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O "discurso da cidadania" e a diferença de gênero

Pietro Costa
Università degli Studi di Firenze, Brasil

O "discurso da cidadania" e a diferença de gênero

RDUno: Revista do Programa de Pós- Graduação em Direito da Unochapecó, vol. 2, núm. 3, 2019

Universidade Comunitária da Região de Chapecó

Recepção: 30/01/20

Aprovação: 28/03/20

Resumo: O objetivo do ensaio é traçar uma história de longo respiro sobre o modo como os discursos da cidadania trataram a diferença de gênero na Europa ocidental da Idade Média ao século XX, entendendo discursos da cidadania como um mosaico de textos pertencentes a diferentes saberes, mas agrupados pela pretensão de estabelecer uma representação geral e abstrata do sujeito e da relação que ele instaura com a comunidade política. Nesse sentido, os discursos da cidadania no que diz respeito à diferença de gênero podem girar em torno de distintos tópicos: hierarquia, corpo e família na Idade Média; igualdade, a partir do jusnaturalismo do século XVII, passando por discursos como os de Mary Wollstonecraft e Olympes de Gouges no século XVIII; a igualdade ainda é importante para o emancipacionismo dos séculos XIX e XX, mas ele valoriza de uma maneira peculiar a identidade de gênero. Diferentes maneiras de abordar o campo de tensão entre igualdade e diferença que tiveram que enfrentar, também, discursos que renovavam tradicionais tópicos de subalternização a partir de novas perspectivas cientificistas e modernizadoras, especialmente no final do século XIX e durante os totalitarismos, de modo que somente com segundo pós-guerra e com o fim das aventuras ‘totalitárias’ é que o tema da diferença feminina volta a ser relacionado com o princípio da igualdade, que constitui um dos elementos inspiradores das novas democracias constitucionais.

Palavras-chave: história do direito, cidadania, gênero, igualdade.

Abstract: The aim of this essay is to trace a long-term history on how citizenship discourses have treated gender difference in Western Europe from the Middle Ages to the 20th century. I understand citizenship discourses as a mosaic of texts belonging to different fields of knowledge that seeks the establishment of a general and abstract representation on the subject and its relationship with the political community. In this sense, citizenship discourses with respect to gender difference can revolve around different topics: hierarchy, body and family in the Middle Ages; equality, from 17th-century jusnaturalism, passing through discourses such as those of Mary Wollstonecraft and Olympes de Gouges in the 18th century; equality is still important for the emancipation discourse of the 19th and 20th centuries, but it values gender identity in a peculiar way. Different ways of approaching the tension field between equality and difference had to face, also, discourses that renewed traditional subordination topics from new scientific and modernizing perspectives, especially in the late nineteenth century and during totalitarianisms. Only after the Second World War with the end of the 'totalitarian' adventures the theme of female difference is again related to the principle of equality, which constitutes one of the inspiring elements of new constitutional democracies.

Keywords: legal history, citizenship, gender, equality.

1

A expressão “discurso da cidadania” que figura no título deste ensaio pede algumas especificações que permitam explicitar o seu sentido e delinear o problema historiográfico que eu gostaria de analisar.

“Cidadania” é uma expressão antiga à qual atribuo um significado mais amplo e fértil. Estudar a cidadania, nesse novo sentido, significa, em primeiro lugar, estudar a relação entre os sujeitos e a ordem político-social: não mais estudar o sujeito e a ordem como linhas paralelas, mas sim constatar o ponto de cruzamento de um elemento sobre o outro. Cidadania é, portanto, um termo metalinguístico que uso para analisar um tema específico: o sujeito e a sua relação com a ordem política. Falar de cidadania significa olhar a constituição da ordem de baixo para cima, do sujeito para a ordem objetiva: o ponto de vista da cidadania é o ponto de vista do sujeito, é o olhar do sujeito sobre a comunidade politicamente ordenada.

Assumida nesse significado, a cidadania pertence não à linguagem-objeto, mas à metalinguagem do historiador: “cidadania” é um filtro, é o instrumento que permite recortar, no magma das experiências, uma área temática, o instrumento que serve para delinear a questão a ser dirigida ao passado, para determinar o objeto da narração historiográfica.

Admitamos, portanto, que o objeto da narração historiográfica é a relação entre o indivíduo e a comunidade política: essa narração pode ser ambientada em qualquer contexto histórico, remoto ou recente, podendo envolver os mais diferentes aspectos da realidade. É necessário, portanto, introduzir critérios de redução da complexidade: é necessário indicar não somente as coordenadas espaciais e temporais da narração, mas, também, o “nível de realidade” ao qual a narração se refere. O pertencimento a uma comunidade política, de fato, é o momento de um processo ‘global’ que atinge qualquer aspecto da vida individual e coletiva: toda sociedade se organiza indicando aos próprios membros ônus e privilégios, distribuindo o poder e a riqueza, pondo regras e impondo-as coativamente, e, ao mesmo tempo, toda sociedade se traduz em palavra, se reflete no espelho dos símbolos, dos saberes, das retóricas, toda sociedade tenta, em suma, se tornar transparente a si mesma recorrendo a uma densa e complicada trama de discursos. É a este último nível de realidade que pretendo associar a minha narração historiográfica; e é isso o que eu chamo, por amor à brevidade, de “discurso da cidadania” que é, exatamente, um mosaico de textos pertencentes a diferentes saberes, mas agrupados pela pretensão de estabelecer uma representação geral e abstrata do sujeito e da relação que ele instaura com a comunidade política.

A questão primária, a questão que, de certo modo, funda todo o discurso da cidadania, concerne, portanto, ao sujeito; é preciso lembrar que o indivíduo é uma realidade tão complexa quanto elusiva: quanto mais complexa, mais aparentemente subtraída às transformações, enganosamente unívoca, ‘naturalmente’ igual a si mesma. Na realidade, a percepção da subjetividade e a própria ideia de indivíduo são construções histórico-culturais, são o resultado de complicados processos de interpretação e de ‘simbolização’ aos quais toda sociedade e cultura submetem a realidade ‘natural’.

O indivíduo, certamente, não aparece no discurso da cidadania em todo o espectro (obviamente amplíssimo) das suas manifestações: o sujeito emerge somente como o primeiro termo de uma relação que tem na outra ponta a comunidade política; do sujeito, portanto, o discurso da cidadania aborda os aspectos que uma determinada cultura assume como relevantes para a representação da dinâmica político-social.

Os conteúdos que marcam o relacionamento entre o sujeito e a ordem político-social são bastante variados: ser cidadão na Atenas de Péricles, na Florença de Dante ou na Nova Iorque dos nossos dias são experiências dificilmente comparáveis e parece imprudente buscar identificar analogias efetivas e continuidades subjacentes. É possível, talvez, focar apenas alguns aspectos formais que possam servir para estabelecer em termos mais analíticos o nosso problema historiográfico.

