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A recontextualização pedagógica operada em uma prática de Modelagem Matemática nos Anos Iniciais

The pedagogical recontextualization operated in a practice of mathematical modeling in the Initial Years

La recontextualización pedagógica operó en una práctica de modelado matemático en los Primeros Años

Flavia Pollyany Teodoro
Universidade Estadual do Paraná , Brasil
Lilian Akemi Kato
Universidade Estadual de Maringá, Brasil

Revista de Ensino de Ciências e Matemática

Universidade Cruzeiro do Sul, Brasil

ISSN-e: 2179-426X

Periodicidade: Trimestral

vol. 12, núm. Esp.2, 2021

rencima@cruzeirodosul.edu.br

Recepção: 18 Novembro 2020

Aprovação: 03 Janeiro 2021

Publicado: 01 Março 2021



DOI: https://doi.org/10.26843/rencima.v12n2a03

Uma nova publicação de artigo publicado na REnCiMa, de iniciativa de seus autores ou de terceiros, fica sujeita à expressa menção da precedência de sua publicação neste periódico, citando-se o volume, o número e data dessa publicação.

Resumo: À luz dos pressupostos teóricos da Teoria dos Códigos de Basil Bernstein, esse estudo buscou responder: Que aspectos recontextualizadores emergem em uma prática de Modelagem nos anos iniciais com a vivência da professora em um espaço de formação continuada em Modelagem Matemática? Para tanto repousamos nossos olhares sobre a relação de comunicação da professora no desenvolvimento de uma atividade de Modelagem, em uma turma de 1º ano dos anos iniciais do ensino fundamental, bem como sobre as relações de comunicações impressas no âmbito do espaço formativo. Os dados oriundos desse estudo foram obtidos por meio de gravações em áudio e vídeo, e submetidos a transcrição dos mesmos. Das nossas análises, na perspectiva da linguagem de descrição, segundo a abordagem metodológica da teoria adotada, emergiram três aspectos recontextualizadores: i) Experiência com a formação em Modelagem; ii) Vivência da própria prática; iii) Especificidade dos anos iniciais, que se apresentaram imbricados na prática pedagógica, no contexto do ambiente instaurado, em meio a diferentes combinações.

Palavras-chave: Educação Matemática, Aspectos Recontextualizadores, Discurso Pedagógico.

Abstract: In light of the theoretical assumptions of Basil Bernstein's Theory of Codes, this study sought to answer: What recontextualizing aspects emerge in a Modeling practice in the early years with the teacher's experience in a space of continuing education in Mathematical Modeling? To do so, we rest our eyes on the communication relationship of the teacher in the development of a Modeling activity, in a class of 1st year of the initial years of elementary school, as well as on the relationships of printed communications within the scope of the formative space. The data from this study were obtained through audio and video recordings, and submitted to their transcription. From our analysis, from the perspective of the description language, according to the methodological approach of the adopted theory, three recontextualizing aspects emerged, i) Experience with training in Modeling; ii) Experience of the practice itself; iii) Specificity of the initial years, who presented themselves intertwined in pedagogical practice, in the context of the established environment, amid different combinations.

Keywords: Mathematics Education, Recontextualizer Aspects, Pedagogical Discourse.

Resumen: A la luz de los supuestos teóricos de la Teoría de los códigos de Basil Bernstein, este estudio buscó responder: Qué aspectos recontextualizadores emergen en una práctica de Modelado en los primeros años con la experiencia del docente en un espacio de formación continua en Modelado Matemático? Para ello, ponemos la mirada en la relación comunicativa del docente en el desarrollo de una actividad de Modelado, en una clase de 1er año de los años iniciales de primaria, así como en las relaciones de las comunicaciones impresas en el ámbito del espacio formativo. Los datos de este estudio se obtuvieron mediante grabaciones de audio y video y se sometieron a su transcripción. De nuestro análisis, desde la perspectiva del lenguaje descriptivo, de acuerdo con el enfoque metodológico de la teoría adoptada, surgieron tres aspectos recontextualizadores: i) Experiencia con la formación en Modelado; ii) Experiencia de la práctica en sí; iii) Especificidad de los años iniciales, quienes se presentaron entrelazados en la práctica pedagógica, en el contexto del entorno establecido, en medio de diferentes combinaciones.

Palabras clave: Educación Matemática, Aspectos Recontextualizadores, Pedagogico del Discurso.

Contextualizando o estudo

Ao considerarmos as potencialidades e possibilidades da prática de Modelagem Matemática[1] nos anos iniciais do ensino fundamental[2], faz-se necessário compreender os entrelaces que constituem o seu fazer em sala de aula. Para Tortola (2016, p. 268) esse fazer “[...] envolve um modo de agir característico, com ações e encaminhamentos específicos, que constituem seu procedimento”. Assim, o autor orienta que sejam consideradas para além da particularidade no uso da linguagem pelo aluno, a formação e a atuação específica dos professores deste nível de ensino.

Comumente licenciado em Pedagogia, os professores dos anos iniciais também são considerados polivalentes por transitarem pelas diversas disciplinas na prática de sala de aula, nem sempre se sentem aptos ou seguros para desenvolver o ensino da Matemática com a competência necessária. Ao considerarmos que práticas com Modelagem se orientam por uma abordagem interdisciplinar, que oferece maiores possibilidades para a integração das diferentes disciplinas (MALHEIROS, 2014;LUNA; SOUZA, 2014), é oportuno admitir que os anos iniciais sejam campo fértil para a prática de Modelagem, e que dar visibilidade a forma como é realizada neste nível de ensino, pode configurar-se como subsídios a estes professores no ensino da Matemática.

De acordo com Oliveira (2010, p. 170), “a relação dos professores com a modelagem pode ser vista em termos de como eles a recontextualizam [...]”, ou seja, na forma como eles levam para a sala de aula a Modelagem comumente experienciada em contextos formativos, como no espaço de formação que nos referimos a seguir. Essa ação de mover a Modelagem de um espaço de formação para a sala de aula é operado segundo Bernstein (2000) por uma recontextualização pedagógica, em que o texto pedagógico é deslocado de um contexto para outro. Neste processo de recontextualização, Oliveira (2010) destaca que o texto pedagógico operacionalizado por professores em sala de aula, não é o mesmo impresso nos espaços de formação. Existe um “princípio recontextualizador” que seleciona e modifica o discurso do professor na formação para a prática pedagógica.

Particularmente no que diz respeito à recontextualização da prática de Modelagem no âmbito dos anos iniciais do ensino fundamental, um mapeamento (TEODORO; KATO, 2017) evidenciou que, até aquele momento, apenas um trabalho abordou essa temática. Nesse trabalho, Luna (2012) ao buscar compreensões sobre a recontextualização da Modelagem em salas de aula de três professoras atuantes na Educação Básica, a partir de uma formação continuada sobre Modelagem, observou a forma como a Modelagem foi levada para a sala de aula de uma professora atuante nos anos iniciais, apontando a polivalência da professora como favorecedora da organização e flexibilização das disciplinas, conteúdos e sequenciamento da prática de Modelagem.

Embora a prática citada tenha repercutido em uma turma dos anos iniciais, a formação vivenciada pela professora não objetivou discussões e reflexões reservadas a prática de Modelagem nos primeiros anos de escolarização. Nesse sentido, investigar como a recontextualização ocorre a partir de uma formação continuada em Modelagem para professores que ensinam Matemática nos anos iniciais, apresentou-se como uma oportunidade para refinarmos nossos olhares para esse processo de adaptação na prática pedagógica, buscando oferecer subsídios para a formação em Modelagem desses professores.

