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O POTENCIAL DE UM GRUPO COLABORATIVO PARA A FORMAÇÃO DOS FORMADORES DE PROFESSORES
THE POTENTIAL OF A COLLABORATIVE GROUP TO THE TRAINING OF TEACHER TRAINERS
Revista de Educação Matemática, vol.. 14, núm. 16, 2017
Sociedade Brasileira de Educação Matemática

Artigos Científicos

Revista de Educação Matemática
Sociedade Brasileira de Educação Matemática, Brasil
ISSN: 2526-9062
ISSN-e: 1676-8868
Periodicidade: Cuatrimestral
vol. 14, núm. 16, 2017

Recepção: 31 Março 2017

Aprovação: 25 Junho 2017

Copyright Revista de Educação Matemática

Este trabalho está sob uma Licença Creative Commons Atribuição-NãoComercial 4.0 Internacional.

Resumo: Este texto se propõe a discutir dados de uma pesquisa de mestrado que investigou o potencial de um Grupo Colaborativo para a constituição do Professor Coordenador (PC) como formador de docentes. O ponto de partida para esta pesquisa foi a problemática em torno da formação continuada em serviço dos professores de Matemática, que é uma das atribuições dos PCs, porém, é considerada como a área mais complexa e difícil de ser acompanhada. Para tanto, foi constituído um grupo colaborativo com 14 Professores Coordenadores que atuam nos Anos Finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio, de oito escolas estaduais localizadas na Zona Leste da cidade de São Paulo (SP). Durante o período de março a novembro de 2016 foram realizados oito encontros formativos, nos quais foram estudados e discutidos aspectos da atuação dos PCs na formação em serviço dos professores de Matemática e coletados os dados para análise, como registros escritos pelos participantes e pela pesquisadora e um questionário de caracterização dos sujeitos. No processo formativo vivenciado com o grupo colaborativo, os Professores Coordenadores, especialistas e não especialistas em Matemática, apresentaram as mesmas dificuldades em relação ao trabalho desenvolvido junto aos docentes de Matemática. Evidenciou-se, assim, que a qualificação do PC deve voltar-se para sua atuação como formador da área pedagógica, independente da sua área de formação inicial e/ou especialidade dos seus professores. Este texto aborda apenas os aspectos da pesquisa que tratam dos entraves e das possibilidades em relação ao papel formador dos Professores Coordenadores e dos sentimentos revelados pelos formadores em relação à formação em serviço dos professores de Matemática, que emergiram a partir dos dados analisados.

Palavras-chave: Grupo Colaborativo, Formação Continuada de Professores em serviço, Sentimentos dos formadores.

Abstract: This text aims to discuss the data from a Master's thesis which investigated the potential of a Collaborative Group to the Coordinating Teachers (CT) formation as the teacher trainers. The starting point for this research was the issue regarding the in-service continuous training of the Mathematics teachers, which is one of the CT assignments, however, it is considered the most difficult and complex area to be followed. For this purpose, a collaborative group with 14 Coordinating Teachers, who work in the Elementary Education and Secondary School from the East Zone of the city of São Paulo (SP), was created. Eight formative meetings were held from March to November of 2016, in which aspects of the CT practices on the in-service training of the Mathematics teachers were studied and discussed and from which data were collected through records written by the participants and the researcher, and, also, from a profiling questionnaire of the subjects. During the formative process experimented within the collaborative group, the Coordinating Teachers, who were or not specialists in Mathematics, presented the same difficulties regarding the work with the Mathematics teachers. Thus, it was highlighted that the CT qualification must focus on their practice as pedagogical trainers, regardless of their initial formation and/or the teacher expertise. This work only addresses the research aspects that deal with the obstacles and possibilities regarding the Coordinating Teachers trainers role and their feelings that emerged from the data with respect to the in-service continuous training of the Mathematics teachers.

Keywords: Collaborative Group, In-service Continuous Training of Teachers, Trainers Feelings.