Ora, o discurso da cidadania é (segundo a definição convencional proposta) o discurso ‘infinito’ que uma sociedade desenvolve sobre si mesma para compreender-se, para exprimir as suas expectativas e os seus valores oferecendo uma visão, de maneira simultânea e complementar, do sujeito (dos sujeitos) e da ordem. O discurso da cidadania no momento em que desenvolve uma representação sintética e global da ordem político-social, se pronuncia também sobre a posição dos sujeitos: nos diz quem são os sujeitos, quais são as suas características essenciais e, com base nisso, dispõe os sujeitos na ordem, designa a eles uma função específica, atribui seus privilégios e ônus.

Concentrado na relação entre os sujeitos e a civitas, o discurso da cidadania, portanto, está ligado à dialética do uno e dos muitos: o seu centro focal (e a sua mais relevante dificuldade) é, assim, representar o processo de unificação dos múltiplos, a convergência dos sujeitos em torno de um centro, a sua constituição em uma comunidade política. O discurso, porém, não é um ponto de vista externo e indiferente em relação ao objeto a que se refere: em primeiro lugar, o discurso não é a foto aérea de uma cidade já edificada; não há, de um lado, a ordem, e, do outro, o discurso que a reflete mais ou menos fielmente; ao contrário, o que existe é uma multiplicidade enormemente complexa de ações e interações sociais e um discurso que, das mais diferentes formas, as exprime, as transforma em palavras, dando a elas um sentido. Em segundo lugar, o discurso não é a asséptica contemplação dos muitos e do uno: sendo parte integrante do processo social, o discurso influencia a dinâmica, ele próprio se transforma em uma prática, veículo de transformação, instrumento dos projetos e lugar de conflitos.

O discurso da cidadania representa, portanto, o processo através do qual os sujeitos se organizam e se constituem como membros de uma comunidade política: isso tem a ver não com ‘todos’ os sujeitos, mas com aqueles sujeitos que compartilham ao menos uma característica: estar ligado a uma determinada comunidade política. O discurso da cidadania representa e sanciona a inclusão dos sujeitos dentro de uma comunidade e, exatamente por isso, separa os ‘seus’ sujeitos dos outros sujeitos; ele se estrutura em torno de uma primeira e fundamental diferença: a diferença entre incluídos e excluídos, entre interno e externo; e é em relação a essa diferença constitutiva que o discurso da cidadania sempre tende a redesenhar algumas figuras recorrentes de oposição, como cidadão/estrangeiro, cidadão/hóspede, cidadão/inimigo.

As diferenças ligadas ao dispositivo de inclusão/exclusão característico de toda comunidade política não são, porém, as únicas que o discurso da cidadania deve representar e ‘tratar’. É verdade que os sujeitos ‘incluídos’, os sujeitos ligados a uma comunidade, são entre eles iguais ao menos desse ponto de vista; mas não é verdade que esse elemento de igualdade anule qualquer diferença residual. Estar dentro, de fato, incide de modo relevante na identidade político-jurídica do sujeito incluído, mas não a exaure. Os muros da cidade delimitam e fixam o palco no qual os sujeitos devem se mover, mas, uma vez determinado o palco, a interpretação, por assim dizer, ainda precisa começar; e a interpretação é um complicado jogo interativo em que cada sujeito nutre expectativas e temores em relação a cada um e a todos, arrisca pretensões, quer ser visível, quer encontrar uma resposta às suas exigências fundamentais, quer que a comunidade os reconheça (e o reconheça como sujeito ativo e relevante da própria comunidade). A ordem existe não somente porque inclui os sujeitos, mas, também, porque reconhece algumas pretensões e desconhece outras, atribuindo ônus e privilégios, distribuindo recursos e poder. Representar a relação entre os sujeitos e a ordem, então, é representar o jogo das diferenças, e, com base nisso, legitimar (ou condenar) a trama das obediências e hierarquias.

Portanto, o discurso da cidadania sempre tem a ver com as diferenças: não somente com as diferenças vinculadas à oposição ‘externo/interno’, mas, também, com as diferenças que graduam a relação de pertencimento à civitas. Quais são essas diferenças? Não creio que seja possível indicar, em abstrato, os limites que uma sociedade não pode superar na sua política de reconhecimento e de diferenciação: nada impede imaginarmos uma organização social de ficção científica que atribua à cor dos cabelos ou à forma dos olhos o valor de uma diferença decisiva para a distribuição do poder e dos recursos. Trata-se de reconstruir, caso a caso, no interior de contextos históricos específicos, as diferenças abordadas em cada uma.

No que diz respeito ao discurso da cidadania desenvolvido na Europa ocidental da Idade Média ao século XX, as diferenças mais significativas me parecem ligadas, por um lado, ao status econômico-social, e, por outro, à identidade de gênero.

Não se tratam de diferenças secundárias e marginais: ambas (a segunda talvez até mais do que a primeira) incidem sobre a representação do sujeito, condicionando sobremaneira a visão da ordem político-social. É sobre a diferença de gênero, em particular, que eu gostaria de me debruçar, certamente não para propor uma recognição profunda de um problema de tamanha complexidade e relevância, mas somente para delinear alguns esquemas ou ‘tipos ideais’. Eu vou tentar, em suma, apresentar sinteticamente algumas estratégias argumentativas que o discurso da cidadania, ao longo da sua história, utilizou para reconhecer (e desconhecer) os sujeitos e as suas diferenças.

2.

Um modo peculiar de abordar e tratar das diferenças é característico do discurso medieval da cidadania, que pressupõe a utilização de duas figuras determinantes para a sua sintaxe: a imagem da hierarquia e a metáfora do corpo[2].

A cultura política medieval busca a metáfora do corpo[3] não só em Lívio, mas igualmente em uma longa tradição teológica, aplicando-a aos mais diversos agregados sociais, em particular ao agregado político por excelência, a civitas, para sublinhar o seu caráter unitário e a sua força inclusiva. Não basta, porém, exaltar a unidade corporativista da comunidade política; é preciso, também, ilustrar a sua capacidade ordenadora; e a ordem, para a cultura medieval, é sinônimo de hierarquia. Na representação da ordem, encontram-se duas características do imaginário medieval: a atenção às diferenciações, a percepção da desigualdade, e, ao mesmo tempo, a hierarquização das diferenças, a coerente distribuição das partes segundo a lógica do baixo e do alto, do mais e do menos, do superior e do inferior. A ordem é, exatamente, a disposição hierárquica das partes: não tanto atribuição voluntarista de papeis, mas o entendimento da ‘natural’ superioridade e inferioridade dos seres.

O discurso medieval da cidadania aborda as diferenças colocando-as dentro de uma precisa hierarquia: assumindo-as como degraus naturais, necessários, imutáveis, de uma ordem hierárquica. As diferenças, e, portanto, as diferenças de gênero também, não são ocultadas, mas são colocadas em plena evidência: não grava sobre elas a sombra ou a suspeição de alguma ilegitimidade ou injustiça (um pesadelo tipicamente moderno); ao contrário, elas são iluminadas pela convicção de que, sem elas, não há a legitimidade, e nem tampouco a possibilidade, da ordem, da ordem cósmica, da ordem natural, da ordem política.