Teodoro e Kato (2017), na busca pela compreensão desse processo recontextualizador em práticas de Modelagem expressas na literatura, observaram que a transformação e a adaptação da Modelagem em sala de aula, são controladas por princípios já operados na prática pedagógica. Nessa pesquisa as autoras constataram que os professores buscaram estratégias que possibilitassem adequar a Modelagem à prática, apontando os conteúdos para a resolução da atividade, estabelecendo relação com o conteúdo abordado em sala de aula, mudando a natureza investigativa da atividade, adaptando informações para a manutenção da problemática e, controlando o sequenciamento da tarefa, entre outras.

Nesta direção, ao considerarmos as possibilidades que o trabalho com Modelagem pode oferecer nesse nível de ensino, para a aprendizagem da Matemática (TORTOLA, 2012; TORTOLA, 2016; LUNA; SOUZA, 2014) admitindo pensá-la de modo crítico e reflexivo (LUNA; SOUZA; SANTIAGO, 2009), e assim, corroborando para a educação matemática das crianças, com vistas a alfabetização e o letramento matemático delas (SILVA; KLÜBER, 2014), faz-se importante analisar como práticas docentes têm sido desenvolvidas em sala de aula, visto que, a Modelagem nos anos iniciais requer ações particulares com práticas que exprimem e atendam às necessidades desse público infantil.

Assim, considerando o contexto apresentado, buscamos neste texto[3] responder ao seguinte questionamento: Que aspectos recontextualizadores emergem em uma prática de Modelagem nos anos iniciais com a vivência em um espaço de formação continuada em Modelagem Matemática? Para tanto, repousaremos nossos olhares sobre o desenvolvimento de uma atividade de Modelagem por uma professora dos anos iniciais, revestindo-nos dos preceitos teóricos de Bernstein (1996; 1998; 2000), referencial este que trataremos a seguir.

A prática de Modelagem Matemática: um olhar à luz dos pressupostos de Bernstein

Ao analisar e sistematizar a estrutura do discurso pedagógico, Bernstein (1996) orientou-se pela compreensão da prática pedagógica como as relações sociais que advém de um determinado contexto, em que ocorre a produção e reprodução cultural. E conferindo a especificidade dos discursos escolares, reconheceu-os como discursos pedagógicos, aqueles que se apropriam de variados discursos, os quais “[...] são produzidos, reproduzidos, trocados, distinguidos e apropriados” ao contexto pedagógico (BERNSTEIN, 1996, p. 39).

Tal produção e reprodução perpassam por três campos distintos, a saber: campo de produção, que se refere a construção de um novo conhecimento, campo de recontextualização, que se incumbe do texto produzido no campo da produção, transformando no discurso pedagógico, e o campo de reprodução, inerente a prática exercida em sala de aula, em meio as diferentes relações de comunicação. Em nosso estudo, o processo recontextualizador decorreu do espaço de formação (campo de produção) para a sala de aula (campo de reprodução).

Nesse processo de recontextualização, as relações sociais refletem uma hierarquia entre agentes transmissores e adquirentes, dirigidas por uma regulação de poder e controle no processo de comunicação, assumidos como princípios. Esses princípios de poder e controle, inerentes à prática pedagógica, se refere para Bernstein (1998) aos conceitos de classificação e enquadramento, respectivamente. A classificação se refere ao conteúdo da comunicação, por isso reflete o que pode ser dito entre os agentes envolvidos na comunicação. O enquadramento por sua vez, diz respeito à forma de comunicação, ou seja, como pode ser dito o texto legítimo da comunicação.

Para Bernstein (1996, p. 32), um texto em termos de comunicação, pode ser expresso na “forma da relação social feita visível, palpável, material”. Em nosso estudo, assumimos como texto, os discursos expressos na forma verbal, escrita e gestual dos professores e formadores no espaço de formação, e professora e alunos no âmbito da sala de aula. Um texto é considerado legítimo, quando esse se adapta ao seu contexto de produção. Assim, de acordo com Luna (2012), o texto legitimado em um ambiente de Modelagem difere daquele produzido em cursinhos pré-vestibulares, em que normalmente reconhece a legitimidade em conteúdos matemáticos pré-estabelecidos em seu planejamento. Contrariamente, a autora esclarece que na prática de Modelagem, a legitimidade do texto encontra-se na problemática levantada que norteia o texto da comunicação, sem a determinação de conteúdos a priori, ou seja, a situação problema, a investigação e o estudo é que guiará a determinação do conteúdo.

De acordo com Bernstein (1998) o princípio de classificação no processo de comunicação, cria regras de reconhecimento que permitem reconhecer a produção textual legítima para um determinado contexto. De outro modo, o princípio de enquadramento, na produção do discurso, cria as regras de realização, que controlam a seleção, sequenciamento e ritmo da comunicação (BERNSTEIN, 1996). Segundo Oliveira (2010) em um ambiente de aprendizagem construído por meio de prática de Modelagem, em que a imprevisibilidade permeia a prática pedagógica, o professor muitas vezes não possui controle sobre a seleção, sequência e ritmo no conteúdo da comunicação, gerando frequentemente situações de tensões[4] no trabalho com a Modelagem.

Nesse sentido, em razão da imprevisibilidade que permeia práticas de Modelagem, os princípios de classificação e enquadramento, segundo Bernstein (1996) apresentam variações fortes e fracas na relação de comunicação. A classificação é dita forte, quando os agentes envolvidos, aluno e professor, possuem clareza ao que pode ser dito, tornando legítimo e comum o texto da comunicação. Contudo, se o aluno desconhece o que pode ser dito, produzindo textos diferentes do esperado pelo professor, temos uma classificação fraca. De modo análogo, dizemos que o enquadramento é forte, quando o aluno compreende como pode ser dito, e assim, o realiza. Ao contrário, o desconhecer sobre a forma de comunicação, ou seja, o modo como pode ser dito, imprime um enquadramento fraco.

Uma situação que exemplifica o fortalecimento dos princípios de classificação e enquadramento pode ser identificada no estudo de Tortola e Almeida (2014) realizado com alunos dos anos iniciais, ainda que não fosse objetivo dessa investigação analisar a relação de comunicação. No desenvolvimento de uma atividade de Modelagem Matemática, durante a problematização do tema água, escolhido pelos alunos, o professor destacou a abrangência do tema, e orientou que buscassem por uma situação-problema para pesquisar: “Prof: Vocês estão vendo que água é um tema muito amplo, não é? Tem muitas coisas, não é mesmo? Então a gente precisa pesquisar alguma coisa mais específica. [...]”. Nessa abordagem, a legitimidade do texto foi reconhecida pelos alunos, que compreenderam a proposta e passaram pesquisar sobre a quantidade comportada por uma caixa de água, reportando a problemática: Quantos litros de água precisa ter na caixa de água da minha casa?

Sobre a ação dos alunos, Bernstein (2000) elucida que a classificação e o enquadramento, são construtos imbricados, haja vista que, ao mesmo tempo em que se reconhece o texto legítimo ao contexto, ele se realiza na relação de poder (classificação) e controle (enquadramento), conforme procederam os alunos.

