Recepção: 20 Julho 2024
Aprovação: 03 Fevereiro 2025
Resumo: As Unidades de Conservação possuem um papel importante na preservação dos recursos naturais e da biodiversidade. Criadas pela Lei Federal n. 9.985/2000, elas dividem-se em dois grupos, unidades de proteção integral e unidades de uso sustentável, que por sua vez são constituídos de diferentes categorias, podendo ser de esfera federal, estadual ou municipal. Diante disto, o objetivo deste estudo foi identificar as unidades de conservação presentes na bacia hidrográfica do rio Machado e classificá-las de acordo com suas categorias e esfera administrativa, bem como identificar a sua distribuição ao longo da bacia. Para tanto, foram tratados no Quantum QGIS 3.30.3, os arquivos shapefile sobre UCs disponíveis para download no Portal de Dados do MMA. Em complemento à pesquisa, utilizaram-se os arquivos do Catálogo de Metadados da ANA e do Portal de Geociência do IBGE. Por fim, foi feita consulta online para identificar o Plano de Manejo de cada UC. Foram identificadas 36 UCs na BHRM: 16 RESEX, 9 FLONAS, 6 RPPN, 2 PARNAS, 1 ESEC, 1 REBIO e 1 MONA. Das UCs instituídas na BHRM, 11 delas são da esfera federal, 24 da esfera estadual e apenas 1 da esfera municipal. Ao todo, são 11.864,24 km² de área protegida, correspondendo a 15,85% de toda a área da BHRM. Por fim, os resultados obtidos nas fichas de cada unidade indicam uma gestão ineficaz, uma vez que parte delas não apresentam instrumentos imprescindíveis a gestão de uma UC, tais como Plano de Manejo e Conselho Gestor.
Palavras-chave: SNUC, Unidades de Proteção Integral, Unidades de Uso Sustentável, Bacia Hidrográfica do rio Machado, Rondônia.
Abstract: Conservation Units play an important role in preserving natural resources and biodiversity. Created by Federal Law n. 9.985/2000, they are divided into two groups, integral protection units and sustainable use units, which in turn are made up of different categories and can be federal, state or municipal. In view of this, the aim of this study was to identify the conservation units present in the Machado river basin and classify them according to their categories and administrative sphere, as well as to identify their distribution throughout the basin. To this end, the shapefile files on Conservation Units available for download from the MMA's Data Portal were processed in Quantum QGIS 3.30.3. To complement the research, files from the ANA Metadata Catalog and the IBGE Geoscience Portal were used. Finally, an online consultation was carried out to identify the Management Plan for each PA. A total of 36 PAs were identified in the BHRM: 16 RESEX, 9 FLONAS, 6 RPPN, 2 PARNAS, 1 ESEC, 1 REBIO and 1 MONA. Of the PAs established in the BHRM, 11 are at federal level, 24 at state level and only 1 at municipal level. In all, there are 11,864.24 km² of protected area, corresponding to 15.85% of the entire area of the BHRM. Finally, the results obtained from the records of each unit indicate ineffective management, since some of them do not have instruments that are essential for managing a PA, such as a Management Plan and a Management Council.
Keywords: SNUC, Integral Protection Units, Sustainable Use Units, Machado river Basin, Rondônia.
Resumen: Las Unidades de Conservación desempeñan un papel importante en la preservación de los recursos naturales y de la biodiversidad. Creadas por la Ley Federal nº 9.985/2000, se dividen en dos grupos, las unidades de protección integral y las unidades de uso sostenible, que a su vez se componen de diferentes categorías y pueden ser federales, estatales o municipales. Teniendo esto en cuenta, el objetivo de este estudio fue identificar las unidades de conservación presentes en la cuenca del río Machado y clasificarlas según sus categorías y ámbito administrativo, así como identificar su distribución a lo largo de la cuenca. Para ello, se procesaron en Quantum QGIS 3.30.3 los archivos shapefile sobre Unidades de Conservación disponibles para descarga en el Portal de Datos del MMA. Para complementar la investigación, se utilizaron archivos del Catálogo de Metadatos de la ANA y del Portal de Geociencias del IBGE. Por último, se realizó una consulta en línea para identificar el Plan de Gestión de cada AP. Se identificaron 36 APs en el BHRM: 16 RESEX, 9 FLONAS, 6 RPPN, 2 PARNAS, 1 ESEC, 1 REBIO y 1 MONA. De las APs establecidas en la BHRM, 11 son a nivel federal, 24 a nivel estatal y sólo 1 a nivel municipal. En total, hay 11.864,24 km² de área protegida, lo que corresponde al 15,85% de toda la superficie de la RBHM. Por último, los resultados obtenidos de los registros de cada unidad indican una gestión ineficaz, ya que algunas de ellas no cuentan con instrumentos esenciales para la gestión de una UC, como un Plan de Gestión y un Consejo de Gestión.