Contribuições teóricas

O baixo desempenho dos alunos na área de Matemática, apontado pelas avaliações externas e internas tem sido motivo de preocupação para muitos educadores, gestores escolares e idealizadores de políticas públicas na área da Educação e da formação de professores. Ao discutir as possíveis causas para tais resultados, é comum a alegação de que a formação inicial dos professores que dão aulas de Matemática, além de deixar lacunas no conhecimento dos conteúdos da disciplina, não garante a bagagem de conhecimentos metodológicos de como ensinar esses conteúdos para os alunos (GATTI; NUNES, 2010).

Outro motivo relevante, que gera discussões calorosas entre os interessados nas melhorias do processo de ensino e aprendizagem, concentra-se na formação continuada em serviço dos professores, ou seja, aquela formação compreendida como um direito dos profissionais da educação e dever do Estado na garantia da oferta e das condições para sua materialização.

No caso da rede pública estadual paulista, a formação continuada dos professores ocorre (ou deve ocorrer) dentro do horário de trabalho, nas Aulas de Trabalho Pedagógico (ATPC), nas reuniões pedagógicas, em reuniões de Conselho de Classe, entre outros espaços formativos que podem ser oportunizados na escola, sob a responsabilidade dos Professores Coordenadores3, no papel de formadores dos docentes.

Ao focar nosso estudo e reflexões neste campo, encontramos inúmeros desafios e, entre eles, está a qualificação do Professor Coordenador para atuar como formador dos docentes, especialmente nos Anos Finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio, cujos segmentos concentram um número grande de professores especialistas nas diferentes disciplinas da grade curricular e o fato de os PCs serem especialistas – possuírem licenciatura – em qualquer disciplina/área do conhecimento.

Outro desafio se refere às relações que se estabelecem na escola entre os profissionais e entre os alunos e às estratégias de trabalho que sustentam a cultura escolar, como o isolamento, o individualismo, a competitividade e a cobrança por resultados. Tais aspectos se manifestam de diferentes formas e se estendem até as mais altas instâncias administrativas que gerenciam e influenciam as decisões a serem tomadas e alimentam esse processo como um todo (PERÉZ GÓMEZ, 2001). Esses fatores, na visão de Fullan e Hargreaves (2000), podem dificultar o acesso a novas ideias e a soluções melhores, contribuem para aumento do estresse internamente como uma chaga, dificultam o reconhecimento e o elogio do sucesso e permitem a existência e a permanência da incompetência em detrimento dos estudantes, dos colegas e dos próprios professores. Além disso, esses autores afirmam que “muitas iniciativas para o desenvolvimento de pessoal assumem a forma de algo que é feito para os professores, ao invés de com eles e, menos ainda por eles” (2000, p. 33). Associado a tudo isso, outro fator muito importante a ser considerado é a sobrecarga de trabalho dos professores, que atualmente, está cada vez maior, e as soluções e inovações propostas pelas instituições não os ajudam a superar os problemas vivenciados em sala de aula, pelo contrário, os deixam cada vez mais desanimados, chegando ao ponto em que “a solução passa a ser o problema”. Então, para minimizar essa sobrecarga, Fullan e Hargreaves (2000, p. 19) sugerem que “é importante que os professores trabalhem e planejem mais com os colegas, compartilhando e desenvolvendo em conjunto suas especializações e seus conhecimentos, ao invés de enfrentar as exigências sozinhos”. O argumento é que esse tipo de trabalho que estimula a união entre as professores, não deve ser realizado apenas por seu valor humanitário, mas principalmente, porque pode causar impactos significativos na qualidade do ensino e da aprendizagem dos alunos nas salas de aula.

Nessa direção, encontramos nos referenciais sobre trabalho colaborativo, alguns indícios de que essa estratégia tem um grande potencial no fortalecimento das pessoas para se engajarem em prol das mudanças desejadas. Identificamos que os estudos que investigam práticas de grupos organizados revelam que vários termos são utilizados para designar o que ocorre nesses espaços como:

aprendizagem cooperativa, aprendizagem colaborativa, trabalho colaborativo, formação compartilhada, trabalho coletivo, entre outros.