Porém, não é somente a representação da ordem que é mediada pelo conceito de hierarquia; a própria representação do sujeito é diferenciada e hierarquizada. Se é verdade que o indivíduo não é uma simples realidade ‘natural’, mas, também, uma construção sociocultural, são componentes essenciais da ‘construção’ medieval do sujeito a abordagem das diferenças e a sua hierarquização. O discurso medieval da cidadania tem mais a ver com os sujeitos do que com o sujeito: a atenção não se concentra no indivíduo em abstrato, mas nas múltiplas e diversas condições subjetivas, cada qual caracterizada por traços específicos e por um ‘pacote’ determinado de privilégios e deveres. O jurista elabora não tanto uma sistemática dos direitos ‘individuais’, mas uma doutrina dos status[4], da qual depende a efetiva configuração das prerrogativas de cada um: mais do que o sujeito em geral, existem indivíduos diferenciados aos quais correspondem diversificados regimes jurídicos.

Portanto, a rigor, nem mesmo existe um status abstratamente definido pela identidade de gênero, não existem sujeitos ‘iguais’, ao menos enquanto pertencentes ao mesmo gênero: tal expectativa, no fundo, ainda é tributária da nossa ideia de igualdade. Obviamente, abundam as reflexões dos teólogos, dos pregadores, dos poetas e dos narradores sobre a mulher e suas características de gênero; porém, quando está em questão uma visão geral da ordem social, a representação da diferença de gênero se cruza com diferenças ulteriores e é a multiplicidade de figuras subjetivas (e não a unidade do indivíduo abstrato) que domina a cena.

Certamente, a atenção à variedade dos status não é sintoma de inclinação anárquica; isso não acontece porque o discurso da cidadania, quando aborda as diferenças, esclarece, também, a precisa disposição hierárquica delas. E é nessa perspectiva que o conceito de família exerce um papel fundamental. Refiro-me não tanto à família como estrutura de relações, mas à família como imagem ou modelo ideal (e não pretendo me pronunciar, aqui, sobre a visão de Brunner acerca da família como centro ‘constitucional’ da sociedade medieval). Refiro-me à imagem de família que encontra uma síntese e um centro de irradiação na Política de Aristóteles, que, graças à tradução de Guilherme de Morbeke, começa, em torno de 1260, a sua plurissecular viagem na cultura europeia medieval e protomoderna. É a imagem da família como um microcosmo hierárquico, dentro do qual à posição eminente do pater correspondem as condições - diversas, mas igualmente subordinadas - de outros sujeitos (a mulher, o servo, o filho), todos convergindo, de maneiras diferentes, para o vértice constituído pelo marido-pai-patrão.

A representação dos sujeitos e das suas diversas condições passa, portanto, pelo filtro obrigatório da família: é principalmente na família que a diferença de gênero se traduz em uma relação natural e necessária de domínio e obediência. A família, em si mesma, é um microcosmo hierárquico, e, enquanto tal, é um seminarium reipublicae: porque se trata de um lugar de hierarquias, e, assim, nó de uma ordem que coincide com a multiplicação das diferenças e com a sua rígida hierarquização.

A família, portanto, tem uma forte valência pública, política. É a família que intervém como um filtro indispensável (ainda que não seja o único) na relação entre indivíduo e civitas. Certamente, a civitas é um corpo inclusivo; é o corpo político que tem condições (como ensina Aristóteles) de garantir uma vida ‘boa’; é unindo-se a esse corpo que o indivíduo se torna um homem completo, um corpo do qual o sujeito extrai privilégios e ônus, mote de identidade coletiva, ímpeto de participação, ainda que não diminua, por isso, a estrutura piramidal da ordem política, já que o corpo é sempre unidade de partes desiguais. A civitas inclui ‘todos’ os sujeitos, mas inclui preservando a sua radical diferenciação e acolhendo, no seu interior, como um dos elementos fundamentais de diferenciação e hierarquização, a família: a civitas acolhe e consagra o microcosmo hierárquico da família, e, dessa forma, a específica diferença e subalternidade vinculada à diferença de gênero. Cidadão é o pater familias; e é através dele que acontece a inclusão na civitas dos sujeitos ligados a ele no microcosmo hierárquico da família.

3

Quando termina o medievo para o nosso problema? Certamente, não com Bodin, ainda que ele seja tradicionalmente apresentado como o inventor da soberania ‘moderna’, já que, para Bodin, a respublica ainda é uma ordem de famílias, e a família continua sendo um microcosmo hierárquico em que o papel político dominante do pater acaba sendo não somente confirmado, mas enfatizado e assumido como modelo do poder régio.

Um significativo momento de descontinuidade é a difusão do paradigma jusnaturalista. Com ele, muda radicalmente o modo de olhar o indivíduo e a sua relação com a ordem política. O jusnaturalismo fala de estado de natureza, de uma condição originária da humanidade, para colocar em foco as características essenciais do sujeito prescindindo de qualquer vínculo com os corpos e com as hierarquias existentes. É o indivíduo enquanto tal que o jusnaturalismo aborda e ao qual ele associa uma série de direitos naturais, originários e fundamentais.

O estado de natureza é o dispositivo retórico empregado para identificar o indivíduo como tal e apresentá-lo acompanhado de duas qualidades essenciais, a liberdade e a igualdade: as diferenças parecem subitamente anuladas pela igualdade natural dos sujeitos.

Porém, é preciso se perguntar quem são propriamente os sujeitos dos quais os jusnaturalistas falam. Vamos assumir como ponto de referência, de certa forma, ‘exemplar’, a contribuição de Locke. A ordem lockeana gira em torno dos direitos fundamentais dos sujeitos à liberdade e à propriedade. Liberdade e propriedade formam uma hendíade, apresentando-se, ao mesmo, como prerrogativas essenciais do sujeito e como fundamento da ordem: é o livre desenvolvimento das capacidades individuais, é a autoconservação respeitosa das regras de propriedade que possibilitam a multiplicação dos bens, a felicidade individual e coletiva, a instauração de uma ordem legítima. A sociedade é composta, então, por uma soma de sujeitos iguais, livres, capazes de satisfazer as próprias necessidades através do trabalho, da apropriação e da propriedade.

Desaparecem, assim, as diferenças? Na realidade, elas definitivamente não se dissolvem: muda drasticamente somente a maneira de abordá-las. Desaparece a imagem medieval da ordem como sistema de diferenças, como pirâmide de status subjetivos diferenciados. A sociedade gira em torno da liberdade-propriedade dos sujeitos, e é em relação a essa regra fundamental que a diferença volta a ser introduzida: diferentes são todos os sujeitos que, por alguma característica, estão inadimplentes com tal relação. Passa-se de uma representação escalonada para uma representação dicotômica da ordem. As diferenças são múltiplas e hierarquizadas; existe uma diferença dominante, radical, não graduável, absoluta: ou se é proprietário, livre, racional, ou não. Existem, substancialmente, duas sociedades, uma das quais, porém, é somente uma sombra da primeira, um resíduo ‘negativo’.

