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OLHOS DE VIDRO, “BLACK MIRRORS”: agenciamento biopolítico no currículo das narrativas midiáticas seriadas
GLASS EYES, BLACK MIRRORS: biopolitic agency in the curriculum of serial media narratives
OJOS DE VIDRIO, “BLACK MIRRORS”: ensemblaje biopolítico en el curriculum de narrativas mediáticas seriales
Revista Espaço do Currículo, vol. 16, núm. 1, pp. 1-16, 2023
Universidade Federal da Paraíba

Demanda Contínua

Revista Espaço do Currículo
Universidade Federal da Paraíba, Brasil
ISSN: 1983-1579
Periodicidade: Cuatrimestral
vol. 16, núm. 1, 2023

Recepção: 29 Junho 2022

Aprovação: 22 Agosto 2022


Este trabalho está sob uma Licença Internacional Creative Commons Atribuição 4.0.

Resumo: O presente artigo toma de empréstimo uma frase de um famoso canal televisivo – “Não é TV. É HBO!” – e a reformula no sentido de mostrar um panorama investigativo que evidencia a emergência de um determinado artefato cultural: as narrativas midiáticas seriadas. O objetivo é o de evidenciar que uma narrativa seriada “Não é TV. Mas é currículo!”, a partir de contribuições das teorizações pós-críticas em intersecção com o campo dos estudos culturais. O argumento é o de que esse currículo tem disponibilizado uma “prática da maratona” que reforça a dimensão biopolítica da constituição de uma “cultura seriadora”, que não se encerra no objeto que aqui investigamos, sendo capaz de se estender a diferentes aspectos das nossas vidas, com diferentes efeitos em nossas composições como sujeitos. Com isso, passamos a significar o currículo das narrativas midiáticas seriadas como um agenciamento biopolítico desterritorializado, isto é, uma combinação de elementos díspares cujas redes constitutivas caracterizam-se fundamentalmente pela total ausência de fronteiras, atravessando um território ilimitado que não pode ser confinado por barreiras inamovíveis. Na produção dessa “cultura seriadora”, atentamos para a regulação da vida social da audiência em um exercício particular de poder, tramando-lhe em uma rede discursiva que tem demandado múltiplas posições de sujeito para comportar o máximo possível de indivíduos. Concluímos que há aqui em jogo uma “narcotização programada da vida”, capaz de provocar o empalidecimento das nossas potências, o congelamento das nossas forças vitais e a proliferação das formas estáticas e estabilizadas a partir de redundâncias subjetivas.

Palavras-chave: Currículo, Narrativas Midiáticas Seriadas, Subjetividade.

Abstract: This article borrows a phrase from a famous television channel – “It's not TV. It's HBO!” – and reformulates it to show an investigative panorama that highlights the emergence of a certain cultural artifact: the serial media narratives. The objective is to show that a serial narrative “It is not TV. But its curriculum!”, is based on contributions from post-critical theorizations that intersect with the field of cultural studies. The argument is that this curriculum has provided a “marathon practice” that reinforces the biopolitical dimension of the constitution of a “serial culture”, which is not limited to the object that we investigate here, being able to extend to different aspects of our lives, with different effects on our compositions as subjects. With this, we come to signify the curriculum of serial media narratives as a deterritorialized biopolitical assemblage: a combination of disparate elements whose constitutive networks are fundamentally characterized by the total absence of borders, crossing an unlimited territory that cannot be confined by immovable barriers. In the production of this “serial culture”, we pay attention to the regulation of the audience's social life in a particular exercise of power, weaving it into a discursive network that has demanded multiple subject positions to contain as many individuals as possible. We conclude that there is a “programmed narcotization of life” at stake here, capable of causing the blanching of our powers, the freezing of our vital forces, and the proliferation of static and stabilized forms based on subjective redundancies.

Keywords: Curriculum, Serial Media Narratives, Subjectivity.

Resumen: Este artículo toma prestada una frase de un famoso canal de televisión: “No es televisión. ¡Es HBO!”. – y lo reformula para mostrar un panorama investigativo que destaca el surgimiento de cierto artefacto cultural: las narrativas mediáticas seriales. El objetivo es mostrar que una narrativa serial “no es TV. ¡Pero es el currículo!”, a partir de aportes de teorizaciones poscríticas que se entrecruzan con el campo de los estudios culturales. El argumento es que este currículo ha proporcionado una “práctica de maratón” que refuerza la dimensión biopolítica de la constitución de una “cultura serial”, que no se limita al objeto que aquí investigamos, pudiendo extenderse a diferentes aspectos de nuestras vidas, con diferentes efectos en nuestras composiciones como sujetos. Con esto, venimos a significar el currículo de las narrativas mediáticas seriales como un ensamblaje biopolítico desterritorializado, esto es, una combinación de elementos dispares cuyas redes constitutivas se caracterizan fundamentalmente por la ausencia total de fronteras, atravesando un territorio ilimitado que no puede ser confinado por barreras inamovibles. En la producción de esta “cultura serial” prestamos atención a la regulación de la vida social de la audiencia en un particular ejercicio de poder, entretejiéndola en una red discursiva que ha exigido múltiples posiciones de sujeto para contener la mayor cantidad de individuos posible. Concluimos que aquí está en juego una “narcotización programada de la vida”, capaz de provocar el blanqueo de nuestras potencias, el congelamiento de nuestras fuerzas vitales y la proliferación de formas estáticas y estabilizadas basadas en redundancias subjetivas.

Palabras clave: Currículo, Narrativas Mediáticas Seriales, Subjetividad.

1 INTRODUÇÃO

Começamos compondo com partes de um cenário que hoje, talvez, soe um tanto quanto datado. Um televisor de tubo em sinal analógico e sua antena ornando pedaços de lã de aço para melhorar a qualidade da transmissão. Um copo d’água em frente à televisão, aguardando pela consagração ao final de uma prece por parte de um líder religioso de algum exemplar dentre as dezenas de “sacro-canais” disponíveis no cardápio da TV aberta. Um sofá centralizado, dispondo de alguns lugares compartilháveis entre os membros da família. O poder de decisão concentrado nas mãos daquele ou daquela que detém o controle remoto. A escolha de qual será a melhor programação a ser consumida. O jorro multicolorido que atravessa aquela caixa de imagens e de sons, munido das polêmicas em torno das tramas novelescas, do estímulo pelos conteúdos apresentados pelas distintas emissoras em diferentes formas, estilos e linguagens. E como esqueceríamos exatamente deles? Os sujeitos na nossa “telinha” – que olhamos e que, por sua vez, também nos olham. Sujeitos estes retratados, esquadrinhados, valorados. E “nós”, do lado de “cá”, nos assujeitando a esse artefato, sendo produzidos/as pelos diversos e variados discursos que por ele são acionados.

Eis as imagens! O que dizer da menina favelada que deixou o apresentador do programa de calouros consternado ao afirmar ser habitante do “planeta fome”?[1] Ou como ficar inerte perante os chocantes registros do acidente fatal de Ayrton Senna, da queda do muro de Berlim ou o estarrecimento ao contemplar o segundo prédio das torres gêmeas do Word Trade Center sendo golpeado por um avião, ao vivo? E por falar em sincronicidade, foi frente à tela da TV que acompanhamos, atônitos/as, o “Caso Eloá”[2], tornando-nos irremediavelmente voyeurs a partir da interferência midiática naquela periclitante situação da jovem sequestrada pelo seu ex-namorado obsessivo. Foi através dessa “vitrine” que nos arrepiamos com a inesquecível imagem das palavras escritas em batom vermelho na vidraça do “ônibus 174” no Rio de Janeiro – “Ele vai matar geral às 6 hs”[3]. Vertigem também sentida quando fomos tomados/as de assalto pelas acachapantes imagens da força arrebatadora do tsunami na Indonésia.

