Demanda Contínua

AS DANÇAS POPULARES NA PERSPECTIVA DE CURRÍCULOS ANTIRRACISTAS COM A EDUCAÇÃO INFANTIL

POPULAR DANCES FROM THE PERSPECTIVE OF ANTI-RACIST CURRICULUM WITH EARLY CHILDHOOD EDUCATION

LAS DANZAS POPULARES DESDE LA PERSPECTIVA DE LOS CURRICULUM ANTIRRACISTAS CON LA EDUCACIÓN INFANTIL

Érica Bolzan 1
Universidade Federal do Espírito Santo, Brasil
Valdete Côco 2
Universidade Federal do Espírito Santo, Brasil
André da Silva Mello 3
Universidade Federal do Espírito Santo, Brasil

Revista Espaço do Currículo

Universidade Federal da Paraíba, Brasil

ISSN: 1983-1579

Periodicidade: Cuatrimestral

vol. 17, núm. 3, e67138, 2024

rec@ce.ufpb.br

Recepção: 29 Junho 2023

Aprovação: 03 Maio 2024



DOI: https://doi.org/10.15687/rec.v17i3.67138

Resumo: O presente ensaio aborda perspectivas de currículos antirracistas no contexto da Educação Infantil tendo as danças populares como meio para a materialização de suas ações. Em diálogo com autores e autoras que discutem currículos, epistemologias e perspectivas decoloniais, objetiva reunir reflexões sobre arranjos curriculares outros, que contemplem as diversidades e as diferenças culturais por meio das danças populares afro-brasileiras, que historicamente têm sido silenciadas ou tratadas de maneira caricata e superficial nas instituições escolares. Em termos metodológicos, foram selecionadas referências para interlocuções que abarcam a perspectiva de ancoragem (estudos decoloniais), os tópicos articulados (currículo, práticas antirracistas e danças), as bases legais vinculadas (no caso, ao ensino da história e da cultura afro-brasileira) e dados contextuais, no horizonte de combinar descrição, análises e proposições na composição de reflexões situadas no campo da Educação Infantil. Conclui que o investimento na formação de professoras e professores é crucial no apoio ao trabalho pedagógico com as danças populares, na ampliação da visão de currículos e na educação antirracista.

Palavras-chave: danças populares, currículos antirracistas, educação infantil.

Abstract: This essay discusses about the perspectives of anti-racist curriculum in the context of Early Childhood Education, using popular dances for the materialization of its actions. In dialogue with authors who discuss curriculum, epistemologies and decolonial perspectives, it aims to gather reflections on other curricular arrangements, which contemplate cultural diversities and differences through afro-brazilian popular dances, which have historically been silenced or treated in a caricatured manner and superficial in school institutions. In methodological terms, references were selected for dialogues that encompass the perspective of anchoring (decolonial studies), the articulated topics (curriculum, anti-racist practices and dances), the legal bases linked (in this case, to the teaching of Afro-Brazilian history and culture) and contextual data, with a view to combining description, analysis and propositions in the composition of reflections located in the field of Early Childhood Education. Conclude that investment in teacher training is crucial to support pedagogical work with popular dances, broadening the vision of curriculum and anti-racist education.

Keywords: popular dances, anti-racist curriculum, child education.

Resumen: El presente ensayo aborda perspectivas de los currículos antirracistas en el contexto de la Educación Infantil, usando las danzas populares como medio para la materialización de sus acciones. En diálogo con autores que discuten currículos, epistemologías y perspectivas decoloniales, pretende recoger reflexiones sobre otros arreglos curriculares, que contemplan las diversidades y diferencias culturales a través de las danzas populares afrobrasileñas, que históricamente han sido silenciadas o tratadas de forma caricaturesca y superficial en las instituciones escolares. En términos metodológicos, se seleccionaron referencias para diálogos que abarcan la perspectiva de anclaje (estudios decoloniales), los temas articulados (currículum, prácticas antirracistas y danzas), las bases jurídicas vinculadas (en este caso, a la enseñanza de la historia y cultura afrobrasileña) y datos contextuales, con vistas a conjugar descripción, análisis y proposiciones en la composición de reflexiones situadas en el ámbito de la Educación Infantil. Se concluye que la inversión en la formación de docentes es fundamental para apoyar el trabajo pedagógico con danzas populares, ampliando la visión de los currículos y la educación antirracista.

Palabras clave: danzas populares, currículo antirracista, educación infantil.

Introdução

Este ensaio está vinculado à pesquisa desenvolvida no contexto da Educação Infantil de Vitória/ES, que suscitou reflexões acerca da estrutura curricular e da viabilidade de mediações pautadas na diversidade cultural e na educação das relações étnico-raciais na primeira etapa da Educação Básica. Para compor essa argumentação, destacamos as danças populares como conhecimentos potentes na abordagem de perspectivas antirracistas ao promover a valorização das culturas e das identidades afro-brasileiras, foco do presente texto. Nessa direção, defendemos que discussões sobre as culturas populares[1] nos currículos das instituições de Educação Infantil podem contribuir para uma ruptura com os modelos de educação que, ao privilegiarem as culturas norte-centradas (europeias e estadunidenses), têm menosprezado saberes outros, incluindo os populares e os locais.

Embora modos de dominação que estruturam as sociedades ocidentais, representadas principalmente pelo capitalismo, o colonialismo e o patriarcado, tenham se instituído desde o século XVIII, cabe observar que, na recente história mundial, marcada pela pandemia do coronavírus, essas formas de opressão se fortaleceram e agravaram o quadro de desigualdades socioeconômicas, políticas e culturais, sobretudo nos países em desenvolvimento. Nesse contexto, aumentam os desafios para pensar a organização do mundo, das relações sociais, das políticas e da educação no período pós-pandemia. Santos (2020) compara metaforicamente esses modos de dominação a três unicórnios: personagens todo-poderosos, ferozes e selvagens, mas que se desmoronam diante da inteligência daqueles que sabem identificá-los. A articulação entre os unicórnios é essencial, são onipresentes na vida humana e suas invisibilidades decorrem do processo educativo e de doutrinação constante.

Uma nova articulação entre os processos políticos e civilizatórios pressupõe uma virada epistemológica, cultural e ideológica que sustente as soluções políticas, econômicas e sociais na garantia da continuidade da vida humana de maneira digna. Uma das alternativas aventadas consiste em construir um novo senso comum, questionando a ideia de que, sobretudo nos últimos quarenta anos, vivemos em quarentena, “na quarentena política, cultural e ideológica de um capitalismo fechado em si próprio e a das discriminações raciais e sexuais sem as quais ele não pode subsistir” (Santos, 2020, p. 32).