Palabras clave: SNUC, Unidades de Protección Integral, Unidades de Uso Sostenible, Cuenca del río Machado, Rondônia.
INTRODUÇÃO
As Unidades de Conservação - UCs apresentam bastante relevância na preservação dos recursos naturais no Brasil e no mundo. Segundo Ayach et. al. (2019), o seu papel fundamental é a defesa dos recursos naturais e da biodiversidade, pois quando bem geridas são capazes de proporcionar diversos benefícios e representam uma forma de garantir a proteção ambiental.
No Brasil, a idealização de áreas protegidas teve início no século XIX, por meio do engenheiro André Rebouças, inspirado pela estratégia americana de proteção de ambientes especiais (Medeiros, 2006). O engenheiro sugeriu, inspirado pela criação do Yellowstone nos Estados Unidos em 1872, a criação de parques nacionais na ilha do Bananal e na extinta Cachoeira de Sete Quedas, entretanto, foi somente no ano 1937, após a sua morte, que o seu desejo se concretizou por meio da criação do Parque Nacional do Itatiaia (Fonseca; Lamas; Kasecker, 2010). De acordo com Rylands; Brandon (2005), o Código Florestal de 1934 foi o marco legal que regulamentou os parques nacionais. Dois anos após a criação do primeiro parque nacional brasileiro, foram instituídos outros novos parques: o Parque Nacional da Serra dos Órgãos e os Parques Nacionais das Setes Quedas, incluindo as Cataratas de Guaíra e do Iguaçu (Rylands; Brandon, 2005).
Conforme Rylands; Brandon (2005), a primeira floresta nacional foi criada em 1946 no Ceará, denominada como Araripe-Apodi, com 38.626 ha de extensão. A segunda floresta nacional, por sua vez, foi criada em 1961 no Pará, seguida pela instituição de mais nove florestas nacionais, todas localizadas na Amazônia, totalizando uma área de 1.879.400 km². Em 1965, as florestas nacionais foram incluídas no novo Código Florestal Brasileiro (Rylands; Brandon, 2005).
As UCs representam a forma de proteção dos recursos naturais mais difundida no Brasil. Inúmeras unidades foram instituídas no país no decorrer dos anos, com objetivos distintos e sob a gestão de diferentes órgãos governamentais, no entanto, até o final da década de 80 ainda não existia um sistema de unidades de conservação unificado, com estrutura organizada e coesa (Fonseca; Lamas; Kasecker, 2010). Foi apenas no ano de 2000, após anos de debate e discussões, que foi instituído o Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC, cuja estrutura atende às necessidades de uso e conservação dos recursos naturais no país.
O SNUC, no Art. 2°, inciso I, define como unidades de conservação:
[...] espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção (Brasil, 2000).
As UCs são divididas em dois grupos com características específicas relativas ao uso e conservação dos recursos naturais: unidades de proteção integral e unidades de uso sustentável. Cada grupo, por sua vez, é composto por diferentes categorias de unidades de conservação, cujo as quais possuem objetivos específicos de proteção da natureza, totalizando 12 categorias distintas.
O processo de ocupação do Estado de Rondônia, começou no século XIX, com o primeiro ciclo da borracha. Após o declínio, houve nova migração, para construção da Estrada de Ferro Madeira Mamoré. O desenvolvimento social no Estado de Rondônia passou por várias etapas, sendo incentivado com projetos de assentamentos, visando à ocupação do território (Nunes, 1996). O objetivo principal dos programas de ocupação no Estado de Rondônia visava o uso e ocupação do solo, principalmente com a finalidade de desenvolvimento da agricultura.