Sobre esse assunto, Passos e André (2016, p. 9) escreveram que “o trabalho colaborativo na escola vem se tornando um campo de estudos pungente, tanto no cenário internacional quanto no Brasil”. Ao discutirem o conceito de trabalho colaborativo a partir de diferentes perspectivas na literatura, as autoras chamam atenção para que o termo “colaboração” não seja usado de forma ingênua, nem tampouco fortaleça o discurso de que todos os problemas da organização escolar serão solucionados se relações mais colaborativas ocorrerem no interior das escolas.

Ao fazer uma revisão de literatura acerca do trabalho colaborativo nas escolas, Daminani (2008), identificou que é comum utilizarmos os termos colaboração e cooperação para se referir às práticas de trabalho em grupo, grupos colaborativos e trabalho em conjunto. Segundo a autora “esse tipo de atividade apresenta potencial para auxiliar no enfrentamento dos sérios desafios propostos pela escola atual em nosso país” (p. 224).

Passos (2010) explica que, embora estejam relacionados à ideia de um grupo de pessoas mobilizadas por uma meta, esses termos – colaboração e cooperação - apresentam distinções significativas em relação ao modo como as tarefas são organizadas, nos papeis de cada sujeito, no compartilhamento dos objetivos e no desenvolvimento profissional que o grupo pode alcançar. Por exemplo: enquanto na cooperação, as tarefas são distribuídas hierarquicamente e a centralização das decisões fica para o coordenador do grupo, na colaboração há a distribuição e compartilhamento da liderança e todos os participantes assumem a corresponsabilidade pelo trabalho a ser desenvolvido.

Por isso, Forte e Flores (2009) consideram importante a formação de professores neste campo como potencial para fomentar o desenvolvimento de práticas colaborativas nas escolas e defende que é fundamental compreendermos as razões pelas quais os professores têm determinadas posturas em relação ao trabalho pedagógico. Elas explicam que os aspectos pessoais e as condições de trabalho, podem ser fatores motivacionais para interferir na relação entre os professores e consequentemente no desenvolvimento das aulas.

Corroborando com essa perspectiva, Imbernón (2010) afirma que é preciso utilizar modalidades e estratégias de formação organizadas sobre a base do trabalho em grupo, como estudo e análise de casos, trocas, debates, leituras, incidentes críticos, situações problemáticas, entre outras, pois a colaboração “é um processo que pode ajudar a entender a complexidade do trabalho educativo e dar respostas melhores às situações problemáticas da prática” (p.65). Essas estratégias contribuem para o desenvolvimento de habilidades individuais e grupais e ajudam a manter o trabalho colaborativo entre os professores.

Ao trabalhar e oportunizar formações nesta perspectiva, juntando reflexão e discussão de práticas e problemas reais dos professores e das escolas, Passos (2016) afirma que os grupos colaborativos podem transformar-se em lugares potentes de formação, ao estimular o compartilhamento de saberes e análise conjunta de situações do cotidiano escolar e com isso, amenizam a angústia provocada pelo isolamento e pela falta de apoio. Desse modo, “os grupos colaborativos e reflexivos como espaços formativos, qualificam a trajetória profissional dos professores e permitem colocá-los em constante aprendizagem docente, decorrente do desenvolvimento da reflexão e da crítica sobre si mesmos e sobre suas práticas” (p.165). Por isso, esses espaços devem ser contextos em que perguntas e incertezas são entendidas como sinais de erudição e não como sinais de fracasso ou deficiência e podem com isso, potencializar a capacidade reflexiva dos professores sobre aquilo que fazem na sala de aula (PASSOS, 2016).

Concordamos que, em muitos aspectos, a colaboração se faz necessária, principalmente quando pensamos nas situações imprevisíveis, nas incertezas do mundo atual, nos problemas complexos da escola e da sala de aula, que não conseguiremos resolver sozinhos, ou mesmo que encontremos as soluções, as mudanças não serão duradouras, por não terem sido construídas com o coletivo. Além disso, essa perspectiva de trabalho em conjunto pode favorecer o desenvolvimento profissional dos professores, melhoria na aprendizagem dos alunos e a transformação da cultura das escolas (RODRIGUES, 2016).