Entendemos que a escola está implicada nessa quarentena, uma vez que muitas de suas práticas reproduzem hierarquizações entre culturas, de modo que uma parcela das crianças é impossibilitada de se humanizar de forma plena. Ao padronizar ideais de cor/raça, etnia, gênero, comportamentos, religião, por exemplo, afirma-se que tudo fora do padrão é errado/ruim. Todos os dias, crianças negras são estigmatizadas e vítimas de racismo, em formas de violência muitas vezes invisíveis, que afetam a sua existência, suas interações com o mundo, suas aprendizagens, a constituição de suas identidades e sua autoestima.

Se, por um lado, as práticas racistas são sutis e silenciosas, os números escancaram as desigualdades na educação brasileira e revelam a necessidade de políticas específicas que revertam esse cenário. Em 2019, 3,6% das pessoas de 15 anos ou mais de cor branca eram analfabetas, percentual que se eleva para 8,9% entre pessoas de cor preta ou parda. No grupo etário de 60 anos ou mais, a taxa de analfabetismo das pessoas de cor branca chegou a 9,5% e, entre as pessoas pretas ou pardas, alcançou 27,1% (IBGE, 2020).

No que se refere aos anos de estudo, mais uma vez, a diferença foi significativa, registrando-se 10,4 anos de estudo para as pessoas de cor branca e 8,6 anos para as de cor preta ou parda, ou seja, uma diferença de quase 2 anos entre esses grupos, panorama que se mantém desde 2016. Considerando todo o quantitativo de jovens de 14 a 29 anos do país, o equivalente a quase 50 milhões de pessoas, 20,2% não completaram o ensino médio, seja por terem abandonado a escola antes do término dessa etapa, seja por nunca tê-la frequentado. Nessa situação, portanto, havia 10,1 milhões de jovens, dentre os quais 27,3% eram brancos e 71,7% pretos ou pardos (IBGE, 2020).

Esses dados são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD/IBGE) realizada em 2020, a qual não apresenta números relativos à Educação Infantil no tocante à raça ou cor. Já do ponto de vista dos estudos teóricos, Gomes (2019) destaca a importância de abordagens sobre crianças negras e Educação Infantil, pois é um tema pouco explorado nas pesquisas educacionais. Esse lugar de subalternidade reflete nos currículos, que, de modo geral, não contemplam a especificidade racial das crianças e nem propõem enfrentar como o racismo se faz presente: nas relações interpessoais entre as crianças, na relação entre educadora/educador e crianças negras, no trato da corporeidade negra, na relação com a família e na abordagem pedagógica. Diante dos dados apresentados, observa-se a emergência de a escola e a sociedade de maneira geral promoverem uma educação antirracista, subsidiada, entre outros aspectos, por políticas de formação docente e por currículos pautados nessa perspectiva.

Como uma das estratégias para repensar os currículos, propomos a tematização das danças populares na Educação Infantil de maneira sistematizada, para que elas estejam presentes em diferentes momentos educativos e não apenas de forma estereotipada em datas comemorativas. A relevância dessas manifestações está na compreensão de que elas são práticas constituídas por aspectos identitários dos grupos que as vivenciam, em suas histórias, personagens, expressões corporais características e musicalidade. Esses saberes possibilitam articular diferentes linguagens (corporal, musical, artística, oral) e promover diversificadas experiências de aprendizagem com as crianças.

Por meio das danças, as manifestações culturais afro-brasileiras podem ser abordadas e afirmadas, a exemplo do jongo, do congo, do maracatu, do maculelê e da capoeira. Dessa maneira, investe-se em construir currículos que promovam maior equidade entre saberes e culturas, na direção de desenvolver a educação das relações étnico-raciais na Educação Infantil, com vistas a elevar a autoestima das crianças negras e desmantelar institucionalmente o racismo que estrutura a nossa sociedade. Vale ressaltar que não se trata de substituir uma cultura pela outra, mas de produzir uma rede de diálogos entre elas, para que as crianças negras não cresçam com sentimento de inferioridade e as brancas de superioridade.

Em termos de contextualização da temática, destacamos que, em estudo (Bolzan; Martins; Mello, 2022), verificou-se que as danças populares, ao mesmo tempo em que são consideradas pelos professores como conhecimentos importantes e utilizadas para fomentar as relações étnico-raciais, são também ponderadas como um tema sensível. Observa-se que há receios sobre a percepção das famílias em aceitarem que as crianças vivenciem ritmos afro-brasileiros, sobretudo por acreditarem que essas manifestações culturais possuem relações com religiões de matriz africana.

No enfrentamento desses desafios, Fávero (2022), a partir de pesquisa-ação existencial pela qual propôs a tematização das danças populares na Educação Infantil em um Centro Municipal de Educação Infantil de Vitória/ES, demonstrou que é possível realizar propostas pedagógicas com o ensino das danças populares ao longo do ano letivo, explorando seus contextos, histórias, personagens, musicalidade e corporeidade para além do trato superficial e que valoriza a dança apenas nas apresentações em datas comemorativas, geralmente com passos externamente orientados pelo professor. Fávero (2022) desenvolveu ações que buscaram descontruir a mediação pautada no adultocentrismo e possibilitar o exercício das agências das crianças. A autora concluiu que o ensino das danças populares abre inúmeras possibilidades, incluindo a educação da e para as relações étnico-raciais na infância.

Essas iniciativas se articulam à obrigatoriedade, prevista nas Leis nº 10.639/2003 e nº 11.645/2008, as quais alteram a Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Nacional nº 9.394/1996, do ensino da história e da cultura afro-brasileira na educação brasileira. Destacamos um contexto que, em meio a debates, pressiona por mudanças nos campos político, discursivo e praticado nas instituições educativas, na abordagem da diversidade de saberes de modo a desconstruir o paradigma de dominação cultural. Institucionalizar a educação das relações étnico-raciais sugere análises conceituais e estruturais na organização curricular, já que currículos monocromáticos têm se mostrado incapazes de contemplar a diversidade cultural das crianças e famílias brasileiras, sobretudo quando lançamos foco nos saberes das culturas afro-brasileiras, que acabam por ocupar um lugar de inferioridade. Para Gomes (2012, p. 105, grifo nosso), “[...] a mudança estrutural proposta por essa legislação abre caminhos para a construção de uma educação antirracista que acarreta uma ruptura epistemológica e curricular, na medida em que torna público e legítimo o falar sobre a questão afro-brasileira e africana”.

