do Amazonas. Os dados do estudo apontam que a exploração de recursos tecnológicos, o uso do Geogebra, a exigência da entrega de listas de exercícios como atividade pós-aula e envio de resumos como atividade pré-aula contribuíram para a aprendizagem dos discentes. Além disso, a ênfase na conversão de registros de representação nas situações propostas e o estímulo constante para que os discentes participassem ativamente das aulas foram outros fatores que muito contribuíram para a aprendizagem dos discentes.
Palavras-chave: Educação. Processo de Ensino-Aprendizagem. Ensino.
Abstract
Due to the COVID-19 pandemic, the classes of several universities of the country are suiting themselves to the scenario of remote teaching, bringing out the need of studies about teaching methodologies thought, until now, for face-to-face classes. Thus, this study aims to present an instrumental orchestration made by remote mode for the teaching of real functions of one real variable. It is a descriptive qualitative research, which has Didactic Engineering as guiding methodology and relies on the Theory of Registers of Semiotic Representations and on the Theory of Didactical Situations as a complement with the scope of describing and building the teaching situations. The orchestration was applied to 24 students of the Calculus subject of a Mathematics degree course at the Federal University of Amazonas. The study data show that the exploration of technological resources, the use of Geogebra, the requirement to deliver lists of exercises as after-class activity and the delivery of summaries as pre-class activity contributed to the students' learning. In addition, the emphasis in the conversion of representation of registers at the proposed situations and the constant encouragement for students to actively participate in classes were other factors which contributed a lot to their learning.
Keywords: Education. Teaching-Learning Process. Teaching.
Introdução
Mediante o quadro atual, no cenário da COVID-19, diversas universidades foram forçadas a adotar o ensino remoto como uma forma de manter as aulas. Segundo Cidrão, Azevedo e Alves (2021, p.252):
O ensino remoto cria um cenário inovador no sistema educativo brasileiro, no qual o triângulo didático (professor-aluno-saber) tem uma nova dinâmica de relações didáticas na ausência da sala de aula. No ensino tradicional, as relações entre professor, aluno e saber ficam restritas ao espaço físico da sala de aula, todavia, no ensino on-line, tornam-se mais complexas, em razão de as relações didáticas serem à distância.
Entretanto, esse modelo de ensino ainda se mostra como um desafio quando olhamos a realidade de muitos estudantes brasileiros. Por exemplo, Yamaguchi e Yamaguchi (2020, p.11) verificaram em seu estudo que:
[...] a instabilidade da internet e o não acesso a ferramentas individualizadas como o computador e o celular tipo smartphone, são entraves que dificultam o processo de ensino e aprendizagem nesta modalidade de ensino.
Concernente aos docentes, estudos mostram que, mesmo em meio ao caos instalado pela falta de planejamento ou formação, os professores demonstraram elevada e contínua capacidade de adaptação, criatividade e reinvenção (VASCONCELOS; COELHO; ALVES, 2020) e que estão buscando ministrar um ensino de qualidade, capaz de minimizar os entraves decorrentes das desigualdades socioeconômicas dos alunos (YAMAGUCHI; YAMAGUCHI, 2020, p.11).
Neste cenário, o ensino de cálculo diferencial e integral, que historicamente tem sido um desafio para os professores, enfrentou grandes dificuldades para proporcionar condições favoráveis à ocorrência de aprendizagem dentro desse contexto educacional. O enfrentamento a essa situação pode se dá no desenvolvimento de projetos de pesquisa com vistas à abordagem de questões relacionadas ao ensino e aprendizagem de Cálculo, quer sejam de natureza teórica ou prática (RASMUSSEN; MARRONGELLE; BORBA, 2014), mas considerando que essas duas abordagens são complementares e que o campo de pesquisa da educação matemática “vai fazer progressos no ensino e na aprendizagem, de maneira eficaz, só se tratar, de forma significativa, com as questões teóricas e pragmáticas simultaneamente” (ROBERT; SPEER, 2001, p. 297, tradução nossa).
Diante desse contexto, o presente estudo teve como norte a seguinte questão: como conceber orquestrações instrumentais por meio remoto que favoreçam a aprendizagem de funções de uma variável real a valores reais no âmbito do Cálculo?
Posto isso, o objetivo aqui é apresentar uma orquestração instrumental realizada por meio remoto para o ensino de funções reais de uma variável real, tendo como metodologia norteadora a Engenharia Didática que, numa perspectiva de complementaridade, apoiou-se na Teoria dos Registros das Representações Semióticas e na Teoria das Situações Didáticas, com o escopo de descrever e estruturar as situações de ensino.
Este trabalho apresenta os resultados relativos a um estudo desenvolvido num contexto de aplicação particular de ensino do Cálculo. Os partícipes da pesquisa foram 24 discentes do curso de Licenciatura em Matemática, da Universidade Federal do Amazonas (UFAM), que cursavam o componente curricular Cálculo I, no primeiro semestre de 2021.
Quanto à estrutura do trabalho, iniciaremos fazendo algumas considerações acerca da Teoria da Orquestração Instrumental. Em seguida, descreveremos os procedimentos metodológicos, com destaque para a metodologia da Engenharia Didática e suas fases, que por sua vez correspondem às seções seguintes.
Referencial Teórico
Diante da realidade do ensino remoto, o professor se viu imerso em um mundo rico em recursos tecnológicos até então explorados por poucos. Faz-se necessário o professor conhecer os recursos disponíveis para o ambiente das aulas remotas para planejar as atividades dos estudantes, como combinar as fases do trabalho individual e coletivo, a iniciativa dos estudantes e os momentos de suas intervenções e ao mesmo tempo antecipar as oportunidades e as dificuldades, ou seja, professor deve pensar as orquestrações instrumentais.
Segundo Trouche (2005, p. 126, tradução nossa):
Uma orquestração instrumental é o arranjo sistemático e intencional dos elementos (artefatos e seres humanos) de um ambiente, realizado por um agente (professor) no intuito de efetivar uma situação dada e, em geral, guiar os aprendizes nas gêneses instrumentais e na evolução e equilíbrio dos seus sistemas de instrumentos. É sistemático porque como método, desenvolve-se numa ordem definida e com um foco determinado, podendo ser entendido com um arranjo integrado a um sistema; é intencional porque uma orquestração não descreve um arranjo existente (sempre existe um), mas aponta para a necessidade de um pensamento a priori desse arranjo.
A teoria da orquestração instrumental busca modelar a ação docente em um ambiente rico em tecnologias digitais que favoreça a gênese instrumental dos indivíduos, tomando por base três elementos essenciais: a configuração didática, o modo de execução e o desempenho didático. As duas primeiras foram caracterizadas por Trouche (2004) e a última, por Drijvers et al. (2010).
A configuração didática diz respeito à organização da sala de aula e às escolhas didáticas feitas pelo professor no que concerne à tarefa matemática, aos recursos a serem disponibilizados, às funções dos indivíduos envolvidos, entre outros aspectos. Já o modo de execução consiste na operacionalização da configuração didática desenvolvida previamente pelo professor com foco na gênese instrumental dos estudantes. No desempenho didático, o professor pode perceber, a partir do modo de execução, situações que não foram previstas na configuração didática. Diante destas, o professor faz emergir as decisões ad hoc. Além disso, pode analisar se o desempenho da orquestração instrumental criada foi favorável ou não aos seus objetivos didáticos.