O potencial de um grupo colaborativo para a constituição do Professor Coordenador como formador de docentes

As questões em torno do trabalho colaborativo na escola e da função dos Professores Coordenadores, em seu papel formador, têm gerado muitos incômodos em minha trajetória profissional como docente e como formadora. Alguns desses incômodos mobilizaram a pesquisa de mestrado (RODRIGUES, 2016), defendida pela PUCSP, no qual este artigo está fundamentado. Ainda que não se tenha pretendido solucionar a problemática apresentada, refletir sobre ela foi importante para chegar à definição do ponto de partida da pesquisa que se voltou para a formação em serviço dos professores de Matemática e tomou a prática dos PCs como objeto de investigação intencional.

O questionamento principal que perpassou o desenvolvimento da pesquisa foi: Será que uma formação em grupo e estimulada por encontros reflexivos pode possibilitar aos participantes – Professores Coordenadores - a construção de aprendizagens e sentimentos de mudança em relação à própria atuação como formadores de docentes?

E para percorrer o caminho formativo que gerou os dados analisados, tomamos como objetivo geral: investigar o potencial de um grupo colaborativo para a constituição do professor coordenador como formador de docentes. Os objetivos específicos foram assim definidos: identificar sentimentos

do professor coordenador, especialista e não especialista em Matemática, em relação à formação em serviço dos professores de Matemática; identificar indícios de reflexão crítica vivenciada pelos participantes do grupo colaborativo relacionada à prática de formação de professores; e, identificar indícios de aprendizagens e percepções de mudança em relação ao trabalho de formador dos professores Coordenadores.

Procedimentos metodológicos

Foi organizado um grupo colaborativo constituído por 14 PCs atuantes nos anos finais do Ensino Fundamental e Ensino médio de oito escolas estaduais, localizadas na zona leste da cidade de São Paulo. O principal procedimento metodológico utilizado para coleta de dados foi a gravação e transcrição dos áudios durante os encontros formativos do Grupo Colaborativo que ocorreram no período de março a novembro de 2016. Essas gravações somam um total de 15 horas de discussões dos participantes do grupo, feitas em 8 encontros formativos.

Dos 14 participantes da pesquisa, 13 são do sexo feminino, apresentam idades entre 32 e 57 anos. Em termos de formação inicial, este grupo ficou bastante diversificado: 1PC é especialista em História e Geografia, 4 PCs são de Ciências Biológicas, 1 PC e a PCNP são de Língua Portuguesa, 1 PC é de Química e 6 PCs são especialistas em Matemática. Em relação ao tempo de experiência em sala de aula, os participantes apresentam entre 6 a 28 anos. Já em relação ao tempo de experiência como Professor Coordenador temos uma participante com apenas 5 meses e outra com 8 anos. Os demais estão na coordenação na mesma escola em média há 2 anos.

Durante os encontros formativos e com autorização dos sujeitos da pesquisa, foram coletados alguns registros escritos pelos participantes do grupo, como relatos de memória de infância em relação à aprendizagem de Matemática, casos de formação envolvendo Matemática e cartas a quem pretende atuar como formador de professores de Matemática. Também foram produzidos registros pela pesquisadora, como a transcrição dos áudios, pautas dos encontros formativos, diário de campo e questionário de caracterização dos sujeitos. Esses materiais constituíram os dados analisados na dissertação.

Achados da pesquisa

Os resultados obtidos indicam que este grupo funcionou como um espaço potencial para revelar sentimentos dos formadores em relação à formação em serviço dos professores de Matemática; possibilitou a denúncia de entraves e o anúncio de possibilidades em relação ao papel formador dos Professores Coordenadores; promoveu reflexão crítica sobre a política e colaboração, por meio de questionamentos e de postura investigativa e estimulou a construção de aprendizagens compartilhadas, a partir do olhar e da contribuição do outro.

Destaco, a seguir, duas dimensões decorrentes das falas e dos registros escritos pelos sujeitos desta pesquisa, que foram discutidos na dissertação. Tais dimensões se referem aos entraves e possibilidades em relação ao papel formador do Professor Coordenador e também aos sentimentos desses profissionais em relação à formação dos professores de Matemática.