Segundo Pedlowski et. al., (1999), como resultado destes projetos, o estado sofreu uma grande perda de cobertura vegetal, com efeitos negativos tanto para os ecossistemas naturais quanto para as populações tradicionais que habitam a região. Rodrigues; Albuquerque (2024), apontam que 54% das UCs instituídas no Estado de Rondônia foram criadas entre os anos de 1993 e 2002, motivados pela implantação do Plano Agropecuário e Florestal de Rondônia (Planafloro), de iniciativa do estado. No entanto, as UCs estão expostas a riscos de degradação ambiental quando não há mecanismos específicos de fiscalização e de comando e controle.
De acordo com Fonseca; Lamas; Kasecker (2010), as UCs constituem um importante instrumento para a manutenção dos serviços ambientais, que são os benefícios concedidos à sociedade humana pelos ambientes naturais bem preservados, como a proteção de reservas de água. Para Cerezini (2022), há uma forte relação entre os recortes territoriais de uma bacia hidrográfica e das unidades de conservação, sugerindo a necessária integração entre a Política Nacional de Recursos Hídricos – PNRH e o SNUC.
Neste sentido, a partir da criação de UCs supõe-se que determinado território terá seus recursos ambientais protegidos ou, ao menos, manejados de forma sustentável. Desta forma, as UCs constituem importante instrumento para conservação e, consequentemente, revitalização de uma bacia hidrográfica e de seus recursos hídricos (Cerezini, 2022).
Conforme Hassler (2005), um dos vários benefícios proporcionados pelas UCs é a conservação dos recursos hídricos que por sua vez, são regulamentados pela Lei 9.433/1997. Pela Política Nacional de Recursos Hídricos, a bacia hidrográfica é a unidade territorial para gerenciamento dos recursos hídricos (Brasil, 1997).
Em Rondônia, a Bacia Hidrográfica do Rio Machado - BHRM representa a maior bacia, dentre as 7 bacias hidrográficas definidas pelo Plano Estadual de Recursos (PERH/RO, 2018). Sendo assim, o objetivo do presente estudo é identificar as unidades de conservação localizadas dentro dos limites da BHRM e classificá-las de acordo com suas categorias e esfera administrativa e identificar sua distribuição ao longo da bacia.
MÉTODOS
A área objeto de estudo deste trabalho é a bacia hidrográfica do rio Machado, uma das sete bacias hidrográficas do estado de Rondônia. A bacia possui dois comitês instituídos: Comitê de Bacia Hidrográfica Alto e Médio Machado e Comitê de Bacia Hidrográfica Rio Jaru Baixo Machado (PERH/RO, 2018).
A bacia hidrográfica do Rio Machado possui uma área de aproximadamente 74.847 km² se estendendo pelo território do estado de Rondônia, e engloba municípios como: Machadinho d’Oeste, Ji-Paraná, Ouro Preto d’Oeste, Jaru, e Pimenta Bueno, dentre outros. Dentre os rios localizados na bacia pode-se citar: rio Machado, rio Jaru, Rio Urupá, Rio Machadinho, e Rio Preto (ANA, 2017).
A Figura 1 indica o fluxograma de desenvolvimento desta pesquisa. Inicialmente, foram obtidos dados pré-existentes disponíveis no Portal de Dados Abertos do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima - MMA sobre as UCs com registro ativo no SNUC em 2022, disponibilizados para download em arquivo shapefile. O arquivo em questão contém dados acerca das UCs, incluindo a categoria de cada unidade, esfera governamental responsável, nome da unidade, área em ha e km² e demais informações.
Cabe ressaltar que o arquivo disponibilizado pelo MMA, contém unidades denominadas como Floresta Estadual do Desenvolvimento Sustentável, que são incluídas na categoria Floresta, assim como as FLONAS. Em consulta aos arquivos do Cadastro Nacional de Unidades de Conservação - CNUC (2024), consta a mesma definição para estas unidades, portanto, as Florestas descritas neste trabalho incluem tanto as Florestas Nacionais, quanto as Florestas Estaduais de Rendimento Sustentável, seguindo a caracterização dada pelo próprio CNUC.
Foram utilizados também os arquivos shapefile referente a divisão das bacias hidrográficas do estado de Rondônia e dos cursos hídricos da BHRM, obtidos através dos dados pré-existentes disponibilizados no Catálogo de Metadados da ANA: Nível 2 de Sub-Bacias do Plano Nacional de Recursos Hídricos e Base Hidrográfica Ottocodificada Multiescalas 2017 50k.