É possível encontrar estudos que realizaram experimentos práticos à luz da teoria da orquestração instrumental. Por exemplo, Lucena, Gitirana e Trouche (2018), tendo como base a análise de duas aulas, retratadas em vídeo e em história em quadrinhos, discutem a OI como um modelo teórico que serve como ferramenta para entender a atividade do professor para integrar recursos digitais em sua prática. Os autores focaram suas análises nas propriedades das quatro operações básicas e a discussão trouxe à tona um novo conceito para o modelo da OI, as reações ad hoc dos estudantes em eventos imprevistos.
Pontes et al. (2018) apresentam uma análise de uma OI elaborada visando o ensino de área de polígonos. Tal orquestração instrumental foi vivenciada em uma escola da rede estadual de ensino, com alunos do 1º ano do ensino médio e, segundo os autores, a análise do experimento permitiu identificar elementos importantes para a OI, como as reações ad hoc e gestão de situações correlatas às expectativas dos estudantes, e permitiu a gênese instrumental dos estudantes para a desconstrução da área como resultado de uma fórmula e avanços na concepção de área como grandeza. Podemos citar ainda os trabalhos de Teixeira, Matos e Domingos (2016), Almeida et al. (2020) que recorrem à teoria da OI.
Entretanto, são poucos os que aplicam a OI de forma remota. Nessa direção, encontramos o trabalho de Couto (2015) que investigou os tipos de orquestração instrumental desenvolvidas pelos professores, na tutoria online, por meio de tecnologias que permitam o uso de múltiplas representações semióticas. A pesquisadora discutiu sobre a tutoria online da disciplina de geometria analítica e a sua relação com as representações semióticas, assim como, o papel do tutor e do artefato numa orquestração instrumental. A metodologia foi desenvolvida em duas fases, na primeira, foram realizadas análises das interações de três chats de cursos de Licenciatura em Matemática a distância, e a segunda fase, em caráter experimental, consistiu na análise da atuação de dois tutores na mediação didática em um ambiente virtual rico em tecnologia.
Podemos citar ainda o trabalho de Feitosa e Rodrigues (2021) que trata da análise do processo de concepção e aplicação de uma orquestração instrumental, por meio remoto, visando a desenvolver a habilidade de resolver problemas, tais como maximizar áreas, volumes e lucros e minimizar distâncias, tempo e custos, isto é, problemas de otimização. Os pressupostos teóricos foram fundamentados na Teoria da Orquestração Instrumental e nos princípios da aprendizagem cooperativa. Os discentes foram divididos em grupos, e as situações de ensino foram trabalhadas em atividades síncronas e assíncronas de modo que, ao final da orquestração, cada grupo apresentou um relatório escrito e uma apresentação oral. Segundo os autores:
A análise dos dados nos possibilitou perceber que a maioria dos discentes apresentou interesse pelo trabalho em grupo e se mostrou satisfeita com a metodologia empregada, desenvolvendo a habilidade de resolver os problemas propostos neste estudo. Além disso, percebeu-se o aumento da satisfação discente com as atividades de ensino, melhora qualitativa na aprendizagem, seu rendimento e diminuição da evasão/desistência. (Feitosa; Rodrigues, 2021, p.1)
Pelo exposto, a relevância deste trabalho reside no fato de não encontrarmos na literatura tantos trabalhos que façam uso da teoria da orquestração instrumental por meio remoto e por ir ao encontro da necessidade de os pesquisadores da área da educação matemática no ensino superior (RASMUSSEN; MARRONGELLE; BORBA, 2014) de integrar teoria e prática em estudos relacionados ao ensino de Cálculo.
Procedimentos metodológicos
Esta pesquisa se utiliza de uma abordagem qualitativa. Segundo Creswell (2010, p. 26):
A pesquisa qualitativa é um meio para explorar e para entender o significado que os indivíduos ou os grupos atribuem a um problema social ou humano. O processo de pesquisa envolve as questões e os procedimentos que emergem, os dados tipicamente coletados no ambiente do participante, a análise dos dados indutivamente construída a partir das particularidades para os temas gerais e as interpretações feitas pelo pesquisador acerca dos significados dos dados.
Quanto aos objetivos, trata-se de uma pesquisa descritiva que, segundo Gil (2008, p. 28), “[...] tem como objetivo primordial a descrição das características de determinada população ou fenômeno ou o estabelecimento de relações entre variáveis.” Quanto aos procedimentos, podemos classificar este estudo como uma pesquisa-ação, que segundo a definição de Thiollent (1985, p. 14):
É um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos do modo cooperativo ou participativo.
Os procedimentos metodológicos do estudo seguiram as fases da metodologia de pesquisa denominada Engenharia Didática (ED), que Artigue (1988, p. 285) caracteriza como “[...] um esquema experimental baseado sobre realizações didáticas em sala de aula, isto é, sobre a concepção, a realização, a observação e a análise de sequências de ensino.”
Existem dois níveis de ED, o da microengenharia e o da macroengenharia. Para Machado (2008, p.235):
As pesquisas em microengenharia são aquelas que têm por objeto o estudo de um determinado assunto, elas são localizadas e levam em conta, principalmente, a complexidade dos fenômenos de sala de aula. Por outro lado, as pesquisas de macroengenharia são aquelas que permitem compor a complexidade das pesquisas de microengenharia com a dos fenômenos ligados à duração nas relações ensino/aprendizagem.
A presente pesquisa é uma microengenharia que busca desenvolver uma ED no ensino de Cálculo relativo ao conteúdo funções de uma variável real a valores reais.
Visando facilitar a análise de uma ED, Artigue (1988) distingue dois tipos de variáveis de comando (variáveis pertinentes do sistema sobre o qual o ensino pode atuar) como variáveis macrodidáticas, concernentes à organização global da engenharia e variáveis microdidáticas, referentes à organização local da engenharia. Isto é, à organização de uma sessão ou de uma fase.
No caso desta pesquisa, tomamos como variáveis macrodidáticas: aplicar os princípios da aprendizagem cooperativa, enfatizar a conversão de registros de representação nas situações propostas, a exploração de recursos tecnológicos que favoreçam o ensino remoto, o uso do Geogebra, a exigência da entrega de listas de exercícios como atividade pós-aula e envio de resumos como atividade pré-aula. Como variáveis microdidáticas consideramos os conteúdos envolvidos nas situações propostas e os saberes requeridos para o uso da tecnologia.
Do ponto de vista da ação experimental e tempo investigativo, Artigue (1996) distingue quatro fases distintas de uma Engenharia Didática: (1) fase de análises preliminares; (2) fase de concepção e análise a priori das situações didáticas; (3) fase da experimentação e, por fim, (4) fase da análise a posteriori e validação. Cabe destacar que a validação numa ED é feita sobretudo internamente e se baseia na confrontação entre a análise a priori e a análise a posteriori.