Mas do horror também podemos ir à paixão: esperamos, pacientemente, o primeiro “beijo gay” em uma novela no horário nobre da maior emissora de televisão do país[4]. E da paixão podemos inflamar protestos: alguém seria capaz de esquecer das manifestações nas ruas em 2013, as chamadas “jornadas de junho”, que até hoje reverberam no cenário político do nosso país? E por falar em política, foi frente à TV que pudemos acompanhar a implacável finitude da vida na figura das personalidades que nos enredam – o misterioso assassinato do presidente norte-americano John Kennedy, a perseguição dos paparazzi franceses que resultou na trágica morte da Princesa Diane ou, mais recentemente, a covardia que tentou calar a voz da vereadora Marielle Franco. Foi também por esse “olho de vidro” que pudemos sentir queimar as labaredas de fogo que lambiam a estrutura de um dos maiores e mais importantes museus do nosso país. Longe dali, no Pantanal, os focos de incêndio ardiam e destruíam uma parcela significativa de um dos nossos mais importantes biomas – tudo registrado por câmeras em alta definição em tomadas aéreas impossíveis e impensáveis até algumas décadas. E por falar em calor, não poderíamos fechar os olhos para os inflamados espaços de disputas que são visibilizados nesse artefato – desde os debates acalorados em virtude das eleições presidenciais, passando pela votação televisionada do processo de impeachment de 2016 ou até mesmo uma enquete para decidir quem seria a nova integrante de um popular grupo de axé nos idos dos anos 1990.

A televisão tem operado, desde a sua inserção em nosso cotidiano, como uma “espécie de processador daquilo que ocorre no tecido social, de tal forma que “tudo” deve passar por ela, “tudo” deve ser narrado, mostrado, significado por ela” (FISCHER, 2017, p. 19). Em outras palavras, aquilo que não passa pelo seu escrutínio “torna-se estranho ao conhecimento e à sensibilidade do homem contemporâneo” (MACHADO, 1988, p. 8). Logo, ao optarmos em abrir este artigo com essas imagens mobilizadas pelo aparato televisivo, não fazemos por mero recurso estilístico; trata-se, pois, da compreensão de que “em maior ou menor grau, nós sempre estamos um pouco naquelas imagens”, uma vez que nos constituímos a partir delas, tomando para nós “o que alguém pensou e que tornou de algum modo visível, público” (FISCHER, 2017, p. 16).

No entanto, inspirados pelo marketing de um celebrado canal de televisão estadunidense, temos articulado outras formas de se pesquisar, na cultura da mídia, um determinado produto audiovisual que germinou na televisão, mas que, na contemporaneidade, tem se alastrado por diversos equipamentos e aparelhos tecnológicos disponíveis. “Não é TV. É HBO!”, alardeia o famoso comercial da HBO, alegando aos/as espectadores/as que a programação do referido canal vai muito além do que é exibido nos demais canais supostamente “genéricos”. Tomando por empréstimo essa mesma frase, a reformulamos no sentido de evidenciar um panorama investigativo que mostra a emergência de um determinado artefato cultural: as narrativas midiáticas seriadas. O objetivo deste artigo, portanto, é o de mostrar que uma narrativa midiática seriada “Não é TV. Mas é currículo!”, a partir de contribuições das teorizações pós-críticas em intersecção com o campo dos estudos culturais.

Estamos assumindo que o currículo inclui e excede as limitações impostas pelos esquemas escolares, pela carga horária disciplinar e pelas atribuições dadas pelos/as profissionais de Educação regulamentados/as. Nesse sentido, o currículo não se restringe ao que se dá entre os muros dos espaços escolares; ele também é produzido pelos diversos artefatos culturais que consumimos de modo supostamente despretensioso (SILVA, 2010; 2016). Afinal, “há toda uma maquinaria não-escolar atribuindo significados a lugares, coisas, fenômenos, práticas e sujeitos” (MAKNAMARA, 2011, p. 17). Tais artefatos culturais são o resultado de um processo no qual os significados gestados por um determinado grupo são atribuídos e vinculados a diferentes objetos forjados material e simbolicamente (CAMOZZATO, 2018). Essa concepção é inspirada pelos chamados “estudos culturais”, um campo teórico-político que toma por objeto “qualquer artefato que possa ser considerado cultural” (PARAÍSO, 2001, p. 69). Nesse sentido, somos autorizados a investigar as imagens veiculadas pelas narrativas midiáticas seriadas e, consequentemente, interrogar de que maneiras vida e morte se imbricam nesse processo de “pedagogização” das nossas existências.

O argumento do presente artigo é o de que o currículo das narrativas midiáticas seriadas tem disponibilizado uma “prática de maratona” com o objetivo de reforçar a dimensão biopolítica da constituição de uma “cultura seriadora”. Para dar conta desse argumento, o artigo está dividido em três partes e um tópico conclusivo. Na primeira, intitulada “Ô da poltrona!”, discutimos acerca das mudanças pelas quais a televisão passou no curso dos últimos anos e a sua concorrência com os serviços de streaming, bem como a constituição daquilo que temos compreendido como o currículo cultural das narrativas midiáticas seriadas. Na segunda parte, “Entre dragões, extraterrestres, zumbis e... escolas!”, traçamos um panorama de como esse currículo tem sido problematizado no campo das investigações educacionais e a sua intromissão nos espaços escolares. Em seguida, com “Você ainda está aí?”, argumentamos que a “maratona” de narrativas seriadas concorre para a produção de um estilo de vida próprio de uma “cultura seriadora” e que, no entanto, é capaz de se estender a diferentes aspectos da nossa vida, com diferentes efeitos em nossas composições como sujeitos. Finalizamos com “Estou ciente e desejo continuar!”, uma conclusão inspirada nos termos de consentimento de serviços de streaming, no qual apontamos que todo esse cenário tem como efeito narcótico uma racionalidade atrelada a uma certa modelização da subjetividade na contemporaneidade.

2“Ô DA POLTRONA!”[5]

Muito já foi e ainda tem sido discutido sobre o potencial pedagógico da televisão (FISCHER, 1997, 2001, 2001a, 2002, 2003, 2003a, 2017; PARAÍSO, 2001, 2001a, 2002, 2007). Parece, portanto, não restar mais dúvidas de que esse artefato compôs um cenário de inegável valor contemporâneo e de impacto direto em nosso traquejo social. Afinal, a televisão “narra, ela tece [...] histórias, seleciona estratégias de linguagem pelas quais edita vidas, aponta caminhos, ensina modos de ser, espetaculariza o humano, a qualquer preço” (FISCHER, 2001, p. 11). Seja no mais descompromissado lazer dominical, seja no acompanhamento de decisões que modificam a vida daqueles e daquelas que estão enredados/as por esse artefato cultural, a televisão “atrai, seduz, mostra, expõe, repete, multiplica” (PARAÍSO, 2001a, p. 155). Ao produzir e fazer circular incontáveis significados, inúmeros sentidos, a televisão tem participado decisivamente “na formação das pessoas – mais enfaticamente, na própria constituição do sujeito contemporâneo” (FISCHER, 2017, p. 18).

Porém, sem deixar de lado essas questões, pretendemos ampliar algumas das possibilidades investigativas que vêm sendo postas na medida em que, na contemporaneidade, a televisão ganha outros provocadores e entra em disputa com novos artefatos culturais e tecnológicos. Em uma investigação acerca dos efeitos subjetivadores da televisão no final do século XX, Fischer (2002) alude que esse aparato teria passado a ocupar um lugar especificamente mais insidioso do que aquele ao qual aparentemente fora destinado originalmente. Se antes a televisão teria o propósito de informar e divertir, a autora conclui que esse veículo havia ampliado e se revestido “de uma “seriedade” antes desconhecida” (FISCHER, 2001, p. 12), questionando-se acerca de qual seria o alcance desse novo papel atribuído e até que ponto a TV interferiria em outras instâncias, a exemplo das práticas pedagógicas.