Outra situação em Santana (2011) imprime a variação nos princípios de classificação enquadramento, quando na situação proposta em sala de aula, ele enfraqueceu esses princípios ao dar voz a aluna que, diferente do esperado pelo professor, buscou discutir aspectos que não haviam sido discutidos pelos demais alunos, sugerindo uma nova configuração no desenvolvimento da atividade. Como efeito, o professor realizou o fortalecimento, indicando os aspectos a serem discutidos e a forma de realização da atividade.

A seguir, apresentaremos o caminho trilhado em nosso estudo, elucidando os entrelaces metodológicos que configuraram o processo de recontextualização impresso pela professora em sala de aula.

Os procedimentos metodológicos da pesquisa

Considerando nosso objetivo de investigar os aspectos recontextualizadores que emergem em uma prática de Modelagem nos anos iniciais, durante a vivência de um espaço de formação continuada em Modelagem, nos pautamos de uma abordagem qualitativa de pesquisa, de cunho descritivo e interpretativo (BOGDAN; BIKLEN, 1994). Nessa perspectiva metodológica, é fundamental entender e interpretar os dados, em que o pesquisador “lida e dá atenção às pessoas e às suas ideias, procura fazer sentido de discursos e narrativas que estariam silenciadas” (D’AMBROSIO, 2004, p. 19), considerando a natureza do discurso de acordo com suas condições de produção.

Assim, buscamos compreensões sobre a recontextualização impressa pela professora, aqui identificada por Laura, a partir de uma formação continuada em Modelagem nos anos iniciais, considerando os discursos impressos por ela no desenvolvimento de uma atividade de Modelagem em sua sala de aula, bem como, os discursos recorrentes dos professores e formadores, no contexto de formação. Além da entrevista realizada com Laura, ao término da atividade desenvolvida.

O desenvolvimento de uma atividade de Modelagem em sala de aula foi apresentado aos professores em formação como um convite aos que desejassem. Quatro professores aceitaram prontamente o convite, mas considerando a restrição de espaço deste texto, optamos por discutir apenas a prática de Laura, em razão de a atividade desenvolvida decorrer uma temática escolhida pelos seus alunos.

O momento formativo desenvolvido com configurações de um curso de extensão, contou com a participação de quatorze professores de uma rede municipal do estado do Paraná[5], ministrado pela primeira autora deste trabalho, em parceria com outro um professor, onde atuaram como formadores. Contemplado em oito encontros semanais, esse momento formativo, tinha por objetivo promover discussões e reflexões teóricas, práticas e metodológicas sobre o trabalho com a Modelagem no ensino de Matemática nos anos iniciais. Oportunizando a elas, a experiência com a Modelagem no papel de aluno e de professor (BARBOSA, 2004), no desenvolvimento de atividades, análise de experiências com Modelagem nos anos iniciais, e ainda, elaboração e desenvolvimento de atividades pelos professores no próprio ambiente de formação. Além do desenvolvimento de uma atividade de Modelagem em suas salas de aulas, àqueles que desejassem. O quadro 1 a seguir apresenta o conteúdo trabalhado nos encontros de formação. (Error 1: La referencia debe estar ligada) (Error 2: El tipo de referencia es un elemento obligatorio) (Error 3: No existe una URL relacionada)

Quadro 1
Conteúdo dos Encontros de Formação
Os Encontros
1º Encontro: - Apresentação da proposta de formação. - Desenvolvimento da atividade “O Pé Grande” (ZANELLA, 2016). 2º Encontro: - Socialização da atividade “O Pé Grande” (ZANELLA, 2016). - Desenvolvimento da atividade “Espaço dos estudantes na sala de aula” (TORTOLA, 2012).
3º Encontro: - Socialização da atividade “Espaço dos estudantes na sala de aula” (TORTOLA, 2012). - Desenvolvimento da atividade “Tigres” (TORTOLA, 2016). 4º Encontro: - Socialização da atividade “Tigres” (TORTOLA, 2016). - Exploração do Material Dourado em práticas de Modelagem.
5º Encontro: - Conjectura das etapas da atividade de Modelagem. - Análise: configuração/características da atividade “Crescimento das unhas” (TORTOLA, 2016). - Pesquisa sobre a temática proposta: “Trem”. 6º Encontro: - Elaboração da atividade “Trem”. - Socialização da atividade elaborada. - Pesquisar uma temática de interesse comum do grupo.
7º Encontro: - Elaboração da atividade com base nas temáticas levantadas pelos grupos. - Orientações para o desenvolvimento da atividade no próximo encontro. 8º Encontro: - Desenvolvimento de atividades pelos professores no âmbito do espaço de formação.
Elaboração das Autoras

Cabe ressaltarmos que não tínhamos como objetivo trabalhar a Modelagem Matemática no espaço de formação à luz de uma única concepção. No entanto, compreendemos que os encaminhamentos e orientações que respaldaram o trabalho com a Modelagem Matemática no âmbito formativo, ainda que não tenha sido explicitada aos professores, elucida a Modelagem como um ambiente de aprendizagem, em que “os alunos são convidados a indagar e/ou investigar, por meio da matemática, situações oriundas de outras áreas da realidade”, (BARBOSA, 2001, p. 6). Em consonância, a prática da professora Laura, aqui relatada, converge aos preceitos segundo a concepção de Barbosa (2001), uma vez que, suas experiências com o espaço de formação, despertou nela, o cuidado com a construção desse ambiente de aprendizagem.

Para a coleta dos dados, utilizamos de gravadores, filmadora e diário de campo. Os textos registrados em áudio e vídeo foram transcritos de acordo com os padrões de concordância em variedades brasileiras, europeias e africanas[6]. Dessa forma, os seguintes sinais foram utilizados: (( )) para indicar comentários dos pesquisadores, e [_] para indicar falas simultâneas dos alunos.

Para a identificação dos discursos oriundos da nossa observação, nominamos com a letra O, e para a entrevista realizada com a professora Laura, após a prática em sala de aula, utilizamos a letra E. Aos formadores indicamos como formador 1 e formador 2, e aos professores participantes do espaço de formação, atribuímos a identificação de professor 1, professor 2, ..., professor n. Aos alunos atribuímos siglas do tipo A1G1 (aluno 1 e grupo1). E quando nos referimos aos alunos do grupo, indicamos por AsG1 (alunos do grupo 1), e As, a turma toda.

Para o processo de descrição e interpretação do processo de recontextualização, assumimos a perspectiva metodológica da linguagem de descrição, (BERNSTEIN, 2000) que prevê a relação dialética entre a linguagem interna, constituída pelo aporte teórico (recontextualização pedagógica) e a linguagem externa, inerente aos dados empíricos da pesquisa (ações e reflexões do processo formativo e conduta da professora). Nesta relação, a linguagem de descrição externa ativa a linguagem de descrição interna, operando como um dispositivo de leitura, que transcende seus próprios construtos, ou seja, profere algo a mais que ela própria possa dizer.

A seguir, apresentamos a recontextualização operada por Laura em sala de aula no desenvolvimento da atividade denominada Celular, com alunos do 1º ano, elucidando nossas interpretações sobre suas ações e reflexões no trabalho com Modelagem em sala de aula.

Lançando lentes sobre o processo recontextualizador

Nesta seção apresentaremos uma descrição e interpretação para a recontextualização operada pela professora Laura, a luz dos pressupostos teóricos de Bernstein (1996, 1998, 2000). Para tanto, nos reportamos a alguns aspectos descritivos do espaço de formação vivenciados pela professora Laura, que nos auxiliaram na compreensão do processo recontextualizador.

