A INICIAÇÃO CIENTÍFICA EM DESIGN E MODA NO BRASIL

Revista de Ensino em Artes, Moda e Design

Universidade do Estado de Santa Catarina, Brasil

ISSN: 2594-4630

Periodicidade: Bimestral

vol. 4, núm. 1, 2020

modaesociedade@gmail.com



Resumo: Entrevistou-se o Prof. Dr. Marcelo Machado Martins e a Profa. Dra. Taísa Vieira Sena, respectivamente presidente e vice-presidenta do Congresso Brasileiro de Iniciação Científica em Design e Moda (CBICDEM), no intuito de compartilhar re- flexões acerca do passado, presente e futuro do evento e destacar a importância da iniciação científica para a academia brasileira de Moda.

Palavras-chave: Iniciação científica, Pesquisa científica, Moda.

Abstract: Were interviewed Prof. Dr. Marcelo Machado Martins and Prof. Dr. Taísa Vieira Sena, respectively president and vice president of the Brazilian Congress of Scientific Initiation in Design and Fashion, in order to share reflections about the past, present and future of the event and highlight the importance of scientific initiation for Brazilian academy of Fashion.

Keywords: Scientific initiation, Scientific research, Fashion.

Resumen: Fueron entrevistados el Prof. Dr. Marcelo Machado Martins y la Prof. Dr. Taísa Vieira Sena, respectivamente presidente y vicepresidente del Congreso Bra- sileño de Iniciación Científica en Diseño y Moda, para compartir reflexiones sobre el pasado, presente y futuro del evento y resaltar la importancia de la iniciación científica para la academia brasileña de moda.

Palabras clave: Iniciación Científica, investigación científica, Moda.

A INICIAÇÃO CIENTIFICA EM DESIGN E MODA NO BRASIL

Profa. Dra. Taísa Vieira Sena e Prof. Dr. Marcelo Machado Martins
Profa. Dra. Taísa Vieira Sena e Prof. Dr. Marcelo Machado Martins
Profa. Dra. Taísa Vieira Sena e Prof. Dr. Marcelo Machado Martins
Fotografia: Natália Régis, Unisinos, setembro de 2019.

Entrevistadores: Felipe Fonseca e Natália Régis de Souza

Estudantes do Bacharelado em Moda da Universidade do Estado de Santa Catarina, bolsistas de Iniciação Cientifica do Laboratório de Moda, Artes, Ensino e Sociedade desde 2018 e comunicadores do 16º Congresso de Iniciação Científica em Design e Moda.

Entrevistados:

Marcelo Martins é professor e pesquisador na Universidade Federal do Per- nambuco, onde atua desde 2016 no departamento de Design. É doutor e mestre em Semiótica e Linguística Geral, bacharel e licenciado em Letras com especialização em língua portuguesa. Além disso, é professor convidado no programa de pós-graduação em Consumo, Cotidiano e Desenvolvimento Social da URFPE. No Colóquio de Moda é vice coordenador do GT Corpo, Moda e Comunicação e presidente do Congresso Brasileiro de Iniciação Científica em Design e Moda.

Taísa Vieira Sena é professora no curso de Design de Moda da PUC-PR, onde também é responsável pela formação continuada da Escola de Arquitetura e Design. É doutora em Comunicação e Semiótica, mestre em Design e Bacharela em Moda,

A INICIAÇÃO CIENTÍFICA EM DESIGN E MODA NO

BRASIL

com especialização em Marketing e Gestão Empresarial. Atualmente faz parte da di- retoria executiva da Associação Brasileira de Estudos e Pesquisa em Moda (ABE- PEM) e é vice-presidenta do Congresso Brasileiro de Iniciação Científica em Design e Moda (CBICDEM).

1. O Congresso Brasileiro de Iniciação Científica em Design e Moda nasceu em 2014, na cidade de Caxias do Sul, contando com a apresentação de 51 pôsteres de iniciação científica. O que motivou a formação deste congres- so e como foi a edificação dele?

