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CONFLITOS ENTRE CORRENTES HEGEMÔNICAS E CONTRAHEGEMÔNICAS NO CURRÍCULO: entre a incompletude do texto e a opacidade da língua

CONFLICTS BETWEEN HEGEMONIC AND COUNTER-HEGEMONIC STRANDS IN THE CURRICULUM: between text incompleteness and language opacity

CONFLICTOS ENTRE CORRIENTES HEGEMÓNICAS Y CONTRAHEGEMÓNICAS EN EL CURRICULUM: entre la incompletud del texto y la opacidad de la lengua

Pedro Neves da Rocha
Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Brasil
Fernanda Cátia Bozelli
Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Brasil
Renato Eugênio da Silva Diniz
Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Brasil

Revista Espaço do Currículo

Universidade Federal da Paraíba, Brasil

ISSN: 1983-1579

Periodicidade: Cuatrimestral

vol. 16, núm. 1, 2023

rec@ce.ufpb.br

Recepção: 12 Março 2023

Aprovação: 27 Março 2023



DOI: https://doi.org/10.15687/rec.v16i1.66093

Resumo: Nesta pesquisa, foi realizada uma análise de arquivo, tendo como objeto o Projeto Pedagógico de um curso de licenciatura em ciências da natureza. A partir do referencial teórico da Educação Libertadora freireana, bem como outros referenciais críticos, e do referencial teórico-metodológico da Análise de Discurso franco-brasileira, buscou-se investigar as condições de produção do discurso materializado no documento. Por meio da análise, considerou-se que de seu interdiscurso são emergidos elementos como: articulação entre teoria e prática na formação docente; articulação entre ensino, pesquisa e extensão universitária; aproximação entre Universidade e Escola; pedagogia das competências. Por outro lado, alguns silenciamentos foram notados: filiações teóricas; jargões e lugares-comuns; discurso de equidade. Assim, concluiu-se que as perspectivas crítico-transformadoras não podem nem devem aparecer de maneira velada ou implícita num documento desta natureza. Em contrapartida, nesse movimento, é possível considerar o silêncio e a inconclusão presentes no discurso materializado no PPC justamente como pontos de deriva, de transformação e superação da lógica hegemônica.

Palavras-chave: Educação Libertadora, Análise de discurso, Formação inicial docente.

Abstract: This research carried out an archive analysis, having as object the degree program structure (DPS) of a natural sciences teacher training course. Based on Freire's Liberating Education, as well as other critical theoretical frameworks, and the French-Brazilian Discourse Analysis theoretical-methodological framework, it aimed to look at the context production of the discourse materialized in the DPS. Through the analysis, it was considered that emerged from their interdiscourse elements such as: articulation between theory and practice in teacher education; articulation between teaching, research, and university extension; approximation between University and School; pedagogy of competences. On the other hand, some silences were noticed: absence of theoretical affiliations; jargon and commonplaces; absence of equity discourse. Thus, it was concluded that the critical-transformative perspectives cannot and should not appear in a veiled or implicit way in a document of this type. On the other hand, in this movement, we can consider the silence and inconclusion present in the discourse materialized in the DPS precisely as points of drift, transformation and overcoming of the hegemonic logic.

Keywords: Liberating Education, Discourse Analysis, Initial teacher training.

Resumen: En esta investigación, fue realizado un análisis de archivo, teniendo como objeto el Programa Educativo de Curso (PEC) de una licenciatura en ciencias naturales. A partir del referencial teórico de la Educación Liberadora de Freire, así como de otros referenciales críticos, y del referencial teórico-metodológico del Análisis del Discurso franco-brasileño, se fue buscado develar las condiciones de producción del discurso materializado en el PEC. A través del análisis, consideramos que, desde su interdiscurso, elementos como: articulación entre teoría y práctica en la formación docente; articulación entre docencia, investigación y extensión universitaria; aproximación entre Universidad y Escuela; pedagogía de las competencias y constructivistas. Por otro lado, se notaron algunos silencios: ausencia de filiaciones teóricas; lugares comunes; ausencia de discurso de equidad. Así, consideramos que las perspectivas crítico-transformadoras no pueden ni deben aparecer de forma velada o implícita en un documento de este tipo. Por otra parte, en este movimiento es posible considerar el silencio y la inconclusión presentes en el discurso materializado en el PEC precisamente como puntos de deriva, transformación y superación de la lógica hegemónica.

Palabras clave: Educación Liberadora, Análisis del Discurso, Curso de licenciatura.

1 INTRODUÇÃO

A presente pesquisa possui como contexto a questão da formação inicial de professores da área de ensino de ciências da natureza (EC). Em específico, focalizamos a problemática da materialização de tendências hegemônicas e contra-hegemônicas (SAVIANI, 2011) projetadas sobre o currículo de um curso de licenciatura, bem como suas normatizações. Para investigar tal embate, realizamos uma análise de arquivo (ORLANDO, 2022), utilizando como objeto o Projeto Pedagógico do Curso (PPC) de Licenciatura em Ciências Exatas[1], da Universidade de São Paulo (USP) Campus São Carlos (UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO, 2017). Como referencial teórico-metodológico, utilizamos a Análise de Discurso (AD) de tradição franco-brasileira (ERNST-PEREIRA; MUTTI, 2011; ORLANDI, 2007, 2005; ORLANDO, 2022).

Para Saviani (2007) as correntes pedagógicas hegemônicas visam a reprodução e conservação do modelo de sociedade vigente; ou no máximo a sua “correção” (mas sem alteração da lógica dominante). Em contraposição, o autor defende as correntes contra-hegemônicas, que reconhecem a sociedade de classes e seus mecanismos de dominação, e consideram que a escola e a educação podem atuar para a transformação desse cenário. Como exemplos de correntes contra-hegemônicas brasileiras, elencamos a Pedagogia Libertadora Freireana, germinada na década de 1960 com a Experiência de Angicos.

Segundo Dullo (2014), a Experiência de Angicos foi o primeiro teste efetivo do Método de Freire, em parceria com o governo do Rio Grande do Norte. Esse Projeto de Alfabetização visava alfabetizar adultos trabalhadores em 40 horas, com baixo custo. Entretanto, muito mais que isso, objetivava estimular um processo de reflexão política, pois partia da problematização sobre Palavras Geradoras, a hierarquização de culturas (popular e erudita) e as condições de dominação dos educandos.

Nessa experiência, Paulo Freire elaborou e sistematizou o método do Círculo de Cultura e da Palavra Geradora (que, posteriormente, se expandiria à noção de Tema Gerador). Tal método perpassaria o momento de investigação temática da realidade para o levantamento das situações-limite — ou seja, as condições de opressão, de ser menos —, seguido da codificação e descodificação por meio dos diálogos, para o desvelamento crítico de tais condições. Por fim, ocorreria a sistematização dos conhecimentos apropriados para tal análise e desvelamento (FREIRE, 2011). Todo esse processo deveria estar pautado na dialogicidade. Devido ao viés explicitamente crítico e transformador dessa concepção, ele foi associado ao Comunismo após o golpe militar e exilado (DULLO, 2014).

A Educação Libertadora surge como contraposição à educação bancária, sendo considerada por Freire (2011, p. 82) o “ato de depositar, de transferir, de transmitir valores e conhecimentos”. Sob essa óptica, a educação bancária traz consigo a perspectiva antidialógica da cultura do silêncio. Segundo Silva e Therrien (2022), uma vez que a educação bancária visa a ação domesticadora, e pauta-se na transmissão/imposição de uma visão de mundo, esta abordagem gera como consequência uma acomodação dos educandos ao silêncio ou, no máximo, a reprodução das respostas aceitáveis. Para os autores, a educação bancária ancora-se na negação do diálogo.

Para Freire (2011), em oposição à educação bancária, o processo de problematização busca a superação de uma situação-limite via apropriação e produção coletiva de conhecimentos teóricos e de ação prática. Ainda, nesse âmbito, a situação-limite é a própria condição de dominação desvelada.

Magoga e Muenchen (2021, p. 4) definem esse conceito como “situações em que o sujeito depara-se em determinada percepção e, inconsciente desta, não vê alternativa para superá-la, de modo que passa a introjetá-la, aceitando-a como natural, mesmo quando não o é”. Dessa forma, compreendemos que uma educação crítica deve estar sempre alinhada ao objetivo de transformação da realidade.

Durante todo o século XX e XXI, ocorreram embates entre as correntes hegemônicas e contra-hegemônicas (NARDI; CORTELA, 2015; SAVIANI, 2011, 2007, 2002). Na última década, o contexto político brasileiro, em geral, tem sido bastante conturbado. Sem a pretensão de esgotar um período tão complexo, podemos apenas apontar o processo de impeachment sofrido pela, até então, presidenta Dilma Rousseff, oficialmente entre 2 de outubro de 2015 até 31 de agosto de 2016 (AGÊNCIA SENADO, 2016), mas antecipado por inúmeros movimentos – orgânicos ou arquitetados. Concomitantemente, vimos a ascensão de grupos ultraconservadores associados a uma política neoliberal (LAGOA, 2019), representada pelo governo de Michel Temer (vice de Dilma, que assumiu o restante de seu mandato) e, posteriormente, pelo mandato de Jair Messias Bolsonaro, entre 2018 e 2022.