Nesse contexto, em diálogo com autores e autoras que discutem currículos, epistemologias e perspectivas decoloniais, o objetivo deste ensaio é reunir reflexões sobre arranjos curriculares outros, que contemplem as diversidades e as diferenças culturais por meio das danças populares afro-brasileiras, que historicamente têm sido silenciadas ou tratadas de maneira caricata e superficial nas instituições escolares. Assim, em termos metodológicos, selecionamos referências para interlocuções que abarcam a perspectiva de ancoragem (estudos decoloniais), os tópicos articulados (currículo, práticas antirracistas e danças), as bases legais vinculadas (no caso, ao ensino da história e da cultura afro-brasileira) e dados contextuais, no horizonte de combinar descrição, análises e proposições na composição de reflexões situadas no campo da Educação Infantil.

Pensar e fazer perspectivas de currículos antirracistas

Especialmente nos últimos anos, observamos avanços na produção acadêmica em relação à abordagem das temáticas curriculares a partir de perspectivas decoloniais (Gomes, 2012; Oliveira, 2018; Passos, 2019; Pavan; Tedeschi, 2021; Nascimento; Castro, 2021), inclusive com foco na Educação Infantil (Passos; Pinheiro, 2021; Santana, 2020). As perspectivas decoloniais ou a decolonialidade[2] vão de encontro às colonialidades que perpassam os tempos históricos e que, ainda na contemporaneidade, (re)produzem lógicas econômicas, políticas, cognitivas e culturais dos colonizadores, mesmo após o término da dominação direta representada pelo colonialismo.

Quando refletimos sobre os currículos escolares, é imprescindível que falemos sobre as diversidades e as diferenças que constituem as crianças e os estudantes que estão sendo formados por esse conjunto de conhecimentos materializados em documentos (base comum, diretrizes, orientações curriculares) e mobilizados cotidianamente por meio das práticas e dos fazeres escolares. A definição usual de grade curricular remete à ideia daquilo que é fechado, engessado e é justamente na contramão dessa premissa que argumentaremos neste texto. Conforme Silva (2021, p. 101), entendemos o currículo de forma ampla, como texto curricular, representado pelo “livro didático e paradidático, as lições orais, as orientações curriculares oficiais, os rituais escolares, as datas festivas e comemorativas” e outras ações, os quais estão impregnados de narrativas étnicas e raciais. Desse modo, o currículo não é apenas o que está prescrito nos documentos, mas, sobretudo, estrutura-se pelas relações das crianças com seus pares, com os profissionais da instituição escolar e com o próprio conhecimento pedagogizado. Por isso, no título deste ensaio, sugerimos currículos antirracistas com a Educação Infantil, uma vez que o compreendemos como um dispositivo vivo e relacional.

Situando esse entendimento na conjuntura brasileira, além do colapso provocado pela pandemia da Covid-19, “vivenciamos um período político conturbado e de forte retrocesso em políticas sociais e culturais, marcado por perspectivas conservadoras e reacionárias” (Candau, 2020, p. 678). Como exemplo, em 2020, tem-se a divulgação da declaração do então ministro da Educação Abraham Weintraub, proferida durante uma reunião ministerial, que causou grande repercussão: odeio o termo povos indígenas, odeio esse termo. Odeio. Povos ciganos. Só tem um povo nesse país [...][3]. Ainda assim, na contramão desse contexto em que se tem autorizado a propagação de discursos de ódio às diferenças, os movimentos sociais e a produção acadêmica não têm se intimidado e se omitido no enfrentamento dessas narrativas (Gomes; Silva; Brito, 2021).

Não raro nos deparamos com a expressão de que somos todos iguais e, quando trazemos esse debate para o âmbito social e cultural, sobretudo na construção das identidades e dos currículos escolares, é imprescindível fazermos o movimento contrário, o de afirmação das diferenças, pois elas se encontram na “base dos processos educativos, mas necessita[m] ser identificada[s], revelada[s], valorizada[s]” (Candau, 2013, p. 25). É justamente no pensamento de que somos todos iguais que se perpetuam práticas meritocráticas e se negligenciam dívidas históricas com os grupos que foram/são exterminados, explorados, violentados e silenciados, desconsiderando suas lutas e as desigualdades que constituíram e estruturam a nossa sociedade.

Para Munanga (2010), o racismo à brasileira possui peculiaridades que o diferenciam de outras formas explícitas de sua manifestação, como na Alemanha nazista, no apartheid na África do Sul ou nos Estados Unidos da América até os anos 1960. Para grande parte dos brasileiros e das brasileiras, está cristalizada a ideia de que não somos racistas e é esse pensamento forte e poderoso que institui o mito da democracia racial brasileira, “que funciona como uma crença, uma verdadeira realidade, uma ordem. Assim fica muito difícil arrancar do brasileiro a confissão de que ele é racista” (Munanga, 2010, p. 170). Há uma tendência em associar o preconceito racial às diferenças de classe econômica e não à compreensão sobre a superioridade do branco e a inferioridade do negro, “o que é a voz do mito de democracia racial brasileira, negando os fatos às vezes tão gritantes da discriminação racial no cotidiano do brasileiro” (Munanga, 2010, p. 172).

Segundo Sodré (2017), urge uma distinção entre o diverso e o diferente, ou seja, a diferenciação entre o universal concreto de toda a existência humana (a diversidade ou a pluralidade existencial de pessoas) e um universal abstrato (a diferença), construção lógica da metafísica europeia. Ainda segundo o autor, historicamente, a construção de definição de humano vinha desconsiderando a alteridade a partir de padrões hierárquicos estabelecidos pela cosmologia cristã e implicitamente referendados pela filosofia secular.