No que tange ao atendimento das questões éticas da pesquisa, os participantes foram esclarecidos quanto aos objetivos do estudo e foram convidados a participar por meio do termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE). De acordo com a Resolução CNS 466/12, item V, toda pesquisa com seres humanos envolve riscos em tipos e gradações variadas. Ressalte-se ainda o item II.22 da mesma resolução que define como "Risco da pesquisa - possibilidade de danos à dimensão física, psíquica, moral, intelectual, social, cultural ou espiritual do ser humano, em qualquer pesquisa e dela decorrente”. Visando evitar danos à dimensão física dos sujeitos devido à pandemia, todas as etapas do estudo foram realizadas por meio remoto. Visando evitar danos à dimensão psíquica e/ou moral, todos os registros audiovisuais e documentais foram restritos à pesquisa, ficando vedada sua exposição para o público externo. Na divulgação dos dados do estudo, a identidade dos sujeitos foi preservada.
Análises preliminares
As análises preliminares para a concepção da engenharia didática são feitas a partir de considerações sobre o quadro teórico didático geral e os conhecimentos já adquiridos sobre o assunto em questão, incluem a análise epistemológica do ensino atual e seus efeitos, das concepções dos alunos, dificuldades e obstáculos, e análise do campo das restrições e exigências no qual vai se situar a efetiva realização didática (ALMOULOUD; SILVA, 2012).
Neste trabalho, as análises preliminares são compostas pelas concepções e dificuldades dos alunos em relação ao conceito de função e suas diversas representações, assim como relacionar modelos matemáticos a uma lista de funções essenciais. Os dados foram obtidos a partir da aplicação de uma avaliação diagnóstica cujas questões são apresentadas no Quadro 1.
Quadro 1 – Avaliação Diagnóstica I (Continua)
Questão 1) O que é uma função? Dê um exemplo. |
Questão 2) Quais dos seguintes diagramas representam uma função de A em B? Justifique sua resposta. Importar imagen Importar imagen Importar imagen Importar imagen |
Questão 3) Dados A = {0, 1, 2, 3} e B = {2, 1, 0, 1} e a correspondência entre A e B dada por y = x - 2, com x ∈ A e y ∈ B. Esta correspondência é uma função de A em B? Justifique sua resposta. |
Questão 4) Verifique se a correspondência de A em B dada pela tabela abaixo representa uma função. Justifique sua resposta. A x 1 4 9 16 25 B y 1 2 3 4 5 |
Fonte: Próprios autores (2021)
Quadro 1 – Avaliação Diagnóstica I (Conclusão)
Questão 5) Determine quais curvas representam o gráfico de uma função de x. Justifique sua resposta. Importar imagen |
Questão 6) No quadro abaixo, temos cinco funções dadas em duas representações distintas, algébrica e graficamente. Faça a associação destas duas representações. Importar imagen Importar imagen Importar imagen Importar imagen Importar imagen (1) (2) (3) (4) (5) Importar imagen Importar imagen Importar imagen Importar imagen Importar imagen |
Fonte: Próprios autores (2021)
A avaliação diagnóstica 1 foi realizada por meio remoto da seguinte forma: em um encontro pelo Google Meet, o professor orientou os discentes quanto aos objetivos da avaliação e em seguida passou a realização da mesma, mostrando uma questão por vez e dando um tempo de 2 a 4 minutos, a depender da questão, para que eles respondessem. Ao final, os discentes deveriam digitalizar suas respostas e enviar pelo link de um Formulário Google disponibilizado pelo professor. Por fim, o professor abriu espaço para a discussão acerca da solução das questões.
Responderam a esta Avaliação Diagnóstica 23 (vinte e três) discentes. Desses, 14 consideraram a avaliação nem fácil e nem difícil, 8 (oito) consideraram difícil ou muito difícil e 1 considerou fácil.
A questão 1 tem como objetivo identificar quantos discentes recordam a definição de função. Em relação a essa questão, 1 (um) discente acertou, 10 (dez) responderam de forma incorreta e 12 não responderam.
As questões 2, 3 e 4 visam verificar se os discentes conseguem identificar uma função em diversas representações (diagramas, algébrica e numérica). Em relação à questão 2, 6 (seis) discentes reconheceram (e justificaram) o diagrama A e 5 (cinco) o diagrama C como funções. Na questão 3, 4(quatro) discentes reconheceram a correspondência apresentada como uma função e 4 (quatro) discentes identificaram a tabela dada na questão 4 como sendo uma função.
A questão 5 visa a identificar quais discentes conseguem reconhecer curvas que representam funções. Dentre os discentes, 3 (três) identificaram a curva dada na letra B e 4 (quatro) a curva C como representações de funções e justificaram suas respostas. Destacamos que 9 (nove) discentes reconheceram a curva do item B como representante de uma função, porém não justificaram.
Na questão 6, os discentes deveriam ser capazes de associar as representações algébricas e gráficas de uma função. O resultado foi o seguinte: 10 (dez) discentes associaram corretamente a equação A ao gráfico 5 e a equação B ao gráfico 4; 8 (oito) discentes associaram corretamente a equação C ao gráfico 1; 7 (sete) discentes associaram corretamente a equação D ao gráfico 2 e 9 (nove) discentes associaram corretamente a equação E ao gráfico 3.
Pelo exposto, pudemos concluir que a maioria dos discentes (22) não sabe a definição de função, além de que apresentam dificuldades em reconhecer uma função quando representada por diagrama, lei de formação, tabela ou graficamente. Isso nos motivou a considerar as seguintes variáveis macrodidáticas: enfatizar a conversão de representações de funções fazendo uso do software Geogebra, aplicar a metodologia da aprendizagem cooperativa para a exploração das potencialidades do trabalho em grupo, a valorização e provocação de conjecturas pelos discentes, incentivar e estimular a participação dos discentes na monitoria.
Desde que apoiamos nossas ações nos pressupostos da engenharia didática, assumimos então a seguinte hipótese de trabalho ao longo de todo o processo investigativo: uma orquestração instrumental on-line, que faz uso do GeoGebra, na qual os discentes têm o apoio de monitores, é exigido a entrega de resumos antes de cada aula e é empregada a aprendizagem cooperativa, contribui para a aprendizagem contribuirá para o entendimento do conceito de função, o desenvolvimento da habilidade de reconhecer uma função em suas diversas representações assim como realizar conversões de representações, relacionar modelos matemáticos a uma lista de funções essenciais, além de obter novas funções a partir de funções conhecidas.
Concepção e análise a priori
Nesta fase o pesquisador, orientado pelas análises preliminares, delimita certo número de variáveis pertinentes do sistema sobre o qual o ensino pode atuar, as quais são chamadas de variáveis de comando. Artigue (1988) distingue as variáveis de comando como: variáveis macrodidáticas (ou globais), concernentes à organização global da engenharia e variáveis microdidáticas (ou locais), concernentes à organização local da engenharia, isto é, à organização de uma sessão ou de uma fase.
Neste trabalho, a concepção e a análise a priori estão centradas nas características de uma orquestração instrumental (OI), que foi organizada na intenção de aplicá-la na situação didática com os discentes na fase da experimentação.
A OI inicialmente criada para estudar a integração de recursos em sala de aula foi pensada, neste estudo, como base para construção de situações de ensino por meio remoto. No Quadro 2, são apresentados os elementos essenciais da orquestração que foi desenvolvida.