Tal representação dicotômica das diferenças é inseparável de uma nova visão do indivíduo, dominada por uma premissa fundamental: aquela segundo a qual a propriedade não é um dado externo, extrínseco, mas é expressão e confirmação da plena maturidade e racionalidade do sujeito. O proprietário é o indivíduo que soube se valer dos próprios talentos, que evitou a dispersão, que soube investir e calcular, que se mostrou capaz de autocontrole, de autodisciplina, em suma, de racionalidade.

Na representação do próprio sujeito, então, está implícita a abordagem das diferenças: os sujeitos não são indivíduos genéricos, abstratas figuras de titularidade jurídica, mas têm um perfil preciso, desenhado com base em pressuposições culturais complexas, expectativas e valores compartilhados. Os indivíduos ‘iguais’ de Locke são seres humanos livres e proprietários, responsáveis, racionais, capazes de cálculo e de autodisciplina, e, enquanto tais, são sujeitos radicalmente, absolutamente, diferentes dos indivíduos não proprietários, irracionais, indisciplinados.

Então, o perfil dos sujeitos é desenhado a partir de uma complexa pressuposição antropológica: de um preconceito cultural segundo o qual os sujeitos, para serem humanamente completos, devem ser racionais, responsáveis, autônomos, proprietários e, justo por isso, tem que ser homens. Continua pesando sobre a definição de sujeito ‘excelente’ (se preferirmos, do sujeito par excellence) o seu pertencimento ao gênero masculino. Os antigos estereótipos sobre a infirmitas sexus, em todas as suas pitorescas e repetitivas variações, definitivamente não se interrompem com a revolução jusnaturalista, mas regulam o paradigma, por assim dizer, do seu exterior. O emprego das novas categorias impõe que se dê um gênero ao sujeito, tornam-no necessariamente masculino, dada a associação culturalmente vinculante entre gênero masculino, racionalidade, responsabilidade e domínio.

Estamos diante, portanto, de uma passiva repetição de antigos lugares retóricos? Ao contrário. Os antigos estereótipos dirigem uma operação que nos leva às antípodas do hierárquico e corporativista discurso medieval.

Na cultura medieval domina a hierarquia, enquanto o jusnaturalismo pressupõe a igualdade dos sujeitos; o modelo corporativista prevê uma escala hierárquica caracterizada por uma multiplicidade de degraus, em contraposição à oposição dicotômica marcada pelo distintivo liberdade-propriedade. Continua central, em ambos os casos, o momento das diferenças, mas muda radicalmente o modo de abordá-las: no mundo medieval, as diferenças são evidenciadas e celebradas como degraus necessários da ordem; no modelo jusnaturalista, as diferenças desaparecem para além da ‘linha da sombra’, são jogadas nas trevas exteriores, enquanto o proscênio está cheio de sujeitos iguais, livres, proprietários, homens e adultos[5].

O único lugar em que a diferença de gênero volta a se tornar visível talvez seja a família, com maior clareza onde são mais fortes as persistências da tradição: como acontece na Europa continental, em que Pufendorf, Thomasius e Wolff alertam que a igualdade absoluta é, sim, uma característica essencial do indivíduo, mas somente, por assim dizer, em uma primeira aproximação, quando se olha o sujeito colocando entre parênteses as modalidades concretas de existências; enquanto, nesse último caso, voltam a emergir as diferenças e os poderes, como demonstra a estrutura familiar, agregado inequivocamente natural e hierárquico.

Para fazer a igualdade descer do céu para a terra, contribuem, primeiro, a corrosiva crítica iluminista, e, depois, de maneira determinante, a revolução francesa: é nos anos da revolução que o princípio da igualdade deixa as instâncias apartadas da filosofia para se tornar parte integrante da retórica política cotidiana. Começa, então, um jogo que, apesar das mil variações e êxitos diferentes, chega até nós: um jogo em que o princípio da igualdade e a abordagem das diferenças se encontram no mesmo plano, gerando um campo de tensão resistente a qualquer resolução unilateral.

É nos anos da revolução que, em nome da igualdade, tenta-se redefinir não somente os direitos, mas, também, os próprios sujeitos: são colocados em xeque dispositivos de exclusão profundamente enraizados na tradição (a exclusão dos judeus do gozo de direitos civis e políticos, a legitimação da escravidão nas colônias) e começa a ser contestado o caráter ‘natural’ das hierarquias fundadas na diferença de gênero.

Na Inglaterra igualitária e radical de Mary Wollstonecraft ou na França revolucionária da girondina Olympe de Gouges, o princípio da igualdade se torna a alavanca de uma estratégia argumentativa que ilumina e denuncia a diferenciação e a hierarquização de classes inteiras de sujeitos, cuja deminutio convivera por muito tempo com a representação jusnaturalista do estado de natureza: os escravos, por um lado, as mulheres, de outro.

Tanto Mary Wollstonecraft como Olympe de Gouges, conhecidíssimas pelo seu empenho ‘emancipacionista’ pioneiro também eram ativas nas campanhas abolicionistas. Não é casual que ambas persigam esse objetivo duplo. Certamente, os dois objetivos não são obrigatoriamente e mecanicamente conexos entre si (e, além disso, a luta contra a escravidão na Grã-Bretanha é conduzida por um grupo compósito, onde fermentos iluministas e igualitários se cruzam com opções claramente cristãs e religiosas); a conexão entre eles, porém, pode parecer estranha, mas é lucidamente abordada no debate da época, parecendo historicamente fundada. O nó a ser desatado (e o lugar que torna possível alguma analogia entre a condição servil e a condição feminina) ainda é o modelo potestativo e hierárquico que faz do pater familias o ponto de referência de sujeitos – a mulher, o servo – diferentes entre si, mas agrupados na sujeição ao único sujeito ‘excelente’: o pater e dominus, vértice da hierarquia familiar.

Combater as privações femininas significa, substancialmente, abater um recinto extraordinariamente resistente: o recinto que separa a mulher da civitas, mantendo-a fechada na ‘casa’; e a casa, esfera intangível da família, aparece, então, por um lado, como um receptáculo (ao mesmo tempo, ‘real’ e simbólico) da liberdade-imunidade dos sujeitos, a zona não alcançada pela pressão do soberano, mas, por outro lado, também como o lugar primário de hierarquização das diferenças.

Tornar a mulher igual significa, portanto, combater em dois fronts diferentes, mas estreitamente conexos e que podemos assumir como declinações distintas da igualdade: trata-se, por um lado, de reforçar a posição da mulher no interior da família, e, em geral, na esfera das relações privadas, combatendo as várias incapacidades jurídicas que a afligem e que sancionam a dependência econômica e jurídica em relação ao pater familias; enquanto, por outro lado, é preciso fazer com que a mulher saia da sombra do doméstico para colocá-la em relação direta com a comunidade política.