Tal guinada repercutiu diretamente no Ministério da Educação (MEC), em seus principais projetos em construção nesse período: a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e a reforma do Ensino Médio. As críticas à BNCC têm sido intensamente produzidas pela academia (Cf. AGUIAR; DOURADO, 2018; COMPIANI, 2018; CÁSSIO; CATTELI JÚNIOR, 2019; LAGOA, 2019; NEIRA, 2018). Especificamente no âmbito da formação de professores foi aprovada a Resolução CNE/CP n˚ 2/2019, que “define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial de Professores para a Educação Básica e institui a Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica (BNC-Formação)” (BRASIL, 2019). Entretanto, a lógica liberal materializa-se no sistema educacional desde os anos de 1990.

Após a redemocratização é possível notar a forte tendência economicista neoliberal nas reformas da esfera pública em diversos campos, incluindo o educacional, sob influência do Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Mundial (ALTMANN, 2002; NARDI; CORTELA, 2015; LEMES, 2013; LIBÂNEO; 2012; SGUISSARDI, 2015). Libâneo (2012) considera a existência de um dualismo nos sistemas escolares do Brasil: a escola do conhecimento, da aprendizagem e da apropriação das tecnologias para as elites; a escola do acolhimento e da integração social, da assistência e do apoio para os pobres. A expansão e universalização do ensino implementado no Brasil a partir da década de 1960 causou um choque à escola tradicional, antes restrita às elites. É muito comum vermos discursos saudosistas sobre a “qualidade” da escola tradicional. Todavia, Libâneo (2012) nos atenta à incapacidade de a escola tradicional promover alguma transformação social. Como aponta Altmann (2002, p. 79), o discurso do Banco Mundial defendia o “uso produtivo do recurso mais abundante dos pobres – o trabalho – e fornecimento dos serviços básicos aos pobres”. Além disso, as necessidades básicas educacionais foram reduzidas a necessidades mínimas:

o papel da escola é prover conhecimentos ligados à realidade imediata do aluno, utilizáveis na vida prática (como acreditam também algumas concepções mais simplistas do ensino à vida cotidiana). Em síntese, a aprendizagem transforma-se numa mera necessidade natural, numa visão instrumental desprovida de seu caráter cognitivo, desvinculada do acesso a formas superiores de pensamento (LIBÂNEO, 2012, p. 18).

Acerca da eficiência das reformas educacionais por meio de currículos, é importante fazer uma ressalva com relação ao currículo prescrito e real. Ao traçar o panorama das tendências sobre a educação e como elas se efetivaram, é possível notar algo denominado tradição legalista (SANTOS, 2005). Para o autor, por herança lusitana cartorária, no Brasil existe uma apologia positivista às leis. Em outras palavras, acredita-se que tudo deve ser prescrito, normatizado, sancionado e fiscalizado por aparatos legais. O autor considera que essa tradição legalista gera uma fé legislativa, ou seja, uma crença ingênua de que bastam leis ou decretos sancionados para que ocorram transformações reais.

No caso das reformas educacionais passadas ou atuais é perceptível como inúmeros discursos e propostas dos documentos tornam-se “letras mortas”. Bem mais comuns do que as reformas sobre a formação docente foram as reformas curriculares para a tentativa de incluir novas tendências. Muitas vezes, estas manifestavam-se diretamente no material didático dos estudantes e sequer eram repassadas aos educadores em sua formação inicial ou em serviço. Por conta disso, nem sempre as mudanças curriculares dos documentos e materiais se manifestam na prática pedagógica. Assim, surge a distinção entre o currículo formal e real.

Segundo Gimeno Sacristán (2013) e Silva (2016), o currículo formal ou prescrito pode ser compreendido como a prescrição objetiva que circunda a macroescala normativa, por exemplo: legislações (parâmetros e diretrizes curriculares), programas de ensino, materiais didáticos. Entretanto, tal prescrição objetiva se transforma ao passar pela subjetividade dos inúmeros atores do processo educativo (professores, estudantes e profissionais da escola). As percepções, representações sociais, opções procedimentais e atitudinais de todos os atores ressignificam os conteúdos objetivos propostos na macroescala curricular. A esse novo produto curricular, mais subjetivo, na microescala do processo educativo, dá-se o nome de currículo real.

Mais a fundo, no processo educativo, as inferências subjetivas vão além das ressignificações explícitas e conscientes. O próprio contexto cultural e social que permeia esse processo é capaz de gerar influências profundas e implícitas nas representações sociais de todos os atores acerca do que é prescrito no currículo. Além disso, em todo o momento da vivência escolar são transmitidos, reforçados ou questionados e desconstruídos inúmeros elementos. Tais elementos implícitos formam o currículo oculto. Moreira (1992) considera que o currículo oculto abarca normas, regras e procedimentos, valores, crenças, relações sociais, hierárquicas e de poder. Justamente por estar oculto, considera-se que a transmissão de tais elementos ocorre implícita no discurso do professor, na relação dos estudantes entre si, entre eles e docentes, bem como entre os diversos profissionais presentes na escola em todos os âmbitos, por exemplo, pedagógico, administrativo e gerencial, assim como funções estruturais relacionadas à segurança, limpeza, manutenção, saúde e alimentação.

Assim, ressaltamos que a questão das tendências pedagógicas e a concretização delas na realidade dos processos educativos não se resume apenas ao que é prescrito na letra da lei na macroescala do sistema educacional; no currículo formal. A efetivação, bem como a manutenção ou transformação, e, acima de tudo, os conflitos e contradições inerentes, manifestam-se na microescala do sistema, ou seja, na sala de aula, na relação entre educador e educandos; nos currículos real e oculto. Feita essa ressalva, apresentamos, a seguir, a análise do PPC selecionado para esta investigação.

2 ANÁLISE DO PROJETO PEDAGÓGICO DO CURSO DE LICENCIATURA EM CIÊNCIAS EXATAS

De início, ressaltamos que compreendemos, alinhados à perspectiva da AD, a incompletude do texto e a opacidade da língua. Isso significa que os sentidos não se originam nem se encerram propriamente no objeto a ser analisado. Ao contrário, buscaremos nos remeter às condições de produção do PPC — no sentido estrito do contexto direto, bem como no sentido amplo do contexto sócio-histórico e ideológico. Mais especificamente, remetemos à inserção histórica, localização, além do alinhamento com as legislações, com perspectivas teóricas, entre outros fatores que compõem o interdiscurso e a desse documento, e como se concretizam nele. Metodologicamente, a unidade com a qual o analista de discurso entra em contato inicialmente é o texto — a superfície linguística. A primeira etapa da AD consiste na passagem da superfície linguística (texto) para o objeto discursivo (discurso). Na segunda, são realizadas as relações do objeto discursivo com as diferentes formações discursivas no interdiscurso. Por fim, na terceira etapa, as diferentes formações discursivas são relacionadas com as formações ideológicas em que estão inseridas. É nesse ponto que se encontra a constituição dos processos discursivos e dos efeitos de sentido (ORLANDI, 2005).

Aproximando a reflexão sobre o currículo oculto ao campo da AD, podemos considerar que a ideologia e a historicidade interpelam os sentidos que são colocados em funcionamento no discurso materializado nos currículos. De acordo com Orlando (2022), os sentidos materializados nos currículos estão intimamente ligados com o modelo de sociedade vigente ou pretendido. Portanto, são objetos históricos. Nesses documentos, materializam-se discursos com opacidade, paráfrases, polissemias, silenciamentos e deslizes.

A educação popular não pode estar alheia a essas estórias que não refletem apenas a ideologia dominante, mas, mesclados com ela, aspectos da visão de mundo das massas populares. Na verdade, esta visão de mundo não é pura reprodução daquela ideologia (FREIRE, 1989, p. 30).

É importante considerar a historicidade, opacidade, silenciamentos, deslizes, falhas e polissemias presentes nos discursos materializados nos currículos, caso contrário, há o risco de cairmos em compreensões crítico-reprodutivistas (SAVIANI, 2002), que considerariam a atuação conservadora da escola como insuperável. Pelo contrário, apesar de ser fortemente interpelada pela ideologia dominante, a educação não é completamente tomada por ela podendo ser transformada.