Quanto aos limites do território de Rondônia, este foi obtido do arquivo shapefile denominado como Malha Municipal, disponível para download nos produtos de geociências do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE.
O tratamento dos arquivos shapefile e composição dos mapas expostos neste trabalho foi utilizado o software de geoprocessamento Quantum GIS versão 3.30.3, enquanto as tabelas foram organizadas no Excel Office 16.
Por fim, buscou-se os Planos de Manejo de cada UC e a criação do Conselho. Para obtenção destes documentos, foram consultadas as fichas de cada unidade disponíveis na Plataforma Oficial de dados do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza, alimentado pelo CNUC.
Para desenvolvimento da pesquisa bibliográfica, utilizou-se o Portal de Periódico da CAPES, por intermédio do acesso ao Café (Comunidade Acadêmica Federada) com login institucional da Universidade Federal de Rondônia - UNIR. Em complementação, utilizou-se também o Google Scholar.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
As unidades de conservação são áreas protegidas criadas no intuito de garantir a representatividade dos diversos biomas, ambientes e biodiversidades do país (Fonseca, Lamas; Kasecker, 2010). Na bacia hidrográfica do rio Machado - BHRM foram identificadas 36 unidades de conservação, com diferentes categorias e esferas de gestão. Juntas, essas unidades de conservação correspondem a uma área de 11.864,24 km², representando 15,85% da área da bacia (MMA, 2022).
De acordo com o Art. 7° do SNUC, as unidades de conservação são separadas em dois grupos distintos: I – unidades de proteção integral e; II – unidades de uso sustentável (Brasil, 2000). Dentro destes grupos, as unidades de conservação dividem-se em categorias, conforme exemplificado no quadro abaixo (Quadro 1).
Conforme analisado por intermédio dos arquivos shapefile de UCs com registro ativo no SNUC, dentro dos limites da BHRM encontram-se instituídas 16 Reservas Extrativistas (RESEX), 9 Florestas Nacionais (FLONA), 6 Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN), 2 Parques Nacionais (PARNA), 1 Estação Ecológica (ESEC), 1 Reserva Biológica (REBIO) e 1 Monumento Natural (MONA). A figura 2 aponta a localização de cada UC dentro da bacia.
Os resultados obtidos, apontam que das 36 UCs instituídas na BHRM, 44,44% são RESEX (MMA, 2022). Conforme a Lei Federal n. 9.985/2000, as RESEX são áreas utilizadas por populações extrativistas tradicionais, cuja subsistência baseia-se no extrativismo, na agricultura de subsistência e na criação de animais de pequeno porte. Seus objetivos são proteger os meios de vida e a cultura dessas populações, assegurando o uso sustentável dos recursos naturais da unidade (Brasil, 2000).
As FLONAS, por sua vez, representam 25% das unidades instituídas na bacia e são definidas como uma área com cobertura florestal de espécies predominantemente nativas tendo como objetivo básico o uso múltiplo sustentável dos recursos florestais e a pesquisa científica, com ênfase em métodos para exploração sustentável de florestas nativas (Brasil, 2000).
Na BHRM, das 9 FLONAS identificadas, 6 delas são denominadas como Floresta Estadual de Rendimento Sustentável: a FERS Tucano, FERS Mutum, FERS Araras, FERS Periquito, FERS Gavião e FERS Cedro. Conforme Brasil (2000), a unidade desta categoria pode ser criada tanto pelo estado quanto pelo município, e então serão denominadas respectivamente como Floresta Estadual e Floresta Municipal.
As RPPN são 16,67% das UCs na BHRM. Conforme definido em Lei 9.985/2000, as RPPN são áreas privadas, gravadas com perpetuidade, com o objetivo de conservar a diversidade biológica (Brasil, 2000). Zanchetta et al. (2021), realizou o monitoramento de 9 RPPN em Rondônia, incluindo 6 unidades da BHRM e concluiu que tais unidades constituem uma alternativa para reduzir os níveis de desmatamento no estado. Entretanto, apenas a instituição das UCs não é suficiente, há a necessidade de que políticas de conscientização e o incentivo de criação sejam promovidos ao longo do estado (Zanchetta et al., 2021).