Os protagonistas da revolução de 1789 não são insensíveis a nenhum desses aspectos. Sobre o primeiro front, das relações privadas, os projetos de codificação que circulam nos breves anos da revolução introduzem algumas novidades relevantes[6]; mas, mesmo no segundo front, não poderia faltar alguma reação por parte dos revolucionários, por vários motivos: não somente porque a revolução é, também, uma revolução de mulheres, que contribuem para o seu desenvolvimento de várias maneiras (dos salões aos clubes, da presença apaixonada durante as reuniões da Assembleia à ação direta, até os casos extremos, ainda que esporádicos, da defesa da pátria em perigo de armas na mão), mas, também, porque o tema da participação política dos sujeitos toca os nervos mais sensíveis da retórica revolucionária: a nação, a virtude, o empenho patriótico e a exigência de eliminar qualquer filtro que se interponha entre os sujeitos e o corpo político.

Para qualquer um que celebrasse a força inclusiva da nação republicana não era possível subvalorizar o problema da participação das mulheres na vida da comunidade política. Porém, trata-se de entender adequadamente as modalidades específicas de tal participação; e, sobre esse ponto, a opinião prevalente (e transversal em relação às várias posições que dividiam a França revolucionária) se orienta na direção de uma solução que, se por um lado celebra a participação, por outro lado determina os seus conteúdos e modalidades enrijecendo e, ao mesmo tempo, exaltando a diferença feminina. A missão revolucionária da mulher passa pelo seu papel de mulher e de mãe: o seu empenho é decisivo para o sucesso da república porque a mulher sustenta, conforta e estimula o empenho político do seu companheiro, e, sobretudo, porque, como mãe, é a via obrigatória para uma educação republicana e patriótica. Através da mulher como mãe e educadora, a república se consolida, se reforça, se purifica, e, sobretudo, se perpetua no futuro através das novas gerações[7].

Nessa perspectiva, o caráter igualitário da participação dos sujeitos nos caminhos da república retrocede, ou, pelo menos, é alcançado a partir da prevalente abordagem da diferença: a participação se realiza através de modalidades inevitavelmente diferenciadas em relação ao gênero dos sujeitos, e a participação da mulher na civitas é tão fundamental quanto (ainda) mediada: exprime-se através do papel conjugal-materno, se realiza através de figuras de mediação (o marido, os filhos) que continuam operando como um caminho obrigatório para o acesso (indireto) à esfera pública.

As posições (isoladíssimas e audaciosas) de um Condorcet ou de uma Gouges tomam, por sua vez, uma estrada claramente diferente apostando em uma visão do sujeito que pressupõe não mais uma consagração da diferença, mas a sua neutralização em nome da igualdade. O princípio da igualdade é usado não mais para recolocar os diferentes (‘todos’ os diferentes) no seio da nação, reconhecendo a sua importância e confirmando a diversidade das suas condições e dos seus papeis, mas para denunciar a própria legitimidade da diferença, definindo, com base nisso, os sujeitos e as suas relações com a comunidade política. Trata-se, então, de tornar iguais os sujeitos passando por cima das diferenças, conferindo a todos um papel autônomo e de protagonismo. Tornar iguais os sujeitos, atribuir-lhes as mesmas chances de autoafirmação, significa, na perspectiva revolucionária, atribuir-lhes um preciso elenco de direitos; tornar iguais os sujeitos diante da nação significa, contornando as diferenças de gênero, atribuir-lhes os mesmos direitos políticos.

Em torno dessa conexão elementar entre igualdade, participação e direitos é que começa uma longa trajetória que vai se desenvolver e se complicar durante todo o século XIX e por boa parte do século XX; e, além disso, trata-se de uma conexão que, se recebe um potente estímulo da contingência revolucionária, não deixa de encontrar correspondentes significativos também na Grã-Bretanha, espelhado desde o título no célebre livro de Mary Wollstonecraft, o Vindication of the Rights of Woman de 1792.

Além disso, nessa obra, não são reivindicados somente os direitos da mulher. Outro tema também é colocado em foco, de importância nada menor e destinado a uma fortuna em nada inferior: o tema da educação. Não estamos diante de uma homenagem ritual a um dos grandes temas do ‘Setecentos reformador’; insistindo na tecla da educação, Mary Wollstonecraft, na realidade, está atacando aquele que é, talvez, o mais relevante estereótipo de uma tradição plurissecular: a ideia do caráter natural, logo involuntário e imutável, da inferioridade (e, portanto, do caráter apolítico e doméstico) da condição feminina. É a educação que enrijece as diferenças e cria a inferioridade, é a educação, e não a natureza, que impede a mulher de ser um sujeito ‘completo’, publicamente ativo e responsável. A sua desclassificação para sujeito ‘privado’, politicamente irrelevante, tem um caráter contingente e removível (tem um caráter, diríamos com a nossa linguagem, não mais natural, mas histórico-cultural), podendo ser eliminado com uma adequada intervenção ‘pedagógica’.

Combater a hierarquização dos sujeitos em nome da igualdade, reivindicar o caráter provisório e modificável da presumida ‘inferioridade’ feminina, ver nos direitos o instrumento principal ao qual recorrer para tornar iguais os sujeitos, e, ao mesmo tempo, travar uma luta que coloca em xeque a própria identidade político-jurídica: eis o legado que a última década do século XVIII deixa para o século subsequente. E prossegue no século XIX e na primeira metade do século XX aquilo que Tocqueville chamará de marcha triunfal da igualdade, mas continua e se aprofunda o debate em torno do tema da diferença feminina, que ainda será invocada (em contextos e idiomas culturais diferentes) para contrastar as aspirações emancipacionistas, mas que vai constituir, de qualquer forma, um problema complexo e delicado, mesmo para os partidários, e, sobretudo para as partidárias, da igualdade.

4.

A igualdade e o vínculo igualdade-direitos continuam a ser os pontos de referência obrigatórios do emancipacionismo oitocentista, que os recolhe de numerosas e diversas ascendências culturais, mas que são confirmados e desenvolvidos na síntese, de certa forma, emblemática, do célebre ensaio de John Stuart Mill (e, antes, no artigo de Harriet Taylor). A novidade relevante que emerge no século XIX maduro, porém, vai além da contribuição de personalidades em particular e marca, no geral, o discurso que a sociedade começa a desenvolver em torno do sujeito-mulher: é um discurso que se compõe de aportes de caráter e espessura diversos, formando um tecido teórico espesso e variado, aos quais correspondem precisos momentos de organização; é um discurso que acaba por impor a uma opinião pública rebelde o problema do sujeito-mulher como uma questão urgente e não resolvida. Desse discurso, tão variado e complexo, não posso oferecer, não digo uma reconstrução, mas nem mesmo uma adequada apresentação no breve espaço da minha palestra. Posso somente chamar a atenção para alguns nós temáticos e argumentativos.