Afinal, de quem é a escolha do tema? Na literatura em que tivemos acesso, a escolha do tema pode ser feita pelo professor, pelos estudantes, ou por ambos. Não existe na literatura um assentimento a quem deve ser incumbida a escolha do tema em uma atividade de Modelagem. Para Burak (2004, p. 5) a Modelagem deve proceder do interesse do aluno e/ou grupo, visto que, “não se pode intervir, de forma adequada, numa realidade que não se conhece”. Porém, Almeida, Silva e Vertuan (2012, p. 25) advertem que “[...] a escolha do aluno está longe de ser condição necessária para o sucesso de uma atividade e, também, não se pode ter a expectativa de que seja condição suficiente para tal”, uma vez que, diversos relatos de atividades com temáticas propostas pelo professor indicaram aceitação e êxito em seu desenvolvimento.

Nesta direção, Silva e Oliveira (2015) apresentam possibilidades em que a escolha do tema possa partir do professor, levando em consideração a realidade, a realidade dos estudantes ou o interesse dos estudantes. Com a intencionalidade de que os professores no espaço de formação vivenciassem e refletissem a relevância dessa prática no ensino de Matemática é que propusemos a eles à elaboração e desenvolvimento de atividades oriundas de temas de interesse deles, discorridas a seguir.

No sexto encontro do espaço formativo, nós formadores solicitamos aos professores que pesquisassem sobre o tema “trem”, para o desenvolvimento de uma atividade de Modelagem. Este tema foi proposto aos professores por representar um assunto que despertava sua curiosidade, pois sempre no período dos encontros, transitava um trem próximo ao local do espaço de formação, levantando sempre discussões sobre ele, e revelando ser um assunto de interesse comum entre os participantes.

Em consonância, no sétimo encontro, os professores foram convidados a escolher uma temática do interesse deles, para desenvolverem outra atividade de Modelagem. Tais solicitações surgiram como atividades formativas com o objetivo de discutir entre outros aspectos da Modelagem, o processo de escolha do tema como motivação para as crianças no desenvolvimento de atividades de Modelagem, conforme o trecho a seguir.

(O1) Professor 1: eu acho que faz mais sentido pra criança [...], porque igual àquela vez que a gente estava debatendo aquele assunto do trem lá, [...]

(O2) Laura: se a gente partir de um tema que a criança gosta, ela vai se envolver mais. Porque tem sentido pra ela.

(O3) Formador 2: [...] essa questão da temática é essencial numa atividade de Modelagem, é exatamente um convite, se os alunos se sentirem motivados, todas as etapas eles vão se engajar.

Laura, ao pensar no planejamento da atividade de Modelagem para desenvolvimento em sua sala de aula, consentiu a escolha do tema Celular advinda de seus alunos, revelando similaridade ao texto da Modelagem, e imprimindo o aspecto recontextualizador experiência com a formação em Modelagem, conforme relatado por ela, no espaço de formação.

(O4) Laura: [...] eu falei pessoal, a professora queria convidar vocês, saber o que vocês querem estudar aqui na escola? Ou de pesquisar alguma coisa, aí eles começaram a falar. [...] A metade da sala falou celular. Aí outro falou assim, mas eu queria do dinossauro. Aí eu falei assim, a gente pode fazer do celular, e depois a gente pode fazer do dinossauro. [...]. E foi muito legal porque eu nunca pedi um tema.

Nessa direção, para a escolha do tema, observamos na relação de comunicação instaurada por Laura, uma classificação enfraquecida por ela ao possibilitar diferentes textos expressos na variedade de temas sugeridos pelos alunos. E que, diante dessa variedade, ela sugeriu aos alunos que estudassem o tema mais votado, revelando novamente o aspecto recontextualizador experiência com a formação em Modelagem, conforme o excerto a seguir.

(O5) Laura: Aí eu fiquei pensando, nossa, mas agora vou ter que fazer uma votação igual a gente falou aqui no curso.

Laura, em seus dizeres, fez referência ao espaço de formação, quando discutido sobre a importância de considerar o apreço da criança na escolha do tema, uma professora alertou sobre a provável abrangência de temáticas, sugerindo que fossem postos em votação os temas sugeridos.

(O6) Professor 1: aí você seleciona. Você vota. Vamos supor que sai mais bola, vídeo game. Aí você discute lá com eles, pra entrar num consenso um tema que vai abranger meninos e meninas.

De acordo com Silva (2013a, p. 76), quando o tema da atividade de Modelagem é uma escolha do aluno ou mesmo da turma, o reconhecimento e realização na legitimidade do texto apresentam-se favorável ao trabalho com Modelagem, ao permitir “[...] que os estudantes reconheçam o texto que é legítimo aquele contexto comunicativo”. Essa legitimidade advinda de situações familiares aos alunos e que leva a investigação por meio da Matemática, caracteriza a prática com Modelagem (VERTUAN; SILVA, 2018).

Realizada a escolha do tema celular, em outra aula, Laura convidou-os novamente para um bate papo sobre o assunto, na intenção de solicitar a eles uma pesquisa. Sentados no chão da sala de aula, em roda de conversa o que, segundo Luna e Souza (2014) é uma ação característica dos anos iniciais e comum nas aulas de Laura, em momentos que configuram o “contar histórias”, a professora retomou a conversa já iniciada na aula anterior, com questionamentos sobre o que do celular eles gostariam de pesquisar, conforme observado nos trechos a seguir.

(O7) Laura: o que vocês queriam saber do celular?

(O8) As: vídeos, joguinhos, WhatsApp [ _ ].

(O9) Laura: o que mais? Se a gente fosse fazer uma pesquisa, [...] o que a gente pesquisaria sobre o celular? Quem será que inventou o celular?

(O10) A1G5: meu pai

(O11) Laura: seu pai inventou o celular, mas como que ele criou o celular? [...]

(O12) A1G5: ele foi juntando ferramentas.

(O13) Laura: o que será que precisa pra fazer o celular?

(O14) As: pilha, película, capinha, chip, carregador, vidro [ __ ].

(O15) Laura: e quando vocês vão ligar pra alguém o que vocês veem no celular?

(O16) As: números [ __ ].

(O17) Laura: e quais números que a gente vê no celular?

(O18) As: 1,2,3,4,5,6,7,8,9,10 [__ ].

(O19) Laura: e existem muitos modelos de celular?

O diálogo promovido pela professora Laura revelou um enfraquecimento no enquadramento, em que ela buscou por intermédio de questionamentos, inteirar-se sobre o desejo dos alunos em pesquisar sobre o celular, oportunizando a participação de todos eles. Entretanto, percebe-se um direcionamento da professora na discussão, no sentido da escolha da construção de um celular, quando ela questionou os alunos sobre quem teria sido o inventor do celular e, ainda, quando ela se valeu da resposta do aluno A1G5 no excerto (O10) de que teria sido seu pai o inventor do celular, para explorar sobre os elementos que compõem um celular.

À luz da teoria de Bernstein (1996), nesta passagem Laura agiu controlando a relação de comunicação sobre a temática escolhida pelos alunos, a fim de estabelecer a comunicação legítima ao contexto da Modelagem, que para ela remetia à construção do celular. Além disso, observa-se que a escolha de Laura pela configuração da sala: sentados em roda de conversa, revelou a combinação dos aspectos vivência da própria prática e especificidade dos anos iniciais.