2.1 Condições de produção do Projeto Pedagógico do Curso

Segundo o PPC (USP, 2017), o curso de Licenciatura em Ciências Exatas foi instituído em 1993, em parceria entre o Instituto de Física de São Carlos (IFSC), o Instituto de Química de São Carlos (IQSC) e o Instituto de Ciências Matemáticas e da Computação de São Carlos (ICMC) e possui como objetivo principal a formação de professores de Física, Química e Matemática para o Ensino Médio, bem como professores de Matemática e Ciências para o Ensino Fundamental. Nos dois primeiros anos, os estudantes cursam um ciclo básico. Já nos dois últimos anos, eles escolhem uma habilitação para o Ensino Médio, dentre as opções de Física, Química e Matemática. O curso ocorre no período noturno.

A inserção do curso, frente ao campus, já revela partes das condições de produção do documento. Historicamente, o campus de São Carlos da USP sempre foi voltado para a produção tecnocientífica aplicada. Sua fundação ocorre com a Escola de Engenharia de São Carlos (EESC), que teve suas atividades letivas iniciadas em 1953. Na década de 1970, foram criados o Instituto de Ciências Matemáticas de São Carlos (ICMSC) e o Instituto de Física e Química de São Carlos (IFQSC). Já nos anos 1990, o ICMSC mudou para o atual nome e o IFQSC desmembrou-se no IFSC e IQSC. Por fim, foi criado o Instituto de Arquitetura e Urbanismo (IAU) em 2010 (USP, 2022).

Esse histórico aponta a ênfase nas ciências exatas puras e aplicadas, que faz parte da cultura consolidada do campus. Ao observar os atuais departamentos dos três Institutos onde o curso de Licenciatura é sediado, é possível notar a posição periférica da pesquisa em Educação. O ICMC possui três departamentos: Departamento de Ciências e Computação; Departamento de Matemática; Departamento de Matemática Aplicada. Dentre os 33 grupos de pesquisa do Instituto, apenas 2 são voltados para educação: Computação Aplicada à Educação e Educação Matemática (INSTITUTO DE CIÊNCIAS MATEMÁTICAS E DE COMPUTAÇÃO, 2022). O IFSC, por sua vez, possui dois departamentos — Física e Ciência Interdisciplinar; Física e Ciência dos Materiais — e 18 grupos de pesquisa. Destes, apenas o Grupo de Física Computacional e Instrumentação Aplicada indica relação com Ensino Básico de Física, via desenvolvimento e aplicação de técnicas computacionais (INSTITUTO DE FÍSICA DE SÃO CARLOS, 2017). Já o IQSC é composto pelo Departamento de Físico-Química e Departamento de Química e Física Molecular. Esse Instituto possui apenas o Grupo de Ensino de Química voltado para educação, dentre 36 grupos (INSTITUTO DE QUÍMICA DE SÃO CARLOS, 2022).

No início do PPC, na seção “Apresentação”, em seu primeiro parágrafo, é trazido o seguinte enunciado (USP, 2017, p. 1, grifo nosso):

A proposta de criação do curso de Licenciatura em Ciências Exatas teve a iniciativa, na época, do Instituto de Física e Química de São Carlos (IFQSC), após pesquisa de opinião realizada em São Carlos e cidades vizinhas que constatou ser esta a aspiração de um grande número de jovens trabalhadores que estavam à espera de um curso superior noturno de qualidade e gratuito a fim de continuar seus estudos.

O curso em questão é o primeiro e um dos poucos do campus da USP São Carlos a ocorrer no período noturno, ao lado dos cursos de Bacharelado em Sistemas de Informação e de Bacharelado em Estatística e Ciência de Dados. O intuito da Universidade de promover uma expansão e inclusão social — expresso na marca discursiva “jovens trabalhadores” —, apesar de bem-intencionado, remete a um traço da formação ideológica ao qual estamos inseridos: a segmentação das carreiras em/para certas classes. Os 23 cursos do campus possuem uma nítida fragmentação em classes sociais, expressada até pelas notas de corte e relação candidato/vaga. Enquanto os cursos de Engenharia — de período integral — contam com mais prestígio e maior procura, cursos de ciências puras e aplicadas são menos buscados. Já as licenciaturas passam por dificuldades até para preenchimento de vagas de suas turmas e possuem nota de corte mínima. A baixa procura pelas licenciaturas e a especificação de sua oferta para a classe trabalhadora também está intimamente ligada à questão da proletarização docente (CONTRERAS, 2002).

O enunciado supracitado também pode ser deslocado para outra questão: a motivação originada da própria população. Notamos como essa marca discursiva foi propositadamente explicitada no PPC, como forma de ratificar a importância do curso como uma demanda regional, social e inclusiva. Nesse mesmo sentido, o enunciado a seguir se soma à argumentação de motivações, dessa vez na seção de “Justificativa” do documento.

A falta de professores qualificados que, além de terem adquirido uma boa formação específica mínima, tenham também uma formação pedagógica adequada é infelizmente um fato concreto. Estudos publicados pelo Ministério da Educação revelam um déficit significativo na formação de professores para o Ensino Médio principalmente nas áreas de Física, Química e Matemática. (USP, 2017, p. 2)

Nesse caso, o enunciado remete a outro âmbito do interdiscurso, numa esfera institucional. Não é explicitado no texto quais seriam os estudos publicados, mas acredita-se que estariam relacionados ao Censo Escolar (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, 2017), que afere o Indicador de Adequação de Formação Docente. No ano de 2016, anterior à publicação do PPC, havia de fato um déficit nas disciplinas de Física e Química, respectivamente com 41,4% e 60,6% de adequação. Na disciplina de Matemática, havia uma adequação de 74,1%, o que consistia no quarto melhor resultado da época, apesar de também deficitário, dentre as disciplinas escolares.

De qualquer maneira, é interessante observar que a argumentação nesse enunciado remete à credibilidade trazida pela marca institucional, por uma dita neutralidade e impessoalidade, de forma genérica, ao citar “estudos publicados” e ao indicar o Ministério da Educação como fonte da afirmação e que remete a uma fonte oficial, de autoridade. Podemos traçar um paralelo entre essa escolha discursiva-argumentativa e a discussão de Pedrancini (2015), que analisou cinco pesquisas estatísticas acerca da Percepção Pública de Ciência e Tecnologia, realizadas entre 1987 e 2010 no Brasil. Apesar das limitações das pesquisas (descontinuidade entre elas e não abrangência estatística em nível nacional de duas delas), todas apontaram que existia uma visão positiva em relação aos cientistas de instituições públicas de pesquisa. Estes eram percebidos como pessoas cultas, confiáveis e que contribuíam de forma útil para a sociedade. Mais além, como apontam Flôr e Trópia (2018), é comum o discurso autoritário legalista, que silencia ou esconde interlocutores nos documentos oficiais, com o intuito de fazer parecer que há apenas um sentido para determinado enunciado.

2.2 Interdiscurso normativo: a estruturação curricular e sua carga horária

Inicialmente, notamos que o PPC dialoga com o interdiscurso em um plano institucional: o das legislações e atos normativos, como evidenciamos nos enunciados a seguir:

i) ajustar o curso de Licenciatura em Ciências Exatas às exigências do MEC quanto às questões das "Práticas como Componentes Curriculares" e “Práticas de Ensino e Estágios Supervisionados” para a Formação de Professores; [...]

iii) aproximar o curso das metas aprovadas pelo Conselho de Graduação da USP, conforme o Programa de Formação de Professores na USP.

Em 2016, os conteúdos e cargas horárias das disciplinas foram adaptados para atender as Deliberações CEE 111/2012, CEE 126/2014, CEE 132/2015 e Resolução CNE/CP no 2/2015. (USP, 2017, p. 4-5, grifos nossos)

A estrutura curricular é organizada seguindo o Programa de Formação de Professores da USP e a legislação vigente para os cursos de Licenciatura. (Ibid., p. 15, grifo nosso)

Em contraposição ao enunciado da “Justificativa”, trazido anteriormente, dessa vez a referência a instituições, legislações e atos normativos trazem a marca discursiva de certa heteronomia. Marcas como “ajustar às exigências” e “atender as deliberações” podem trazer, como um não-dito, que tais decisões não partiram espontânea ou organicamente da comissão organizadora do curso. Pelo contrário, estas foram realizadas para atender a demandas externas. Em alinhamento à AD, relembramos que essas marcas discursivas podem ter emergido de maneira inconsciente, como um deslize na linguagem, por meio de sua opacidade. Portanto, desvelam elementos importantes da memória discursiva e da ideologia.