Na BHRM há dois PARNAS instituídos, o Parque Nacional dos Campos Amazônicos e o Parque Nacional de Pacaás Novos, que juntos representam 5,56 % das unidades de conservação na bacia. Segundo Brasil (2000) os PARNA, tem como objetivo básico a preservação de ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica, possibilitando a realização de pesquisas científicas e o desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental, de recreação em contato com a natureza e de turismo ecológico.
A ESEC e a REBIO representam, cada uma, 2,78% das unidades de conservação na bacia, uma vez que há uma unidade de cada instituídas no território em questão. A ESEC, denominada como Estação Ecológica Samuel, é definida por Lei como uma área que tem por objetivo a preservação da natureza e a realização de pesquisas científicas (Brasil, 2000).
A Reserva Biológica presente na BHRM é denominada como Reserva Biológica do Jaru, sua instituição, conforme o SNUC, tem por objetivo a preservação integral da biota e demais atributos naturais existentes em seus limites, sem interferência humana direta ou modificações ambientais, excetuando-se as medidas de recuperação de seus ecossistemas alterados e as ações de manejo necessárias para recuperar e preservar o equilíbrio natural, a diversidade biológica e os processos ecológicos naturais (Brasil, 2000).
Por fim, tem-se o MONA Morro Chico Mendes, situado no município de Ouro Preto do Oeste. Representa 2,78% das categorias de UCs instituídas na BHRM e seu objetivo principal é a preservação de sítios naturais raros ou de grande beleza cênica (Brasil, 2000).
Em Rondônia, há 75 unidades de conservação instituídas, ou seja, apenas a BHRM abriga 48% das UCs de todo o estado (MMA, 2022). Todavia, cabe observar que algumas das UCs instituídas ultrapassam os limites da BHRM, abrangendo também outras bacias hidrográficas. Na Figura 3 é possível observar o percentual em km² ocupado por cada categoria de UCs (Figura 3).
Embora sejam maiores em quantidade, as reservas extrativistas representam apenas 9% de toda a área protegida na BHRM, com área total de 1.079,20 km² (MMA, 2022). Os maiores percentuais são ocupados pelas florestas e pela reserva biológica, que apresentam uma área, consecutivamente de 4.499,18 km² e 3.468,60 km². Cabe ressaltar que, a bacia hidrográfica do rio Machado possui apenas 1 reserva biológica, denominada como Reserva Biológica do Jaru e sozinha representa 29% de toda a área protegida na bacia hidrográfica (MMA, 2022).
Os PARNA por sua vez, representam 19,11% da área protegida na bacia, corresponde a uma área de 2.267,30 km², no entanto, ressalte-se que ambos os parques se estendem além da BHRM e, portanto, a área total de cada parque é superior a encontrada na bacia em questão (MMA, 2022).
Das 36 unidades de conservação instituídas na BHRM, apenas 8 delas estão localizadas no CBH Rio Alto e Médio Machado, enquanto que as 28 restantes localizam-se no CBH – Rio Jaru Baixo Machado. No CBH do Rio Jaru – Alto Machado encontram-se as categorias de FLONA, RESEX, REBIO, PARNA e ESEC (Figura 4).
As UCs localizadas no CBH - Rio Jaru Baixo Machado representam 77,7% de todas as unidades instituídas na BHRM, demonstrando uma desigualdade na distribuição espacial destas áreas de proteção. Quando comparado ao CBH Rio Alto e Médio Machado, o CBH do Rio Jaru – Baixo Machado, apresenta um maior número de unidades de conservação, bem como maior diversidade das categorias e usos de cada uma delas.
Embora seja identificado um volume considerável de UCs no CBH do Rio Jaru Baixo Machado, observa-se a falta de conectividade entre essas áreas. Conforme Assis (2021), este aspecto propicia a formação de “ilhas de vegetação”, ocasionadas pelas manchas e fragmentos de vegetação na paisagem, apresentando auto grau de atividade predatória, que possibilita especiações e adaptações, bem como aumenta o efeito de borda em áreas isoladas.
Das unidades de conservação do CBH Rio Jaru – Baixo Machado, 25 são do grupo de uso sustentável, e 3 são do grupo de proteção integral. No CBH – Rio Alto e Médio Machado, por sua vez, todas unidades representam UCs de uso sustentável, como por exemplo o MONA que representa 0,02 de toda área protegida da BHRM.