Após a discussão com os alunos, a professora Laura solicitou que os alunos realizassem uma pesquisa sobre o celular, indicando a eles que pesquisassem uma curiosidade sobre o tema, mostrando que, mesmo discutindo a temática celular com eles, ela considerou importante que eles realizassem uma pesquisa. Sua ação apontou semelhança à ação de nós formadores no espaço de formação, quando solicitamos aos professores que buscassem por informações sobre o trem para desenvolver a atividade, mesmo já promovida a discussão em diversos momentos sobre a temática.

Sob uma ótica bernsteniana, Laura empreendeu na prática, um texto especializado da Modelagem, vivenciado no processo formativo, e que revelou o aspecto experiência com a formação em Modelagem. Além disso, conforme atestam Burak e Klüber (2011) sobre a pesquisa exploratória do tema em Modelagem, as crianças quando tornadas pesquisadores em suas investigações, assumem uma postura mais autônoma e crítica sobre o tema de estudo.

Em meio às pesquisas realizadas pelos professores sobre o tema trem no espaço de formação, nós formadores sugerimos que planejassem uma atividade de Modelagem a partir das informações coletadas por eles. Na ocasião, possibilidades de ampliar a busca por informações sobre o tema trem foram utilizadas pelos professores. Como no grupo de Laura, que na ausência de informações específicas sobre o trem que passava na cidade, agregou-se informação sobre outro trem, que havia pesquisado para problematizar a temática.

(O20) Laura: A gente pesquisou quanto tempo que levaria para retirar os vagões de um outro acontecimento, porque a gente não sabia que tempo que levava [...]

(O21) Formador 2: então, vejam que elas agregaram outras informações. Isso também é possível, o que elas fizeram.

[...]

(O22) Formador 1: então quando vocês pedirem para os alunos escolherem o tema, você terá que ter esse jogo de cintura, porque talvez as informações trazidas ali, não são suficientes ou não leva a uma problemática de interesse deles. Aí você tem que ter esse jogo de cintura para poder encaminhar para uma outra problemática.

Em sala de aula, de modo semelhante, a professora Laura, revelou similaridade ao texto do espaço de formação, empreendendo o aspecto recontextualizador experiência com a formação em Modelagem, ao agregar às informações trazidas pelos alunos, outras pesquisadas por ela, visando problematizar a construção de um celular para o trabalho dos conteúdos de forma geométrica e sequência numérica.

(E23) Laura: o meu maior objetivo era saber mesmo se eles conseguiam entender as formas, [...] e o objetivo também era os números, [...] com a construção eles conseguiram fazer melhor já.

A ação de Laura nos mostrou que a professora, como agente do discurso pedagógico, agiu selecionando informações de acordo com seus propósitos didáticos de trabalhar conteúdos curriculares. Assim, pôde-se observar que as ações de Laura foram orientadas pela experiência com a formação em Modelagem, ao agregar informações às trazidas pelos alunos, mas, regidas por questões curriculares emergentes da vivência da própria prática, ao guiar-se pelo conteúdo do programa curricular. O que consideramos apropriado e oportuno para o alcance e reconhecimento da Modelagem Matemática em sala de aula, neste nível de ensino, em que a alfabetização matemática se revela imprescindível.

Sobre guiar-se pelos conteúdos curriculares, Silva (2013a) em conformidade, ao observar a recontextualização, verificou que o planejamento de Modelagem do professor, esteve condicionado ao trabalho de conteúdos pré-estabelecidos por ele, ao indicar na resolução da atividade modelos gráficos e tabulares contidos em seu planejamento.

De todo modo, Tortola (2016), em pesquisas com alunos dos anos iniciais, tem orientado a inserção de informações pelo professor àquelas trazidas pelos alunos, para a “complementação” e elaboração da situação problema, como característico ao trabalho com Modelagem neste nível de ensino.

Com entendimentos da importância em se considerar as especificidades deste nível de ensino, a professora Laura ao refletir sobre as formas de envolver os alunos na discussão da atividade em sala de aula, elaborou dois cartazes trazendo informações sobre a temática da atividade para serem discutidas com os alunos. Segundo ela, a visualização configura uma peculiaridade dos anos iniciais. Além disso, a prática de confeccionar cartazes em suas aulas é frequente, conforme relatado na entrevista após o desenvolvimento da atividade.

(E24) Laura: [...] a visualização tanto das palavras e ilustrações atraem a atenção deles. É uma forma de chamar a atenção para desenvolver conteúdos [...]. Sempre uso para iniciar um conteúdo novo, para uma problematização.

De acordo com Bernstein (1996, 2000), quando o professor transforma o discurso do campo da produção levando-o para o campo da reprodução, ele age regulando-o de acordo com o contexto, ou seja, com discursos ou práticas já consolidadas. Como os cartazes planejados por Laura, que eram comuns em sala de aula e imprimiam o apreço dos alunos. Estudos como de Aguiar (2014), Oliveira (2010) e Silva (2013a), já demonstravam que a recontextualização da Modelagem na prática pedagógica, manifestava discursos e ações de uma prática já consolidada na sala de aula.

Sobre a escolha de Laura pelos cartazes, conjecturamos ainda, revelar compreensões sobre o vivido no espaço de formação, em fazer desse momento um convite a Modelagem. Para ela, o uso estratégico de cartazes sugeriu a aceitação do seu convite para discutir a temática. Desse modo, sua escolha, imprimiu a combinação de três aspectos recontextualizadores, a saber: experiência com a formação em Modelagem, quando ela compreendeu fazer desse momento um convite, vivência da própria prática, com o emprego de um material (cartaz) já utilizado em sala de aula, e especificidade dos anos iniciais, prezando pela visualização, considerada por ela, importante e peculiar neste nível de ensino.

Após a apresentação dos cartazes, a professora Laura empreendeu uma discussão com os alunos de modo interativo, demonstrando enfraquecer o enquadramento, ao permitir questionamentos que instigassem os alunos a pensarem e a compreenderem a evolução dos modelos de telefones, na linha do tempo elaborada por ela nos cartazes,

(O25) Laura: [...] esse cartaz, ele traz pra gente a linha do tempo dos telefones, antes do celular, o que tinha antes do celular?

(O26) As: telefone [__ ].

(O27) Laura: aí depois eles começaram a ter mais telefones modernos. Esse daqui [...], ligava na tomada e aí você pegava o telefone e sai conversando com as pessoas sem fio.

(O28) A1G4: igual um celular.

Por outro lado, ao conferir a legitimidade de seu texto no excerto anterior (O27), pelo aluno A1G4 no excerto (O28), ela fortalece o enquadramento, direcionando a discussão para a temática celular.

(O29) Laura: exatamente! Aí, [...] o Martim, esse homem aqui ((mostra o cartaz)), [...] ele criou esse modelo aqui de celular. Olha como era o primeiro celular.

(O30) A1G1: esse é grande hem.

(O31) Laura: nossa é enorme, [...] mas só que aí [...] começou a diminuir olha, grandão, foi diminuindo, diminuindo, aí foram criando alguns modelos, olha. [...]

A discussão promovida sobre celulares pela professora se estendeu, e foi conduzida ao debate sobre informações dos celulares atuais, tema de estudo da atividade. A dinâmica adotada por Laura foi realizar a leitura das informações constadas nos cartazes, e os alunos irem reconhecendo-as como fruto de suas pesquisas. Essa dinâmica levou a professora Laura a problematizar a temática celular com o questionamento: [...] vamos construir um celular?, tecendo questionamentos que suscitassem reflexões sobre as funções e elementos de um celular.

(O32) Laura: muito bem a A1G2 pesquisou sobre o GPS, porque tem tanta coisa dentro do celular hoje, existem fotos, filmagens. [...] Porque o celular virou moda?