Ao analisar os documentos citados (SÃO PAULO, 2014, 2015; BRASIL, 2015; USP, 2004), notamos que essa aproximação ocorre majoritariamente no sentido de adequação formal (estrutural), não de conteúdo (essencial). Enquanto o PPC explicita quase exclusivamente a questão da carga horária ao citar as normativas, os documentos oficiais trazem inúmeros outros aspectos além dessa questão. Apenas o capítulo V da Deliberação CNE/CP 2/2015 trata da carga horária mínima para os cursos de Licenciatura. Já a Deliberação CEE 111/2012, alterada pelas Deliberações CEE 126/2014 e CEE 132/2015, também tratam desse aspecto — respectivamente no aumento de 200h para 400h de estágio supervisionado, bem como no aumento para 30% de carga horária em formação didático-pedagógica (no mínimo 960h), entre outras. Com relação ao Programa de Formação de Professores na USP (USP, 2004), a adequação volta-se à divisão da estrutura curricular em quatro blocos: I – disciplinas e atividades diretamente relacionadas aos conhecimentos específicos da área; II – disciplinas e atividades introdutórias à formação do professor da educação básica; III – disciplinas e atividades relacionadas à formação pedagógica em geral; IV – disciplinas e atividades relacionadas ao ensino das áreas específicas.

Com relação à carga horária do curso e à distribuição dos blocos de disciplinas ao longo dele, os seguintes enunciados também remetem, em sua memória discursiva, às tendências de formação docente, segundo Nardi e Cortela (2015). Mais especificamente, à origem das licenciaturas a partir dos cursos de bacharelado e à herança do modelo “3 + 1”.

No início da década de 80 existiam no campus de São Carlos as licenciaturas diurnas em Física, em Química e em Matemática, sendo as duas primeiras mantidas pelo, então, IFQSC, e esta última de responsabilidade do atual Instituto de Ciências Matemáticas e da Computação de São Carlos (ICMC). A experiência com as licenciaturas em Física e Química, estruturadas a partir dos respectivos cursos de bacharelado, levou à proposta de um curso inovador para a formação de professores para o Ensino Fundamental e Médio, considerando a complementaridade entre Física, Química e Matemática dentro da área de "Ciências Exatas". (USP, 2017, p. 1, grifo nosso)

Os cursos de licenciatura nas áreas das ciências inicialmente eram voltados para a especialização do docente e estruturados a partir dos respectivos cursos de bacharelado. Deste modo, o professor do Ensino Médio, por exemplo, de Física, Química ou Matemática, era o bacharel ao qual se forneceu alguma formação pedagógica, no modelo também conhecido como "3 + 1": depois de três anos (em geral) de formação específica acrescentava-se, ao final do curso, uma fração pedagógica pela substituição de disciplinas avançadas do bacharelado por disciplinas de conteúdo pedagógico. (Ibid., p. 2-3)

Essa historicidade ainda aparecia de forma mais explícita em décadas anteriores nas licenciaturas, segundo análise realizada por Kasseboehmer e Ferreira (2008), que apontava uma média de 15% a 12% da carga horária de cursos de licenciaturas das disciplinas científicas voltadas aos conteúdos pedagógicos no período e recorte daquela investigação. Ressaltamos que tal pesquisa é anterior à Deliberação 132/2015. Assim, no PPC atual da Licenciatura em Ciências Exatas, o cenário é bem mais promissor, pois há mais de 30% da carga horária total voltada à formação didático-pedagógica.

A estrutura curricular do curso em questão é dividida em oito semestres no período noturno. Na primeira metade, os estudantes cursam um núcleo geral e optam por uma habilitação a partir do quinto período. As disciplinas são divididas em quatro blocos, em conformidade com o Programa de Formação de Professores da USP (USP, 2004). A carga horária do curso é composta por 2670h de conteúdos curriculares de formação geral e aprofundamento, 1050h de conteúdos curriculares de formação didático-pedagógica, 200h de estudos integradores (atividades acadêmico-científico-culturais), 465h de prática como componente curricular e 400h de estágio curricular supervisionado. A ênfase no âmbito didático-pedagógico, além da crítica ao modelo “3 + 1” e da marca discursiva recorrente “integração”, aparecem em diversos enunciados do PPC, por exemplo:

A formação de professores de Ciências, Física, Química e Matemática para a Educação Básica demanda um trabalho coletivo e direcionado comprometido com os problemas escolares contemporâneos, centrando-se na compreensão de teorias e práticas [sic] pedagógicas [...] Como o curso está voltado para a formação de professores, sua estrutura curricular integra não só conteúdos dos campos da Matemática, da Física, da Química e da Biologia, mas também da Educação [...]. (USP, 2017, p. 2, grifos nossos)

A grade de disciplinas do curso garante uma solida [sic] formação teórica e interdisciplinar, com ênfase em atividades práticas e vivências na escola. (Ibid., p. 3, grifo nosso)

O "ciclo básico comum" também contempla disciplinas pedagógicas desde o primeiro semestre [...]. (Ibid., p. 4.)

O presente projeto pedagógico estabelece claramente que ele se fundamenta no fato de que, um curso voltado para a formação de professores deve ser rigoroso tanto no que se refere ao conteúdo específico quanto ao pedagógico, buscando contribuir para a formação do cidadão-educador.

A formação do professor ocorre durante todo o curso de graduação. As disciplinas "pedagógicas" são introduzidas seguindo uma sequência lógica e integrada, favorecendo a continuidade entre as disciplinas subsequentes.

[...]

É preciso também considerar que uma formação sólida nos conteúdos específicos obtida paralelamente à formação pedagógica não garante que o futuro professor tenha facilidade de vencer as dificuldades da realidade da sala de aula. Portanto, deve-se buscar a formação do professor de maneira integrada, desenvolvendo atividades que permitam a articulação entre a formação específica e a pedagógica, bem como um contato constante com a realidade escolar. (Ibid., p. 5, grifos nossos)

Desta forma, espera-se que o licenciado seja um profissional com conhecimentos sólidos e atualizados de teorias pedagógicas e de conteúdos científicos específicos e abrangentes. (Ibid., p. 7, grifo nosso).

Segundo Ernst-Pereira e Mutti (2011), o “excesso”, dado pela repetição, é um elemento importante a ser observado durante o processo de AD. Essa repetição remete a um reforçador ideológico. Observamos, assim, que a ênfase dada no documento ao aspecto pedagógico e à centralidade da formação de professores é bastante positiva. Nas repetições, ora as marcas discursivas referentes aos “conhecimentos pedagógicos” aparecem em primeiro plano, ao lado dos “conhecimentos científicos específicos” em segundo; ora esse foco se inverte. Podemos considerar que isso representa também a polissemia do discurso frente ao interdiscurso. Essa polissemia, expressa na alternância de focos, relembramos, é afetada pelas relações de poder históricas e ideológicas. Na seção “Perfil do licenciado” (USP, 2017, p. 8-9), notamos mais uma vez tal alternância, além da maior ênfase na esfera didático-pedagógica:

Em suma, notamos que a articulação do PPC com o interdiscurso das normativas relaciona-se, de fato, de maneira muito mais intensa com a estipulação/cumprimento de cargas horárias mínimas, de maneira heterônoma, como é explicitado no próprio documento. Entretanto, para além da questão de forma, existem conteúdos daquelas que também estão presentes nele, como exploraremos a seguir.

2.3 Articulação entre ensino, pesquisa e extensão e a parceria Escola-Universidade

Uma marca discursiva recorrente no PPC é a defesa pela articulação entre ensino, pesquisa e extensão. Esta remete ao interdiscurso do Programa de Formação de Professores da USP (USP, 2004) e à memória discursiva do modelo universitário vigente no Brasil (SOUZA et al., 2013; TRINDADE, 2000).

Considerando o papel da universidade em desenvolver atividades de pesquisa, ensino e extensão, bem como a importância de tais atividades para a formação de qualquer profissional, particularmente de professores, os licenciandos têm várias oportunidades de atuar em atividades de pesquisa e extensão universitária, seja realizando pesquisas de iniciação científica nos diversos grupos de pesquisa do campus USP-São Carlos, seja atuando em atividades de extensão promovidas pelo CDCC e por outras iniciativas, no campus.