Entretanto, já não podemos encarar a televisão como “lócus privilegiado de veiculação, reforço e também produção de certas maneiras de ser e de estar no mundo hoje” (FISCHER, 2001, p. 13). Afinal, como a própria autora pondera, a partir da revolução tecnológica e das modificações culturais pelas quais passamos nos últimos anos, “a tela da TV e tudo o que ela continua a nos oferecer [...] agora se expande para outros lugares de televisibilidade” (FISCHER, 2017, p. 7). As antigas televisões deram lugares às inteligentes smartvs; as nossas defasadas antenas “escamas de peixe” de transmissão analógica cederam o espaço em detrimento da transmissão em sinal digital em 4K (ultra definição). Hoje, a maquinaria moderna está eivada por um artefato que se impõe como o mais representativo dos nossos dias, com toda sua ubiquidade, invisibilidade, capilaridade e investimento massivo, dando sustento para a ampla difusão das narrativas midiáticas seriadas. Estamos nos referindo, logo, aos serviços de streaming.

Streaming é uma tecnologia de transmissão de dados a partir da internet que permite o consumo imediato de artefatos audiovisuais como filmes, narrativas midiáticas seriadas e músicas. O consumo pode acontecer em qualquer lugar: em nossas casas, com o plano de internet que dispomos a partir da assinatura de operadoras de telecomunicação; nos trajetos que efetuamos em transportes públicos, a partir do serviço de internet móvel com a tecnologia de 4G dos nossos smartphones; bem como nos mais diversos espaços em que transitamos, a partir do compartilhamento comunitário do sinal de wi-fi. Diversos também são os serviços ofertados e as suas plataformas correlatas – no audiovisual contamos, atualmente, com a Netflix, Prime Video, HBO Max, Disney +, Star +, Globo Play, Apple TV, entre outros que vão surgindo a cada ano. Relativamente ao mundo sonoro, consagram-se o Spotify, Deezer, Apple Music e Tidal como algumas das possibilidades de consumo de músicas e podcasts.

Inspirado pelos escritos de Hardt e Negri (2001) e Lazzarato (2014), temos compreendido o currículo das narrativas midiáticas seriadas como um agenciamento biopolítico desterritorializado, isto é, uma combinação de elementos díspares cujas redes constitutivas caracterizam-se fundamentalmente pela total ausência de fronteiras, atravessando um território ilimitado que não pode ser confinado por barreiras inamovíveis. Com isso, desejamos argumentar que não há constituição de modos de vida que estejam alheios às complexas malhas políticas, sociais e econômicas que sustentam e constituem esse maquinário globalizado de registro capitalista (LAZZARATO, 2014). É precisamente por esse fenômeno que temos significado o currículo das narrativas midiáticas seriadas como um artefato apátrida; não porque ele tenha perdido um suposto “ponto de origem” – tampouco seria essa uma preocupação a partir da perspectiva teórica que subsidia nossa pesquisa –, mas sim pela sua capacidade de planificar, de se pulverizar por todos os lugares, em todas as direções. Parece não haver, na contemporaneidade, qualquer concorrência para esse artefato em termos de alcance espacial e temporal/global, visto que ele não está centralizado em um território fixo. Com o advento dos serviços de streaming e com diferentes narrativas midiáticas seriadas chegando, ao mesmo tempo, em distintos pontos do globo[6], esse currículo tem se materializado em um aparelho descentralizado e desterritorializado.

É possível afirmar, portanto, que a tecnologia de streaming revolucionou o modo pelo qual consumimos as imagens em movimento da/na televisão. Afinal, estamos completamente desobrigados/as em assistir os conteúdos que nos interessam apenas naquele horário fixado e já estabelecido. Por outro lado, a televisão, que por muito tempo foi a máquina de difusão de conteúdo audiovisual por excelência, agora disputa, também pela força do streaming, a preferência com tantos artefatos tecnológicos sejam possíveis: notebooks, smartphones, tablets etc. A democratização do acesso aos conteúdos midiáticos também modificou substancialmente as suas formas de consumo. Se antes precisávamos de uma onerosa assinatura de TV a cabo para consumir uma parte da programação das narrativas seriadas estadunidenses, ou pelo menos de uma boa dose de cafeína para aguentar as madrugadas insones aguardando a exibição de alguma série em um canal da TV aberta [7] tal cenário modificou-se. Por uma mensalidade relativamente acessível[8] em comparativo ao elevado custo das assinaturas de canais a cabo, a atual era do streaming permite-nos acessar um catálogo cada vez mais variado e convidativo e garante a difusão em escalas gradativamente exponenciais desse artefato nas malhas de nossas vidas cotidianas.

Não se trata de desprezar o estatuto pedagógico da mídia televisiva (FISCHER, 1997) ou desconsiderar como a televisão consolidou como um dispositivo que participa “efetivamente da constituição de sujeitos e subjetividades, na medida em que produz imagens, significações, enfim, saberes que de alguma forma se dirigem à “educação” das pessoas, ensinando-lhes modos de ser e estar na cultura em que vivem” (FISCHER, 2002, p. 153). Trata-se, no entanto, de um deslocamento em torno de um determinado artefato cultural a partir das condições históricas que possibilitaram uma atualização da mídia televisiva e, consequentemente, suscitam novos olhares, novos questionamentos, novas possibilidades de investigação.

Ainda nos anos 1990 – e, portanto, bem distante do boom dos serviços de streaming que se avolumam em nosso contexto atual – Giroux (1995, p. 136) já havia nos antecipado quanto ao “poderoso papel que a mídia está, de forma crescente, assumindo na produção de imagens e de textos que penetram cada vez mais áreas da vida cotidiana”. Não reduzirei tais palavras a um dom premonitório ou uma aposta que calhou de realizar. Mas é perceptível que, ao passo em que a televisão foi se constituindo em uma refinada maquinaria pedagógica, as pesquisas tributárias do campo dos estudos culturais passaram a inquirir em torno dos mais variados aspectos que tangenciam a mídia e as suas possibilidades de educar e produzir sujeitos. Nesse sentido, não há mais nenhum aspecto das nossas vidas, por mais banal ou corriqueiro que seja, que não esteja enredado pelas imagens da mídia. Seja na transmissão em sinal analógico das antigas antenas ou na corrente de bits do sinal digital dos atuais conversores, tais imagens “tendem a fixar determinadas “verdades”, determinados conceitos universais” (FISCHER, 2017, p. 42). Se nada passava incólume sob o escrutínio intenso desse “olho de vidro”, atualmente o avanço tecnológico vem ampliando a gama de artefatos que nos captam e nos esquadrinham por meio de suas “black mirrors”[9].

O cenário que se constitui tem muito a nos dizer acerca dessa “expansão quase ilimitada dos meios tecnológicos de produção, de circulação e de troca cultural que estamos vivendo” (FISCHER, 2017, p. 29). Para Hall (1997), essa expansão apresenta tanto uma interface global, na qual a mídia apresenta-se como “um dos principais meios de circulação das ideias e imagens vigentes nestas sociedades” (HALL, 1997, p. 17), como também aponta para uma dimensão local, “igualmente penetrante no nível do microcosmo” (HALL, 1997, p. 21), modificando a vida cotidiana dos sujeitos. Seguindo esses rastros, é possível entender que os serviços de streaming têm operado de modo ainda mais substantivo do que aqueles produtos das “revoluções culturais” (HALL, 1997) da primeira metade do século XX, apontando para a sua escala e escopo globais, seu impacto no que se refere as nossas práticas mais cotidianas e sua natureza democrática e popular (HALL, 1997). Tempo e espaço tornaram-se noções flutuantes e cambiantes nessa nova era que se instaurou. Logo, sociedades distintas e seus modos de vida particulares, os sentidos e significados que nela são produzidos, bem como os hábitos e valores que as suas culturas ora acolhem, ora contestam, entram em conflitos com tantos outros sistemas de significação disponíveis, intercruzados em escalas globais.