Taísa: Já existia a categoria Iniciação Científica dentro do colóquio. Só que ficava afastado e nós sempre pensamos em dar mais visibilidade a esse trabalho. Quem avaliava, via os esforços dos alunos para poderem estar no evento que, às vezes, é longe e se organizavam o ano inteiro para aquilo. Então, foi lá em Fortaleza, um ano antes [que tudo começou]. A gente estava numa reunião na orla, e eu me lembro bem, sentados num varandão do hotel e falando sobre fazer um congresso de IC. A Káthia [Castilho]1 falou: “Você e o Marcelo poderiam ficar com isso”. Nos primeiros dois anos ele ocorreu no primeiro dia. Depois, nos últimos, ele passou para o último dia. E só vem crescendo, a cada ano temos recebido mais trabalhos. No ano passado resolvemos colocar as apresentações logo antes da sessão dos GTs para integrar, dá continuidade e, da mesma forma, o estudante de iniciação científica porque já passou pela sua apresentação, pela troca com os pares, com os colegas, ele se sente mais à vontade ali. Para o próximo ano vamos mudar o nome de “Pôster” para “artigo de iniciação científica”.

Marcelo: Como a gente já trabalhava junto no GT do colóquio Corpo, Moda e Comu- nicação, éramos amigos. A Taísa estava terminando o doutorado e eu dando maior apoio na finalização do trabalho. Eles viram na gente pessoas em potencial para aju- dar a alavancar isso. Eu fiquei muito assustado em coordenar tudo, porque não moro em São Paulo, moro longe. Não tenho o contato que elas têm sempre do colóquio, mas tive muita segurança por causa da Taísa. Virou novamente uma parceria, que já existia por outras coisas. Eu ainda estava processando e ela já estava desenhando como seria. É maravilhoso ter gente assim do lado. O desenho da coisa começou na orla de Fortaleza e no ano seguinte se efetivou em Caxias. Agora no formato atual, no início, as pessoas estavam ainda muito assustadas, mas na verdade a gente viu que ficou muito mais integrado. Muitos professores me pararam no corredor para elogiar o alto nível dos trabalhos e o conforto dos estudantes ao apresentar. Foi um ganho mui- to grande a ideia de integrar. São três os grandes momentos: o início, a transformação

do pôster em slides e a integração com o GT do colóquio.

1. O CBICDEM chegou em 2019 à sua 6ª edição. Quais foram os desa- fios encontrados nesse percurso e quais diferenças podem ser enal- tecidas desse começo até agora? O jovem-estudante que participa da IC alterou seu perfil ao longo desses primeiros anos?

Taísa: Alterou! Mesmo que não fosse ainda como a gente queria, os estudantes foram ganhando ainda mais visibilidade, principalmente no momento em que eles passam a apresentar em sala de aula para várias pessoas, não mais num corredor. Era sempre uma apresentação para quem estava na sua frente e no ano passado, que começou a apresentação para grupo, para esse ano vimos um crescente na qualidade, tanto dos trabalhos escritos quanto na apresentação oral, os scores de pontuação aumentaram bastante.

Marcelo: Eu também acho. Porque, de alguma maneira, ter integrado uma coisa es- pecífica para os alunos fez com que eles tivessem outra relação, inclusive com os pro- fessores autores, ídolos, e professores que passam por aqui. Há essa possibilidade de encantamento, de admiração. Acho que de alguma maneira isso tem contribuído para eles se dedicarem mais. Consigo perceber isso com essas pessoas com quem eu falo e que apresentam. Tem uma felicidade diferente, que faz parte da formação. “Eu estou feliz, estou aqui com meu professor, com minha professora, alguém está me ouvindo, tem um espaço que é dedicado para mim”. Vejo um monte de gente que começou lá nos primórdios, no poster, e hoje está em GT. Na apresentação da Juliana [Schmitt] ela falou isso, até marquei a expressão “troca de lugares”. A história dela foi feita no colóquio e hoje ela está como palestrante, então eu acho que isso acaba, de alguma maneira, motivando os graduandos e graduandas que participam.