Daí provém o julgamento epistêmico de que o Outro (anthropos – não europeu) não tem plenitude racional, logo, “seria ontologicamente inferior ao humano ocidental. É um juízo que na prática abre caminho para justificação das mais inomináveis violências” (Sodré, 2017, p. 12-13). Violências essas que são autorizadas e reproduzidas cotidianamente por atores e instituições sociais, em diferentes níveis de (in)visibilidades: a desigualdade de acesso da população negra às universidades e a empregos de maior renda e status social, os sutis olhares de menosprezo para o cabelo black, até a diferença no recebimento de carinho da professora na Educação Infantil pelo fato de ser uma criança negra (Oliveira; Abramowicz, 2010). Concordamos com Sodré (2017, p. 19) que a destruição do racismo pressupõe “[...] um conhecimento da diferença, que supõe a sua pluralidade numérica e espacial, assim como a atribuição de uma identidade a ser sensivelmente reconhecida. Sem o reconhecimento no plano dos afetos, não se cria a solidariedade imprescindível à aproximação das diferenças”. Nesse sentido, é necessário construir e fortalecer outras mentalidades sobre humanização e reafirmar as diferenças como características inerentes aos seres humanos, para que as crianças desenvolvam suas subjetividades distantes de estereótipos que associam os povos negros, seus corpos, suas histórias e suas culturas aos estigmas de feiura, pobreza, criminalidade e inferioridade.

Nesse propósito, cabe considerar que, conforme Silva (2021), os conceitos de diferença e de identidade se constituem em um processo relacional. Ambos não podem ser considerados um fato ou uma coisa, pois dependem da construção discursiva em constante transformação e só existem em mútua dependência. “É por isso que a teoria social contemporânea sobre identidade cultural e social recusa-se a simplesmente descrever ou celebrar a diversidade cultural” (Silva, 2021, p. 101), pois a diversidade também não possui uma definição fixa, é resultado de um processo histórico e discursivo de construção das diferenças.

Entretanto, ao longo do tempo, houve a produção e a propagação da padronização de humano, de conhecimento válido, de cultura e de sociedade. Segundo Lander (2005), é por meio da naturalização das relações sociais, representadas pela modernidade, como a expressão de tendências espontâneas e naturais, que a sociedade liberal constitui a ordem social única e desejável: uma sociedade sem ideologias, com modelo civilizatório único, globalizado, universal, que torna desnecessária a política, pois não há alternativas possíveis a esse modo de vida. Pelo caráter universalizador da experiência europeia, as formas de conhecimento desenvolvidas para a compreensão dessa sociedade se converteram nas únicas válidas. Essa construção eurocentrada,

[...] pensa e organiza a totalidade do tempo e do espaço para toda a humanidade do ponto vista de sua própria experiência, colocando sua especificidade histórico-cultural como padrão de referência superior e universal […] as outras formas de ser, as outras formas de organização da sociedade, as outras formas de conhecimento, são transformadas não só em diferentes, mas em carentes, arcaicas, primitivas, tradicionais, pré-modernas (Lander, 2005, p. 13).

Indagando o olhar eurocêntrico e colonizado sobre o conceito de humano, de cultura e de conhecimento, emergem estudos denominados, entre outros termos, como decoloniais e pós-coloniais. No contexto do pensamento decolonial, Aníbal Quijano (2005) elabora o conceito de colonialidade do poder e refere-se à maneira como a dominação do centro sobre as periferias é estruturada a partir das relações de diferença étnica, de gênero e de classe, que hierarquizam o dominador e o dominado na intenção de controlar o trabalho, os recursos e a produção. Como exemplo, podemos citar a conhecida história de atrocidades do colonialismo belga no Congo a partir de 1885, que sob os argumentos de civilizar, cristianizar os pagãos e levar os benefícios do livre comércio, escravizou, mutilou, violentou e matou inúmeros homens, mulheres e crianças durante a exploração de matérias-primas valiosas no território africano e inclusive, em um tempo não muito distante, congoleses foram ridicularizados e exibidos em zoológico humano em 1958, na Bélgica.

Tal dominação de ordem política, econômica e cultural tenta se justificar pela raça, de modo que todos aqueles que não são europeus são classificados como uma raça humana inferior, passível de dominações epistêmicas, filosóficas, científicas e linguísticas. Já as perspectivas pós-coloniais buscam denunciar diferentes formas de dominação e opressão a partir da identificação antagônica entre colonizadores e colonizados. Autores como Edward Said, Franz Fanon e Stuart Hall são representativos dos estudos pós-coloniais. Essa linha de pensamento tece críticas à modernidade eurocentrada e às suas consequências para a construção das identidades.

Por meio da ecologia do reconhecimento, Santos (2007) defende descolonizar mentalidades para produzir algo que distinga o que é produto da hierarquia e o que não é. Portanto, a questão não é apagar as diferenças, mas extinguir as hierarquias de poder que as habitam. As chamadas Epistemologias do Sul afirmam e valorizam as diferenças que permanecem depois da eliminação das hierarquias de poder e aparecem como validação de conhecimentos ancorados nas experiências de resistência de grupos sociais que “têm sido sistematicamente vítimas da injustiça, da opressão e da destruição causadas pelo capitalismo, pelo colonialismo e pelo patriarcado” (Santos, 2019, p. 17).

De acordo com Santos (2019), trata-se de um sul epistemológico, não geográfico e diverso. O objetivo é permitir que “os grupos sociais oprimidos representem o mundo como seu e nos seus próprios termos, pois apenas desse modo serão capazes de transformá-lo de acordo com suas próprias aspirações” (Santos, 2019, p. 17). Nesse sentido, o referido autor propõe a ecologia de saberes, pela qual defende que necessitamos de todos os tipos de conhecimento, tanto das práticas científicas quanto das culturas populares.

Na reunião dessas reflexões, lembramos que, conforme Gomes (2012), vivemos um momento importante no campo do conhecimento, no qual debates em torno da diversidade epistemológica encontra maior espaço nas ciências humanas e sociais. O campo da educação, ao articular teorias e práticas, participa desse processo e tem seus currículos atingidos e cada vez mais provocados a mudar. Quanto mais ampliados são o direito à educação, a universalização da educação básica e a democratização do acesso ao ensino superior, mais entram para o espaço escolar sujeitos antes invisibilizados ou desconsiderados como sujeitos de conhecimento. Assim, eles chegam com suas histórias, demandas políticas, valores, corporeidade, condições de vida, sofrimentos e vitórias, colocando em xeque currículos colonizados/colonizadores e exigindo propostas emancipatórias (Gomes, 2012). É nesse contexto

[...] que se encontra a demanda curricular de introdução obrigatória do ensino de História da África e das culturas afro-brasileiras nas escolas da educação básica. Ela exige mudança de práticas e descolonização dos currículos da educação básica e superior em relação à África e aos afro-brasileiros. Mudanças de representação e de práticas. Exige questionamento dos lugares de poder. Indaga a relação entre direitos e privilégios arraigada em nossa cultura política e educacional, em nossas escolas e na própria universidade (Gomes, 2012, p. 99-100).