Nesse sentido, não é sem espanto que nos deparamos em um mesmo “canal” com produtos completamente distintos, que divergem em termos de linguagem adotada, estilo visual e interpelação ao público. Basta uma breve “zapeada” pelo catálogo da Netflix para irmos de uma narrativa audaciosa sobre uma jovem que não se enquadra em sua comunidade judaica hassídica, para chegarmos a uma prosaica sitcom[10] sobre uma família de imigrantes cubanos vivendo o tão almejado american way of life em Los Angeles. A mídia das plataformas de streaming divulga uma miríade de artefatos audiovisuais para vários países diferentes, em fusos horários distintos, alcançando milhões de pessoas a um só instante. Assim, seja uma comunidade de assentados/as com acesso moderado a internet[11], seja um/a adolescente brasileiro de classe média aficionado por música pop norte-americana, seja um/a estadunidense “maratonando” uma narrativa seriada brasileira[12], é certo que os deslocamentos da cultura da mídia impactam diretamente em nossos “modos de viver, sobre os sentidos que as pessoas dão à vida, sobre suas aspirações para o futuro” (HALL, 1997, p. 18).

Cultura da mídia esta que, ao “urdir o tecido da vida cotidiana”, vem “dominando o tempo de lazer, modelando opiniões políticas e comportamentos sociais e fornecendo o material com que as pessoas forjam a sua identidade” (KELLNER, 2001, p. 9). Nesse sentido, as narrativas midiáticas seriadas podem ser compreendidas como textos curriculares capazes de ensinar “às vezes de modo mais eficiente do que as instâncias pedagógicas tradicionais, dada a sua impressionante capacidade de mobilizar sonhos e desejos” (PARAÍSO, 2010, p. 39). Ao reportar tais narrativas em termos de um “texto”, estamos nos referindo a sua composição de “signos, significados e significantes, que não somente nomeia, mas que tem efeitos produtivos sobre aquilo que significa” (PARAÍSO, 2010, p. 41). Consequentemente, ao privilegiar valores culturais específicos, ao mobilizar determinados saberes a partir de linguagens particulares, ao capturar tempos e espaços com o objetivo de envolver o seu público alvo, bem como ao fixar determinados sentidos e significados, as narrativas midiáticas seriadas têm se interessado pela produção de sujeitos na contemporaneidade. Constituem-se, portanto, em um eficiente “currículo cultural”.

Ao grafarmos “currículo cultural”, estamos aludindo a capacidade dos diferentes artefatos culturais que nos enredam – o que inclui não apenas as narrativas midiáticas seriadas, como também filmes, novelas, livros, músicas, peças publicitárias, brinquedos etc. – em nos ensinar “novas habilidades, capacidades, modelos de sociabilidade e afetividade” (MAKNAMARA, 2020, p. 59). Tal noção também nos possibilita melhor entender esse fenômeno de “ampliação dos lugares em que nos informamos, em que de alguma forma aprendemos a viver, a sentir e a pensar sobre nós mesmos” (FISCHER, 1997, p. 62), ultrapassando os muros das escolas. Logo, o espaço escolar passa a ser problematizado não mais como o único lugar de fruição do aprender, mas sim como um dos espaços possíveis e que muitas vezes antagoniza com aquilo que é ensinado por outras instâncias pedagógicas extraescolares. É essa intromissão entre um currículo cultural e os currículos praticados nas escolas que abordaremos a seguir.

3 ENTRE DRAGÕES, EXTRATERRESTRES, ZUMBIS E... ESCOLAS!

Cactáceos e formações rochosas compõem o que parece ser um cenário desértico. O céu, absolutamente limpo e azulado, entra em contraste com um objeto estranho que se avista: uma calça social bege que sobrevoa na imensidão do horizonte. O que ainda havia de pacato nesse cenário é subtraído pelo barulho dos pneus de uma van arrastando no pedregoso solo de um deserto. Dentro do veículo há três homens. O motorista, trajando apenas uma cueca e uma máscara de proteção radioativa, provavelmente o dono das calças aladas que acabamos de ver, parece estar em fuga. Somos capazes de ouvir, na parte traseira da van, sons que remetem à pequenas explosões. Um entornado caldo de substâncias químicas garante a periculosidade desse pequeno laboratório em movimento. A cena toda é frenética, inquietante, empolgante: o homem fugindo, não sabemos ainda de que ou de quem; o mistério por trás daqueles outros dois homens desacordados em companhia do motorista em fuga; o fato de o motorista estar despido; um automóvel tornando-se um laboratório químico no meio de um silencioso deserto.

Essa é a cena de abertura de “Breaking Bad”, narrativa midiática seriada que Fary e Oliveira (2017) se valem para problematizar a ciência química como “acontecimento”, isto é, um espaço possível para transgredir as supostas fronteiras entre as ciências, a filosofia e a arte. Os/as autores/as desejam “pensar em (im)possibilidades, em diferenciações no cerne da prática científica, junto à ideia de que Deleuze chama de “ciência menor””, encontrando, portanto, “maneiras marginais – sempre marginais – de olhar para a química” (FARY; OLIVEIRA, 2017, p. 3). Ainda que não manifestem explicitamente uma relação com os espaços escolares, Fary e Oliveira (2017) mostram, nesse trabalho, uma outra relação com a química escolar a partir dos encontros com a narrativa seriada que investigam. Se as vidrarias dos laboratórios da escola estavam “presas à institucionalização, à ciência maior”, elas podem se tornar “instrumentos para a produção de uma química-outra, de uma química menor que escapa à institucionalização” (FARY; OLIVEIRA, 2017, p. 9).

Do tórrido deserto do velho oeste no Novo México de “Breaking Bad”, podemos chegar até o mundo pós-apocalíptico de “The Walking Dead”. Para Silva (2017), tal narrativa exercitaria uma “pedagogia do medo do outro”, acionando diversas sensações as quais manifestam uma “crise de confiança” nesse mundo distópico que fabula. Afinal, ao longo dos episódios, “fica claro que a principal ameaça para a sobrevivência das pessoas não é a epidemia ou os zumbis, mas o “outro”, “o diferente”, que é sempre marcado como imprevisível, frio, calculista, dissimulado, que não mede esforços para atingir seus objetivos (SILVA, 2017, p. 2). Embora seja reconhecidamente uma ficção, essa série amplifica algumas problemáticas que nos são bastante verossímeis, a exemplo das parcerias virtuais como um modo de se proteger de um mal que não estaria mais localizado em um sujeito ou em uma instituição – um mal difuso, camuflado, sempre à espreita, “potencializando os medos e os dilemas sociais, assim como a faceta mais perversa da humanidade” (SILVA, 2017, p. 2).

E por falar em fantasia, passamos a vislumbrar disputas sanguinolentas pelo trono de ferro, dragões de estaturas inimagináveis e uma horda de assustadores “caminhantes da noite”. Não, não se trata de cinema, embora o seu orçamento milionário faça concorrência com filmes do grande filão de Hollywood. Nos referimos a “Game of Thrones”, narrativa seriada compreendida por Gaudenzi e Bicca (2019) como partícipe de uma intrincada relação de saber-poder que produz algumas das “verdades” anunciadas na TV[13]. Nesse sentido, não são apenas os lobos encontrados no piloto da série que são considerados ferozes – há a construção da imagem feminina “Fera” em Arya Stark, que destoa dos padrões generificados aludidos pela narrativa, em contraposição direta à “Lady” de Sansa Stark, posicionada adequadamente às normas de feminilidade hegemônica (GAUDENZI; BICCA, 2019). Por mais que a condição de fantasia épica pudesse sugerir um distanciamento total dessa ficção seriada em nossos modos de vida contemporâneos, é certo que esse artefato “ensina para seus milhões de espectadores verdades sobre ser homem e ser mulher à medida que os interpela acionando discursos que regem nossa sociedade, reiterando verdades naturalizadas de nossa época” (GAUDENZI; BICCA, 2019, p. 11).