Cabe destacar que em todas as unidades do campus USP-São Carlos envolvidas no oferecimento do Curso de Licenciatura (IFSC, IQSC, ICMC) existem grupos liderados por pesquisadores que atuam em cursos de pós-graduação e que se dedicam exclusivamente à investigação do Ensino de Ciências e Matemática. Neste contexto, aos licenciandos são oferecidas possibilidades de desenvolver iniciação científica não somente nas áreas de Física, Química e Matemática, como também nas áreas de Ensino de Física, de Química e de Matemática. (USP, 2017, p. 7, grifos nossos)

Pode dedicar-se, ainda, à extensão, divulgação científica, museus e centros de ciência, produção de material didático, modalidade de ensino à distância, entre outros. Pode ainda ingressar na pós-graduação visando a carreira no magistério em nível superior nas áreas de Educação, Ensino de Ciências e Matemática, ou áreas científicas e Engenharia. (Ibid., p. 10, grifos nossos)

As diversas estratégias pedagógicas adotadas no curso visam a formação integral do professor, apoiando suas atividades nos três pilares básicos da universidade: ensino, pesquisa e extensão. (Ibid., p. 10, grifos nossos)

Como a atividade de pesquisa é considerada uma vivência fundamental na formação do futuro professor, os alunos são estimulados a desenvolverem pesquisas de iniciação científica nos diversos grupos de pesquisa do campus. Muitas vezes estas atividades são desenvolvidas em grupos dedicados à pesquisa em ciências naturais e matemática, os quais têm forte atuação nos Institutos, mas em todas as unidades envolvidas no oferecimento do Curso de Licenciatura (IFSC, IQSC, ICMC) existem pesquisadores que atuam em cursos de pós-graduação e que se dedicam exclusivamente à investigação do Ensino de Ciências e Matemática. (Ibid., p. 11, grifos nossos)

- Atividades desenvolvidas junto ao CDCC (Centro de Divulgação Científica e Cultural), cujo principal objetivo é estabelecer um vínculo duradouro entre a Universidade e a Comunidade, facilitando o acesso da população aos meios e aos resultados da produção científica e cultural da Universidade. (Ibid., p. 11)

Os alunos têm a oportunidade de participar dos colóquios e seminários que ocorrem no campus. (Ibid., p. 13)

Com relação à memória discursiva dos modelos universitários modernos, Souza e cols. (2013) e Trindade (2000) apontam que o Brasil possui um modelo híbrido de Universidade. Nesse âmbito, o modelo napoleônico, proveniente da França, foi instituído no início do século XIX. Segundo Trindade (2000), a Universidade fundada naquele país era bastante centralizada e possuía forte vínculo com o Estado. Seu principal objetivo era a produção material e intelectual para formar técnicos e gestores que poderiam fomentar a política de expansionismo bélico francês. Além disso, Souza e cols. (2013) apontam que havia uma separação entre instituições voltadas a atividades de pesquisa e outras voltadas ao ensino. Já o modelo humboldtiano colocou-se como uma antítese ao modelo francês. Também do início do século XIX, ele foi originado na Prússia num contexto político em que ainda não haviam se formado os Estados-nação daquela região. Na região que hoje compõe a Alemanha, foi fundada a Universidade de Berlim, que se pautava na autonomia da instituição universitária — como forma de se proteger dos interesses da Igreja e Estado —, bem como na indissociabilidade entre ensino e pesquisa (TRINDADE, 2000).

No século seguinte, consolidar-se-ia, por sua vez, o modelo estadunidense de universidade. Este, com raízes no modelo britânico — inspirado, em partes, pelos dois modelos europeus anteriores —, tinha viés mais pragmático. Com o desenvolvimento do sistema de produção industrial no século XX, o viés desse terceiro modelo assumiu caráter alinhado aos interesses do mercado, à formação de profissionais para desenvolver as formas de produção agrícolas e industriais. Nesse momento, surge também a ideia de extensão, atrelada ao discurso de fomento aos interesses funcionais da sociedade.

Tanto o modelo humboldtiano quanto napoleônico e estadunidense influenciaram na forma como as instituições de nível superior se organizaram e se transformaram ao longo dos séculos XIX e XX. Assim, a característica da formação de pesquisadores e a defesa pela síntese entre pesquisa e docência — heranças humboldtianas — mostram-se presentes nas propostas universitárias, principalmente nas Universidades públicas brasileiras — em contraposição às instituições privadas, de fato mais alinhadas com demandas de mercado e de trabalho, como almeja o modelo estadunidense.

Contudo, Goergen (2014) indica que tal perspectiva liberal também influenciou a Universidade pública brasileira. No cenário atual, o nosso modelo universitário aproximou-se de maneira bastante intensificada da perspectiva estadunidense, compromissada com a lógica mercadológica, produtivista e conservadora das estruturas sociais. Essa aproximação ocorreu tanto após as reformas da década de 1960 como da década de 1990, a partir da influência estadunidense no país (CHASTEEN, 2016; NARDI; CORTELA, 2015; SGUISSARDI, 2015; LEMES, 2013; LIBÂNEO; 2012; ALTMANN, 2002).

Os três pilares da Universidade são debatidos por Freire e Shor (2013) em escritos sobre as mudanças em Universidades latino-americanas (argentinas e chilenas) a partir da década de 1970, às quais Freire vivenciou — antes dos respectivos golpes militares. Neles, o autor discorre sobre a reflexão das instituições sobre o seu papel, bem como sobre uma prática assistencialista ou verticalizada entre a Universidade e as classes populares. Nessa concepção, Freire defende a aproximação entre Universidade, movimentos sociais e grupos populares. Assim, ela deveria se colocar em serviço dos interesses populares e buscar compreender criticamente a relação entre conhecimentos científicos, saberes populares e senso comum.

No que se refere à pesquisa e ensino, Freire (2013) afirma em diversos momentos que elas seriam atividades indissociáveis. Segundo o autor, o ciclo do conhecimento é composto por dois momentos: o ato de conhecer o conhecimento existente; bem como o ato de produzir o novo conhecimento. O primeiro relaciona-se à docência, enquanto o segundo consiste na pesquisa. Ressalta, ainda, que estes são, de fato, momentos distintos, com suas características, mas não podem existir de maneira fragmentada.

Somado a isso, Freire e Shor (2013, p. 18) afirmam que tais momentos se relacionam dialeticamente. Em sequência, os autores criticam que a separação entre a produção de conhecimento e o ensino, se orientada pela lógica neoliberal dominante, faz com que as escolas se tornem espaços “para venda de conhecimento, o que corresponde à ideologia capitalista”. Os autores ressaltam ainda a maneira como o controle sobre a educação é realizado quando o professor é colocado em uma posição de reprodução técnico-instrumental de um currículo prescrito, produzido sem sua participação e imposto a ele. Tal perspectiva remonta à proletarização da carreira docente (CONTRERAS, 2002; DINIZ-PEREIRA, 2014).

Nessa esfera, percebemos que o PPC dialoga com uma memória discursiva que remonta a um modelo de Universidade construído e consolidado por décadas. O princípio pela pesquisa na Universidade — seja em seu conceito original do século XIX, seja na visão produtivista da segunda metade do século XX — manifesta-se nos enunciados do documento. Cabe apontar, entretanto, a partir da enumeração de grupos de pesquisa do campus, que existe pouco espaço à área de EC. Além disso, a opacidade do discurso do PPC remonta mais uma vez à polissemia. Portanto, não há um posicionamento explícito de uma concepção conservadora (produtivista, liberal ou tecnicista) ou transformadora tanto do ensino como da pesquisa e extensão universitárias.

Mais além, outra marca discursiva recorrente no PPC, que se aproxima em conteúdo do interdiscurso das normativas e das pesquisas em EC, é a articulação entre a Universidade e as escolas de Educação Básica. São diversos os enunciados do documento em que isso é percebido:

O curso de Licenciatura em Ciências Exatas é desenvolvido com uma forte ênfase nas relações entre teoria e prática. [...]

Nesse segundo sentido, a “prática” está também presente durante todo o curso de formação tanto pelas atividades externas, em escolas de Ensino Fundamental ou médio, bem como na forma mediada, a partir de narrativas orais e escritas, de análise de produções dos alunos, de situações registradas em textos, em estudo de casos, no uso de novas tecnologias (computador, vídeo, lousa digital etc.). Nesse enfoque, a prática contextualizada tem como fonte a própria prática desenvolvida no curso. (USP, 2017, p. 3, grifos nossos)

Dado o caráter público da educação, este curso busca o estabelecimento de ligações com as escolas das redes municipal e estadual através de atividades de estágio, pesquisa, acompanhamento, intervenção e melhoria da ação docente. (Ibid., p. 5, grifo nosso)

Muitas das disciplinas listadas na estrutura curricular da Licenciatura em Ciências Exatas, principalmente aquelas voltadas à formação pedagógica do futuro professor, possibilitam o desenvolvimento de diversas atividades práticas desenvolvidas nos laboratórios de ensino ou didáticos, como o Laboratório Interdisciplinar de Formação de Educadores - LIFE, simulando situações reais de ensino, junto a alunos da Rede Oficial de Ensino Fundamental e Médio [...] (Ibid., p. 10, grifo nosso)

[...] atividades de Iniciação à Docência desenvolvidas no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência – PIBID CAPES e Residência Educacional, em que os licenciandos recebem orientação de um professor da Universidade e de um professor da Educação Básica para desenvolver e aplicar atividades na escola básica, propiciando uma inserção mais profícua na escola. (Ibid., p. 11, grifo nosso)

- Acompanhamento e atendimento de grupos de alunos da Educação Básica no CDCC e público em geral nas exposições permanentes e temporárias do CDCC;

- Alunos da Licenciatura atuam como monitores em plantões de atendimento individual de alunos, nos quais trabalham com alunos da Educação Básica visando reforço e recuperação escolar;

- Atividades de difusão das ciências biomoleculares aos alunos do Ensino Médio das escolas de São Carlos e região, promovidas pelo Centro de Biotecnologia Molecular Estrutural (CBME/CEPID-FAPESP); [...]