Quadro 2 – Orquestração Instrumental (Continua)
Configuração Didática | |
Situação Matemática | Quatro maneiras de representar uma função, funções essenciais, novas funções a partir de conhecidas, funções exponenciais, funções inversas e logaritmos. |
Recursos | Ferramentas Google Education (Google Meet, Google Sala de Aula, Google Drive), software de Geometria Dinâmica GeoGebra, livro texto, listas de exercícios/problemas. |
Fonte: Próprios autores (2021)
Quadro 2 – Orquestração Instrumental (conclusão)
Sujeitos | Pesquisadores (1 na função de professor da disciplina e 1 na função de tutora), 30 discentes do curso de licenciatura em Matemática e 3 monitores. Os discentes trabalharão em grupos de até 4 pessoas, sendo estes grupos formados pelos pesquisadores. |
Tempo | 6 (sete) encontros de 2h cada entre pesquisador-professor e discentes, sendo 5 (cinco) síncronos e 1 para a realização de uma avaliação de aprendizagem; 4 (quatro) encontros síncronos de 2h cada entre monitores e discentes e 1 encontro síncrono de 1h cada entre pesquisadora-tutora e os grupos. |
Modo de Execução | |
Encontros entre pesquisador-professor e discentes: Estes encontros dar-se-ão por meio do Google Meet. Serão abordados os objetos de conhecimento da situação matemática, dando enfoque na compreensão conceitual. Um resumo da aula deve ser enviado via formulário eletrônico antes de cada aula. O objetivo é que o discente faça uma leitura do conteúdo antes da aula. O Geogebra terá uma função importante por permitir múltiplas representações das funções e possibilitar as transformações de conversões entre registros. Ao término de cada encontro, uma lista de exercícios/problemas selecionados do livro texto, será repassada aos discentes que deverão enviar a resolução, por meio de um Formulário Google, antes do início do encontro seguinte. Encontro entre pesquisadora-tutora e grupos: Este encontro acontecerá após a Avaliação de Aprendizagem. A tutora conversará com cada grupo separadamente com o objetivo de fazer uma avaliação do trabalho do grupo ao longo do módulo. Verificar se todos conseguiram entregar as listas, quais dificuldades encontraram, se frequentaram o horário da monitoria, como está o ambiente de trabalho do grupo, o que pode ser melhorado para que o grupo renda mais, são questões que serão investigadas nesses encontros. Encontro entre monitores e discentes: Nestes encontros os monitores auxiliarão os discentes na resolução das listas de exercícios/problemas. Para tanto, os discentes já deverão ter tentado resolver as listas e usarão estes encontros para sanar suas dúvidas. Os monitores serão instruídos a incentivar que os discentes busquem explicar como pensaram em resolver as questões e os monitores devem dar sugestões de como os discentes podem superar suas dificuldades. |
Fonte: Próprios autores (2021)
Compõe nosso quadro metodológico a aprendizagem cooperativa que consiste em uma metodologia, na qual pequenos grupos de alunos trabalham juntos em uma tarefa comum. De acordo com Johnson e Johnson (1999), existem cinco elementos básicos essenciais que precisam ser incluídos para que uma aula seja cooperativa: interdependência positiva, responsabilização individual, interação promotora, habilidades sociais, e processamento de grupo. Estimular a interação promotora, o aprimoramento das habilidades sociais e o processamento de grupo eram ações reforçadas nos encontros entre pesquisadora-tutora e discentes.
O professor garante a interdependência positiva quando assegura que cada estudante perceba que está ligado aos outros de tal maneira a sentir que não terá sucesso algum a não ser que os outros também o tenham (JOHNSON; JOHNSON; SMITH, 1998). Para tanto, estruturamos cada aula de modo que cada aluno assuma a responsabilidade de entregar a resolução das listas de exercícios/problemas, e de certificar-se de que todos os membros do seu grupo a entreguem também. A nota de cada discente é calculada pela média aritmética entre a nota obtida por ele e a nota média do seu grupo.
O segundo elemento básico é a responsabilidade individual, que existe quando o desempenho de cada aluno é avaliado individualmente e os resultados são devolvidos ao grupo e ao indivíduo (JOHNSON; JOHNSON, 1989). Assim, foi determinado que cada aluno se responsabilizasse em executar a parte do trabalho que lhe foi confiada e a não esperar que os outros a fizessem por ele. Além disso, todos os membros do grupo deveriam estar atentos para perceber qual deles estava precisando de mais assistência e apoio para concluir a tarefa.
A interação promotora acontece quando os alunos promovem o sucesso uns dos outros, auxiliando, encorajando e elogiando os esforços de cada um para aprender. Para tanto, foi solicitado que os discentes explicassem oralmente como resolver problemas, discutissem a natureza dos conceitos que estão sendo aprendidos, ensinassem o conhecimento de um para os colegas, além de desafiar o raciocínio e as conclusões uns dos outros.
O sucesso de um esforço cooperativo requer o uso apropriado de habilidades sociais. Com o mesmo propósito e precisão que ensinamos habilidades acadêmicas aos alunos, as habilidades interpessoais e de pequenos grupos, como liderança, tomada de decisão, construção de confiança, comunicação e gestão de conflitos, devem ser ensinadas.
O processamento de grupo tem como objetivo simplificar o processo de aprendizagem para torná-lo mais simples, eliminar ações não qualificadas e inadequadas, melhorar continuamente as habilidades dos alunos em trabalhar como parte de uma equipe e celebrar o trabalho árduo e o sucesso. A partir do processamento de grupo, cada membro maximiza a sua própria aprendizagem e a aprendizagem uns dos outros para que as formas de melhorar o processo possam ser identificadas (JOHNSON; JOHNSON, 1989).
Experimentação
Esta é a fase da realização da engenharia didática e supõe a explicação dos objetivos e condições de realização da pesquisa à população de alunos que participará da experimentação, o estabelecimento do contrato didático, a aplicação dos instrumentos de pesquisa e o registro das observações feitas durante a experimentação. O Quadro 3 apresenta a estrutura de coletas de dados do nosso estudo.
Quadro 3 – Estrutura de coleta de dados
Técnica de coleta de dados | Instrumento de coleta de dados | Dados produzidos |
Observação | Diário de bordo | Registro cursivo resultante das observações |
Entrevista | Questionário online (formulário do Google forms) | Respostas dos discentes em relação à metodologia empregada |
Filmagem | Função gravar do Google Meet | Vídeo dos encontros |
Coleta de interações | Fórum WhatsApp | Registro das interações entre os discentes |
Documentos | Diário de classe, avaliações, listas de exercícios/problemas, prints de resoluções enviadas pelos discentes, diário de bordo dos monitores e da tutora e planilhas de controle de entrega de atividades e participação nas aulas e nas sessões de monitoria e de tutoria. | Desempenho acadêmico dos discentes |
Fonte: Próprios autores (2021)
1º Encontro professor-pesquisador e discentes – 31/03/2021
Participaram 24 discentes e a aula teve como objetivo apresentar o conceito de função e dar exemplos em diversas representações por meio do Geogebra. Além disso, foram abordados os conceitos de função par e função ímpar. Devido a problemas com a internet, a aula foi interrompida duas vezes e isso comprometeu a programação, não permitindo abordar os conceitos de função crescente e função decrescente, ficando estes conceitos para o encontro seguinte. Os alunos se mostraram participativos, pois em diversas oportunidades pediram a fala para fazer perguntas e comentários.
2º Encontro professor-pesquisador e discentes – 03/04/2021
Estavam presentes no segundo encontro 19 discentes e o objetivo da aula foi apresentar os principais tipos de funções que ocorrem no Cálculo e descrever o modo de usá-las como modelos matemáticos de fenômenos do mundo real. Houve mais participação dos alunos do que no encontro anterior. Na transcrição a seguir, vemos a participação de 4 (quatro) discentes durante uma discussão acerca de funções polinomiais.