O caráter distópico das narrativas seriadas retornam com força nas interpelações de Kopp (2019), inspiradas nas teorizações “pós-humanas”. A imagem da tela enegrecida trincada pode assustar um/a desavisado/a, achando que a própria televisão está com defeito. Não é o caso: a abertura de “Black Mirror” é eficaz em trazer o/a espectador/a para “dentro” da narrativa, tornando-se, portanto, “um espelho no imaginário coletivo” (KOPP, 2019, p. 6). Cada episódio disponibilizado pela série nos tensiona a observar nosso próprio “reflexo”, de modo relacional com as temáticas discutidas ao longo dos enredos. Entretanto, ainda que tenha caído no gosto popular por um suposto diagnóstico do nosso futuro face aos irremediáveis avanços tecnológicos, as intenções de “Black Mirror” estão mais para uma sátira do presente, tornando as mudanças na contemporaneidade ainda mais desconcertantes (KOPP, 2019).

Extraterrestes à vista! Dimensões intergalácticas, realidades alternativas, poções mágicas, laboratórios criados em lugares inimagináveis, monstros excêntricos, parasitas alienígenas, subversão das noções de tempo e espaço: muitas são as aventuras propostas na animação seriada “Rick e Morty”. Aventuras que sempre reportam à ciência, reificando um lugar de inquestionabilidade e propagando “efeitos de verdade sobre diferentes assuntos por meio de seus discursos” e contribuindo para o “processo de constituição da representação da ciência que os sujeitos possuem” (MONTEIRO; KNÖPKER, 2019, p. 2). Nessas peripécias de um cientista alcóolatra e seu neto melindroso, assistimos ao processo de produção do que seria a ciência a partir de três enunciados recorrentes: a ciência rígida e superior aos outros modos de conhecimento; a ciência elitista e individualista e a ciência como método universal da apreensão do conhecimento (MONTEIRO; KNÖPKER, 2019).

Sim, há muita fantasia no currículo das narrativas midiáticas seriadas. Há, sim, dragões e caminhantes brancos. Não há dúvidas que esteja infestado de zumbis. Podemos chegar até o espaço sideral, entrar em contato com povos de outras galáxias. Podemos nos deparar com os dispositivos tecnológicos que ultrapassam os limites da nossa imaginação. Mas também há espaço para o que há de mais corriqueiro, prosaico, ordinário: a escola, a docência, o aprender (KAPPAUN, 2017; COUTINHO, 2017; ARAÚJO, 2019). Valendo-se dos chamados “teen dramas”, isto é, narrativas midiáticas seriadas que representam a juventude e cujos protagonistas são adolescentes, Coutinho (2017) analisa como esse artefato tem se tornado um espelho de uma identidade juvenil contemporânea. Tais identidades refletem uma cultura dominantemente conservadora, mas que traz em seus rastros alguns pequenos focos de transgressão. A escola é enunciada nessas narrativas – que vão desde as aventuras de uma jovem caçadora de vampiros em “Buffy, The Vampire Slayer” a um tradicional grupo de coral no musical “Glee” – como um espaço que tanto é saudado como condenado. Saudado pois é um espaço inerentemente de sociabilidade, de laços, de conexões; condenado pela sua estrutura eminentemente opressora e injusta, seja pelos focos de bullying ou pela sua estrutura social padronizadora (COUTINHO, 2017).

Talvez uma das dimensões da escola nas narrativas seriadas seja de opressão porque a própria docência é enunciada, em alguns casos, como algo maligno. Se sintonizarmos em “O Incrível Mundo de Gumball”, podemos nos deparar com uma professora apresentada ao/a espectador/a “como alguém dotado de grande desamor pela profissão docente e grande desprezo pelos alunos”, em uma associação direta “entre educação e sofrimento, causando imensa alegria na personagem da professora” (KAPPAUN, 2017, p. 2). Embora seja uma animação pautada no fantasioso, trata-se de um importante elemento discursivo sobre a identidade docente, produzida “como uma pessoa infeliz, sozinha e malvada” e que deve ser entendida como “potenciais constituintes da cultura e que agem fortemente nas concepções e ações em educação” (KAPPAUN, 2017, p. 11).

Mas basta sintonizarmos em outras narrativas para chegarmos a outras enunciações acerca da docência, como aqueles veiculados em “Merlí”. Na referida narrativa, o protagonista apresenta-se como um “professor criativo, dialógico, que faz com que os alunos sejam colocados para pensar vinculando o conteúdo com a vida [...], que desenvolve vínculos pessoais com estes alunos” (ARAÚJO, 2019, p. 9). Trata-se de um artefato que pensa nos efeitos de ser professor/a em tempos da chamada “crise da escola”, sendo sempre instado a repensar a docência e a sua função social (ARAÚJO, 2019).

Embora assuma esse artefato como um currículo cultural, penso ser importante argumentar também acerca das diferentes maneiras pelas quais as narrativas midiáticas seriadas emergem nos espaços escolares. Afinal, o que está em foco aqui é um sistema de significação que faz desse artefato tanto o produto como o produtor de uma cultura específica: a “cultura seriadora”. Quem se assume como um/a legítimo/a “seriador/a” não será apenas no conforto do seu lar, mas poderá assim se posicionar em distintos tempos e espaços – inclusive o da escola. Isso porque a cultura está envolvida “na produção de significados, de regimes de verdade e de sujeitos de determinados tipos” (PARAÍSO, 2006, p. 9), relacionando-se, portanto, aos “conceitos, às ideias, às práticas, aos sentimentos, às relações e às emoções que um grupo cria, mobiliza, adota e recria em suas relações nos mais diferentes espaços” (PARAÍSO, 2010, p. 35).

Uma “cultura seriadora” corresponderia aos modos de vida forjados pelas inúmeras práticas discursivas das narrativas midiáticas seriadas, que tem buscado reforçar verdades e que encontra, na figura do/a seriador/a, um/a “representante” legítimo/a dos saberes, valores e comportamentos que ora deseja negar e subtrair, ora deseja preservar e afirmar. Em outras palavras, a “cultura seriadora” regula a vida social de sua audiência fidedigna em um exercício particular de poder, tramando-lhes em uma rede discursiva que tem demandado múltiplas posições de sujeito para comportar o máximo possível de indivíduos. Para tanto, esse artefato precisa conhecer o seu público. Conhecê-lo tão bem ao ponto de saber o que dele esperar, como antecipar determinados sentimentos, ações e comportamentos, como influenciar suas respostas frente às imagens que assistem e como conduzir as suas condutas. Logo, tal artefato necessita “endereçar-se” a sua audiência.