1. Qual é a grande importância do CBICDEM no Colóquio de Moda? Por que realizá-lo junto ao colóquio? E qual a importância do CBIC- DEM para o meio acadêmico da moda?

Taísa: Os cursos da área de Moda têm em torno de 30 anos, então é um discurso que a gente ouve há mais de vinte: “tem que fomentar, tem que crescer”. E a gente se or- gulha em poder fazer parte disso. O próprio colóquio foi mudando. Quando ele nasceu era para discutir a área, que na época não tinha praticamente nem bibliografia. Então a ideia do colóquio nesse início era fazer essa área crescer, para trazer bibliografia,

material de pesquisa e então nesse momento se solidificou muito bem. E aí come- çaram outros espaços, como o Fórum [das escolas de Moda], para pensar a área da educação, que agora a gente já conseguiu fomentar mais. Já que conseguimos fazer crescer, como está esse crescimento? Como melhorar? Vimos a mesma coisa com a iniciação científica: eu fui aluna da Mara [Rúbia Sant'Anna] e hoje sou professora há vários anos. A Káritha [Macedo] é professora também e foi minha aluna na UDESC. Os primeiros alunos são professores. Isso vem dessa paixão por estudar, por pes- quisar e aí a gente fomenta isso nos nossos alunos. A pesquisa não precisa ser só acadêmica. O gosto pela pesquisa pode levar a vários lugares. E poder despertar e incentivar isso é muito gratificante.

Marcelo: Eu me emociono! A minha formação acadêmica é do colóquio. São várias gerações formadas e mesmo para quem não vai seguir carreira acadêmica. Eu tenho casos em Pernambuco de gente que participou do colóquio em algum momento, e faz parte do currículo, de um portfólio. Isso para quem está indo para empresa chama a atenção, dá uma visibilidade para quem está indo para o mercado, que não necessa- riamente acadêmico. Claro que para o acadêmico conta muito. E para o acadêmico elas [as professoras] acabam sendo nossas inspirações, nossos modelos. Essas his- tórias fazem parte da vida da gente, a professora com várias gerações. A Mara Rúbia trabalha o dia inteiro, a noite inteira com todo mundo. É esse tipo de coisa que elas fazem.

1. Nas discussões sobre ensino de moda se fala muito sobre um novo perfil de estudante que chega ao ensino superior. É um estudante in- quieto, que busca resultados imediatos. De que forma podemos atrair esse novo perfil de estudante para a iniciação científica?

Taísa: Da mesma forma que esse estudante é muito inquieto, se você acha o viés correto, a linguagem mais adequada para trabalhar com ele, ele também se engaja bastante, porque é um estudante com muitas paixões. Se em algum momento alguma dessas paixões se torna o viés da pesquisa, o viés da iniciação, ele se engaja profun- damente. É claro, não é para todas as pessoas porque realmente tem que despertar uma paixão. Mas se você consegue, dentro desse novo perfil de estudante, ele se engaja e vai atrás, pesquisa, busca. Ele também tem mais acesso à informação e às coisas do que a geração anterior. Com isso, se ele se apaixona por esse método da pesquisa ele se engaja mais.