(O33) A2G4: porque ele é bonito,

(O34) Laura: ele é bonito, que mais?

(O35) A3G1: porque tem tecnologia,

(O36) Laura: porque tem tecnologia, que mais?

(O37) Laura: [...] E esses modelos mais atuais não aparecem os números na tela não é, como que faz pra aparecer os números?

(O38) A2G4: na tela.

(O39) Laura: hum, legal então vamos construir um celular?

Sob um olhar bernsteniano, Laura apreendeu o controle sobre a comunicação, objetivando problematizar a temática celular, isto é, buscando imprimir nos alunos, discursos especializados sobre os modelos atuais de celulares. Além disso, sua conduta na problematização do tema revelou a legitimidade do texto ao contexto de Modelagem, imprimindo o aspecto experiência com a formação em Modelagem, em que os alunos reconheceram o que poderia ser dito (sobre celular), quando a professora exclamou “exatamente” em resposta ao aluno A1G4, que relacionou o modelo de telefone indicado no cartaz, com um celular. E assim, realizaram como poderia ser dito (sobre construção do celular), quando Laura incitou em meio as informações trazidas pelos alunos, que apontassem os elementos de um celular.

Sobre o encaminhamento dado a problematização do tema, impresso por meio de questionamentos e discussões sobre a temática, Laura inferiu na entrevista que já realiza em suas aulas, porém de forma diretiva, com perguntas prontas. Contudo, na prática de Modelagem, conforme orientado no espaço de formação, ela vislumbrou que o momento da problematização poderia realizar-se de forma interativa, com perguntas elaboradas no contexto da discussão. Sant’Ana, Sant’Ana e Serpa (2020) reconhecem na postura questionadora do professor contribuições para a autonomia do aluno.

Ainda que, não vivenciada essa problematização direcionada no espaço de formação, em que algumas problemáticas já foram apresentadas por nós formadores de forma direta no desenvolvimento das atividades: Tigres, O pé Grande e Espaço dos estudantes na sala de aula, conforme consta no quadro 01 (Conteúdo dos Encontros de Formação) e outras elaboradas pelos próprios professores a partir de suas temáticas, sem a influência de nós formadores, Laura na prática empreendeu uma ação própria, a qual ela considerou acordada com seu objetivo didático, revelando o aspecto recontextualizador vivência da própria prática.

Ao pensar essa ação docente revestida de uma intencionalidade, e ao mesmo tempo de uma orientação e mediação necessária ao trabalho com Modelagem, considerando sua natureza investigativa, é acordada na literatura a necessidade de intervenções docentes questionadoras que oriente, levando o aluno a investigar, refletir e conjecturar a situação proposta (ALMEIDA; SILVA; VERTUAN, 2012; TORTOLA, 2016). Em consonância a esses entendimentos, durante o espaço de formação se discutiu sobre o papel do professor em uma atividade de Modelagem.

(O40) Formador 1: gente o papel do professor é extremamente importante. Saber mediar, chegar nos grupos, compreender como os alunos estão fazendo, e orientar não é uma tarefa fácil não, [...] ás vezes você chega num grupo e não está saindo nada, [...] aí você começa a fazer essas perguntas instigadoras e vai surgindo, [...]

(O41) Formador 2: vocês têm que tentar implementar a pedagogia da pergunta.

Nesse sentido, os encaminhamentos e discussões com os professores no espaço formativo, foram orientados para que eles buscassem sempre realizar questionamentos que instigassem o aluno a pensar sobre a problemática, instaurando a “pedagogia da pergunta”, que afetuosamente foi apelidada por eles de “provocações” a serem realizadas com os alunos. Em vista disso, e orientada pelo aspecto recontextualizador experiência com a formação em Modelagem, Laura em entrevista manifestou preocupação, anunciada como tensões[7] por Oliveira (2010), sobre ter orientado corretamente os grupos, com discursos questionadores, sem direcionamentos, como requer o trabalho com a Modelagem.

(E42) Laura: às vezes eu sentia assim, [...] eu precisava perguntar mais para eles, pra deixar eles assim mais pensativos. Por que precisava né? [...] eu não conseguia fazer muitas perguntas, talvez pela limitação deles. Deles falarem, eu quis por esses números, [...] aí eu fiquei pensando, se eles quiseram porque vou falar pra não por, [...] Nossa você colocou até quatorze. Mas por quê? Porque o meu vai até quatorze. Então eu não podia interferir na produção dele. Então eu me senti, meio assim, porque eu não sabia se eu poderia, [...]

A insegurança relatada por Laura referiu-se à sua observação nas construções de celulares de alguns alunos, que para ela destoava de um modelo real de celular. Como o aluno A4G4 que construiu o teclado do celular com números de 1 a 14. E o aluno A2G4 que apresentou um teclado com números de 1 a 10. Para ambas as situações, Laura buscou intervir com questionamentos que instigasse o aluno a pensar sobre a construção de um celular mais próximo do real. Porém, ela imprimiu ações distintas com os alunos. Ela preferiu consentir a construção do aluno A4G4, mediante a insistência dele, agendando retomar a discussão no momento da socialização da atividade. Diferentemente do aluno A2G4, que quando questionado, ainda no momento da construção, realizou mudanças em seu celular, conforme mostra o diálogo a seguir.

(O43) Laura: mas o celular tem o número 10?

(O44) A2G4: o meu tem.

(O45) Laura: o seu tem, mas o de verdade?

(O46) A2G4: ((fica olhando para o celular))

(O47) Laura: o celular de verdade tem o número 10?

(O48) A2G4: não.

(O49) Laura: ah, então vê como que você vai colocar.

(O50) A2G4: me empresta a borracha um pouco Prô.

O discurso de Laura no excerto (O45) mostra que ela, ao questionar “mas o de verdade?” conduziu ao aluno a construção mais próxima do que ela compreendia como um celular, e que, nesse caso, o número dez não deveria fazer parte da sua construção. Desse modo, percebe-se que a comunicação foi regulada pela professora por um enquadramento forte, e que apesar de demonstrar resistência, o aluno reconheceu a legitimidade do texto da professora, descartando o número dez de seu celular. Esta passagem nos mostra que Laura exerceu um controle sobre a comunicação, provocando mudanças na construção que o aluno desenvolvia.

Esse mesmo aluno (A2G4) ainda inferiu não existir o número zero no teclado do seu celular. A estratégia utilizada pela professora para mostrar o equívoco do aluno em relação à existência do número zero, foi questioná-lo sobre a presença do zero nos modelos de celulares apresentados no cartaz, que apesar de observar os cartazes expostos no quadro, o aluno garantiu não existir o número zero nos modelos de celulares.

(O51) A2G4: eu não vi nenhum zero no começo de lá.

(O52) Laura: mas onde ficou o zero, se no começo não tem o zero?

(O53) A1G4: mas não é no começo, é no final.

(O54) A2G4: mas eu vou fazer no começo.

(O55) Laura: hum.

Na tentativa de instigar o aluno a pensar sobre o discutido, Laura questionou-o sobre qual seria a posição do número zero, se não no final. Mesmo com a resposta do colega (A1G4) que afirmou que o número zero estaria no final, o aluno A2G4 manteve seu entendimento sobre a posição do número zero, revelando resistência à legitimidade do texto da professora e do colega. Na ocasião, Laura preferiu manter o entendimento do aluno, justificando sua escolha.