A noção de “endereçamento”, desenvolvida por Elizabeth Ellsworth (2001), compreende que qualquer texto cultural é produzido para um “alguém” que esse artefato pressupõe ser o seu alvo. Tal investimento não ocorre sem um determinado endereçamento, isto é, sem dirigir-se a uma audiência a partir de estratégias que questionam incessantemente quem é o seu público e quem esse artefato quer que o seu público seja (ELLSWORTH, 2001). Logo, é preciso que cada espectador/a entre “em relação particular com a trama e com o [seu] sistema imagético” (MAKNAMARA, 2011, p. 96-97). Configurando-se em torno daquilo que Silva (2010) nomeou como “textos de poder” e imersos em uma lógica comercial, as experiências possibilitadas pelos endereçamentos de um artefato como o das narrativas midiáticas seriadas, embora resguardem algum caráter idiossincrático, é eminentemente relacional (ELLSWORTH, 2001). Afinal, um modo de endereçamento está sempre relacionado a “uma projeção de tipos particulares de relações entre o eu e o eu, bem como entre o eu e os outros” (ELLSWORTH, 2001, p. 19). Consequentemente, as movimentações de um modo de endereçamento são pensadas de modo a disponibilizar determinadas posições de sujeito e deixar traços das suposições que fazem a respeito do público a que se dirigem (MAKNAMARA; PARAÍSO, 2015).

As imagens das narrativas midiáticas seriadas têm disponibilizado sistemas de crenças, valores e desejos que, como ocorre com o currículo das músicas, “não apenas “chegam” às escolas, mas também entram em conflito com o que nelas se ensina” (MAKNAMARA, 2011, p. 50). Nesse sentido, concordamos com Maknamara (2011) quando ele argumenta que é “musical” a vida de quem vai à escola - e, portanto, fazendo-se necessário investigar os mais diversos estilos musicais que contribuem para os processos de subjetivação ao disponibilizar posições de sujeito. Seguindo as suas pistas, pensamos que também é “seriada” a vida dos/as nossos/as alunos/as, que eles/as estão imersos nessa “cultura seriadora”, forjando-se como sujeitos próprios a esse currículo que tem investido em modos sofisticados para poder “falar” a uma audiência diversificada.

Se diversos são os gêneros das narrativas midiáticas seriadas (horror, drama, ficção científica, animação, fantasia, comédia musical etc.), os seus enredos, as suas tramas e suas personagens, também são múltiplas as formas como elas surgem nos espaços escolares ou relacionados a eles. Em uma breve pesquisa no YouTube, encontramos alguns exemplares que fazem referências diretas a essas narrativas no cotidiano escolar. Há pelo menos uma dezena de vídeos de alunos e alunas recriando cenas da narrativa seriada “Friends”[14]. Tamanha expressividade contorna o argumento de Gummerson (2010) e Ramalho (2011) de que as sitcoms são um potente recurso didático e que tem se tornado corriqueira a sua utilização no ensino de uma língua estrangeira, no intuito de expandir o repertório linguístico dos/as alunos/as. Também nos chamou a atenção um trabalho de literatura que consistia em uma “refilmagem” por parte de um grupo de adolescentes de alguns momentos-chave dos episódios iniciais da já mencionada narrativa seriada “Game of Thrones”[15]. O vídeo, datado de 2011 (mesmo ano em que a série foi ao ar pela primeira vez), é um registro de como “Game of Thrones” rapidamente ganhou um apelo do público jovem, tornando-se um dos fenômenos mais significativos nesse período de transição da televisão para o streaming e concorrendo para reforçar o estilo de vida proposto pela cultura seriadora.

Tal narrativa surge novamente em outro trabalho escolar[16], dessa vez na reencenação de um dos episódios mais aguardados de toda a série, a “Batalha de Winterfell”. Podemos observar mais uma vez um grupo de jovens refazendo, com materiais simples e cotidianos, a parafernália de indumentárias e adereços relacionados ao enredo da série. O que está em jogo no espetáculo gerido pelos jovens é, na verdade, a maneira como os seus corpos ganham centralidade, como eles passam a narrar essa história – a despeito de qualquer orçamento reduzido ou instrumentos que lhes faltem – com seu aparato morfológico. Na ausência de espadas de aço valiriano ou de armaduras de cota de malha, os meninos usam pedaços de pau e se protegem dos ataques inimigos com os seus próprios corpos, munindo-se tão somente de uma bravura supostamente inata aos corpos masculinos.

Embora “Game of Thrones” não tenha “paralelo temporal explícito com a nossa “realidade”, é possível analisar a ação de discursos [...] que agem fora da tela da TV”, uma vez que esse universo medieval foi produzido a partir de “discursos próprios de nossa época, não sendo possível que escapem às verdades naturalizadas [...] por mais aspectos fantasiosos que possam aparecer na trama” (GAUDENZI; BICCA, 2019, p. 11). Garotos franzinos, cuja compleição física se difere com boa parte daqueles que desfilam no épico medieval, trazem à tona uma das dimensões mais importantes do artefato cultural das narrativas midiáticas seriadas: o seu poder sedutor de mobilizar audiência, de cativar os sujeitos, de tocarem-nos referente aos “desejos, sonhos, convicções políticas ou religiosas, faltas ou aspirações” (FISCHER, 2017, p. 30).

4 VOCÊ AINDA ESTÁ AÍ?

“Você ainda está assistindo?” – É o que nos interroga o algoritmo de algum serviço de streaming quando nos encaminhamos para mais um episódio de uma narrativa seriada em uma sequência ininterrupta. Tal questionamento, embora pareça aleatório, não sugere alguma preocupação quanto a nossa saúde[17] por parte de um servidor consciente com o nosso consumo desenfreado de seu catálogo, tampouco parece interrogar em prol do nosso conforto depois de horas sentados/as em uma mesma posição. Trata-se de uma interrogação que dispara uma espécie de “vigilância automatizada” que tem atualizado a figura do panóptico (FOUCAULT, 2014), dando lugar, nesses nossos tempos, para um outro modelo que, ainda que não nos “veja” diretamente, é capaz de nos inquirir no sentido de informar-lhes aquilo que os seus “olhos” já não são mais capazes de enxergar.

Sim, ainda estou assistindo, não estou distraído, desleixado e nem estou realizando qualquer atividade que tire a minha concentração. Estou prestando atenção aos mínimos detalhes, imerso em seu contagiante circuito de imagens e sons, talvez seja a resposta que o servidor gostaria de ouvir. Na impossibilidade de assim respondê-lo diretamente, acionamos um monossilábico “sim” através do controle remoto.

O monitoramento agora é de outra ordem. Deslocado da “sociedade disciplinar” exortada por Foucault (2014), estaríamos mais próximos das elucubrações deleuzianas quanto a uma “sociedade de controle”, que funciona não mais pelo confinamento, mas pelo “controle contínuo e comunicação instantânea” (DELEUZE, 2013, p. 222). Controle esse que, sob os signos da diversão, do relaxamento, do passatempo e do lazer, faz com que sequer nos demos conta dos seus ardis. Vigiar e divertir! Tal esquadrinhamento estende-se, em um contexto biopolítico, “para as profundezas da consciência e dos corpos da população – e, ao mesmo tempo, através da totalidade das relações sociais” (HARDT; NEGRI, 2001, p. 43-44). Essa chave de leitura reforça que o poder, mesmo tendo uma multiplicidade de sujeitos a gerir – e diante do que expusemos ao longo do texto, podemos argumentar acerca de um poder exercido a nível global – tem de ser “tão eficaz quanto se ele se exercesse sobre um só” (FOUCAULT, 2017, p. 326).

As narrativas midiáticas seriadas têm obstinadamente reportado a sua audiência. A plataforma de streaming Netflix, por exemplo, reiteradamente se dirige ao público a partir de mensagens em redes sociais como facebook e twitter, valendo-se de imagens, gifs, vídeos e montagens bem-humoradas, “prevendo” uma “maratona”[18] em nosso futuro, ou organizando em um calendário[19] a quantidade de episódios que devemos assistir com o intuito de mantermo-nos “em dia” com as nossas obrigações de um/a assíduo/a consumidor/a. Afinal, é inaceitável que uma série que estreou há pouco mais de um mês ainda não esteja em nossas listas de “assistidos recentes” e é preciso urgentemente corrigir essa falha, uma vez que esse artefato “não vai se assistir sozinho”[20].