Marcelo: Acho que também tem um perfil diferenciado desse estudante de Moda. Eu me lembro que antes de estar no colóquio, presencialmente, eu cheguei a dar aula em São Paulo, para um curso de Moda, na Paulista. Era um perfil completamente di- ferente dos alunos que eu vejo hoje nos cursos de Moda. Era uma coisa do glamour, “estou aqui para ser um grande estilista, estou aqui para desenhar, para cortar, para ser famoso e para ser fotografado”. A pesquisa estava muito longe dessa primeira geração do curso de Moda. Eu estou falando de um caso específico de uma universi- dade particular. Mas acho que nas públicas também se passou um pouco disso. Hoje as pessoas estão mais engajadas. Esse despertar da paixão, se a gente consegue tem bons resultados. Eu sou um professor mais antigo, mas de certa forma eu tam- bém aprendi com elas aqui. A gente precisa pegar na mão, sim, porque as pessoas estão muito perdidas hoje. Isso tem todos os aspectos positivos, mas constrói outra identidade para gente. Uma identidade muito múltipla, muito pesada, muito antenada com tudo e ao mesmo tempo com nada, quanto à profundidade. E quando a Taísa fala da paixão, se a gente consegue despertar e identificar, aí a gente precisa pegar na mão e falar “agora a conversa vai ser outra”. A gente quer fazer aflorar a paixão, mas transformar isso, de alguma maneira, num trabalho muito produtivo e sempre pensando na relação com o outro. A gente está formando o aluno para ele mesmo, mas tentando mostrar que ele não está sozinho no mundo. Existe um outro, em algum momento você vai ter que parar para pensar quem é esse outro. Qual a relação que você tem com o outro?

1. E nesse sentido do que estávamos falando, como incentivar os pesquisadores, professores e instituições a atuarem junto à iniciação científica?

Taísa: Tem algumas instituições que não dão foco à pesquisa, das privadas existem muitas. Eu estou em uma [instituição] privada que dá muito foco, mas é um caso à parte. Ela está sempre olhando os rankings e quer estar nos primeiros lugares. In- clusive separa bolsas de pesquisa, tem bolsa CNPq, bolsa Fundação Araucária e a própria bolsa da universidade. Eu tenho quatro estudantes, dois deles são bolsistas, é o máximo de bolsistas que um professor pode ter. Há um incentivo, tem um con- gresso interno de iniciação científica. Então dentro da nossa universidade a iniciação científica é valorizada, é buscada e os professores devem fazer. Eu faço por paixão, mas tem professor que faz porque tem que fazer e às vezes se enrolam… E a gente vê nitidamente quem faz, se engaja, se apaixona. Essa paixão passa para o aluno, que se encanta e continua. Uma das minhas bolsistas, que está entregando agora, fez duas pesquisas diferentes. Engatou um período atrás do outro. Mas a gente sabe

que não é a realidade das privadas, que não têm o foco em pesquisa. E aí fica para as públicas a maior parcela da iniciação científica que a gente vê no congresso. A gente continua fazendo por paixão, porque mesmo sem horas para aquilo, você faz. Mas é muito válido, acho que é fantástico.

Marcelo: Eu acredito muito nesse discurso da paixão que a Taísa acabou de falar. Acompanhar uma iniciação científica dá muito trabalho. Você tem que estudar, às vezes tem coisa que você não tem referência. Você tem que pesquisar. Tem que di- datizar aquilo para conversar na orientação, e aí você tem que ajudar na produção de texto, porque as pessoas escrevem menos. Então, se tem uma série de coisas para fazer que não é para todo mundo. Se você não tem paixão em orientar, é melhor que nem oriente, porque a minha falta de paixão pode tolher a sua paixão. A má orientação pode fazer você gostar menos ou deixar de gostar, do que se estava disposto a fazer. Por isso eu acho que vai do perfil de cada professor. A universidade hoje é aberta, para todo mundo, a gente tem que acolher a diversidade e a gente acolhe porque acredita no discurso e tal. E aí tem casos de alunos que tem uma paixão despertada, tem vontade, mas não tem orientador que tenha a sensibilidade de respeitar o aspecto que o torna o sujeito da diversidade. Vou dar um exemplo: tive um aluno disléxico. Não é fácil. Ele chegou dizendo “eu nem fui procurar outro professor, porque eu acho que só o senhor pode me aceitar”. Fez. Não superou nada da dislexia, mas fez. Feliz, tran- quilo. A família vai agradecer. Quando a família participa, também é bem importante. É fantástico. A educação salva vidas.