O emancipacionismo da segunda metade do século XIX é um capítulo importante, talvez o mais significativo, de um fenômeno oito-novecentista que eu gostaria de indicar recorrendo a uma famosa expressão de Jhering: a “luta por direitos”. Os direitos que movimentos muito diversos reclamam, a partir da revolução francesa, não são a articulação de uma ordem existente; são os moral rights dos quais fala Mill, são os direitos assumidos como declinação de uma igualdade que denuncia os dispositivos vigentes de diferenciação e de exclusão e que pretende modificar a distribuição de poderes corrente.

No que diz respeito ao emancipacionismo feminino, os direitos pelos quais lutar são os mais diversos e se propõem como a derrocada das diferentes privações ou incapacidades que atingem a condição feminina: da paridade entre os cônjuges à revogação da proibição de investigação de paternidade, do direito à instrução ao acesso às profissões. A luta pelos direitos, portanto, é uma luta ampla, que abarca tanto a esfera das relações privadas como as públicas, mas, talvez, o terreno da participação política é a sua mais evidente manifestação (basta pensar no sufragismo inglês, a partir de Harriet Taylor e do próprio Mill[8], em Anna Maria Mozzoni[9] e no emancipacionismo italiano[10], ou em Hubertine Auclert na França[11]).

Além disso, não é casual que a luta por direitos políticos adquira um valor, de certa forma, emblemático de toda a gama de reivindicações emancipacionistas. Na relação que toda uma classe de sujeitos – as mulheres – estabelece com a civitas, chega a um ponto crítico, de fato, um nó antigo, vinculado a uma visão enraizada da relação entre esfera pública e a esfera privada. Reivindicar os direitos políticos das mulheres significa colocar em xeque um modelo cultural de extraordinária longevidade que está nos acompanhando neste itinerário: a ideia de família como microcosmo unitário e hierárquico que, da cultura medieval (e da auctoritas da redescoberta Política de Aristóteles) alcança a modernidade, e que continua a ser proposta em formas sempre diferentes, mas ainda fiéis à inspiração original, isto é, fiéis a uma estratégia que transforma as diferenciações dos sujeitos em uma disposição hierárquica, atribuindo ao vértice da hierarquia a honra e o ônus de representar para o exterior os sujeitos 'incapazes'.

Nem mesmo o terremoto da revolução jacobina foi o suficiente para anular a antiga imagem do caráter objetivamente representativo da figura masculina (paterna, conjugal) e da consequente invisibilidade da mulher, do seu vínculo constitutivo e direto com a família ao qual corresponde um vínculo adquirido e indireto com a civitas. Mais uma vez James Mill, o utilitarista, o reformador, amigo de Bentham, vai sustentar que os interesses da mulher estão incorporados no interesse do pai ou do marido, que age, portanto, como representante objetivo e canal obrigatório da mulher na esfera pública[12] (e justo por isso merecerá o brilhante ataque do socialista e protoemancipacionista Thompson[13]). Aliás, em um contexto muito diferente e com um idioma teórico radicalmente diferente do de Mill, Johann Gottlieb Fichte também chegou a uma conclusão substancialmente análoga[14].

Então, não é casual que o sufragismo inglês ataque a ideia de uma esfera feminina obrigatória, de uma proper sphere, de um recinto doméstico ou de um espaço social ao qual a mulher, por vocação natural, deve estar necessariamente adstrita; portanto, não é casual que a luta por direitos políticos adquira o valor de desafio à diferenciação de gêneros e à dicotomia entre esfera privada e esfera pública, entre casa e civitas, enxergando na anulação da 'separação' feminina o principal instrumento para anular a persistente 'invisibilidade' da mulher.

Lutar por direitos políticos, então, não é lutar por um objetivo de autoafirmação genérica: os direitos políticos são, por um lado, o mais direto repúdio da tradição, e, por outro, a veste formal de uma forte exigência de participação política e de empenho cívico. A luta por direitos do emancipacionismo oitocentista nutre-se de uma autêntica paixão republicana: não me refiro somente às ascendências mazzinianas de Anna Maria Mozzoni, mas, de uma maneira mais geral, à convicção, amplamente difundida no movimento emancipacionista, sobre o vínculo entre direitos, empenho cívico e participação política. A dimensão privada, a reivindicação dos direitos do sujeito-mulher nas suas relações privadas, ainda que fundamental, tem seu horizonte de sentido na possibilidade de participar ativamente na respublica.

Lutar por direitos políticos é lutar por uma participação política que constitui o fundamento último de qualquer outro possível direito das mulheres, mas é lutar, também, por uma transformação geral da ordem política. Eis outro aspecto do pathos republicano que circula nos meandros do emancipacionismo oitocentista: combate-se contra a exclusão das mulheres da polis na convicção de que tal batalha espelha não somente o ponto de vista, os interesses, as exigências de uma 'classe' particular de sujeitos (ainda que composta pela metade dos membros da nação), mas o bem de toda a comunidade política. A luta por direitos das mulheres pretende conscientemente atingir toda a estrutura política existente para transformá-la: não se trata de uma operação aritmética, de um aumento quantitativo dos que tem direito ao voto; mas está em jogo muito mais uma redefinição do sujeito-mulher, e, consequentemente, está em jogo uma redefinição do cidadão, da relação entre o indivíduo e a comunidade política, assim como o papel e a composição desta última.

Como qualquer outro episódio da luta por direitos que se desenrola, a partir da revolução francesa, na Europa durante os séculos XIX e XX, a luta por direitos das mulheres também mira o futuro: a sua própria condição de possibilidade está inscrita no corte entre ordem existente e ordem alternativa, entre uma ordem presente, ilegítima ou, pelo menos, incompleta, e uma ordem futura que o empenho cívico dos sujeitos contempla como seu horizonte de sentido. É nesse tensionamento na direção do futuro, não menos do que ao cotidiano empenho de luta, que veio se formando, entre os séculos XIX e XX, o novo sujeito-mulher, a mulher como sujeito que adquire uma nova visibilidade pública a partir do momento em que começa a reivindicar o direito de ser politicamente ativa.

A luta por direitos da mulher (a luta das mulheres por direitos), portanto, é uma luta por uma ordem futura que começa a se delinear quando, em nome da igualdade, começa a ser colocada em questão a distribuição de poderes existente. Então, o movimento emancipacionista, desse ponto de vista, é um movimento sustentado e estimulado pela longa onda do igualitarismo que encontrou nos anos da revolução, talvez, a sua mais explosiva manifestação. A paixão igualitária, porém, longe de exaurir a luta das mulheres por direitos, é somente um componente, ainda que fundamental, ou, mais precisamente, é um dos polos de um campo magnético que tem como polo oposto uma renovada abordagem da diferença de gênero[15].

O impulso igualitário, mesmo onde age com força – basta pensar, por exemplo, no movimento por direitos políticos na Grã-Bretanha pós-Mill – nunca deve ser dissociada da consciência que a conquista dos direitos políticos não diz respeito somente às mulheres: é uma conquista que redefine a comunidade política não somente enquanto modifica as tradicionais relações entre esfera pública e esfera privada, mas, também, porque coloca em cena um novo sujeito, o sujeito-mulher, capaz de realizar uma mudança qualitativa na vida da polis. A mulher-que-vota não é o titular abstrato de um direito: é um indivíduo que não esquece da própria identidade de gênero e há de renovar profundamente os conteúdos e o estilo da política.