As mensagens compartilhadas pelo perfil da referida plataforma não têm como objetivo apenas publicizar o seu catálogo, mas efetivamente produzir e disponibilizar significados acerca de como ela deseja que sua audiência se comporte e quais hábitos devem ser incorporados por ela. Nesse sentido, divulga a “prática da maratona” para o seu público seriador. Tal prática é disponibilizada no intuito de reforçar a dimensão biopolítica da constituição de uma “cultura seriadora”. Em outras palavras, trata-se de uma estratégia do artefato para aumentar as chances de sucesso nas posições de sujeito que ele demanda a partir dos textos e imagens veiculados por seus episódios. Compreender a maratona como uma importante empreitada biopolítica é atentar para o seu mecanismo de se encarregar, simultaneamente, de um corpo individual e de uma população em geral, como um investimento particular para a constituição do seu “público seriador”. Público, também aqui, “não diz respeito a um aglomerado qualquer de indivíduos”: como ocorre com estilos musicais, só há um público “porque há uma população que figura tanto como objeto (para os quais são direcionados determinados mecanismos de poder) quanto como sujeito (a quem se interpela e solicita para que aja de tal ou qual forma) dos endereçamentos” (MAKNAMARA; PARAÍSO, 2015, p. 184).

Um/a “maratonista” é aquele/a que assiste rapidamente aquilo que lhe é ofertado, investindo em uma “watchlist”[21] cada vez mais extensa de narrativas a serem consumidas. Trata-se daquele indivíduo capaz de passar horas com os olhos vidrados na tela, mesmo que ao final desse exercício dispendioso ele se assemelhe aos monstros que as séries fazem referência – a exemplo da imagem fantasmática que a Netflix utiliza para mostrar como um/a seriador/a ficaria após uma “maratona de 10 horas” e, com isso, aproveita para divulgar a sua série original sobre uma mansão mal assombrada[22]. No entanto, um bom ou uma boa “maratonista” não é aquele/a que se aventura apenas no novo, mas aquele/a que também percorre caminhos já conhecidos. Isso é bem lembrado pelo perfil do twitter do serviço de streaming Prime Video, ao fazer um comentário jocoso sobre aqueles/as que reassistem uma mesma narrativa seriada pela “24ª vez”[23]. Preocupado/a com a sua dependência em termos de consumo cada vez mais agudo de narrativas midiáticas seriadas, uma vez que o binge-watching[24] pode estar associado a um maior risco de morte[25]? Não precisa se aborrecer, pois segundo o perfil do streaming GloboPlay, “esse vício tá liberado!”[26]

Nós “maratonamos” essas narrativas porque a nossa sociedade oferece as condições de possibilidade para que essa prática se institua não só como algo que é possível, mas que é, sobretudo, desejável. Em outras palavras, nós maratonamos narrativas seriadas e orgulhosamente nos afirmamos enquanto “maratonistas” porque vivemos em uma sociedade em que as pessoas são convocadas a serem procrastinadoras[27]; porque essa mesma sociedade que nos convida a procrastinar, também é pautada na performance e em uma cultura somática, o que explicaria o aumento no número de corredores/as durante a pandemia[28]; porque “maratonar” pressupõe sermos pessoas consumistas e integradas a um certo ideário de diversão, figurado nas formas em que essa prática tem veiculado em propagandas e peças publicitárias; enfim, porque todos esses aspectos são produzidos a partir de enunciados como “no final, tudo dá certo”, permitindo que deixemos sempre as coisas para última hora e retornemos sem tanta culpa ao nosso binge-watching.

Logo, “maratonar” não pode estar reduzida a uma prática. É a produção de um estilo de vida próprio dessa “cultura seriadora”, que, no entanto, é capaz de se estender a diferentes aspectos de nossas vidas e que tem diferentes efeitos em nossas composições como sujeitos, ultrapassando a dimensão do artefato aqui analisado. Nós não maratonamos apenas narrativas seriadas; agora, podemos maratonar músicas, que têm sido produzidas de modo a terem durações cada vez mais curtas para que possamos ouvir o máximo de canções possíveis em menos tempo, em acordo com esse fenômeno de “audição ansiosa”[29]; nossa competição com o relógio é tamanha que agora aceleramos as imagens de um filme para terminá-lo mais rapidamente[30]; passamos a maratonar também as nossas relações pessoais quando aceleramos os áudios que recebemos em uma rede social de troca de mensagens instantâneas[31], adequando as nossas interações mais corriqueiras a uma “lógica da urgência”; e, como se não fosse pouco, também temos feito um binge-watching de conteúdos escolares ao tornar os estudos algo “maratonável” ao passo que uma importante e decisiva avaliação se aproxima[32].

Cada um dos exemplos acima citados evidencia que, por mais contraditório que possa parecer, “maratonar” tornou-se precisamente uma estratégia que objetiva nos tornar sujeitos anestesiados, sedados, paralisados. Trata-se de um certo “efeito narcótico” desse artefato, isto é, um sintoma de uma racionalidade própria a esse estilo de vida. Maratonamos inúmeros episódios de séries, no entanto – ou precisamente por isso – estamos constrangidos por algumas ações pré-estabelecidas. Tornamo-nos alvos de uma “modelização” a partir de estratos semióticos próprios de uma racionalidade capitalística, cujas “representações” – de gênero, de sexualidade, de raça, de etnia, de classe etc. – concorrem para a programação das subjetividades em um circuito de signos sobrecodificados e padronizados. Contrariamente às representações dos zumbis em filmes e narrativas seriadas, comumente apresentados como seres cujos movimentos são lentos, tornamo-nos zumbis ativos, maratonistas, enérgicos. Um aceleramento que, em contrapartida, leva-nos ao amortecimento das nossas formas de ser e estar no mundo. Tal “narcotização programada da vida” investe para provocar o empalidecimento das nossas potências, o congelamento das nossas forças vitais e a proliferação das formas estáticas e estabilizadas a partir de redundâncias subjetivas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS: ESTOU CIENTE E DESEJO CONTINUAR!

E se adicionalmente ao anúncio de mais uma narrativa seriada adentrando no seu já extenso catálogo, a Netflix nos advertisse – de modo semelhante às publicidades antitabagistas que veiculam nos versos das carteiras de cigarro desde meados dos anos 1990 – dos perigos de sua dependência semiótica? E se as tão requeridas e celebradas “maratonas” fossem compreendidas não mais como um fenômeno ocasional e inocente, mas o efeito narcótico de uma racionalidade atrelada a uma certa modelização da subjetividade na contemporaneidade? E se fossem criadas casas de recuperação para aqueles sujeitos que, confrontados com seu estado de adição, desejassem implodir esse processo que os encerra em uma narcotização programada da vida? E se os serviços de streaming solicitassem, dentre as várias cláusulas de um termo de compromisso – que na expressiva maioria das vezes assinamos sem sequer lê-l

E se adicionalmente ao anúncio de mais uma narrativa seriada adentrando no seu já extenso catálogo, a Netflix nos advertisse – de modo semelhante às publicidades antitabagistas que veiculam nos versos das carteiras de cigarro desde meados dos anos 1990 – dos perigos de sua dependência semiótica? E se as tão requeridas e celebradas “maratonas” fossem compreendidas não mais como um fenômeno ocasional e inocente, mas o efeito narcótico de uma racionalidade atrelada a uma certa modelização da subjetividade na contemporaneidade? E se fossem criadas casas de recuperação para aqueles sujeitos que, confrontados com seu estado de adição, desejassem implodir esse processo que os encerra em uma narcotização programada da vida? E se os serviços de streaming solicitassem, dentre as várias cláusulas de um termo de compromisso – que na expressiva maioria das vezes assinamos sem sequer lê-los em sua integridade – a completa desresponsabilização quanto aos possíveis indivíduos compulsivos produzidos pelas horas dedicadas ao binge-watching?