Professor: Se eu escrevesse assim
, essa função é uma função polinomial?
Discente 1: É.
Discente 2: Não, por causa da raiz.
Discente 3: Mas a raiz está no 3 e não na variável.
Discente 4: Sim pois podemos transformar a raiz numa potência.
Professor: Mas aí, ela é uma função polinomial?
Discente. Uma pergunta que eu vi lá no resumo que toda função racional é algébrica. E toda função algébrica é racional?
Percebemos neste encontro que a exigência dos resumos começou a apresentar indícios de que estava contribuindo para a maior participação dos discentes no sentido de fazer questionamentos, tirar dúvidas e ter segurança para participar das discussões. Abaixo destacamos a fala de discente durante a explicação acerca das funções racionais e algébricas: E esse comportamento é esperado para os demais encontros.
3º Encontro professor-pesquisador e discentes – 05/04/2021
Neste encontro estavam presentes 21 discentes e o objetivo foi desenvolver no discente a habilidade de, partindo das funções básicas apresentadas nos encontros anteriores, obter novas funções por transformações como deslocamento, expansão ou reflexão de seus gráficos. Foi discutido também como combinar pares de funções por meio de operações aritméticas ordinárias e por composição.
O encontro iniciou com a realização de uma atividade (Figura 1) na qual o professor usou o GeoGebra para apresentar algumas funções nas suas representações algébricas e gráficas e, a partir de modificações na sua forma algébrica, os discentes tinha que observar que modificações ocorriam na representação gráfica e escrever em seu caderno ou numa folha de papel as suas observações. Foram apresentadas cerca de 5 funções e ao final os discentes enviavam o print de suas anotações para o WhatsApp do professor (Figura 2).
Figura 1 – Print da atividade realizada pelo professor
Fonte: Dados da pesquisa (2021)
Figura 2 – Print das observações enviadas por um discente
Fonte: Dados da pesquisa (2021)
Devido às dificuldades apresentadas pelos discentes para responder à lista de exercícios/problemas da aula anterior, resolvemos dispensá-los do envio do resumo a respeito deste encontro. Entretanto, observamos que essa decisão levou a uma menor participação dos discentes em comparação aos dois encontros anteriores. Isso demonstrou a importância do envio dos resumos de cada encontro.
4º Encontro professor-pesquisador e discentes – 07/04/2021
O objetivo deste encontro foi tratar das funções exponenciais e logarítmicas bem como as características de seus gráficos. Além disso, definimos função injetora, a condição para a existência da inversa de uma função e como obter esta inversa. Iniciamos o encontro propondo a seguinte situação didática que foi aplicada segundo a metodologia de ensino da teoria das situações didáticas:
Situação Didática 1: Uma cultura de bactérias começa com 500 indivíduos e dobra de tamanho a cada meia hora. Quantas bactérias existem após 3 horas? Quantas bactérias existem após t horas?
Na situação de ação, instigamos os discentes a explorarem todos os conhecimentos necessários para encontrar a solução do problema, se apropriando do enunciado e dos seus conhecimentos prévios pertinentes à situação apresentada, visualizando e reconhecendo hipóteses, sem formalismo, que possam ser aplicadas à questão. Almeja-se, portanto, que o discente: escolha uma variável para representar a quantidade de bactérias e para representar o tempo,
e
, por exemplo; perceba que
, e, como a quantidade dobra a cada meia hora, enxergue que
,
, e assim por diante.
Na situação de formulação, os discentes tinham um tempo para escrever sua estratégia de resolução da situação. Em seguida estimulamos os discentes a apresentarem aos demais sua estratégia para chegarem à solução do problema, independente de corretas ou não. Esclarecemos que as explicações deles poderiam vir acompanhadas de raciocínio incompleto ou de falsas teorias, pois os devidos ajustes seriam feitos em seguida (na situação de institucionalização).
Pretende-se que os discentes percebam que devem primeiramente obter a expressão algébrica da função que relaciona a quantidade
de bactérias ao tempo
. Isso poderia ser feito segundo o Quadro 4 e colocando para alguns instantes (
,
,
, etc.) a quantidade de bactérias correspondentes.
Quadro 4 – Relação tempo e quantidade de bactérias
t | Q |
0 | Importar imagen |
½ | Importar imagen |
1 | Importar imagen |
1,5 | Importar imagen |
2 | Importar imagen |
Fonte: Próprios autores (2018)
Na situação de validação, espera-se então que o aluno explicite a formalização do seu raciocínio. Os discentes foram incentivados a apresentar aos demais suas asserções, independentes de corretas ou não, explicando o caminho traçado que os levaram a encontrar a solução do problema.
Para determinar o número de bactérias após 3 horas o discente poderia continuar o preenchimento do Quadro 4 e concluir que após esse tempo haveria 32.000 bactérias. Determinar o número de bactérias após
horas equivale a determinar a função que modela a situação dada, que pode ser deduzida a partir do Quadro 4, da seguinte forma:
Quadro 5 – Situação didática 1
0 | Importar imagen |
½ | Importar imagen |
1 | Importar imagen |
1,5 | Importar imagen |
t | Importar imagen |
0 | Importar imagen |
Fonte: Próprios autores (2018)
Assim, os discentes deveriam concluir que a função que modela a situação é dada por
. Como forma de valida o modelo obtido, o discente poderia calcular novamente o número de bactérias após 3 horas fazendo:
Ao final desta etapa, os discentes, fazendo uso do celular, obtiveram uma imagem da sua folha de resposta e enviaram para o professor por meio de um formulário eletrônico.
Realizaram esta atividade 15 (quinze) discentes dos quais 11 (onze) conseguiram identificar os dados e a pergunta da situação-problema. Apenas 2 (dois) discentes conseguiram perceber que a situação envolvia função exponencial e 4 (quatro) discentes modelaram a situação por uma função afim. Somente 3 (três) discentes conseguiram chegar na resposta correta, porém não conseguiram obter o modelo matemático para a situação (Figura 3). E apenas 1 (um) discente calculou o número de bactérias após 3 horas fazendo da forma esperada (Figura 4).
Figura 3 – Solução apresentada pelos 3 discente que obtiveram o resultado correto
Fonte: Dados da pesquisa (2021)
Figura 4 – Solução apresentada pelos 3 discente que obtiveram o resultado correto
Fonte: Dados da pesquisa (2021)
Na institucionalização, apresentamos a solução da situação e, em seguida, sistematizamos o tópico de função exponencial por meio de uma apresentação de definições, propriedades e outras situações. Nessa etapa, fizemos uso do software de geometria dinâmica GeoGebra para apresentar o comportamento do gráfico das funções exponenciais e suas propriedades (Figura 5).
Figura 5 – Print de tela durante o uso do GeoGebra
Fonte: Dados da pesquisa (2021)
Ainda na fase de institucionalização, fizemos uso do aplicativo Jamboard, que é um quadro interativo desenvolvido pelo Google, o qual permite o trabalho colaborativo por meio remoto. Na situação apresentada na Figura 6, os alunos deveriam fazer um esboço do gráfico da função
, a partir do gráfico da função
e de transformações (reflexão, translação ou expansão) desse gráfico. Durante a atividade, vários alunos participaram desenhando a curva que eles acreditavam ser a resposta do problema.