O papel formador do Professor Coordenador: entraves e possibilidades

Foi recorrente durante os encontros formativos, relatos que revelam o desejo dos PCs em desenvolver a formação dos professores, porém diante das dificuldades encontradas, sentem-se frustrados com a própria atuação. Os depoimentos e registros escritos mencionam questões relativas à falta de valorização profissional e de reconhecimento da função formadora, o fato de os PCs não conseguirem se dedicar, exclusivamente, à formação dos professores, os conflitos e tensões que esses sujeitos vivem no cotidiano escolar, além de problemas associados à rotatividade dos professores. O PC Roger, que está na função há quatro anos, na mesma Escola, ilustra bem essa frustração:

A gente fala assim, como coordenador a gente tem as frustrações nossas. Pelo nosso tempo. Porque a nossa função, querendo ou não, a gente fala assim “como eu queria só fazer isso”. Como seria se o mundo nosso fosse somente tratar da aprendizagem e da formação? Só que isso não é real ainda (...) a gente tá engatinhando a passos pequenos. (...) a gente tem que conquistar o nosso espaço. E essa conquista faz a gente ficar frustrado porque a gente não consegue atender todos os professores. (PC Roger/2º encontro).

Apesar dos entraves e desafios latentes na atuação dos Coordenadores, existem inúmeras possibilidades para que a dimensão formadora seja potencializada na Escola, conforme identificamos nas falas de alguns PCs. Foi defendida a importância da parceria e do trabalho conjunto/colaborativo com os professores, em especial para o andamento das ações, da aprendizagem e para o desenvolvimento profissional de todos os envolvidos no processo educativo. O depoimento da PC Meire, que exerce essa função há mais de cinco anos, exemplifica esses aspectos do trabalho do formador na escola:

(...) o PC precisa considerar a questão da parceria e o quanto é importante o olhar do outro. A questão da escuta, ouvir o professor, o que esse professor pensa sobre a aula, quais suas impressões, quais suas dificuldades. Se a gente se colocar como parceiro, tudo muda, a situação muda. (...) Muitas vezes a gente não faz isso. Uma sala problema, então, quais as soluções do grupo? O que o grupo de professores pensa? Quais as soluções? Porque não tem receita. É no coletivo que a gente consegue. (PC Meire/6º encontro).

Também foram identificados alguns conhecimentos e habilidades que, na ótica dos sujeitos desta pesquisa, compõem um corpo de saberes estruturantes para o papel formador do PC e constituem mais possibilidades para sua atuação no contexto escolar, como por exemplo: escutar os docentes e ter uma postura acolhedora e de não imposição, conhecer os professores, seus saberes e necessidades formativas, conhecer os alunos e suas famílias, conhecer o perfil do grupo de professores, conhecer o Currículo e os materiais disponibilizados pela Secretaria da Educação e dominar estratégias de formação de adultos.

Os sentimentos dos formadores em relação à formação em serviço dos professores de Matemática

O fato de escolhermos a área da Matemática para uma discussão mais focada possibilitou, para os participantes do Grupo Colaborativo, a manifestação de sentimentos em relação a esta disciplina/área do conhecimento e também em relação à própria atuação como formador dos professores de Matemática. Nos encontros formativos, era comum ouvir os PCs relatando como se sentiam nas aulas de Matemática quando eram alunos e o quanto isso influenciou na escolha do curso de licenciatura para se tornarem professores. Identificamos também que essa relação entre o aluno e o professor (ou a disciplina e, neste caso, a Matemática) vivida na Educação Básica continua na vida adulta e, para alguns Coordenadores, se estendeu no seu trabalho como formador junto aos professores dessa área do conhecimento.