(E56) Laura: por trabalharmos a sequência numérica desde o zero até o nove. Acho que pelo entendimento deles não seria necessário nesse momento.

A ação de Laura revelou que, mesmo com a intencionalidade de propor a construção de um “celular de verdade”, ela optou por manter o discurso da prática vigente em sala de aula, no trabalho com a sequência numérica, para não confundir o aluno A2G4. De acordo com Bernstein (1996), o discurso pedagógico se apropria de outros discursos recolocando de acordo com as regras daquele contexto, como Laura procedeu, ao optar por manter o discurso antes impresso na sala de aula sobre a sequência numérica, para não confundir o aluno. Contudo, ela ansiou por uma discussão coerente sobre a sequência numérica, agendando para o momento da socialização, a fim de promover compreensões sobre a composição dos números. Conforme o trecho a seguir:

(O57) Laura: se eu quisesse digitar no meu celular o número 10, como que eu faria?

(O58) A1G4: o 1 e o 0.

(O59) A4G4: eu fiz até o 14 Prô.

(O60) Laura: e se eu quisesse o 14, como seria?

(O61) As: o 1 e o 4 [__ ].

Laura explorou a composição de números, a partir da sequência numérica estabelecida no celular com números de 0 a 9, para que os alunos observassem que a partir daquela sequência, era possível compor infinitos números. Para isso, ela buscou legitimar o texto da comunicação, ou seja, o texto da atividade de Modelagem, contextualizando a situação e questionando como faria, caso fosse preciso utilizar alguns números em suas ligações pelo celular. Reconhecemos na ação de Laura a relação entre o aspecto experiência com a formação em Modelagem e vivência da própria prática no controle exercido do sequenciamento da Modelagem, ao agendar para a socialização da atividade, discussões matemáticas como forma de sistematizar os conceitos envolvidos na atividade.

Para este encaminhamento da Modelagem, Laura ainda agendou explorar as formas geométricas, procedendo de maneira estratégica ao intervir nas apresentações dos alunos, sobre suas construções, questionando sobre as formas geométricas envolvidas. Primeiramente ela solicitou que todos expusessem no quadro sua construção. E um a um, ela foi convidando para a apresentação.

(O62) Laura: [...] eu vou chamar o A1G4 pra pegar o celular dele e falar como que ele fez. O que ele usou. [...] ((o aluno fala como construiu))

(O63) Laura: olha o celular do A1G4 pessoal. Todos os celulares tem o mesmo tamanho?

(O64) As: não [ __ ].

(O65) Laura: e que formas tem nesse celular será? ((alunos indicam diferentes formas))

(O66) Laura: e tem mais alguma forma aí que você usou diferente?

(O67) A1G4: o quadrado.

O diálogo anterior mostra a variação no enquadramento no discurso de Laura. No início, ao solicitar que o aluno A1G4 discorresse sobre sua construção, Laura revelou um enquadramento fraco, ao fornecer possibilidade para que ele expusesse o que considerava legítimo em sua apresentação. Porém, após a explanação do aluno, ela fortaleceu o enquadramento com questionamentos que levassem os demais alunos a produzirem discursos que ela considerava legítimos naquele momento, no caso, discorrer sobre as formas geométricas.

A legitimidade requerida por Laura foi reconhecida pelos demais alunos em suas apresentações, que passaram a discorrer sobre as formas geométricas utilizadas em suas construções. Após a apresentação dos modelos de celulares produzidos pelos alunos, Laura sistematizou no quadro com os alunos as formas geométricas emergentes da atividade. Para este diálogo, ela promoveu para além do reconhecimento das formas, uma discussão sobre a veracidade dos modelos elaborados, como exemplo, ao questionar os alunos sobre a existência de um celular na forma de triângulo.

A escolha de Laura revelou seu entendimento de fazer da socialização da atividade de Modelagem, um momento oportuno a validação das resoluções e argumentação dos alunos, orientada pelo aspecto experiência com a formação em Modelagem, visto que, sua compreensão convergiu às orientações dadas no espaço de formação, durante a socialização das primeiras atividades de Modelagem desenvolvidas pelos professores, em que se portaram no papel de aluno, sendo convidados à apresentação de suas resoluções.

(O68) Formador 2: [...] esse momento não é a ideia de ir contra os grupos, mas de vocês argumentarem também sobre suas, e as outras resoluções. [...] [...] tentar identificar qual modelo, qual estratégia criada então, se adequa melhor à nossa situação.

E ainda, quando as discussões avançaram para questões do fazer pedagógico no trabalho com Modelagem, em que se discutiram orientações para a socialização das resoluções.

(O69) Formador 1: tentar fazer desse momento, algo valorizado, que representa para a aluno a importância desse momento. E quando ele for para o quadro, você perguntar quais foram as suas estratégias? O que vocês pensaram? [...] Porque se não eles acham que só tem que ir lá ao quadro, colocar a continha que eles fizeram, e voltarem e sentar.

Para a socialização da atividade, Laura ainda realizou no quadro uma construção coletiva com a turma na forma de desenho, de modo colaborativo. Ela valeu-se desse momento ainda, para juntos sistematizarem a sequência numérica, ainda em fase de aprendizagem por alguns alunos. Ao inferir que a “ajudassem” na construção de um celular, Laura enfraqueceu o enquadramento, pois os alunos também assumiram o controle sobre a comunicação, ao apontarem os elementos que compunham um celular.

(O70) Laura: agora eu queria que vocês me ajudassem a construir um celular. Só que vocês vão me falando o que eu preciso colocar no nosso celular. Então tá, eu vou fazer o celular, de que forma é o celular?

(O71)As: retângulo.

(O72) Laura: ah os botões de ligar para os outros. [...] Olha eu apertei o quadrado do telefone, ai vai aparecer os?

(O73) As: números [__ ].

(O74) Laura: vamos por os números então. Qual número que começa?

O diálogo promovido por Laura durante o desenho do celular demonstrou seu empenho em fazer com que todos os alunos participassem, e juntos, validassem suas estratégias, na medida em que os elementos sugeridos por eles fossem agregados na construção coletiva. Desse modo, verifica-se que essa dinâmica possibilitou contemplar todos os elementos existentes em um celular, representando um modelo para situação.

Barbosa (2007) confere ao modelo, toda forma de representação matemática da situação investigada. Desta forma, ao considerar a especificidade dos anos iniciais, estes podem se dar por meio de tabela, gráfico, desenho, produção textual e aritmética, visto que, essas formas de representações das situações estudadas, fazem referência a forma de vida dos alunos atuantes nos anos iniciais (TORTOLA, 2016).

Para finalizar, Laura solicitou aos alunos que esboçassem em seu caderno o celular, configurando o registro da atividade de Modelagem desenvolvida por eles. Na literatura, estudos realizados, apontam que a adaptação da Modelagem na prática pedagógica, é regulada por princípios que já operam no contexto escolar (OLIVEIRA, 2010; LUNA, 2012; SILVA, 2013a; SILVA, 2013b; AGUIAR, 2014), o que também foi constatado na prática recontextualizada de Laura, que solicitou aos alunos o registro da atividade em seus cadernos, comum na prática em sua sala de aula, e característicos dos anos iniciais (LUNA; SOUZA, 2014). Essa passagem revelou a combinação entre os aspectos recontextualizadores vivência da própria prática e especificidade dos anos iniciais.