No intuito de abordar proposições de mudanças nos currículos, ao analisar o Projeto Político Pedagógico da Escolinha Maria Felipa, instituição de Educação Infantil da cidade de Salvador, Santana (2020) observou a construção de um calendário decolonial no qual as temáticas trabalhadas são baseadas em datas comemorativas que mesclam os feriados nacionais católicos, as festividades populares locais, as mitologias de matrizes africanas e as datas festivas dos povos indígenas. Projetos como esse abarcam uma dinâmica que compreende os variados olhares para o mundo, de diferentes culturas, valorizando a diversidade cultural e intelectual dos povos, apresentando às crianças o potencial educativo constitutivo na diversidade. Desse modo, colocam-se as crianças (sejam elas negras, pardas ou brancas) em um mundo real, em que não existe centro em uma cultura dominante (Santana, 2020).

Nessa busca de alternativas para a produção de currículos que dialoguem com perspectivas decoloniais, é relevante mencionar a proposta de Trindade (2005) para a abordagem dos valores civilizatórios afro-brasileiros na Educação Infantil. A autora destaca a África em toda a sua diversidade e os africanos e as africanas trazidos ou vindos para o Brasil e que marcaram e instituíram valores civilizatórios em nosso país. Valores esses presentes na memória, no modo de ser, na literatura, na ciência, na arquitetura, na gastronomia, na religiosidade, na pele e no coração. Alguns dos princípios compartilhados por Trindade (2005) são: energia vital, oralidade, circularidade, corporeidade, musicalidade, ludicidade e cooperatividade.

Avançando para a ancoragem conceitual, no âmbito das teorias de currículo, Lopes e Macedo (2011) apresentam algumas concepções que contribuem para entendermos a importância desse dispositivo e seus desdobramentos no cotidiano escolar. Dentre elas, temos o currículo como seleção e organização do que vale a pena ensinar, pois sabemos que abarcar toda a produção de conhecimento produzida na história da humanidade torna-se uma tarefa impossível e, assim, justifica-se a necessidade dos recortes. Com isso, cabe-nos analisar que discursos e construções estão sendo privilegiados (em detrimento de outros) e como esse currículo dialoga com a realidade das crianças brasileiras, entendendo também que, quando se opta pelo que será ensinado, escolhe-se igualmente o que não será.

A estrutura da escola moderna, por meio do currículo, exerce formas de controle ao contemplar determinados conhecimentos, dado que valoriza maneiras de ser e de existir. Assim, crianças que não aprendem ou que não se adequam ao modelo imposto são culpabilizadas ou dividem essa responsabilidade com professoras que não sabem ensinar. Enfim, como construção discursiva, (re)produtor de linguagem e lugar de práticas sociais, o currículo constrói subjetividades, molda e produz identidades:

Assim como as tradições que definem o que é currículo, o currículo é, ele mesmo, uma prática discursiva. Isso significa que ele é uma prática de poder, mas também uma prática de significação, de atribuição de sentidos. Ele constrói a realidade, nos governa, constrange nosso comportamento, projeta nossa identidade, tudo isso produzindo sentidos. Trata-se, portanto, de um discurso produzido na interseção entre diferentes discursos sociais e culturais que, ao mesmo tempo, reitera sentidos postos por tais discursos e os recria. Claro que, como essa recriação está envolta de relações de poder, na interseção em que ela se torna possível, nem tudo pode ser dito (Lopes; Macedo, 2011, p. 41).

Assim, enquanto lugar de poder, o currículo é um valioso instrumento, também utilizado por governos que desejam alterá-lo conforme os seus ideais – e/ou de seus eleitorados. No cenário brasileiro, vemos que, historicamente, ao invés de os currículos serem pautas de políticas de Estado, acabam sendo manobrados por políticas de governos. Esse contexto acende um sinal de alerta, pois o sistema educacional fica à mercê de movimentos como exclusão ou inclusão de componentes curriculares e censura a temas equivocadamente considerados inadequados, como o racismo, o sexismo e o machismo, por exemplo, sem quaisquer argumentos de relevância científica ou social e que vão de encontro aos princípios democráticos, da liberdade e da solidariedade.

Por todos esses elementos apresentados, consideramos a importância de compreender o currículo como lugar de poder, mas também considerar o consumo produtivo (Certeau, 2014) que a comunidade escolar faz com o que lhes é apresentado. Com isso, cabe indagar: quais são os usos que as professoras fazem dos conteúdos? Como escolhem o que tematizarão? Como encaminham e negociam as ênfases, tonalizações, destaques e silenciamentos? Nessa perspectiva, entendemos o currículo como um dispositivo vivo, compostos por documentos, leis e, principalmente, pelas maneiras e artes de fazer (Certeau, 2014) das professoras em suas mediações com as crianças.

A fim de enfrentar o caráter homogeneizador e monocultural da escola e estabelecer outra compreensão das relações entre educação e cultura(s), partimos da compreensão do espaço educativo como cruzamento de culturas, como algo fluido e complexo. Para além do multiculturalismo na abordagem descritiva, Candau (2013) nos alerta sobre o multiculturalismo na perspectiva propositiva, como maneira de atuar, intervir e transformar a dinâmica social. Nesse sentido, o currículo constitui-se de maneira ampliada, como projeto político-cultural, como política pública na radicalização da democracia, com propósito de construir estratégias pedagógicas.

Nessa perspectiva propositiva, Candau (2013) também contextualiza a perspectiva intercultural para compreensão dos currículos. A visão intercultural promove a inter-relação entre diferentes grupos culturais e concebe a cultura em contínuo processo de elaboração, hibridização e transformação. Em resumo, a interculturalidade é

[...] um paradigma outro, que questiona e modifica a colonialidade do poder, enquanto, ao mesmo tempo, torna visível a diferença colonial. Ao agregar uma dimensão epistemológica outra a esse conceito – uma dimensão concebida na relação com e através de verdadeiras experiências de subordinação promulgadas pela colonialidade – a interculturalidade oferece um caminho para se pensar a partir da diferença e através da descolonização e da construção e constituição de uma sociedade radicalmente distinta (Walsh, 2019, p. 27, grifos nossos).

No bojo dessas reflexões, situadas em perspectivas de currículos antirracistas, propomos focalizar as práticas expressivas do corpo, mais particularmente as danças populares, como possibilidade de contribuição ao trabalho educativo na Educação Infantil.