Esta unidade localiza-se dentro dos limites do Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio Alto e Médio Machado, juntamente com as Reservas Particulares do Patrimônio Natural e o Parque Nacional dos Pacaás Novos, conforme demonstrado na Figura 5.
Em suma, 85,71% das unidades de conservação instituídas na BHRM são unidades de uso sustentável, enquanto 14,29% são unidades de proteção integral.
As discrepâncias entre os números de UCs de uso sustentável e UCs de proteção integral se assemelham aos encontrados no âmbito nacional, onde 68,52% são de uso sustentável e apenas 31,48% são de proteção integral. Quando se observa o bioma amazônico o cenário se repete, uma vez que as unidades de conservação de proteção integral representam 28,6 % da totalidade de UCs, e as de uso sustentável representam 71,4% (CNUC, 2024).
Além das divisões por grupos e categorias, as unidades de conservação podem ser observadas de acordo com a esfera da administração a qual pertence (Figura 6). Conforme Young; Medeiros (2018), as UCs representam uma importante tipologia de área protegida no Brasil e podem ser instituídas pelo Poder Público, seja em esfera federal, estadual ou municipal, ou voluntariamente por iniciativa privada e estão organizadas sob a forma de um sistema único, o SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação.
Na Figura 6, observa-se que das 36 unidades de conservação identificadas, 11 UCs são de esfera federal, sob gestão do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio, enquanto que 24 são de esfera estadual, sob gestão da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Ambiental – SEDAM e apenas 1 de esfera municipal, estando sob gestão da Prefeitura Municipal de Ouro Preto d’Oeste (MMA, 2022).
Segundo Pinto, et. al. (2019), a consolidação de unidades de conservação municipais depende de mecanismos capazes de fortalecer técnica e financeiramente os governos locais, de forma a garantir a sustentabilidade e continuidade no processo de proteção da biodiversidade e dos serviços ambientais que essas unidades proporcionam.
Como exemplo, o autor cita a implementação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) verde ou ecológico que, segundo o mesmo, fomentaram a criação de unidades de conservação municipais no estado de Minas Gerais (Pinto et. al., 2019).
Conforme Cerezini (2022), além de instituir novas UCs é preciso garantir a sua consolidação por meio da gestão efetiva e escolhas coerentes das categorias adequadas a cada objetivo de conservação. No que se refere a gestão destes territórios, Brasil (2000) estabelece para as unidades de conservação o Plano de Manejo, definido como o documento técnico no qual se estabelece o zoneamento e as normas que orientam o uso da área e o manejo dos recursos naturais em uma UC.
Das unidades instituídas na BHRM que são de esfera federal, 5 unidades de conservação possuem Plano de Manejo aprovado (CNUC, 2024). As 6 unidades federais as quais não foram identificados o Plano de Manejo correspondem às RPPN.
Na esfera estadual, 17 (70,83%) UCs possuem Plano de Manejo instituídos, enquanto 7 delas não possui nenhum tipo de informação. Quanto à esfera municipal, a única UC existente, não possui Plano de Manejo. Para Santana; Santos; Barbosa (2020), esses números indicam um uso desordenado que contribui para o aumento dos problemas socioambientais no entorno da unidade.
Ao analisar a BH do Rio São Francisco, Cerezini (2022), identificou que 86% das UCs não possuíam Plano de Manejo elaborado. Para o autor, estes valores apresentam a efetividade da gestão das unidades e evidenciam as limitações e potencialidades do SNUC dentro do âmbito de gestão bacia hidrográfica.
Ao todo, das 36 UCs existentes na BHRM, 22 delas possuem Plano de Manejo instituído. Ao observar por grupos de uso, 4 destas são unidades de proteção integral e 18 são unidades de uso sustentável (CNUC, 2024).
Partindo do pressuposto de que nos limites territoriais da BHRM estão instituídas 5 UCs de proteção integral e 31 UCs de uso sustentável, é possível inferir que este último grupo aparentam ter uma gestão menos eficaz, uma vez que apenas 58% das unidades possuem Plano de Manejo instituído.