Conforme apresentado nessa seção, as semelhanças e diferenças manifestadas nos discursos produzidos por Laura, durante a recontextualização, relacionaram-se, sobretudo, ao tema da atividade selecionado pelos alunos, à problematização da atividade elaborada a partir de orientações dadas no espaço de formação, ao convite à discussão e problematização da situação-problema, às intervenções questionadoras e instigantes promovidas no desenvolvimento da atividade, e, à promoção da argumentação e validação dos resultados (construções) na socialização da atividade com toda a turma. Orientadas pela manifestação de três aspectos recontextualizadores: i) Experiência com a formação em Modelagem; ii) Vivência da própria prática; iii) Especificidade dos anos iniciais, os quais tecemos algumas considerações sobre suas emergências, na seção seguinte.

Sobre os aspectos recontextualizadores emergentes

Na intenção de investigarmos os aspectos recontextualizadores que emergem em uma prática de Modelagem nos anos iniciais com a vivência em um espaço de formação continuada em Modelagem Matemática, buscamos compreensões sobre o processo de recontextualização operada pela professora Laura na prática de Modelagem em sua turma, o qual revelou a emergência de três aspectos recontextualizadores: i) Experiência com a formação em Modelagem; ii)Vivência da própria prática; iii) Especificidade dos anos iniciais, impressos por diferentes combinações nas ações de Laura.

Ao elucidarmos estes aspectos, não buscamos compreensões isoladas sobre eles no processo de recontextualização operado por Laura. Entendemos que os três aspectos apontados se encontraram imbricados na prática pedagógica, tendo em vista que, ao mesmo tempo em que Laura resgatou elementos da formação em Modelagem, conduzindo de acordo com os preceitos da Modelagem, elementos da prática vigente e as especificidades dos anos iniciais foram revelados na recontextualização.

De acordo com Bernstein (1996), a prática pedagógica é regulada pelas regras de poder (classificação) e controle (enquadramento) na relação de comunicação entre os agentes envolvidos. Em vista disto, inferimos que os três aspectos recontextualizadores operados no ambiente de Modelagem propostos por Laura foram regulados por regras instauradas na relação de comunicação nas salas de aula. Essas regras nos auxiliaram a compreender a forma com que a Modelagem foi levada para a sala de aula, observando as formas como os princípios foram operados no ambiente de Modelagem organizado pela professora, que conduziu a atividade, regendo as regras do que poderia ser dito e como poderia ser dito naquele contexto. Em outras palavras, buscando legitimidade para o ambiente de Modelagem, contudo, considerando os preceitos da própria prática, as aprendizagens formativas, e as especificidades dos anos iniciais.

Nesta direção, torna-se oportuno repousarmos nossa atenção e reflexão sobre as relações e os motivos da emergência dos aspectos recontextualizadores identificados neste estudo. Visto que eles se apresentaram imbricados por aquilo que a professora considera legítimo de uma prática de Modelagem Matemática, como a escolha do tema advinda de seus alunos, a problematização realizada de forma interativa, com questionamentos elaborados no contexto de discussão, a intervenção no desenvolvimento da atividade com discursos questionadores, e a promoção da socialização da atividade como forma de validação dos resultados.

Ao observarmos a manifestação do aspecto vivência da própria prática, entendemos a importância da professora Laura se revestir de ações que a possibilite estanciar ao que configura comum à sua prática, como incentivo e assentimento da Modelagem em suas aulas de Matemática. De mesmo modo, as especificardes dos anos iniciais consideradas na prática, podem revelar a ela uma conciliação formidável com a Modelagem nesse nível de ensino.

Inerente à experiência com a formação em Modelagem, compreendemos quão influente os espaços de formação podem revelar-se na prática de Modelagem quando levadas para a sala de aula. Isso desperta-nos a reflexão sobre as formações ofertadas no âmbito educacional, de modo particular, em Modelagem. Estariam os programas de formação em Modelagem considerando as experiências pedagógicas dos professores? E as especificidades dos contextos, têm sido discutidas nestes espaços?

Questões como estas, merecem atenção, haja vista que, reconhecemos em nossa proposta de formação limites temporais para um trabalho que pudéssemos assessorar as práticas pedagógicas dos professores e as especificidades deste nível de ensino apresentadas no processo de recontextualização.

Mutti e Klüber (2018, p. 104) argumentam que as práticas pedagógicas dos professores sejam tomadas como “orientadoras” da formação, visto que, essa ação pode revelar encaminhamentos que favoreçam a “adoção” da Modelagem em sala de aula. Segundo os autores, “a ideia é, portanto, que a aproximação à Modelagem seja iniciada com base na reflexão acerca da prática pedagógica e não apenas da teoria”. De modo articulado, Gomes (2018) orienta uma formação continuada em Modelagem Matemática à professores dos anos iniciais, a partir de suas ações, e realizada de forma colaborativa, constituindo um espaço de reflexão sobre suas práticas.

Integrando ensejos ao trabalho colaborativo para a formação de professores em Modelagem, Klüber (2017) orienta a constituição de coletivos de pensamento, entre professores pesquisadores e professores da Educação Básica, que compartilham de um mesmo “estilo de pensamento”, desenvolvido de forma conjunta. Isso sugere a superação de formatos de formação que priorizam apenas a abordagem teórica, com natureza de treinamentos que desconsidera as práticas dos professores (MUTTI; KLÜBER, 2018), realizados num espaço curto de tempo (TAMBARUSSI; KLÜBER, 2014), com princípios pragmáticos de “exposição e replicação” de práticas com Modelagem (KLÜBER, 2017), e apenas “informando ou apresentando a Modelagem como uma possibilidade” para o ensino da Matemática (KLÜBER et al, 2016, p. 10).

Em tempo, se não consideradas a experiência que o professor traz consigo e as particularidades dos diferentes níveis de ensino, corremos o risco de que a Modelagem não chegue à sala de aula, por ser considerada imprópria pelos professores à prática pedagógica. Por esse motivo, reconhecer a transformação e adaptação da Modelagem em sala de aula, pode contribuir com os programas de formação, em particular, a fim de que, os aspectos recontextualizadores sejam trabalhados e discutidos na formação, criando estratégias para seu trabalho em sala de aula. Aspiramos para estudos futuros, o planejamento de um espaço colaborativo de formação em Modelagem Matemática para professores que ensinam Matemática nos anos iniciais, em conformidade com os aspectos recontextualizadores discutidos nessa pesquisa.

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Notas

[1] A partir deste momento usaremos o termo Modelagem para nos referirmos a Modelagem Matemática na perspectiva da Educação Matemática.
[2] Por fins textuais, nos referiremos a partir deste momento como anos iniciais, fazendo referência aos anos iniciais do ensino fundamental.
[3] O estudo que empreendemos são resultados de uma pesquisa mais ampla já concluída, e se relaciona com o objeto de investigação de doutorado da primeira autora.
[4] Oliveira (2010) designou situações de tensões àquelas nas quais os professores Educação Básica denotaram apreensões no desenvolvimento de atividades de Modelagem em sala de aula.
[5] Para o desenvolvimento da pesquisa submetemos ao comitê de ética em pesquisa da Universidade Estadual de Maringá, o projeto e o termo de consentimento dos professores participantes autorizando a divulgação dos dados produzidos.
[6] Todas as normas de sinais encontram-se disponíveis em:http://www.concordancia.letras.ufrj.br/index.php?option=com_content&view=article&id=52&%20Itemid=58. Acesso em: 20 out. 2018.
[7] O termo tensões é utilizado por Oliveira (2010) para denotar as apreensões apresentadas por professores da Educação Básica no trabalho com a Modelagem em sala de aula.

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