Taísa: Eu tenho uma aluna que foi premiada no colóquio de João Pessoa. Ela fez uma pesquisa de trajes de banho, no TCC, para muçulmanas. Fez, a gente deu continui- dade. E o pai dela, no dia da formatura, fez questão de vir falar comigo. Ela se apai- xonou, entrou na especialização logo depois e hoje ela trabalha como pesquisadora em um instituto em Curitiba.

1. Os professores são de regiões distintas em nosso país, de dimen- sões continentais. O professor Marcelo atua em um centro de ensino público e gratuito de uma UF, localizada há quase 140 quilômetros da capital Pernambucana e a professora Taísa atua numa instituição de ensino privada, na capital de um estado do sul. Além das diferenças geográficas, quais seriam as experiências e contextos da pesquisa que os diferenciam também? O que os uniu nesse propósito do CBI- CDEM?

Taísa: A gente se uniu nessa missão, porque mesmo antes já tínhamos estudantes que vinham aqui, que buscavam esse espaço. E a gente sempre pensou “nós pre- cisamos dos alunos com mais força para vir apresentar a sua pesquisa. Não vai ter pesquisador daqui a vinte anos se a gente não incentivar agora”. E o Marcelo também, sempre com essa paixão e sempre ajudando os alunos, tentando dar visibilidade aos estudantes. É como o Marcelo falou antes: tem professor que não faz com o aluno, não é aquela paixão. Eu fico extremamente grata, feliz, recompensada quando eu vejo a possível transformação que eu posso fazer na vida do meu estudante. Essa é minha maior recompensa: ver que os meus estudantes, nesses meus 15 anos lecio- nando, hoje estão bem. Eu tenho contato com cada um deles, sei onde eles estão. Isso é muito compensador ver que você pôde, por uma mínima questão que seja, tocar a vida de alguém, fazer alguém pensar sobre si ou poder ajudar alguém na sua transformação. Não tem nada que pague, não tem salário. Isso é o maior valor pos- sível que a gente pode ter. E quando a gente vê os olhinhos dos nossos estudantes felizes de poder estar aqui, estar nesse espaço. Eu já levei aluna para o CIMODE, já levei aluna para o CBS, em São Paulo. E eles se acham o máximo, eles estavam lá no congresso, com as pessoas que eles viam nos livros. E isso é transformador. Então a gente se juntou nessa missão de ser agente de transformação. Quando eu comecei a lecionar, eu ouvia do gestor da universidade, que era outra privada: “você não é amiga do seu aluno, você é professora”. E eu achava aquilo o fim da picada, porque uma coisa não exclui a outra.

Marcelo: A gente tem a mesma formação, em semiótica. Eu sou mais velho do que a Tatá, comecei antes. E a gente vem de uma escola - acho que isso que emociona

- que não é a escola de hoje, não era acolhedora. Nossa escola foi muito dura. Eu não tive a oportunidade, no meu mestrado ou doutorado, de participar de uma coisa assim, que você vem e quer voltar todos os anos. Era outro tipo de escola, outro tipo de aluno. A gente não tinha voz e tudo que a gente fazia, não é que podia ser melhora- do, é que nada era bom. E no meio dessa trajetória a gente se conheceu e aí a gente se encontra aqui tendo a possibilidade de fazer algo diferente. Participar de um GT para a gente já era diferente. Mas quando veio a ideia do congresso, a gente pensa até inconscientemente: “temos que fazer diferente, a gente precisa fazer com eles o que não fizeram com a gente”. Estavam muito pouco preocupados com o resultado da formação que estava sendo ali trabalhada. A gente tem que fazer um acolhimento dife- rente. Acho que quando eu falo dos três grandes picos é justamente isso, esses picos mostram que a gente está preocupado, que a gente está antenado em fazer diferente do que fizeram com a gente. O negócio é fazer diferente mesmo. Apaixonadamente diferente.