Figura 6 – Print de tela durante o uso do Jamboard
Fonte: Dados da pesquisa (2021)
Para esse encontro, voltou a ser exigido que o resumo fosse enviado antes da aula. Como observado nos dois primeiros encontros, houve maior participação dos discentes no sentido de fazer perguntas e responder a questionamentos feitos pelo professor durante a aula.
Uma situação que tem feito parte da realidade de muitos alunos em nosso país é a dificuldade de ter uma internet de qualidade que permita o aluno participar das aulas remotas de forma plena. A Figura 7 foi enviada por um dos discentes durante este encontro.
Figura 7 – Print de uma mensagem de um discente durante a aplicação da situação 1
Fonte: Dados da pesquisa (2021)
5º Encontro professor-pesquisador e discentes – 09/04/2021
Participaram 21 discentes e o objetivo inicial deste encontro foi tratar das funções logarítmicas bem como as características de seus gráficos. Além disso, foi discutido o conceito de função injetora e o fato de ser esse tipo de função que admite inversa. O GeoGebra foi usado para a visualização de gráficos de funções logarítmicas e a relação desta com a função exponencial.
Em um segundo momento, os alunos podiam tirar dúvidas das listas de exercícios/problemas que foram propostas no decorrer dos encontros. Ficou claro que a maioria das dúvidas eram em relação à determinação do domínio de uma função e na obtenção de sua inversa. Em ambas as situações, a função era dada em sua representação algébrica.
No último momento do encontro, realizamos uma segunda avaliação diagnóstica com o objetivo de verificar se houve evolução na aprendizagem dos discentes em comparação a primeira avaliação diagnóstica realizada no primeiro encontro. A metodologia para realização foi a mesma aplicada na primeira e as questões eram semelhantes e com o mesmo grau de dificuldade. Os discentes responderam ainda a um formulário para avaliar a metodologia aplicada pelo professor e o trabalho em grupo.
No dia seguinte, 10/04/2021, os discentes realizaram uma avaliação final com o objetivo de avaliar sua aprendizagem em relação a todos os conteúdos estudados durante os encontros. Além disso, foi feita uma análise da participação dos discentes nas seções da monitoria, da entrega das listas de exercícios/problemas e dos resumos, e da frequência nas aulas. Os resultados dessa análise, da segunda avaliação diagnóstica, das respostas dadas ao formulário e do desempenho na avaliação final serão apresentados e discutidos na próxima seção.
Análise a posteriori e validação
Iniciaremos nossa análise a posteriori discutindo o desempenho dos discentes na Avaliação Diagnóstica II (Quadro 6) e fazendo um paralelo com o desempenho na primeira. Responderam a essa avaliação 17 discentes e o Quadro 7 compara o desempenho dos discentes nas duas avaliações em relação às habilidades exigidas por cada questão.
Quadro 6 – Avaliação Diagnóstica II
Questão 1) O que é uma função? Dê um exemplo. |
Questão 2) Quais dos seguintes diagramas representam uma função de A em B? Justifique sua resposta. Importar imagen Importar imagen |
Questão 3) Dados A = {0, 1, 2, 3} e B = {1, 0, 2, 9} e a correspondência entre A e B dada por y =Importar imagen, com x ∈ A e y ∈ B. Esta correspondência é uma função de A em B? Justifique sua resposta. |
Questão 4) Verifique se a correspondência de A em B dada pela tabela abaixo representa uma função. Justifique sua resposta. A x -2 -1 0 1 -2 B y 1 3 0 4 5 |
Questão 5) Determine quais curvas representam o gráfico de uma função de x. Justifique sua resposta. Importar imagenImportar imagen |
Questão 6) No quadro abaixo, temos cinco funções dadas em duas representações distintas, algébrica e graficamente. Faça a associação destas duas representações. Importar imagen Importar imagen Importar imagen Importar imagen Importar imagen (1) (2) (3) (4) (5)Importar imagenImportar imagenImportar imagenImportar imagenImportar imagen |
Fonte: Próprios autores (2021)
Quadro 7 – Desempenho dos discentes nas avaliações diagnóstica
Acertos (%) | ||
Habilidade | AV1 | AV2 |
Conhecer a definição de Função | 4,3% | 52,9% |
Reconhecer uma função quando representada por diagramas. | 26,1% | 67,7% |
Reconhecer uma função quando representada algebricamente. | 17,3% | 70,5% |
Reconhecer uma função quando representada por uma tabela. | 17,3% | 47% |
Reconhecer uma função quando representada graficamente. | ||
Reconhecer uma função afim em suas representações algébrica e gráfica. | 43,7% | 82,3% |
Reconhecer uma função quadrática em suas representações algébrica e gráfica. | 43,7% | 82,3% |
Reconhecer uma função exponencial em suas representações algébrica e gráfica. | 30,4% | 70,5% |
Reconhecer uma função logarítmica em suas representações algébrica e gráfica. | 39,1% | 76,4% |
Reconhecer uma função cúbica em suas representações algébrica e gráfica. | 34,7% | 70,5% |
Fonte: Próprios autores (2018)
A partir do Quadro 7, podemos perceber um aumento significativo no desempenho dos discentes em relação às habilidades investigadas. O resultado que mais chamou a atenção foi o aumento de 4,3% para 52,9% dos discentes que acertaram a definição de função, visto que este é o objeto central de estudo do Cálculo Diferencial.
As avaliações diagnósticas visam a avaliar os conhecimentos básicos dos discentes. Por outro lado, a Avaliação Final (Quadro 8) tem objetivo avaliar a compreensão dos discentes acerca de todos os conceitos que foram abordados nos encontros, mais especificamente: determinar o domínio e a imagem de uma função em suas representações algébricas e gráficas (Questões 1 e 2), reconhecer quando uma curva representa o gráfico de uma função (Questão 3), determinar a composta de funções (Questão 4), obter o gráficos a partir de transformações em um gráfico dado (Questão 5), classificar uma função como par ou ímpar ou nenhum dos dois (Questão 6) e classificar uma função como polinomial, racional ou algébrica (Questão 7).
Realizaram a Avaliação Final (Quadro 8) 24 discentes, a nota média foi de 6,3 e 79% dos discentes obtiveram nota maior ou igual a 5,0, isto é, obtiveram aprovação. O cálculo da nota final dos discentes levou em conta, frequência nas aulas, nota obtida nas listas de exercícios, participação na monitoria e a nota média do grupo. Quando consideramos todos esses critérios, a nota média sobe para 7,05 e o percentual de discentes com notas ≥ 5,0 aumenta para 87%.
Quadro 8 – Avaliação Final (continua)
Questões | |
1. Importar imagen | 4. Importar imagen |
Fonte: Questões retiradas de Anton, Bivens e Davis (2014)
Quadro 8 – Avaliação Final (conclusão)
2. Importar imagenImportar imagen | 5. Importar imagen |
3. Importar imagen Importar imagenImportar imagen | 6. Importar imagen 7. Importar imagen |
Fonte: Questões retiradas de Anton, Bivens e Davis (2014)
O formulário para avaliar a metodologia empregada e o trabalho em grupo foi respondido por 21 discentes e os resultados descreveremos nos parágrafos seguintes. Em relação ao nível de interesse pelo trabalho em grupo, 90,5% disseram ter ficado muito interessados ou razoavelmente interessados. Quanto ao nível de dificuldade encontrado no trabalho em grupo, 47,6% responderam que não foi muito difícil, apenas o suficiente.