- PIBID - Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência - O programa oferece bolsas de iniciação à docência aos alunos de cursos presenciais que se dediquem ao estágio nas escolas públicas e que, quando graduados, se comprometam com o exercício do magistério na rede pública. O objetivo é antecipar o vínculo entre os futuros mestres e as salas de aula da rede pública. Com essa iniciativa, o Pibid faz uma articulação entre a educação superior (por meio das licenciaturas), a escola e os sistemas estaduais e municipais. (Ibid., p. 12-13, grifos nossos)

9. ESTÁGIOS SUPERVISIONADOS E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS

Os estágios supervisionados e as práticas pedagógicas como componentes curriculares proporcionam ao aluno contato, ao longo de todo o curso, com a realidade escolar. Isso possibilita que o aluno presencie e vivencie experiências reais, preparando-o para assumir a liderança de uma sala de aula, assim como trocar experiências com professores em serviço e outros profissionais envolvidos na rotina escolar, como os profissionais da administração escolar. [...]

Com as escolas de Educação Básica, preferencialmente da rede pública de ensino, são desenvolvidas atividades de observação, regência, entre outras. (Ibid., p. 14, grifos nossos)

Outra marca discursiva alinhada a essa ideia, a “contextualização”, não é definida abertamente no PPC. Entretanto, a Resolução CNE 2/2015 (BRASIL, 2015) a define como:

§ 1o Por educação entendem-se os processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na convivência humana, no trabalho, nas instituições de ensino, pesquisa e extensão, nos movimentos sociais e organizações da sociedade civil e nas relações criativas entre natureza e cultura.

§ 2o Para fins desta Resolução, a educação contextualizada se efetiva, de modo sistemático e sustentável, nas instituições educativas, por meio de processos pedagógicos entre os profissionais e estudantes articulados nas áreas de conhecimento específico e/ou interdisciplinar e pedagógico, nas políticas, na gestão, nos fundamentos e nas teorias sociais e pedagógicas para a formação ampla e cidadã e para o aprendizado nos diferentes níveis, etapas e modalidades de educação básica. (BRASIL, 2015, p. 4)

Notamos nesses enunciados do PPC um posicionamento político em torno da educação como direito público e universal. É bastante importante que esse posicionamento seja colocado de forma documental, em contrapartida a uma visão mercadológica de educação como produto — uma vez que essa tendência é bastante hegemônica no sistema educacional atual.

Entretanto, ressaltamos que o PPC não é imune a esse viés ideológico. Em dois enunciados, emerge a marca discursiva “mercado de trabalho”, respectivamente nas seções de “Objetivos” e “Avaliação”:

colocar docentes no mercado de trabalho com formação adequada para ensinar Física, Química ou Matemática para o Ensino Médio, bem como Ciências para o Ensino Fundamental [...] (Ibid., p. 7, grifo nosso)

O mercado de trabalho e a evolução profissional dos egressos servem como uma forma de monitorar o curso. (Ibid., p. 21, grifo nosso)

Mais que isso, o discurso materializado no PPC se aproxima da perspectiva neoliberal em outra esfera: a da pedagogia das competências e habilidades.

2.4 Perspectivas pragmáticas neoliberais: a pedagogia das competências nos discursos oficiais

De forma mais velada e recorrente, o alinhamento com concepções neoliberais aparece repetidamente no que diz respeito a marcas discursivas, tais como “competências”, “habilidades”, “capacitação” e outros termos permeados pela lógica pragmática produtivista:

Como o curso está voltado para a formação de professores, sua estrutura curricular integra não só conteúdos dos campos da Matemática, da Física, da Química e da Biologia, mas também da Educação, e desenvolve no aluno habilidades para sua atuação no Ensino Fundamental e no Ensino Médio. (Ibid., p. 2, grifo nosso)

4 OBJETIVOS

- garantir uma formação tanto ampla como flexível, incluindo habilidades e conhecimentos necessários às expectativas presentes e capacidade de atuação em perspectivas futuras que já se delineiam na sociedade nacional e mundial; [...]

- ser um curso inovador na sua proposta de formar profissionais competentes e capazes de acompanhar as constantes mudanças de uma realidade globalizada;

- propiciar a construção, nos futuros professores, das competências docentes requeridas para ensinar e fazer com que os alunos aprendam de acordo com os objetivos e diretrizes pedagógicas traçadas pela legislação para a educação básica. (Ibid., p. 7, grifos nossos)

Outro aspecto a ser considerado é a capacitação do profissional em se aprofundar em áreas do conhecimento relacionadas com o curso e administrar sua formação continuada [...] (Ibid., p. 7, grifos nossos)

Quanto às habilidades e competências, o licenciado em Ciências Exatas (seja qual for a habilitação escolhida) deve ser capaz de: (Ibid., p. 8, grifos nossos)

A formação do Licenciado em Ciências Exatas deve contemplar as habilidades, competências e vivências definidas acima de uma forma ampla o suficiente para que o profissional formado possa atuar segundo as perspectivas atuais e, ao mesmo tempo, possa adaptar-se aos desafios futuros, tendo em vista as novas demandas sociais, culturais e econômicas da sociedade. (Ibid., p. 9, grifos nossos)

Duarte (2010) e Saviani (2011) apontam que, desde os anos de 1990, existe uma hegemonia de princípios pedagógicos do construtivismo, da pedagogia das competências e do professor reflexivo. Para ambos, apesar da heterogeneidade dessas linhas, todas se fundamentam em bases gerais da pedagogia pragmática do final do século XIX, representada por Dewey e pelo escolanovismo, além da psicologia genética de Jean Piaget, já do século XX. Tais linhas pedagógicas adentraram não só as instituições básicas de ensino, mas também diversos cursos de formação de professores e, principalmente, os documentos oficiais produzidos pós-reformas da década de 1990. Para Duarte (2010), essas linhas fundam-se em uma visão idealista de ensino, propondo que a solução para os problemas contemporâneos estaria em mudanças no plano das ideias. Como consequência, ignora-se a materialidade concreta das relações de produção e trabalho que são, de fato, as origens de tais problemas.

Além disso, Duarte (2010) afirma que essas tendências hegemônicas estão atreladas a valores mercadológicos, como o utilitarismo, o pragmatismo, a desestruturação. Tais valores são defendidos com o intuito de preparar e adaptar as pessoas à forma capitalista neoliberal de organização do trabalho, através de slogans como empreendedorismo e flexibilidade. Atrelado a eles, surge a ideia de pedagogia das competências, com base nas ideias de Perrenoud, para defender um ensino de viés prático-utilitário. Mais que isso, o autor (Ibid.) denuncia o papel do relativismo para esvaziar a função da escola de promover o acesso e a apropriação de toda a população aos conhecimentos sistematizados. Desse modo, o slogan da educação para o cotidiano ganha espaço e ênfase nas propostas de ensino. Com base na discussão marxista de Heller sobre cotidiano, Duarte (Ibid.) critica como o ensino encerrado no cotidiano torna-se mera reprodução utilitarista e imediatista das condições de existência do indivíduo e da sociedade. Elencamos também a crítica de Young (2007, p. 1297) acerca desta questão:

Isso significa que, se as escolas devem cumprir um papel importante em promover a igualdade social, elas precisam considerar seriamente a base de conhecimento do currículo, mesmo quando isso parecer ir contra as demandas dos alunos (e às vezes de seus pais). As escolas devem perguntar: “Este currículo é um meio para que os alunos possam adquirir conhecimento poderoso?”. Para crianças de lares desfavorecidos, a participação ativa na escola pode ser a única oportunidade de adquirirem conhecimento poderoso e serem capazes de caminhar, ao menos intelectualmente, para além de suas circunstâncias locais e particulares. Não há nenhuma utilidade para os alunos em se construir um currículo em torno da sua experiência, para que este currículo possa ser validado e, como resultado, deixá-los sempre na mesma condição.

Tal pragmatismo também é desvelado em outra crítica de Duarte (2003) acerca da racionalidade prática e da ideia de professor reflexivo. Nesse contexto, o conhecimento tácito é elevado a um status equivalente ao dos conhecimentos teóricos, esvaziando-os e relativizando-os. No mesmo sentido, o ideal do construtivismo também atua como uma relativização dos conhecimentos e um fechamento dos estudantes em seu cotidiano imediato. Assim, ficam sem possibilidade de transformação, apenas de reprodução de sua realidade (DUARTE, 2010). A crítica de Gimeno Sacristán (2013, p. 33) também vai ao encontro desta visão:

A orientação racional moderna na educação está sendo mediada pela visão utilitária de uma sociedade marcada pelo desenvolvimento tecnológico e sua aplicação às atividades laborais e cotidianas. O velho lema da educação progressista do início do século, que sustentava a necessidade de que a escola deveria nos preparar para a vida, hoje, mais do que nunca, é aplicado por meio da pressão crescente do sistema de produção sobre o escolar, selecionando nesse os saberes que lhes são mais úteis.