O emancipacionismo igualitário não compartilha do horror jacobino às diferenças, mas se utiliza do princípio da igualdade para abater os mecanismos de exclusão e a diferenciação hierárquica dos sujeitos, valoriza a identidade de gênero na convicção de que ela contribui a uma forte renovação da vida política e civil.

Não se trata de uma dialética fácil e previsível nos seus resultados. Ao contrário, justo porque igualdade e diferença de gênero constituem os pontos focais de um mesmo campo de tensão, as estratégias políticas e argumentativas desenvolvidas em cada momento soam diferentes de acordo com a ênfase na dimensão da igualdade ou no momento da diferença. Então, se, por um lado, desenvolve-se um emancipacionismo que parte do princípio da igualdade e recupera no seu interior o sentido da especificidade feminina, por outro lado, toma forma uma perspectiva que exalta o papel da mulher como tal, colocando em foco as suas características antropológicas e psicológicas, privilegiando a sua vocação materna, e somente depois de um longo giro em torno da 'diferença', recupera o sentido de uma luta contra os dispositivos de exclusão e de hierarquização dos sujeitos.

Então, o jogo da igualdade e da diferença já é complexo no interior do discurso emancipacionista. Porém, a complexidade aumenta ao inserirmos o tema da ‘diferença’ no ‘discurso público’ geral da época.

Uma complexificação que nasce, em uma primeira aproximação, de que, se a igualdade deve prestar contas com uma diferença específica, a diferença de gênero, em uma segunda aproximação, outra diferença – a diferença de classe – se coloca e requer, de certo modo, uma articulação com a anterior. Abre-se, então, o capítulo (que me limito somente a mencionar, já que não posso ir além de uma simples identificação ‘cartográfica’ dos principais nós temáticos) da difícil relação entre estratégias políticas e culturais geneticamente e culturalmente diferentes entre si, mas, em vários aspectos, também, confluentes e interligadas: a cultura emancipacionista, por um lado, e, por outro, as reivindicações dos vários partidos socialistas europeus, desde a socialdemocracia alemã de August Bebel ou de Clara Zetkin até o partido socialistas italiano de Anna Kuliscioff. Quando essas diferentes tradições culturais entram em contato, o problema espinhoso nem é tanto a relação entre igualdade e diferença, mas a avaliação comparativa das duas ‘diferenças’, dos dois diferentes dispositivos de exclusão, fundados, respectivamente, no gênero e na classe. As posições de Anna Maria Mozzoni e de Anna Kuliscioff, desse ponto de vista, são exemplares: ambas defendem que as ‘diferenças’ (de gênero e de classe) são invocadas para sustentar injustas e intoleráveis privações, mas elas discordam quando se trata de decidir qual das duas ‘diferenças’, por assim dizer, em última instância, é determinante.

Certamente, quando Mozzoni e Kuliscioff estão discutindo, as divergências se resolvem diante da exigência de interromper o vínculo entre diferença e privação, entre diferença e exclusão. No front da relação entre igualdade e diferença se delineia, porém, uma ulterior complicação que nasce do fato de que a diferença feminina, em meados e no final do século XIX, não é abordada somente como um aspecto complementar de um projeto igualitário (como ocorre no emancipacionismo), mas é levada muito a sério, inclusive, por um forte grupo de cultores das novas ciências antropológicas e criminológicas, que a empregam para destruir qualquer credibilidade residual do mito da igualdade.

A diferença feminina, de acordo com os vários Lombroso, Sergi ou Moebius, deve se traduzir, mais uma vez, em uma especificidade subalterna e separada. Não estamos diante de uma simples repetição da tradição. A tradição – a antiga, incrivelmente longeva, imagem da família e da consequente, natural, hierarquização dos papeis no seu interior – não está nem um pouco exaurida, ao contrário, se presta a conhecer uma enésima reformulação e revitalização na Itália e na Alemanha dos anos 1930. A abordagem da diferença feminina dos novos antropólogos e criminólogos não pretende ser, porém, uma operação ‘tradicionalista’, mas um moderno reclame ao valor indiscutível dos ‘fatos’ e da experimentação científica. São os fatos cientificamente comprovados que demonstram o caráter ‘absoluto’, biológico, da diferença feminina: a diferença feminina está inscrita na própria conformação física e psíquica da mulher, voltada para uma função procriadora que, tornando-a psicologicamente ‘passiva’ e ‘receptiva’, a separa irrevogavelmente do mundo masculino, ativo e propositivo, da arena política.

Então, a igualdade é uma velha ferramenta metafísica que a ciência já demonstrou ser inútil e a diferença da mulher sanciona, com a indiscutível certeza dos fatos, o caráter separado da sua condição. A ofensiva igualitária que Mary Wollstonecraft lançara no final do século XVIII, contrapondo a educação à natureza, relativizando a diferença feminina, sustentando o seu caráter histórico, modificável, reversível, encontra uma resposta ideal e conclusiva no final do século XIX em uma contraofensiva que, em nome das novas ciências antropológicas, torna inconcebível a igualdade, tornando absoluta a diferença: a diferença é absoluta porque está fundada biologicamente, subtraída às escolhas, à autodeterminação, à liberdade do sujeito; e é esta diferença que se traduz em um dispositivo de exclusão e de separação, projetando sobre ela o seu caráter absoluto e imutável.

Estamos diante de uma imagem de mulher – e de uma abordagem sobre a sua diferença de gênero – onde os estereótipos de uma tradição antiga são reformulados e refundados no interior de um discurso que ambiciona se apresentar com todas as lantejoulas de uma epistemologia atualizada (e não faltam, ainda, no interior do compósito front positivista contribuições onde o allure ‘modernizante’ produz, também, alguns resultados no terreno da representação do papel social da mulher – basta pensar, a título de exemplo, em Sighele)[16].

Inicia um complexo jogo de referências recíprocas entre ‘tradicionalismo’ e ‘modernização’ que terá um sucesso renovado na Itália (e, de maneira parcialmente diferente, na Alemanha) dos anos vinte e trinta do século XX. Na Itália e na Alemanha ‘totalitárias’ é que viriam a se cruzar duas exigências diferentes e difíceis de compatibilizar: por um lado, a celebração tradicionalista e católica da família hierárquica e prolífica, e, por outro, a exigência de organizar a mobilizar as massas, a exigência de ignorar qualquer ‘diferença’ subjetiva para obter a adesão militante de ‘todos’ à mesma fé; e é nessa perspectiva, então, que a tradicional separação ou invisibilidade política da mulher pode coexistir com algum envolvimento no processo político. A quadratura do círculo pode ser observada na configuração hierárquica da ordem política. É graças a ela que alguma visibilidade política ‘moderna’ da mulher pode ser compensada e neutralizada pela posição objetivamente, naturalmente, subalterna que ela deverá ocupar no organograma do poder[17].