1. Nesta edição de 2019, quais as características e números do even- to? Está havendo um crescimento no que se refere aos estudantes?

Taísa: Esse ano os números foram muito próximos com o anterior, embora Curitiba tenha sido mais alto, porque provavelmente vieram os mesmos ou teve pouca varia- ção. Ano que vem, em Fortaleza, com certeza a gente vai ter mais estudantes do Nor- deste, mas a gente já sabe que o número de iniciação científica lá é menor. Como na IC, geralmente, são pessoas que estão quase se formando. Se é aquele que já está no último ano, agora ele já está no mercado de trabalho, às vezes ele veio para área acadêmica… então vai acontecendo um ciclo de renovação. Tem anos um pouco mais altos e anos um pouco mais baixos. O interessante é que nunca teve nenhuma baixa e isso é muito bom. A média vem se mantendo, um crescente. O “se manter” para gente é mais importante, porque você vai criando essa cultura. Às vezes você tem uns picos muito altos, depois abandonam, mas é a coisa do rodízio. O que tem nos deixado mais feliz é que ele tem crescido, e se mantido. Isso é importante. Acho que a gente está mesmo criando essa cultura.

Marcelo: Tem um crescimento, mas eu ainda acho que é muito difícil os alunos acom- panharem, porque é um evento itinerante. Em um ano está em São Paulo, outro ano está em Caixas, outro ano em João Pessoa… fica oneroso para o aluno acompanhar, então eu não me preocupo muito com números. Estamos em uma média boa. E atri- buo a não presença anual dos estudantes justamente pela questão financeira. Não por falta de vontade ou por falta de trabalho.

1. A gente falou do surgimento do Fórum das Escolas e da importân- cia dele. Já pensaram em criar um Fórum de Estudantes?

Taísa: Já pensamos. Temos pensado inclusive em fazer algo em paralelo, para ouvir mais os estudantes sobre o processo. Talvez, não sei, se dentro do próprio fórum. A gente começou a conversar sobre isso esse ano e estamos começando a voltar nossas conversas para esse viés. Porque acontece o fórum, mas o estudante acaba não indo, ele tem um foco em números e universidades, em perfil de egressos, que é muito denso. Mas estamos vendo que temos uma necessidade de ouvir o aluno.

Marcelo: Tanto que a gente vai montar uma mesa ano que vem especificamente para a IC, independentemente dos nossos trabalhos do GT. Para discutir com os alunos mesmo. Estamos pensando como vai ser, qual vai ser a proposta, mas isso já foi fala- do. Eu tenho uma ideia, mas ainda não deu tempo de conversar, a gente ainda vai se

sentar para falar sobre isso.

1. Para encerrar, quais são as expectativas para o CBICDEM frente ao cenário político atual e de que maneira podemos fortalecer a pesquisa científica nesse novo campo de incertezas?

Marcelo: O cenário é péssimo, a perspectiva é péssima. Não tenho a ideia de que ano que vem vai ser melhor. Tenho medo de tudo que está acontecendo. Acho que estamos em um período muito negativo, mas isso não impede de arregaçarmos as mangas e fazermos tudo como fazemos todos os anos. O cenário não é positivo: corte de bolsa, professor sendo mandado embora e sendo recontratado com salário menor, sobrecarga de trabalhos nas universidades federais. Estão jogando a socieda- de contra a gente, contra a categoria do professor. É coisa temerosa, apavorante. Não tem verba para ajudar na própria realização do colóquio, tem que se organizar interna- mente com as inscrições para dar conta. Eu acho que a nossa parte estamos fazendo: arregaçando as mangas, divulgando e trabalhando muito. Ontem alguém falou assim: “É tão rápido três ou quatro dias”. Sim, são três dias aqui, mas é um ano de trabalho.