Danças e conhecimentos populares: o lugar nos currículos

Quando tratamos das práticas expressivas do corpo e dos elementos ligados à corporeidade no ambiente escolar, por vezes encontramos entraves sobre o que é permitido, adequado ou não. Como exemplo, observamos que, em 2019, ganhou repercussão e dividiu opiniões o Projeto de Lei (PL) 494/2019[4], que proibiu a abordagem de algumas danças nas escolas do estado de Pernambuco. Embora o referido projeto não faça referência direta, o passinho, dança que surgiu nas periferias do estado e que virou sucesso entre jovens, teria sido uma das motivações da deputada que apresentou o projeto.

Segundo o então presidente da Ordem dos Advogados/PE, o projeto seria inconstitucional, pois feriria o Art. 5º da Constituição Federal, o qual veda a censura prévia. Além disso, o Art. 2º do referido projeto carece de atenção, pois dispõe que a proibição “se aplica a qualquer modalidade de dança, inclusive manifestações culturais pernambucanas”. Ações como essas vão autorizando ou não o que deve ser ofertado aos estudantes e abre brechas para interpretações de que danças originadas nos contextos populares periféricos sejam menosprezadas e banidas do ambiente escolar, fortalecendo argumento de que o conhecimento popular, além de não ser importante, é também criminalizado. Em direção oposta, Candau (2013, p. 13) lembra que “[...] não há educação que não esteja imersa nos processos culturais do contexto em que se situa [...]. Existe uma relação intrínseca entre educação e cultura(s). Estes universos estão profundamente entrelaçados e não podem ser analisados a não ser a partir de sua íntima articulação”.

Essas considerações ratificam a pertinência de as escolas estarem conectadas às necessidades e às demandas de seu entorno, aos seus profissionais e crianças/estudantes, que diariamente interagem nesses espaços. Assim, a escola é desafiada a ser mais que um lugar de transmissão do conhecimento, tornando-se um centro de promoção do diálogo entre diferentes saberes: científicos, populares e escolares (Zandomínegue; Mello, 2014). Conforme assinalamos nos tópicos anteriores, os Estudos Culturais teceram críticas contundentes ao currículo, desconstruindo o que antes era definido como padrão de educação e propondo outro olhar para a cultura popular. Segundo Mattos e Monteiro (2021), por meio da crítica aos conteúdos hegemônicos que postularam os currículos de educação, os teóricos da pedagogia crítica buscaram respeitar a diversidade e promover a equidade entre os conhecimentos.

Trazendo essa questão para a especificidade das normativas e orientações situadas no campo da Educação Infantil, cabe observar que o Referencial Nacional para Educação Infantil (RCNEI) (Brasil, 1998) já preconizava o acolhimento de diferentes culturas, valores, crenças e a valorização da pluralidade cultural na educação de crianças. Segundo o RCNEI (Brasil, 1998, p. 77), “acolher as diferentes culturas não pode se limitar às comemorações festivas, a eventuais apresentações de danças típicas ou à experimentação de pratos regionais”. O documento ressalta que essas iniciativas são interessantes e desejáveis, mas insuficientes, pois é necessário desenvolver um trabalho com a diversidade e o convívio com a diferença para ampliação dos horizontes dos professores e das crianças, partilhando do entendimento que as realidades individuais são partes de uma realidade compartilhada. Nessa direção, o RCNEI apresenta o diálogo com as famílias como estratégia fundamental para acolher as diferentes culturas e educar para a diversidade.

Posteriormente, as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEIs) (Brasil, 2010, p. 21) indicam que as propostas pedagógicas das instituições infantis devem assegurar “o reconhecimento, a valorização, o respeito e a interação das crianças com as histórias e as culturas africanas, afro-brasileiras, bem como o combate ao racismo e à discriminação”. Devem, ainda, garantir experiências que possibilitem vivências éticas e estéticas com outras crianças e grupos culturais, que alarguem seus padrões de referência e de identidades. Nesse documento, a dança aparece ao lado de manifestações como a música, artes plásticas e gráficas, teatro e literatura, na garantia de experiências que promovam o relacionamento e a interações das crianças na diversidade.

Recentemente, a Base Nacional Comum Curricular (Brasil, 2018)[5] veio reforçar a dança como linguagem corporal, pois, com o corpo, as crianças exploram o mundo, o espaço e os objetos em seu entorno, estabelecem relações, expressam-se, brincam e produzem conhecimentos sobre si, sobre o outro e sobre o universo social e cultural.

Na particularidade do contexto pesquisado, nas Diretrizes Curriculares da Educação Infantil do município de Vitória (Vitória, 2020), observamos a proposta organizada nos Temas Infantis de Vitória (TIVs): Linguagens; Processos Investigativos; Alimentação e Saúde; Diferença e Diversidade. Essas diretrizes expressam uma referência curricular aberta às variações e diferenciações desenhadas cotidianamente nas produções curriculares. Nessa perspectiva, as questões culturais, sociais e políticas, como racismo, intolerância religiosa, entre outras que perpassam os temas apresentados, devem ser problematizadas nas experiências curriculares vinculadas à diversidade, valorização cultural, identidade, saberes e práticas das crianças, das famílias, dos profissionais e dos sujeitos da comunidade local (Vitória, 2020).

Nesse sentido, somamos com Sborquia e Neira (2008) e Diniz e Darido (2015), que entendem que as danças populares como conhecimento no currículo escolar podem produzir a compreensão de diferentes culturas. Ao interpretarem o currículo como campo político em que se constroem identidades, Sborquia e Neira (2008) defendem a tematização de uma variedade de danças que compõem o patrimônio cultural corporal, pois geralmente as danças populares são desvalorizadas em detrimento das danças midiáticas, desse modo reproduzindo um ciclo de exaltação de determinados grupos sociais sobre outros. Ainda segundo os autores, com o avanço da tecnologia e da globalização, observa-se a tendência à universalização e à padronização de hábitos que culminam na homogeneização cultural e, nesse cenário, as manifestações populares despontam como um elemento de resistência ao mobilizarem e representarem diferentes identidades. No campo da Educação Física, Neira (2018, p. 9) nos convida a refletir sobre o Currículo Cultural da Educação Física, o qual pretende

[...] borrar fronteiras, conectar manifestações dispersas e promover a análise e o compartilhamento dos seus significados. Parte do princípio de que se a escola for concebida como ambiente adequado para discussão, vivência, ressignificação e ampliação da cultura corporal, será possível almejar a formação de cidadãos que identifiquem e questionem as relações de poder que historicamente impediram o reconhecimento das diferenças. Afinal, em uma sociedade democrática é importante indagar por que determinados esportes, brincadeiras, danças, lutas ou ginásticas são tidos como adequados ou inadequados.