No tocante a essas lembranças e marcas guardadas em relação à Matemática, Fernandes (2007) verificou em seus estudos o quanto é importante a mediação feita pelos professores na relação ‘aluno-objeto do conhecimento’, para que haja movimentos de aprendizagem significativa que vão determinar a natureza afetiva dessa relação:

Os alunos que gostam de Matemática tiveram, em sua trajetória, a convivência com um professor que os mobilizou para o aprendizado de Matemática, e essa mobilização se deu por diferentes formas. Nesse sentido, pode-se supor que as experiências vividas em sala de aula por esses alunos determinaram a natureza afetiva da relação do aluno com a disciplina. A forma como o professor medeia essa relação aluno-objeto do conhecimento gera diferentes tipos de sentimentos na relação do aluno com tal objeto (p. 49).

Os dados revelaram que alguns Coordenadores guardam marcas negativas em relação à Matemática, tais como medo, notas baixas, e imagens como um monstro devorador, um bicho de sete cabeças, ser uma aluna mediana, ou ter pavor da professora durante o início da escolarização. Contudo, esses mesmos Coordenadores sentem necessidade de encontrar uma forma para ajudar os professores a dar mais sentido à Matemática, para que os alunos compreendam a importância dessa área do conhecimento na sua formação. Eles expressam certa vontade de descobrir um “como fazer” a formação dos professores, e de encontrar uma estratégia formativa que auxilie, ao mesmo tempo, professores e alunos em relação ao ensino e à aprendizagem dos conteúdos da Matemática. Os depoimentos abaixo exemplificam nossa interpretação:

A gente busca uma estratégia formativa de como nós Coordenadores, podemos ajudar o professor de Matemática na sala de aula. Porque muitas vezes, eu me pergunto também: "Como eu posso ajudar esse professor? (PC Ágata/1º encontro).

(...) não é algo que eu vou começar hoje e dizer: a culpa é do professor ou a culpa é do aluno. Não! Tenho que ver onde eu posso auxiliar. O que posso fazer? O meu aluno está pedindo socorro. Porque eles vão lá e gritam. E o meu professor também. Como fazer tudo isso pra poder ajudar os dois lados? A gente está buscando caminhos para tentar de uma melhor forma ajudar ambos. Como? Eu ainda não sei. (PC Sophia/4ºencontro).

E essa busca de caminhos e estratégias de trabalho do PC como formador indica que, ao atuarem como formadores de docentes, nas relações que estabelecem com os professores de Matemática e, ainda, na tentativa de ajudá-los no desempenho de suas funções na sala de aula, os PCs vivenciam situações que despertam sentimentos como: ansiedade, preocupação, tensão, apreensão e tristeza. Ao participar do Grupo Colaborativo, os Coordenadores puderam verbalizar algumas situações comuns em suas práticas, aliviando um pouco esses sentimentos.

Essa circunstância nos faz recorrer a Pérez Gómez (2001) que, em seus estudos, reforça o papel do afetivo em processos de mudança na cultura escolar:

A confiança afetiva é fundamental em todo processo de inovação e melhora institucional, pois a transformação da cultura escolar requer a modificação não apenas das ideias, mas fundamentalmente dos sentimentos e dos comportamentos adquiridos na história individual, mediante experiências vitais que configuram o esqueleto da personalidade, contrária e resistente a toda mudança fundamental (p. 174).

O Grupo Colaborativo também funcionou como um recurso importante na diminuição da sensação de isolamento e do “não saber como fazer” que, dependendo da forma como o sujeito lida com isso, pode acumular estresse como uma chaga e limitar o desenvolvimento das suas competências (FULLAN; HARGREAVES, 2000).

Outro dado mostrado na pesquisa foi que alguns PCs, mesmo sendo especialistas em Matemática, admitem ter dificuldades em fazer a formação dos colegas da mesma área devido a questões do perfil, da resistência, da representação que têm da disciplina. Mas, identificamos também, que há PCs que, por serem especialistas em Matemática, ficam mais à vontade em discutir questões específicas durante as formações em ATPC, no entanto sentem dificuldades em articular as discussões com os professores das outras áreas.

Isso sugere que os Coordenadores precisam de conhecimentos específicos do formador, que estão além dos conhecimentos da disciplina e podem incluir competências do campo da comunicação/relacionamento, liderança e gestão de pessoas. Esses aspectos precisam ser considerados na formação continuada desses profissionais, e explorados com estratégias formativas que estimulem os PCs a falar, escrever e compartilhar com outros colegas o que pensam sobre a própria realidade e o que vislumbram de possibilidades para transformá-la.