Somente com o segundo pós-guerra e com o fim das aventuras ‘totalitárias’ é que o tema da diferença feminina volta a ser relacionado com o princípio da igualdade, que constitui um dos elementos inspiradores das novas democracias constitucionais. A partir desse momento, começa um discurso da cidadania que, apesar das relevantes fraturas no seu interior, chega até hoje. Não tenho nem o tempo nem a competência para me aventurar nesse terreno. Posso somente formular, à guisa de finalização, uma pergunta que, superando os cinquenta anos que nos separam da aprovação das constituições do pós-guerra, alcança o nosso presente. Isto é, seria preciso indagar se a promessa ou o espectro da igualdade ainda nos dizem respeito intimamente ou se o campo de tensão entre igualdade e diferença se dissipou ou se rompeu; seria preciso que nos perguntássemos se o princípio da igualdade, esta figura retórica que, por tantas décadas, estimulou a imaginação de um futuro livre de privação e exclusões, ainda inspira a nossa cultura política ou se o discurso no qual nos espelhamos se limita a refletir e a consagrar uma soma de diferenças consideradas ingovernáveis e imutáveis.

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Notas

[1] Professor emérito de História do Direito Medieval e Moderno da Università degli Studi di Firenze (Itália).
[2] Sobre esse tema, assim como sobre os subsequentes, a literatura é vastíssima. Vou me limitar somente a algumas menções, permitindo-me remeter, para indicações mais detalhadas, a P. Costa, Civitas. Storia della cittadinanza in Europa, voll. I-IV, Roma-Bari, 1999-2001.
[3] Cfr. E.H. Kantorowicz, The King’s two Bodies. A Study in Mediaeval Political Theology, Princeton, 1957; A. Cavarero, Corpo in figure: filosofia e politica della corporeità, Milano, 1995.
[4] Cfr. P. Cappellini, “Status” accipitur tripliciter. Postilla breve per un’anamnesi di ‘capacità giuridica’ e ‘sistema del diritto romano attuale’, in “Annali dell’Università di Ferrara”, Nuova Serie, Sez. V, I, 1987, pp. 29-97
[5] Cfr. C. Pateman, The Sexual Contract, Cambridge, 1988; Feminist Interpretations and Political Theory, a cura di M.L. Shanney e C. Pateman, Cambridge, 1991.
[6] Cfr. M. Garaud, R. Szramkiewicz, La révolution française et la famille, Paris, 1978; I. Woloch, The New Regime. Transformations of the French Civic Order, 1789-1820s, New York-London, 1994.
[7] Cfr. D. Godineau, Cittadine tricoteuses. Le donne del popolo a Parigi durante la rivoluzione francese, Milano, 1989; Les femmes et la révolution française. L’effet 89, a cura di M.-F. Brive, Toulouse, 1991; O. H. Hufton, Women and the Limits of Citizenship in the French Revolution, Toronto, 1992; V. Fiorino, Dai diritti civili ai diritti politici: la cittadinanza delle donne in Francia, in “Passato e presente”, XVII, 47, 1999, pp. 67-91.
[8] Cfr. R.J. Evans, Comrades and Sisters. Feminism, Socialism and Pacifism in Europe 1870-1945, Brighton, 1987; A. Rossi-Doria, Le idee del suffragismo, in A. Rossi-Doria, La libertà delle donne. Voci della tradizione politica suffragista, Torino, 1990, pp. 263-316
[9] Cfr. F. Pieroni Bortolotti, Alle origini del movimento femminile in Italia, 1848-1892, Torino, 1963.
[10] A. Buttafuoco, Condizione della donna e movimento di emancipazione femminile, in Storia della società italiana, 20, L’Italia di Giolitti, Milano, 1981, pp. 145-85; A. Buttafuoco, Cronache femminili. Temi e momenti della stampa emancipazionista in Italia dall’Unità al fascismo, Arezzo, 1988; L. Mariani, L’emancipazione femminile in Italia: Giacinta Pezzana, Giorgina Saffi, Gualberta Beccari, in “Rivista di storia contemporanea”, XIX, 1990, pp. 3-31; M. De Giorgio, Le italiane dall'unità a oggi: modelli culturali e comportamenti sociali, Roma-Bari, 1992. Sobre o problema da educação, cfr. L’educazione delle donne. Scuole e modelli di vita femminile nell’Italia dell’Ottocento, a cura di S. Soldani, Milano, 1989; S. Franchini, Élites ed educazione femminile nell'Italia dell'Ottocento: l'Istituto della SS. Annunziata di Firenze, Firenze, 1993.
[11] Cfr. L. Klejman, F. Rochefort, L’égalité en marche. Le féminisme sous la Troisième République, Paris, 1989.
[12] Cfr. J. Mill, Essay on Government, in J. Mill, Essays [from the Supplement to the Encyclopaedia Britannica], London, 1825, pp. 3-32.
[13] W. Thompson, Appello di metà del genere umano, le donne, contro la pretesa dell’altra metà, gli uomini, di mantenerle nella loro schiavitù politica, civile e domestica, a cura di S. Franchini, Firenze, 1974.
[14] J.G. Fichte, Fondamento del diritto naturale secondo i princìpi della dottrina della scienza (Seconda parte, ovvero Diritto naturale applicato) (1797), a cura di L. Fonnesu, Bari, 1994, pp. 227 sgg.
[15] Sobre o vínculo igualdade-diferenças, cfr., em termos gerais, Il dilemma della cittadinanza. Diritti e doveri delle donne, a cura di G. Bonacchi e A. Groppi, Roma-Bari, 1993 (e ivi, pp. 214-40, L. Gianformaggio, Eguaglianza e differenza: sono veramente incompatibili?) e L. Ferrajoli, La differenza sessuale e le garanzie dell’uguaglianza, in “Democrazia e diritto”, XXXIII, 1993, pp. 49-73.
[16] Cfr. V. P. Babini, F. Minuz, A. Tagliavini, La donna nelle scienze dell’uomo. Immagini del femminile nella cultura scientifica italiana di fine secolo, Milano, 1986; G. Landucci, I positivisti e la ‘servitù’ della donna, in L’educazione delle donne, cit., pp. 463-95; B.P.F. Wanrooij, Storia del pudore. La questione sessuale in Italia 1860-1940, Venezia, 1990, pp. 171 sgg.; A. Rossi-Doria, Antisemitismo e antifemminismo nella cultura positivistica, in Nel nome della razza. Il razzismo nella storia d’Italia 1870-1945, a cura di A. Burgio, Bologna, 1999, pp. 455-73.
[17] Cfr. V. De Grazia, Le donne nel regime fascista, Venezia, Marsilio 1993; M. Salvati, Tra pubblico e privato: gli spazi delle donne negli anni Trenta, in “Studi storici”, 38, 1997, pp. 669-92.
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