Nessa direção, para que as danças sejam tematizadas na Educação Infantil e contribuam para a construção de currículos decoloniais, fazem-se necessárias também leituras e usos decolonizados dessas práticas corporais. Em termos procedimentais, culturalmente, permeia o imaginário geral que a dança ainda está associada aos padrões de movimento de difícil aprendizagem e/ou que é uma prática apropriada para o público feminino.

Segundo Baldi, Marques e Nascimento (2019), pensar a decolonialidade na dança inclui abordá-la pedagogicamente para além dos passos codificados, pois essa manifestação cultural possui outros conteúdos, como a criação e a musicalidade, por exemplo. Metodologicamente, ao explorar as formações em roda, em grupos e ao usarmos filas, possibilitamos que as crianças revezem as posições de destaque. Ao fazermos variados usos das danças populares, partimos do pressuposto de que qualquer pessoa/criança/estudante pode dançar. Ao dançar, a criança aprende e interage com o conhecimento que é corporalizado, valorizando não apenas o saber intelectual, mas também suas emoções e o movimento.

Mesmo diante de um modelo de educação que ainda tem nos empurrado para a cultura norte-centrada, outras culturas têm resistido taticamente nas sociedades e nas escolas. Quais são as resistências? E, na prática, como é possível viver o currículo que contemple a interculturalidade? Como as professoras e os professores tematizam as danças populares para adentrar as relações étnico-raciais? No diálogo com essas questões, entendemos que a formação continuada é um dos caminhos para que possamos promover espaços de troca, de reflexão e de produção de conhecimento de forma coletiva, ancorados nas práticas escolares. Nesse sentido, acompanhamos Silva e Portela (2022) na argumentação de que uma educação afrocentrada colabora para repensarmos a atuação docente e os currículos de formação inicial e continuada com vistas à superação do modelo eurocêntrico sobre o qual foram estruturados e assim localizar a história, a cultura e os conhecimentos produzidos pelos povos africanos e afro-brasileiros na composição curricular.

Recorremos novamente à Trindade (2005) para defender a incorporação dos valores civilizatórios afro-brasileiros no trabalho pedagógico com as danças populares. Presentes na memória, nos modos de ser, na música, na literatura, na gastronomia, nas danças, esses valores são

[...] princípios e normas que corporificam um conjunto de aspectos e características existenciais, espirituais, intelectuais e materiais, objetivas e subjetivas, que se constituíram e se constituem num processo histórico, social e cultural. E apesar do racismo, das injustiças e desigualdades sociais, essa população afrodescendente sempre afirmou a vida e, consequentemente, constitui o/s modo/os de sermos brasileiros e brasileiras.

Para detalhar, assinalamos que, dentre os aspectos afro-brasileiros apontados por Trindade (2005), temos o princípio da energia vital, no qual tudo que é vivo e que existe tem axé, energia vital: plantas, água, pedras, pessoas, animais, ar, tudo é sagrado e está em constante relação. Esse entendimento nos leva a valorizar, sem discriminação, diferentes seres, com suas histórias e culturas. Ao trabalhar com o maracatu, podemos explorar as histórias dos Orixás[6] e suas relações com os elementos da natureza: o mar, os rios, as florestas e o ar. Essa abordagem possibilita a construção de outra visão de mundo e a compreensão de que, como humanos, somos apenas parte de um todo, que é coletivo e conectado. É importante frisar que, do ponto de vista pedagógico, o interesse está no aspecto cultural dos movimentos corporais presentes no maracatu, não no ensino da religião em si. Nesse sentido, as Diretrizes Curriculares da Educação Infantil de Vitória (Vitória, 2020, p. 136) ponderam que

Os estudos das diferentes sociedades e culturas traduzidos nos conhecimentos da Arqueologia, da História, da Antropologia, da Geopolítica, têm demonstrado, por meio das danças, da música, da arquitetura, da arte, dos símbolos, dos escritos sagrados, dos mitos e dos ritos, que os fenômenos religiosos fazem parte da construção humana, pois estão presentes em todas as sociedades.

Ainda nesse âmbito metodológico, destacamos que nossa expressão oral é carregada de sentidos, de marcas da nossa existência. Por meio dos contos, das lendas, da história das danças e dos grupos que dançam, podemos proporcionar às crianças serem contadoras de histórias, compartilhadoras de saberes, memórias, desejos e fazeres pela fala (Trindade, 2005). A utilização da história possibilita a contextualização, a produção de sentidos e, ao mesmo tempo em que se constitui o preparo do terreno enquanto elemento introdutório, a história vem e vai ao longo do processo, pois as crianças por si mesmas produzem as conexões com o vivido e o contado.

A roda tem grande importância enquanto valor civilizatório afro-brasileiro: significa movimento, circularidade, renovação, processo, coletividade. Essa formação está presente em inúmeras danças populares, a exemplo dos sambas, dos jongos, da capoeira, dos cocos, do carimbó, pelas quais podemos trabalhar o dançar junto, o aprender com o outro. Rodas fazem com que movamos nossos corpos e a corporeidade é outro elemento importante na perspectiva afro-brasileira, pois com o nosso corpo vivemos, existimos e somos mundo. Portanto, valorizar os corpos das crianças como possibilidades de construções, produções de saberes e conhecimentos coletivizados e compartilhados pode ser uma estratégia didática importante. Nesse caso, trata-se de conhecer elementos específicos de uma determinada dança, a exemplo do frevo, mas também de juntos criarmos nomes para os passos, desenvolvermos nossa própria forma de dançar, o nosso frevo.

A musicalidade é mais um aspecto muito presente na Educação Infantil e nos costumes da brasilidade em geral. Trindade (2005, p. 34) nos convida a não nos restringirmos às “músicas estereotipadas, o mesmismo que vemos na TV”, e a valorizar músicas que falem da nossa cultura. O Brasil é um país rico em diversidade rítmica, musical e nas danças. Podemos viajar e conhecer o Brasil inserindo as crianças nos conhecimentos sobre o jongo, o congo, os maracatus, os sambas, a capoeira, o carimbó, a chula, o tambor de crioula, as cirandas, os cocos e tantos outros ritmos.