Como formadores alguns Coordenadores, verbalizaram que se sentem importantes na escola, e isso induz sentimentos de alegria, satisfação, vibração, esperança e otimismo em relação ao próprio trabalho. Desse modo, identificamos que há PCs se sentindo mais fortalecidos e autoconfiantes para desenvolver o trabalho pedagógico, no qual as relações interpessoais preponderam. A parceria construída com os professores por meio de vínculos de confiança, o fato de se disponibilizar em auxiliar o professor a refletir sobre a própria prática, olhar para sua atuação, refletindo e aprendendo constantemente, são condições que proporcionam ao Coordenador esses sentimentos de tonalidades agradáveis que dão a força para continuar na função e contribuir para reforçar a colaboração entre as pessoas na Escola.

Considerações finais

Esse estudo possibilitou constatar que existem questões bastante abrangentes no contexto do trabalho do Professor Coordenador, que antecedem o seu olhar para os indicadores da aprendizagem dos alunos e influenciam, de maneira direta, na sua atuação como formador, como por exemplo: a cultura da escola e dos docentes, o trabalho colaborativo, as estratégias formativas e as relações interpessoais.

Na problematização do tema pesquisado, tínhamos dúvida se o Professor Coordenador, para atuar como formador de professores de Matemática, necessariamente, precisa ser especialista – ter licenciatura em Matemática. Conforme a pesquisa foi sendo desenvolvida, outra questão se impôs, pois as dificuldades apresentadas pelos Coordenadores foram as mesmas, tanto dos especialistas, como dos não especialistas em Matemática.

O processo de formação vivenciado no Grupo Colaborativo ajudou o PC não especialista a constatar e a reconhecer que as suas dificuldades como formador não são maiores que as apresentadas pelos especialistas, a superar um pouco do medo que sentia dessa área do conhecimento e a assumir o papel formador de professores. Todavia, não estamos defendendo que um PC não precisa ser especialista em uma disciplina para ser formador, é evidente que se ele for especialista e possuir uma formação na perspectiva valorizada pela referida pesquisa (RODRIGUES, 2016), estará melhor qualificado a desenvolver a formação dos professores daquela disciplina/área do conhecimento.

Em síntese, não basta ser especialista em Matemática para ser um bom formador de professores de Matemática, é preciso aprender fazer perguntas, identificar problemáticas, provocar reflexão da prática, desenvolver parceria e trabalhos em conjunto com o professor. O Professor Coordenador precisa, de fato, de uma formação que o qualifique para atuar como formador e voltada às questões pedagógicas e de conhecimento da prática, independente da sua área de formação e da área e/ou especialidade dos seus professores.

Entendemos que essa perspectiva de formação crítico-reflexiva, que valoriza a importância do trabalho colaborativo na Escola, além de ampliar a atuação dos sujeitos e tornar mais eficientes as suas decisões, pode ocasionar um processo de transformação em cadeia no contexto escolar, uma vez que o PC pode influenciar o professor para um olhar mais apurado da própria prática em sala de aula, e da relação que estabelece com os alunos.

Finalmente destacamos, a partir dos resultados pesquisa, que uma formação que se constitui com o trabalho colaborativo leva tempo para ser consolidada, exige um grande esforço inicial e engajamento para ser mantida. Essa prática de formação, embora possa ser caracterizada por gerar mudanças na mentalidade e nas atitudes das pessoas, é difícil de ser realizada por envolver fatores complexos do cotidiano escolar, por estimular as pessoas a saírem do isolamento, a compartilhar saberes, trocar experiências e desenvolver trabalhos em conjunto. Os sujeitos envolvidos nesse processo precisam estar em constante movimento de resistência ao cotidiano que está posto, no qual predominam o individualismo, a competitividade e o excesso de demandas num tempo corrido. Assim, a perspectiva de formação colaborativa precisa ser assumida como um processo contínuo e para a vida toda (RODRIGUES, 2016).

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