Nas atividades propostas pelo professor, 66,7% entenderam exatamente o que o grupo deveria fazer. Segundo as respostas dadas 42,9% responderam que o grupo se reunia ocasionalmente para resolver e/ou discutir as listas de exercícios propostas pelo professor. Para 95,2%, a troca de ideias se dava apenas por mensagem de texto pelo aplicativo WhatsApp.
Durante os encontros do grupo para resolver os problemas, 38,1% afirmaram que falavam apenas o suficiente e 81% disseram ter falado o quanto quiseram. Quando perguntados se eles se entenderam bem com os membros do seu grupo, 85,7% responderam que se deram bem com todos.
Para o envio das atividades, o grupo escolhia um "líder" que ficava encarregado de receber as listas dos membros e responsável por enviá-las ao professor. Pedimos que os discentes descrevessem como foi sua experiência em relação a essa dinâmica. Segue as respostas de alguns discentes:
Não houve essa dinâmica, dois dos alunos não interagiam muito no grupo, apesar de eu sempre estar tentando fazer esse contato, tentar estimular que houvesse uma real interação com todos, aconteceu que ou não tinham tempo, ou estavam desinteressados mesmo.
Não muito boa. Os trabalhos sempre eram enviados, porém, na maioria das vezes faltava algum integrante deixava de direcionar o seu arquivo ao grupo.
Foi proveitosa, tivemos a oportunidade de nós conhecer e tirarmos dúvidas que pôde fluir a atividade proposta.
Era muito boa, para podermos entregar todas as atividades para o líder muitas vezes nós nos ajudava vamos tirando dúvidas ensinando questões para quem tinha dificuldade a qualquer horário o que era muito bom porque muitos participavam tirando suas dúvidas e também comentando sobre a dos outros de uma maneira amistosa.
Acerca da metodologia empregada pelo professor, 95,2% afirmaram que se sentiram satisfeitos ou muito satisfeitos, demonstrando a aprovação da metodologia por grande parte dos discentes. Particularmente em relação à metodologia aprendizagem cooperativa, 81% responderam terem ficado satisfeitos ou muito satisfeitos.
Acerca da exigência de entregar o resumo da aula antes de cada encontro, 95,2% disseram que contribuiu ou muito contribuiu para a melhor compreensão dos assuntos abordados durante as aulas.
Para 47,6% dos discentes, se a metodologia utilizada tivesse sido a tradicional, sua aprendizagem teria sido pior. Solicitamos aos discentes que escrevessem sua visão acerca da metodologia utilizada, destacando aspectos positivos, negativos e sugestões para o aperfeiçoamento do método.
Gostei do método, ajudou muito na conclusão dos exercícios, dividir a sala em grupos fica mais pratico e mais ágil na hora da resolução dos exercícios.
A estratégia de fazer com que nos faça revisar o conteúdo antes de estuda-lo sobre a supervisão do professor, agregou e muito para deixar a aula mais argumentativa e voltou o nosso foco da aula, não somente para revisar o conceito, mas já à estimular o desenvolvimento das atividades propostas. Aos pontos negativos, nada a declarar.
Eu adorei a dinâmica das aulas, das atividades que ocorrem em alguma aula uma vez por semana e achei uma sacada muito interessante da criação do grupo para realizar o envio das atividades e me senti bem empolgado em participar. Contudo, acredito que deveria haver uma flexibilidade no envio dessas atividades, por conta das outras disciplinas que todos estão envolvidos.
A metodologia em si é boa, tendo em vista que se adquire uma noção daquilo que ainda será estudado, permitindo assim que o aluno esteja por dentro do assunto.
Achei o método ótimo, só não gostei da questão do tempo para entrega dos resumos e atividades, creio que me falta um pouco de base, assunto do ensino médio, preciso relembrar muita coisa! Mas consegui acompanhar, não 100% como eu gostaria, mas comparada as outras disciplinas essa foi a melhor.
Positiva - porque tinha a oportunidade de saber a cerca do assunto antes de ser abordado, ou seja, já tinha um pré contato. Pôde ser confirmado no ponto 1.3 quando não foi feito um resumo.
O resumo antes ajuda muitos, as aulas são bem didáticas. O tempo pra fazer a lista podiam ser um pouco maior. Até pra absorver melhor o conteúdo pois fica muito corrido com aulas e atividades de outros.
Muito benéfica, pois prepara o aluno para a aula e, com essa revisão prévia, que surgem as dúvidas que podem ser expostas para que o professor possa esclarecer.
A ideia do resumo foi o que mais achei interessante pq assim ja tínhamos dúvidas pra resolver na aula e também os exercícios me fizeram aprender bem mais do que o normal.
Muito bom em relação de ter uma base sobre a próxima aula e já poder tirar dúvidas.
Eu já até disse pro professor que eu gostei da metodologia dele a única parte ruim é saber administrar tudo o que está ocorrendo porque além da matéria dele temos outras E aí acumula e a gente fica sobrecarregado mas a metodologia é muito boa porque gera no aluno um sentimento de que você já sabe alguma coisa então você não fica perdido o que não lhe causa desconforto E aí na aula você só tira suas dúvidas.
Ótima, pois no resumo conseguíamos relembrar e na aula ficava mais claro as ideias.
O aspecto positivo é que o aluno já começa a assistir a aula com uma base do assunto que será abordado, em contra partida, minha dificuldade esta relacionada ao fato de ter outras disciplinas no curso que são necessários estudar mais e os resumos e entregas de lista antes de cada aula fica um pouco puxado e acaba delimitando o tempo para o estudo de outras disciplinas.
Acerca da contribuição da monitoria para sua aprendizagem, 66,7% afirmaram que ajudou ou muito ajudou. Por outro lado, podemos observar a partir do Gráfico 1 que a participação dos discentes na monitoria decaiu no decorrer das sessões. Solicitamos que os discentes descrevessem sua visão acerca de como foram realizadas as monitorias, destacando aspectos positivos, negativos e sugestões para o aperfeiçoamento do trabalho dos monitores. 50% dos discentes elogiaram a monitoria e destacaram bastante a atenção dada a eles pelos monitores.
Gráfico 1 – Participação dos discentes na monitoria
Fonte: Dados da pesquisa (2021)
Na fala do discente 1, que destacamos abaixo, evidencia-se a sua satisfação em relação à metodologia empregada nas seções da monitoria. Por outro lado, percebemos na fala do discente 2 que ele não se adaptou.
Discente 1: A monitoria é boa porque as pessoas que estão ensinando elas são muito amigáveis, eles sempre nos ensinam e perguntam toda vez se a gente entendeu, se não, eles repetem, se sim, ok. Todo mundo tem o direito de falar e dizer a sua opinião e também tem o direito de perguntar é por ordem de chegada se eu não me engano, e é muito bom também porque eles também são alunos O que não gera desconforto a gente conversa de igual para igual só que Claro eles sabem mais que a gente.
Discente 2: Não tenho como opinar, pois das vezes em que eu fui eu não me introduzi na metodologia. Das poucas eu ia porque não entendia uma questão e lá os meus colegas de classe tiravam suas duvidas e eu só os acompanhava, pois no momento eu não tinha uma opinião formada para debater sobre o assunto.