O que se denominou “vocacionalização” dos currículos se converteu em uma força que leva à seleção de conteúdos de acordo com seu valor de aplicação, funcionando como uma ideologia que tende a articular melhor o sistema de ensino ao mercado de trabalho em uma economia com alto desemprego (Lauglo; Willis, 1998 [apud Gimeno Sacristán, 2013]). Como consequência, as humanidades, a cultura clássica e as ciências sociais são desvalorizadas dentro dos sistemas educacionais, e são promovidas, por exemplo, a matemática, a ciência, o conhecimento aplicado em geral e os idiomas modernos.

Apesar de divergências teóricas, a concepção freireana também converge com a crítica resgatada pelos três autores citados. Freire (2015), ao discorrer sobre o contexto concreto e contexto teórico, também parte de uma compreensão histórica, bem como dialética e praxiológica, ancorado em Sánchez Vázquez.

Para Freire (2015), a experiência existencial consiste em uma experiência social e histórica. Nessa compreensão, as percepções e concepções humanas são interpeladas pela história (que é feita pelos sujeitos, mas também os faz/refaz). Essas percepções podem ser críticas — se fundadas numa concepção metodicamente rigorosa —, ingênuas ou até mágicas — se fundadas em dogmas ou explicações míticas/místicas da realidade.

Ainda para Freire (2015), o cotidiano abrange ações que foram originadas da vivência social, mas que se tornaram hábitos automatizados. Por isso, não são mobilizadas nas ações cotidianas por meio de uma curiosidade epistemológica. Por outro lado, o contexto teórico consiste, para o autor, no afastamento momentâneo da prática, para que possamos agir com curiosidade epistemológica e refletir sobre tais fenômenos. Ressalta, ainda, que esse movimento não pode prescindir das ciências.

A distinção entre curiosidade ingênua e epistemológica, para Freire (2014), não é dada como uma simples contrariedade, mas sim como um movimento de superação por incorporação. A curiosidade ingênua possui caráter simplificado, imediatista. Isso não é compreendido por Freire de forma pejorativa, mas sim como um ponto de partida para a reflexão e investigação mais ampla. Ou seja, a curiosidade ingênua gradativamente transforma-se em curiosidade epistemológica — por meio da dialogicidade e permanente busca por superação das percepções imediatistas do senso comum. Assim, a curiosidade epistemológica funda-se num rigor metódico para a investigação e elaboração de reflexões, de maneira mais crítica e embasada também em fundamentos teóricos mais profundos.

Para Freire (2015), portanto, teoria e prática são indissociáveis. A reflexão sobre a prática ocorre a partir do distanciamento parcial do contexto concreto para o contexto teórico, com o intuito de apreensão dos saberes sobre a prática. O autor critica igualmente uma concepção empirista na formação docente, em que seria possível formar educadores na prática sem nenhuma teoria, esvaziando-a.

A dialeticidade entre prática e teoria deve ser plenamente vivida nos contextos teóricos da formação de quadros. Essa ideia de que é possível formar uma educadora praticamente, ensinando-lhe a como dizer bom-dia a seus alunos, a como moldar a mão do educando no traçado de uma linha, sem nenhuma convivência séria com a teoria é tão cientificamente errada quanto a de fazer discursos, preleções teóricas, sem levar em consideração a realidade concreta, ora das professoras ora das professoras e de seus alunos. (FREIRE, 2015, p. 76)

O discurso construtivista criticado por Duarte (2010) também emerge a partir da memória discursiva nas seguintes marcas do PPC, além de outros citados anteriormente.

Partindo da certeza da importância de que o professor desenvolva em seus alunos a capacidade de relacionar a teoria com a prática, torna-se indispensável que, na formação inicial do futuro docente, os conhecimentos especializados sejam contextualizados, de modo a promover uma permanente construção desses conhecimentos com sua aplicação, de preferência em situações reais, sua importância e relevância, na vida pessoal e social, e sua validade para a compreensão de fatos da realidade. (USP, 2017, p. 3, grifo nosso)

b) Ser capaz de relacionar os conhecimentos científicos e matemáticos com a realidade do aluno, mostrando sua utilidade prática, relacioná-los com os fenômenos observados no cotidiano, com outras áreas do conhecimento, bem como com suas aplicações tecnológicas;

c) Utilizar-se de recursos tecnológicos como ferramenta para a construção do conhecimento; [...]

f) Encarar os alunos como agentes da construção de seu conhecimento e assumir, enquanto professor, funções que propiciem esta construção, tais como as de organizador, facilitador, mediador, incentivador e avaliador; [...]

i) Planejar e desenvolver atividades didáticas apropriadas para a realidade em que atua, buscando a construção do conhecimento e desenvolvimento do espírito crítico por parte dos alunos;

A partir dessa crítica percebemos que tais visões de mundo esvaziadas não promovem a transformação social e educacional, mas se alinham à sua conservação. Dessa maneira, estão interligadas à formação ideológica hegemônica. Tal formação ideológica, por sua vez, determina os ditos e os modos de dizer de todo o interdiscurso que traz essas visões: seja o PPC, seja a Lei de Diretrizes e Bases, seja a BNCC ou referenciais curriculares regionais/locais. A BNC-Formação (BRASIL, 2019), mesmo posterior ao PPC analisado, apresenta um prolongamento da lógica da racionalidade prática, do ensino utilitarista restrito ao cotidiano. Não só prolonga, como intensifica esse movimento. Assim, por um lado, a ênfase na articulação entre teoria e prática, refletida inclusive sobre o aumento de carga horária didático-pedagógica, é um componente interessante. Por outro lado, a ausência de filiações teóricas explicitamente críticas pode contribuir para reforçar as tendências pragmáticas e proletarizadas na formação docente.

Outro conjunto de marcas discursivas a ser debatido nessa esfera diz respeito a termos relacionados à reflexão crítica, como nos enunciados a seguir, com bastante opacidade.

A formação de professores de Ciências, Física, Química e Matemática para a Educação Básica demanda um trabalho coletivo e direcionado comprometido com os problemas escolares contemporâneos, centrando-se na compreensão de teorias e práticas pedagógicas, bem como no compromisso para a construção de uma sociedade justa e democrática. (USP, 2017, p. 1)

O presente projeto pedagógico estabelece claramente que ele se fundamenta no fato de que, um curso voltado para a formação de professores deve ser rigoroso tanto no que se refere ao conteúdo específico quanto ao pedagógico, buscando contribuir para a formação do cidadão-educador. (Ibid., p. 5)

É necessário, então, criar condições, durante toda sua formação para que o futuro professor exerça efetivamente não só uma liderança intelectual, mas também social e política que possa contribuir ativamente para a melhoria, não só́ do ensino, como também da Escola, da Educação, da Comunidade e do País. (Ibid., p. 5-6)

A pesquisa é atividade essencial na formação docente, pois o desenvolvimento de uma postura investigativa como parte do processo de formação docente facilita uma atuação reflexiva tanto em relação ao conteúdo específico a ser ensinado, como com relação à prática pedagógica do futuro professor. (Ibid., p. 6)

A formação de professores pelo Curso de Licenciatura em Ciências Exatas interunidades do campus da USP de São Carlos deve considerar uma sólida formação científica e humanista do profissional, considerando também uma formação generalista, crítica e ética do futuro professor.

Espera-se também que o egresso seja um profissional dinâmico e capaz de criar e aperfeiçoar estratégias didáticas e pedagógicas que estimulem o aprendizado e o espírito crítico de seus alunos. (Ibid., p. 7)

e) Refletir criticamente sobre sua própria prática pedagógica; [...]

h) Analisar criticamente materiais didáticos, tanto do ponto de vista do conteúdo específico quanto dos conteúdos ideológico e cultural envolvidos; [...]

n) Pautar sua conduta profissional por critérios éticos e humanísticos, de rigor científico e de responsabilidade social. (Ibid., p. 8-9)

c) Leitura, reflexão e discussão de textos de divulgação científica e literatura relacionada com aspectos epistemológicos e históricos da ciência; [...]

f) Elaboração de atividades de ensino, sua execução em sala de aula e reflexão crítica sobre o processo. (Ibid., p. 9)

[...] promover a reflexão dos licenciandos sobre os aspectos e caraterísticas do trabalho docente e da escola contemporânea, oferecendo-lhes a oportunidade de ampliar e utilizar as habilidades e os conhecimentos adquiridos no Curso para, a partir de uma postura investigativa e problematizadora, responder às necessidades e aos desafios da realidade escolar. (Ibid., p. 14)

Nestas disciplinas, a prática pedagógica é desenvolvida com ênfase nos procedimentos de observação e reflexão sobre a realidade escolar, visando à atuação em situações contextualizadas e a resolução de situações-problema. (Ibid., p. 15)

Orlando (2022), ao analisar diretrizes curriculares sobre os cursos de ciências biológicas, aponta para a materialização dos valores cognitivos, sociais e pessoais naqueles. Para a autora, marcas discursivas como cidadania e democracia materializam-se com grande polissemia, uma vez que suas filiações teóricas são silenciadas. De um lado, é possível notar a interpelação da ideologia hegemônica, voltada aos valores de mercado. Dentre eles, é possível elencar o consumismo, a flexibilidade para o mercado, e uma noção passiva de participação.