Você ainda assumiria os riscos e encararia essa maratona?

REFERÊNCIAS

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Notas

[1] Episódio ocorrido com a cantora Elza Soares em sua primeira aparição pública na televisão, em 1953. Disponível em: http://www.jornaldacidade.net/tv-e-famosos/2019/09/311570/novo-figurino-de-elza-soares-traz-referencias-de-sua-primeir.html. Acesso em: 17/11/2021.
[2] Para uma discussão mais aprofundada sobre a espetacularização da violência e a lamentável abordagem da mídia televisiva nesse caso, conferir o documentário “Quem matou Eloá”, dirigido por Lívia Perez. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=4IqIaDR_GoQ. Acesso em: 17/11/2021.
[3] Sequestro do ônibus 174 no Rio de Janeiro, em 2000, que culminou na morte do sequestrador e de uma das vítimas. As imagens do sequestrador ameaçando os/as passageiros/as teve ampla circulação televisiva em todo o país. O caso deu origem ao documentário “Ônibus 174” dirigido pelo cineasta José Padilha e ao longa-metragem “Última Parada 174”, dirigido por Bruno Barreto.
[4] Nos referimos a cena romântica entre os personagens Félix e Niko, da novela “Amor à Vida”, exibida em janeiro de 2014. Disponível em: http://globotv.globo.com/rede-globo/memoria-globo/v/amor-a-vida-o-primeiro-beijo-gay/3146288/. Acesso em: 17/11/2021.
[5] Referência ao jogo de metalinguagem proposto pelo humorista Renato Aragão e a sua personagem Didi Mocó, que costumava reportar a sua audiência televisiva com a icônica frase Psit, ô da poltrona!
[6] Para se ter uma ideia da dimensão do alcance global dos serviços de streaming, a plataforma da Netflix está disponível em boa parte do território mundial, ausentando-se apenas na China, Crimeia, Coreia do Norte e Síria. A Prime Video, por sua vez, está disponível em mais de 200 países, em uma lista que tem aumentado expressivamente a cada ano. Dados disponíveis em https://help.netflix.com/pt/node/14164 e em https://www.amazon.com.br/b?ie=UTF8&node=16144717011. Acesso em 18 de novembro de 2021.
[7] Nos referimos aqui ao hábito dos canais brasileiros, como a Rede Globo e o SBT, em transmitir narrativas midiáticas seriadas estadunidenses na faixa da madrugada. Um bom exemplo é a transmissão de “Lost”, a partir de 2006, que mesmo sendo exibida após o último jornal da noite, ainda rendia ótimos índices de audiência. Disponível em https://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq0402200625.htm. Acesso em 28 de fevereiro de 2022.
[8] Argumentar acerca de acessibilidade financeira em um país como o nosso, sobretudo no atual cenário de recessão econômica, é sempre arriscado. No entanto, consideramos essa “acessibilidade” fruto de algumas possibilidades gestadas pela própria lógica do streaming. Uma delas é, por exemplo, a divisão de uma assinatura com mais pessoas, tornando o valor até 60% mais em conta do que o valor integral. Há um serviço próprio pra isso, o chamado “Kotas”, no qual o/a usuário/a pode se juntar a outros/as interessados/as pelo mesmo serviço de streaming e dividir os custos. Disponível em www.kotas.com.br. Acesso em 18 de novembro de 2021.
[9] A narrativa seriada “Black Mirror” faz referência à tela enegrecida dos dispositivos tecnológicos que estão ao nosso redor, de modo tão intenso que nem nos damos mais conta da sua onipresença.
[10] “Sitcom”, do inglês “Situation Comedy”, é um formato de narrativas seriadas do gênero comédia no qual os seus enredos se baseiam em situações corriqueiras, em fórmulas bem delimitadas e em ambientes do cotidiano, como um grupo de amigos/as, um local de trabalho, um núcleo familiar etc.
11] Referência a uma experiência vivenciada por um dos autores do artigo, quando atuou como professor em um acampamento do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra, entre os anos de 2016 e 2017. A despeito do paupérrimo sinal de internet móvel e a ausência de serviços de banda larga, os sujeitos que transitavam naquele lugar consumiam alguns dos artefatos culturais que analisamos em nossa pesquisa e dialogavam entre si ao comentar sobre enredos, personagens e reviravoltas das tramas. As crianças (“sem-terrinhas”, como gostavam de ser chamadas) sempre aludiam em suas brincadeiras aos fenômenos dos desenhos animados que assistiam, cantarolavam as músicas que ouviam ou reencenavam as tramas dos filmes que eram projetados em ocasiões especiais no acampamento. Essa experiência é um reflexo daquilo que Munarim (2007) aponta sobre o modo em que a mídia tem propiciado, particularmente às crianças, a construção das brincadeiras e do seu “se-movimentar”, isto é, as maneiras lúdicas em que elas se reportam a esta cultura da mídia e produzem significados sobre ela.
[12] Em um comunicado feito em 2017, a Netflix apontou que a série de língua não-inglesa mais vista pelo público norte-americano em sua plataforma foi a brasileira “3%”. Disponível em https://telepadi.folha.uol.com.br/3-e-serie-da-netflix-de-lingua-nao-inglesa-mais-vista-da-plataforma-nos-eua/. Acesso em 17 de novembro de 2021
[13] Embora as autoras façam referência a transmissão de “Game of Thrones” no canal televisivo que a produziu (a HBO), convém lembrar que essa narrativa seriada, pela sua força de interpelar e seduzir o público, causou instabilidade no serviço de streaming da HBO Go quase todas as vezes em que os episódios da sua última temporada foram ao ar. Disponível em https://www.uol.com.br/tilt/noticias/redacao/2019/05/02/sofreu-para-assistir-game-of-thrones-veja-por-que-o-hbo-go-nao-funcionou.htm. Acesso em 28 de fevereiro de 2022.
[15] Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=Psf5TB1NfGc&t=98s. Acesso em 17 de novembro de 2021.
[16] Disponível em https://youtu.be/jWYUyXHlduw. Acesso em 26 de junho de 2022
[18] “Maratonar” uma narrativa seriada significa assistir vários episódios ou até mesmo temporadas inteiras em uma sequência ininterrupta. Disponível em https://twitter.com/NetflixBrasil/status/1241011465781481476. Acesso em 05/04/2021.
[19] Disponível em https://twitter.com/NetflixBrasil/status/1219722638567841792. Acesso em 19 de novembro de 2021.
[20] Disponível em https://twitter.com/NetflixBrasil/status/1303440923259547648. Acesso em 19 de novembro de 2021.
[21] Watchlist é um termo utilizado para a lista de séries a serem assistidas posteriormente pelos/as seriadores/as.
[22] Disponível em https://twitter.com/NetflixBrasil/status/1058694278740733952. Acesso em 19 de novembro de 2021.
[23] Disponível em https://twitter.com/PrimeVideoBR/status/1363247057553813505. Acesso em 19 de novembro de 2021.
[24] Termo popularizado no campo audiovisual para descrever o ato de “maratonar” uma narrativa seriada, isto é, assistir vários episódios ou mesmo uma temporada inteira em sequência.
[26] Disponível em https://twitter.com/globoplay/status/1268708489569894405. Acesso em 19 de novembro de 2021.
[27] Disponível em https://exame.com/bussola/vida-corporativa-penso-logo-procrastino/. Acesso em 19 de novembro de 2021.
[30] Disponível em https://www.bbc.com/portuguese/geral-56368238. Acesso em 19 de novembro de 2021.
[31] Disponível em https://exame.com/tecnologia/whatsapp-libera-recurso-para-acelerar-audios/. Acesso em 19 de novembro de 2021.


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