Taísa: Para nós o colóquio começou sábado, a três dias atrás. É um ano de trabalho para estarmos aqui três dias. Desde sábado estamos trabalhando e fazendo reuniões para o colóquio do ano que vem, em Fortaleza.

Marcelo: Mas a gente tem uma superestrutura, sim, no ponto de vista de apoio, de incentivo... a própria ABEPEM. Fico muito feliz com essa revista que a gente orga- niza que também é fruto desse trabalho conjunto que fazemos no colóquio, além da Dobras. A nossa [publicação] particular, a coletânea dos alunos que apresentaram na iniciação científica, que a gente conseguiu lançar esse ano.

Taísa: Foi uma conquista. Foi um marco bastante grande a gente conseguir materia- lizar isso e a gente estava tentando fazer isso desde 2016. Antes a gente tinha par- cerias com outras revistas, mas tudo isso toma tempo e todas as pessoas fazem isso voluntariamente, não existe pagamento. O fato de a gente ainda conseguir pessoas que façam isso de forma voluntária já mostra um pouco desse caminho para a gente seguir. Não vai na mesma velocidade, às vezes volta um pouquinho, mas a gente con- segue. Vai depender muito da vontade, do engajamento e da persistência de cada um. Tempos difíceis em algum momento aparece, mas como a gente se posiciona perante eles faz a diferença. A gente tem sim que afirmar nossa posição, esbravejar e falar,

mas se a gente ficar só nisso é vazio. Não adianta ficar esperando que venha algo. Acho que a gente tem que fazer isso, mas a gente também tem que tomar nossas ações para fazer com que a coisa ande e é o que temos feito. Às vezes com passo de formiguinha, às vezes a gente consegue um passo de lebre, às vezes a gente volta e vira tartaruga.

Marcelo: E ontem, uma moça falou uma coisa que me tocou muito, pensando nesse cenário todo: “eu não tenho dinheiro para pagar o doutorado, mas eu vou continuar estudando, vou fazer curso de ouvinte, vou continuar lendo, pensar em escrever ar- tigo, vou participar de congresso, porque essa é minha forma de marcar resistência”. Isso é muito pessoal, mas se vê uma paixão por trás motivando, é muito forte essa imagem. A gente tenta de alguma maneira fazer nossa parte, mas as pessoas que participam também têm que fazer. É a nossa forma de resistência: fazer a coisa conti- nuar acontecendo e as pessoas continuarem vindo, dos pesquisadores mais renoma- dos à iniciação científica.

Conclusão

Entende-se, portanto, dessa conversa com os professores Marcelo e Taísa, que dar voz aos estudantes de moda atuantes na iniciação cientifica no Brasil por meio do Congresso Brasileiro de Iniciação Cientifica em Design e Moda é algo funda- mental para o crescimento da pesquisa nessa área que ainda é relativamente nova no país. Fica claro que a união desses dois mestres em prol do mesmo objetivo, foi algo crucial para gerar visibilidade, segurança e sobretudo paixão pela pesquisa cientifica nos estudantes, que é capaz leva-los para os mais diversos caminhos após a gradua- ção. Além disso, destaca-se o papel do orientador em meio a tudo isso, haja vista que é percebendo as particularidades dos estudantes e dedicando-se nesse sentido, que vai gerar interesse nessas pessoas.

Assim, pode-se afirmar que é por conta da vontade de transformação na ma- neira de encarar a pesquisa brasileira que o Congresso Brasileiro de Iniciação Cien- tifica em Design e Moda consolidou-se da forma que é hoje. Afinal, parafraseando o professor Marcelo Martins, a educação é capaz de salvar vidas.

Modelo de publicação sem fins lucrativos para preservar a natureza acadêmica e aberta da comunicação científica
HMTL gerado a partir de XML JATS4R