Por outro lado, tais marcas também podem ser relacionadas à crítica ao modelo de sociedade, ao consumismo, bem como uma compreensão de participação tal como ativa, dialógica e problematizadora. Alinhada com a perspectiva freireana (FREIRE, 2015, 2014, 2013, 2011, 1989), as marcas discursivas citadas podem e devem estar explicitamente relacionadas ao desvelamento colaborativo das situações-limite, para que possam desenrolar-se na superação dessas, e por fim, na transformação da sociedade.

Consideramos, por sua opacidade, que essas marcas aparecem de maneira bastante pontual, desconexa e artificial. No contexto da formação discursiva em que estão inseridas, tais marcas — por não serem elaboradas ou discutidas — aparecem como jargões e lugares-comuns dos discursos da área da Educação; ou seja, aparecem como paráfrases. Não é possível considerar que elas, isoladas, tenham uma filiação explícita com memórias discursivas de referenciais de fato críticos, como da Pedagogia Libertadora ou outras. Por outro lado, o slogan esvaziado da “reflexão crítica” remete a uma formação ideológica liberal hegemônica, que permeia a formação de professores na atualidade, como viemos discutindo até então.

2.5 Silêncios e ausências: a discussão sobre equidade na Educação

Se as normativas são elencadas para justificar o cumprimento de carga horária, por outro lado, diversos conteúdos daquelas não são abarcados no PPC. A Resolução CNE 2/2015 (BRASIL, 2015, p. 3) trata, em diversos momentos, das inúmeras modalidades de ensino: “Educação de Jovens e Adultos, Educação Especial, Educação Profissional e Tecnológica, Educação do Campo, Educação Escolar Indígena, Educação a Distância e Educação Escolar Quilombola”. Outras perspectivas importantes da Resolução, mas ausentes no PPC, dizem respeito à diversidade, à equidade e à inclusão educacional universal:

CONSIDERANDO que a igualdade de condições para o acesso e a permanência na escola; a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber; o pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas; o respeito à liberdade e o apreço à tolerância; a valorização do profissional da educação; a gestão democrática do ensino público; a garantia de um padrão de qualidade; a valorização da experiência extraescolar; a vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais; o respeito e a valorização da diversidade étnico-racial, entre outros, constituem princípios vitais para a melhoria e democratização da gestão e do ensino; (BRASIL, 2015, p. 2)

VI - as questões socioambientais, éticas, estéticas e relativas à diversidade étnico-racial, de gênero, sexual, religiosa, de faixa geracional e sociocultural como princípios de equidade. (Ibid., p. 5)

O pensamento freireano ainda é muito atual, principalmente se tratando das condições de opressão na sociedade e o papel da educação diante disso. Arroyo (2019) discutiu recentemente como a obra de Freire pode contribuir para a manifestação de um outro paradigma na formação docente voltado para essas condições. A crítica do autor centra-se no fato de que as formas de dominação desveladas por Freire (o processo de desumanização; o deslocamento dos sujeitos oprimidos de uma posição de reconhecimento de sua vocação de ser mais; as violências institucionais que sofrem para manutenção das condições de dominação) precisam ser explicitadas no currículo dos cursos de formação de professores. Mais que isso, o autor resgata a proposição freireana de que os oprimidos precisam ser reconhecidos como sujeitos que resistem, que visam à libertação e à emancipação e que lutam por sua humanização.

Essa proposição vai ao encontro dos enunciados da Resolução supracitada (BRASIL, 2015), mas estão silenciadas no discurso materializado no PPC. De acordo com o Orlandi (2005), compreendemos que este último não é a fonte do discurso. Pelo contrário, a origem desses sentidos, que condiciona não só o que deve ser dito (como tratamos até então), mas também o silêncio, o não-dito, é dada na exterioridade, nas condições de produção, na formação ideológica. Além disso, o dito e o silêncio são trazidos na autoria do discurso de forma inconsciente. Consideramos, dessa maneira, que quando o PPC explicita a Resolução CNE/CP 2/2015 como uma diretriz, tal como exigência, mas utiliza-a apenas no que diz respeito à carga horária do curso e relega a discussão sobre diversidade e equidade ao silêncio, essa marca é um traço da interpelação ideológica que permeia seu contexto. Mais além, segundo Orlandi (2007), o silêncio consiste justamente em um ponto de deriva, de transformação do sentido.

Consideramos problemático que essa questão seja silenciada e que marcas discursivas como “reflexão”, “crítica”, “problematização”, “cidadania”, “democracia” apareçam de forma artificial no documento, como já abordado. Como aponta Adorno (1979, apudMAAR, 2003, p. 459), ao discorrer sobre a semiformação e a indústria cultural: “Toda sociedade ainda é de classes, [...] [mas se] subjetivamente encoberta, a diferença de classes cresce objetivamente”. Em alinhamento com Arroyo (2019) e Freire (2011, 2014), consideramos que é central no processo educativo o desvelamento das situações-limite, em comunhão entre educandos e educadores. Aqueles, por sua vez, precisam de uma formação docente voltada para a Educação Libertadora, de forma explícita.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao analisar o PPC, é possível notar que este está inserido em uma formação discursiva e ideológica que resgata diversas memórias discursivas tanto de documentos normativos (em nível nacional, estadual e institucional da própria Universidade) como de debates da pesquisa em educação, como de concepção de formação de professores, de modelos formativos.

Por um lado, essa memória determina muitos pontos a serem ditos. Dentre eles, apontamos os discursos da articulação entre teoria e prática, bem como entre saberes específicos e didático-pedagógicos na formação docente; da articulação entre ensino, pesquisa e extensão universitária; da aproximação entre Universidade e Escola; da influência da pedagogia das competências e construtivistas. Esses diversos interdiscursos de forma alguma são homogêneos. Nesses diversos aspectos, elencamos uma multiplicidade de visões de mundo, ora alinhadas com a ideologia dominante e sua manutenção, ora defensoras de sua superação e transformação.

Por outro lado, alguns silenciamentos do interdiscurso do PPC foram notados. Se uma fração dos discursos resgatados na memória discursiva tendiam à reprodução das condições materiais atuais, há diversos pontos de proposição crítica de superação dessas condições. Inúmeros referenciais discutem as possibilidades de superação de tais situações-limites, a partir de diferentes caminhos (FREIRE, 2015, 2014, 2013, 2011, 1989; ORLANDO, 2022; SILVA; THERRIEN, 2022; MAGOGA; MUENCHEN, 2021; ARROYO, 2019; CÁSSIO; CATELLI JÚNIOR, 2019; LAGOA, 2019; AGUIAR; DOURADO, 2018; COMPIANI, 2018; FLÔR; TRÓPIA, 2018; NEIRA, 2018; SGUISSARDI, 2015; DINIZ-PEREIRA, 2014; DULLO, 2014; GOERGEN, 2014; FREIRE; SHOR, 2013; LEMES, 2013; LIBÂNEO, 2012; SAVIANI; 2011, 2007, 2002; DUARTE, 2010, 2003; YOUNG, 2007; MAAR, 2003; CONTRERAS, 2002).

Ao analisar tal discurso, relacionado à sua memória discursiva, consideramos que essas perspectivas crítico-transformadoras não podem nem devem aparecer de maneira velada ou implícita. Assim, compreendemos que o movimento para a superação das condições materiais, dada a importância atribuída à Educação — e, por conseguinte, à formação dos sujeitos educadores — precisa ser defendido em um posicionamento explícito nesse tipo de documento voltado à formação docente. Em contrapartida, nesse movimento, em sintonia com Orlandi (2007) e Freire (2014, 1989), podemos considerar o silêncio e a inconclusão presentes no discurso materializado no PPC justamente como pontos de deriva. Ou seja, como pontos de transformação, de desvio e superação da lógica hegemônica.

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Notas

[1] Apesar da nomenclatura “Ciências Exatas”, o curso visa a formação de professores de ciências da natureza para os anos finais do Ensino Fundamental, e oferece habilitações em física, química e matemática para o Ensino Médio.
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