Nas culturas afro-brasileiras, a ludicidade ainda aparece como celebração da vida: incorporar os elementos brincantes presentes nas danças, o riso, a diversão, a possibilidade de criação livre e espontânea permitirá à criança produzir sentidos próprios ao se apropriar dos ritmos. Não se trata apenas de aprender sobre as danças e a dançar, mas também de brincar de dançar.

Com as reflexões apresentadas, como síntese, advogamos que as maneiras de operar com as danças no contexto da Educação Infantil podem transitar entre as diferentes áreas de conhecimento, múltiplas linguagens e sujeitos que interagem na educação das crianças, fortalecendo a potência de uma organização curricular que se liberta da lógica disciplinar. Enquanto conteúdo, as danças e os ritmos populares, impregnados de diversidade étnica e racial, podem oferecer espaços para que as diferentes crianças possam agir e pensar por si mesmas na relação com os saberes mediados e exerçam lugar de coparticipantes nos processos de ensino-aprendizagem (Mello et al., 2020).

Considerações finais

Na abordagem das danças populares na constituição de currículos antirracistas na Educação Infantil, à guisa de conclusão retomamos os três unicórnios – o capitalismo, o colonialismo e o patriarcado – trazidos por Santos (2020) para observar que o capitalismo provavelmente nos levará a consumir determinados tipos de danças, aquelas que induzam ao consumo por meio da indústria cultural, cada vez mais fluida e rápida: na era dos tik tokers, a dança chega até nós por um click. Daí emerge a potência da indagação: será que existem danças outras?

No vigor das problematizações (re)significadoras das docências e do trabalho educativo, com esse ensaio convidamos o leitor/a leitora a indagar sobre nossos preconceitos encarnados, no horizonte de compreender a potência na diversidade e na diferença. Nessa perspectiva, focalizamos as vivências das danças de maneira plena, propondo a desconstrução de estereótipos que perpetuam a existência de uma única forma bonita e correta de dançar (fruto de uma educação marcada pelas colonialidades) ou que preconizam que as danças são próprias do universo das meninas (como dita o patriarcado).

Na articulação com o compromisso de garantir currículos antirracistas no contexto da Educação Infantil, sabemos que a adoção de posturas antirracistas nos contextos pessoais e profissionais não acontece de maneira automática e imediata, elas são processuais e exigem investimento formativo, pautado nas redes dialógicas entre formadores e professores, entre sujeitos e práticas cotidianas. Além da obrigatoriedade legal que determina a inclusão de conteúdos da cultura africana e afro-brasileira na formação inicial de professores e de professoras, municípios, estados e governo federal precisam garantir políticas antirracistas como pilar da educação brasileira. Desse modo, esse ensaio é também a afirmação do direito à formação, um direito ampliado, que possa abarcar vivências de reconhecimento das práticas expressivas do corpo, no bojo das perspectivas de currículos antirracistas.

Se mediar com a criança padrão pode parecer mais confortável (sobretudo em tempos de ataques à autonomia do trabalho docente), por outro lado, as práticas pedagógicas que investem em reconhecer e, sobretudo, mobilizar aprendizagens tendo as diferenças como ponto de partida são (mesmo com desafios) espaços de construção partilhada e, portanto, investimentos de formação. Nessa direção, constituem também um chamado para que nós, professoras e professores, assumamos uma postura ética e política frente às realidades nas quais estamos inseridos, confluindo diferentes saberes, culturas, histórias de vida, incluindo as nossas trajetórias como ser cultural em constante transformação. Paulo Freire já nos alertou que a educação não transforma o mundo. Educação muda as pessoas. Pessoas transformam o mundo e, talvez enfim, alcancemos um paradigma que não separe “corporeidade, cognição, emoção, política e arte. Um paradigma que compreende que não há hierarquias entre conhecimentos, saberes e culturas [...]” (Gomes, 2012, p. 102). Assim, esse ensaio representa, em síntese, nossos diálogos com documentos curriculares e autores e autoras que discutem epistemologias, currículos e perspectivas decoloniais, com vistas a mover convites a experimentações de currículos outros, no horizonte de reunir investimentos em ações na direção a uma educação antirracista.

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Notas

[1] São aquelas produzidas por pessoas comuns, em suas diferentes maneiras e artes de fazer o cotidiano (Certeau, 2014). Nessa perspectiva, para compreendermos as culturas, faz-se necessário nos debruçarmos sobre o consumo e sobre os usos peculiares que os praticantes fazem das práticas culturais.
[2] Para Bernardino-Costa, Maldonado-Torres e Grosfoguel (2018, p. 10) a decolonialidade “reside na sua capacidade de esclarecer e sistematizar o que está em jogo, elucidando historicamente a colonialidade do poder, do ser e do saber e nos ajudando a pensar em estratégias de transformar a realidade”.
[3] Matéria disponível em: https://oantagonista.uol.com.br/brasil/weintraub-odeio-o-termo-povos-indigenas/. Acesso em: 13 set. 2022
[4] Matéria sobre o PL disponível em: https://marcozero.org/projeto-que-proibe-passinho-nas-escolas-e-inconstitucional-alerta-presidente-da-oab/. PL disponível em: http://www.alepe.pe.gov.br/proposicao-texto-completo/?docid=4966&tipoprop=p. Acesso em: 13 set. 2022.
[5] Barbosa, Martins e Mello (2019) realizaram análises sobre a BNCC e concluíram que o documento traz avanços para a Educação Infantil no que se refere à concepção de infância e à organização curricular, mas também um retrocesso ao se apresentar como um material prescritivo.
[6] Os deuses do Candomblé são genericamente chamados de Orixás. Genuinamente brasileiro, o Candomblé é uma religião cujo país de ascendência tem seus adeptos generalizados como “povo santo” (Martins, 2018, p. 33).
Como citar BOLZAN, Érica; CÔCO, Valdete; MELLO, André da Silva. As danças populares na perspectiva de currículos antirracistas com a educação infantil. Revista Espaço Currículo, v. 17, n. 3, e67138, 2024. DOI: 10.15687/rec.v17i3.67138

Autor notes

1 Doutora em Educação Física pela Universidade Federal do Espírito Santo. Docente no Instituto Federal do Espírito Santo.
2 Doutora em Educação pela Universidade Federal Fluminense. Docente na Universidade Federal do Espírito Santo.
3 Doutor em Educação Física pela Universidade Gama Filho. Docente na Universidade Federal do Espírito Santo.
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