Creditamos a queda da participação na monitoria a dois fatores. Primeiro, a metodologia empregada, que exigia dos discentes que eles já tivessem pelo menos tentado resolver os problemas da lista de exercícios. Segundo, a participação na monitoria não era obrigatória e, embora houvesse uma pontuação bônus para aqueles que participassem, os dados demonstram que isso não foi suficiente para estimulá-los a participar da monitoria.
Processamento de grupo
A pesquisadora que atuou como tutora participou do processamento de grupo de todos os grupos. Foi organizada uma agenda e combinado dia e horário em que iram se reunir pelo Google Meet e as concepções dos discentes resultantes do processamento de grupo são descritas a seguir.
Evidenciou-se que a maioria dos alunos gostou desta metodologia e conseguiram enxergar os benefícios que ela trouxe para eles. A partir disso, o que mais acharam proveitoso foram os resumos antes de cada encontro com o professor, pois afirmam que assim eles têm uma preparação maior para a aula e não ficam tão perdidos durante a explicação do assunto.
Quanto às listas de exercícios, os alunos afirmaram que foram muitas questões e o prazo de entrega era muito curto. Segundo esses alunos, ficou complicado para eles darem conta de tantas atividades na disciplina de Cálculo I, pois, além de terem outros compromissos fora do contexto universitário, eles faziam outras disciplinas além dessa e acabaram negligenciando estas em favor de Cálculo. Os discentes disseram que muitas vezes deixam questões em branco nas listas de exercícios, não porque não sabem fazer, mas por conta do prazo de entrega, que dizem ser muito curto, o que os impede de terminar as questões. A única exceção foi um grupo, o qual disse que se o número de questões diminuir, a qualidade da disciplina vai cair em igual nível. Este grupo disse entender o rigor com que a disciplina é trabalhada, pois sabem que Cálculo é uma disciplina que exige bastante do aluno, além de que os problemas com os quais cada um tem que lidar fora da disciplina nada têm a ver com o professor, ou seja, se você começou esse curso, concordou em assumir o compromisso e as responsabilidades que vêm com ele.
Com exceção de um grupo, do qual 3 alunos desistiram do curso e um membro ficou prejudicado com isso, os demais conseguiram se adaptar a metodologia de aprendizagem cooperativa de uma forma excelente, além de terem gostado de trabalhar dessa forma, a qual acreditam facilitar a compreensão dos assuntos. Apesar de alguns alunos terem sofrido um choque no início, por conta de essa não ser a metodologia com a qual estavam acostumados a estudar, conseguiram se adaptar bem com o decorrer das aulas.
Observamos que cada grupo tinha a sua estratégia de trabalho baseada na realidade de cada membro. Os que tinham mais tempo livre ajudavam os que tinham menos tempo com a entrega das listas nos formulários, os que tinham mais facilidade na disciplina, ajudavam e os que tinham mais dificuldade, e há muitos casos em que estes também deram uma grande contribuição ao grupo depois de terem compreendido o assunto, chegando assim, a uma relação de auxílio mútuo. Ficou claro, portanto, após a realização da tutoria com todos os grupos, que os 5 pilares da aprendizagem cooperativa, segundo Johnson, Johnson e Smith (1998), foram cumpridos durante esse tempo as atividades.
A maioria dos alunos concordou que a dificuldade deles se encontra principalmente em matemática básica, o que foi comprovado durante a correção das provas. Os estudantes ainda cometem muitos erros com operações dentro de raízes, além de realizarem procedimentos incorretos na resolução de funções racionais, principalmente quanto ao cancelamento de termos. Além disso, todos os alunos erraram pelo menos uma alternativa da questão 5 da prova, a qual pedia para fazer a alteração nos gráficos das funções a partir de translações, expansões etc., além de uma boa parte deles também terem calculado incorretamente as funções compostas na questão 4.
Com algumas exceções, os alunos ficaram bem empenhados com a metodologia empregada e a respeito de a nota ser calculada com a interferência da média do grupo, isso está incentivando os alunos a entregarem suas atividades a fim de não prejudicarem os colegas, como os próprios alunos falaram nos encontros de tutoria, o que os leva a ter mais disciplina e responsabilidade com os estudos.
Conclusão
Como conceber orquestrações instrumentais por meio remoto que favoreçam a aprendizagem de funções no âmbito da disciplina de Cálculo foi a pergunta norteadora deste trabalho. Nesse sentido, traçamos como objetivo, realizar uma orquestração instrumental por meio remoto visando o ensino de funções tendo como metodologia a Engenharia Didática.
Foram tomadas como variáveis macrodidáticas: aplicação dos princípios da aprendizagem cooperativa, ênfase na conversão de registros de representação nas situações propostas, exploração de recursos tecnológicos, o uso do GeoGebra, exigência da entrega de listas de exercícios como atividade pós-aula e envio de resumos como atividade pré-aula. Como variáveis microdidáticas foram consideradas os conteúdos envolvidos nas situações propostas e os saberes requeridos para o uso da tecnologia.
Quando comparamos o desempenho dos discentes nas duas avaliações diagnósticas percebemos a evolução na sua aprendizagem. O resultado da avaliação final, que tinha um caráter mais abrangente, também evidenciou um bom desempenho dos discentes, visto que a nota média foi de 6,3 e 79% dos discentes alcançaram nota maior ou igual a 5,0, isto é, obtiveram aprovação. O cálculo da nota final dos discentes levou em conta frequência nas aulas, nota obtida nas listas de exercícios, participação na monitoria e a nota média do grupo.
A partir das observações feitas durante a orquestração e das falas dos discentes nos questionários aplicados, percebemos que a exploração de recursos tecnológicos, o uso do GeoGebra, exigência da entrega de listas de exercícios como atividade pós-aula e envio de resumos como atividade pré-aula contribuíram para esse bom desempenho. Para os pesquisadores, a ênfase na conversão de registros de representação nas situações propostas e o estímulo constante para que os discentes participassem ativamente das aulas, foram outros fatores que muito contribuíram para a aprendizagem dos discentes. Em relação à metodologia aprendizagem cooperativa, os discentes demonstraram satisfação e compreenderam que isso colaborou para a sua aprendizagem.
Algumas dificuldades foram percebidas no decorrer da orquestração. Em primeiro lugar, estão as limitações com a Internet. Foram frequentes as quedas de conexão ou as dificuldades para acessar as gravações das aulas postadas do Google Sala de Aula. Dificuldades com as operações básicas também foram percebidas durante a correção das listas de exercícios/problemas. O fato de alguns discentes trabalharem ou mesmo serem mães de família também foi um fator que dificultava o cumprimento das tarefas propostas para eles. Isso fez com que a quantidade de questões nas listas de exercícios/problemas fosse reduzida de modo que os objetivos de aprendizagem não fossem comprometidos e que esses discentes tivessem condições de resolvê-las.
Pelo exposto, os dados deste estudo respondem positivamente à questão norteadora e que nosso objetivo foi alcançado. Evidentemente que os resultados aqui apresentados não podem ser generalizados, nem podemos garantir que outras turmas responderiam da mesma forma, contudo, apresentamos neste estudo uma sequência didática que se mostrou eficaz no ensino de funções no contexto do Cálculo e que articula teoria e prática no campo da Educação Matemática.
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