A ausência do Plano de Manejo nas UCs reflete o cenário federal onde, segundo Barros; Leuzinger (2018), os órgãos responsáveis enfrentam dificuldades na implementação deste documento. Embora o Plano de Manejo possua arcabouço legal para sua elaboração e implantação, as autoras identificaram que os principais desafios para implantação do documento são decorrentes de razões de ordem prática, tais como dificuldades de implementação dos planos de manejo, de adequação aos parâmetros fornecidos pelos roteiros metodológicos, de observância do prazo de elaboração, dentre outras questões.
O SNUC também estabelece que cada UC tenha Conselho Consultivo ou Conselho Deliberativo, ou os dois em conjunto, dependendo da categoria a qual se trata (Brasil, 2000). Na BHRM, 16 unidades possuem algum Conselho Gestor instituído, sendo: 10 RESEX, 2 PARNA, 2 FLONA, 1 REBIO e 1 ESEC (CNUC, 2024). Ao analisar em referência a esfera administrativa, são 11 unidades estaduais e 5 unidades federais.
Nestes termos, observa-que 45% das UCs federais possuem Conselho Gestor, assim como nas UCs de esfera estadual. De acordo com Viana; Umbelino (2016), na esfera federal, estes valores podem refletir o processo de consolidação das áreas federais que são mais antigas, e possuem investimento maior e de longo prazo.
Entretanto, quando se observa a data de instituição das UCs, 95% das UCs estaduais foram instituídas entre os anos de 1995 e 1997, e apenas 1 unidade foi instituída posteriormente a isso, no ano de 2024. As UCs federais, por sua vez, foram instituídas entre os anos de 1961 e 2012.
Por fim, foi possível observar também que em relação às UCs da esfera federal, apenas as RPPN não possuem nem Plano de Manejo e nem Conselho Gestor, indicando uma gestão ineficiente no cadastramento desta categoria de unidade perante ao CNUC.
Diante destes números, não há como evidenciar quais fatores influenciam na instituição de um Conselho Gestor, bem como na instituição do Plano de Manejo, no âmbito da BRHM. No entanto, é possível apontar alguns desafios para a gestão das UCs de forma geral.
Godoy; Leuzinger (2015), cita os problemas mais graves em relação a baixa efetividade da implantação do SNUC, dentre eles: escassez de recursos, gastos desnecessários, falta de corpo técnico, falta de utilização de critérios científicos para a escolha da categoria de manejo, formato e dimensão das unidades de conservação, populações tradicionais residentes em unidades de proteção integral, baixa aceitação pelas população circunvizinha, falta de regularização fundiária, ausência de proteção equânime entre os biomas
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As unidades de conservação estão distribuídas de forma desigual ao longo da bacia hidrográfica do Rio Machado, deixando inassistidos os recursos naturais presentes nos limites do CBH Alto e Médio Machado. Além da desigualdade espacial, foi identificado também a desconectividade entre as áreas protegidas, propiciando a especiação e adaptação de espécies predadoras e a ampliação do efeito de borda.
O número de UCs de uso sustentável é superior ao número de UCs de proteção integral, refletindo o cenário federal. Quanto as esferas administrativas, há um número maior de unidades sob a responsabilidade do governo do Estado de Rondônia, enquanto há um menor número de UCs federais. Além do mais, com exceção das RPPN e da Rebio, as UCs federais não se limitam ao território da BHRM.
No que se refere aos instrumentos de gestão, 70% das UCs estaduais estão com Plano de Manejo instituído, e 45% possui Conselho Gestor. Nas UCs federais, 45% possuem tanto o Plano de Manejo quanto o Conselho Gestor. Ante a estes números, entende-se que além da necessidade de se instituir novas unidades de conversação, em lugares estratégicos, cabe aos governantes e a população observar os aspectos referentes a gestão e administração destas unidades.
Os resultados também apontam a ausência de unidades de conservação na esfera municipal, demonstrando a falta de recursos técnicos e financeiros nas prefeituras municipais para instituir unidades no seu território que visem a proteção integral ou o uso sustentável dos seus recursos naturais e da biodiversidade.
Agradecimentos
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001, agradeço também ao Programa de Mestrado Profissional em Rede Nacional em Gestão e Regulação de Recursos Hídricos - ProfÁgua, Projeto CAPES/ANA AUXPE No. 2717/2015, pelo apoio técnico científico aportado até o momento.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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