Dossier
Recepção: 01 Julho 2018
Aprovação: 01 Março 2019
Resumo: O artigo traz um quadro aproximado da ocupação pré-colonial na planície aluvial e nos terraços do rio Araguaia utilizando informações de projetos de pesquisa preventiva e acadêmica, trabalhos científicos, dois estudos de casos e dados de sítios fora desse ambiente, para ampliar o contexto ocupacional, especialmente no que se refere a sítios lito-cerâmicos. Ao longo dos tempos, o rio Araguaia foi um elemento significativo da paisagem para a ocupação humana no Planalto Central brasileiro. Relatos históricos mencionam aldeias indígenas junto às suas margens. Em relação a ocupação pré-colonial esse rio localiza-se estrategicamente entre o norte e o sul do País e da América do Sul, sendo uma via de deslocamento favorável entre as bacias amazônica e platina. A planície aluvial e os terraços apresentam uma série de sítios arqueológicos lito-cerâmicos de grupos agricultores e ceramistas, predominantemente da Tradição Uru. Na bacia hidrográfica do rio Araguaia, também ocorrem sítios pré-cerâmicos e de agricultores e ceramistas de outras tradições arqueológicas, de superfície e em abrigos rochosos com reocupações, havendo alguns com pinturas e gravuras rupestres. Nessa abordagem, mostra-se a estruturação da bacia do rio Araguaia como tema fundamental para a Arqueologia, visualizando a relação com os sistemas fluviais, análise espacial dos sítios, processos de formação do registro arqueológico, e apropriação e construção da paisagem.
Palavras-chave: Arqueologia brasileira, Arqueologia e sistemas fluviais, Ocupação humana do Brasil Central.
Abstract: The article presents a proximate picture of the pre-colonial occupation in the Araguaia river alluvial plain and terraces, using information from preventive and academic research projects, scientific works, two case studies and data from sites external to this environment, to expand the occupational context, especially with respect to lithic-ceramic sites. Throughout the ages, the Araguaia River has been a significant element of the landscape for human occupation in the Brazilian Central Plateau. Historical reports mention indigenous villages along its banks. This river is located strategically between the north and south regions of the country and of South America and provides an advantageous travel route between the Amazonian and Plate basins. The alluvial plain and the terraces present a series of ceramist and farmer group litho-ceramic archaeological sites predominantly from of the Uru Tradition. In the Araguaia river basin, there are also other farmer and potter lithics from other archaeological traditions, surface and rock shelters with reoccupations, some of them with cave paintings and engravings. This work approaches the structure of the Araguaia river basin as a fundamental theme for Archaeology, visualizing the relationship between river systems, spatial analysis of sites, processes of archaeological record formation, appropriation and construction of the landscape.
Keywords: Brazilian archaeology, Archaeology and fluvial systems, Human occupation of central Brazil.
Resumen: El artículo trae un cuadro aproximado de la ocupación precolonial en la llanura aluvial y en las terrazas del río Araguaia, utilizando informaciones de proyectos de investigación preventiva y académica, trabajos científicos, dos estudios de casos y datos de sitios fuera de ese ambiente, para ampliar el contexto ocupacional, especialmente en lo que se refiere a los sitios lito-cerámicos. A lo largo de los tiempos, el río Araguaia fue un elemento significativo del paisaje para la ocupación humana en el Planalto Central brasileño. Los relatos históricos mencionan aldeas indígenas junto a sus márgenes. En relación a la ocupcción precolonial, el río se encuentra estratégicamente entre el norte y el sur del país y de América del Sur, siendo una vía de desplazamiento favorable entre las cuencas Amazónica y Platina. La llanura aluvial y las terrazas presentan una serie de sitios arqueológicos lito-cerámicos de grupos agricultores y ceramistas, predominantemente de la Tradición Uru. En la cuenca hidrográfica del río Araguaia, también ocurren sitios precerámicos y de agricultores y ceramistas de otras tradiciones arqueológicas, de superficie y en abrigos rocosos con reocupaciones, habiendo algunos con pinturas y grabados rupestres. En este abordaje, se muestra la estructuración de la cuenca del río Araguaia como tema fundamental para la arqueología, visualizando la relación con los sistemas fluviales, el análisis espacial de los sitios, de los procesos de formación del registro arqueológico, y de la apropriacíón y construcción del paisaje.
Palabras clave: Arqueología y sistemas fluviales, Arqueología brasileña, Ocupación humana del Brasil central.
Introdução
O rio Araguaia tem sido, ao longo do tempo, uma importante via de deslocamento dos grupos humanos, conforme atestam os sítios arqueológicos, identificados e pesquisados na área, e as informações orais sobre a existência de novos sítios em diversos municípios dos estados de Goiás, Mato Grosso e Tocantins, que ainda não foram investigados por diversos fatores. De acordo com Nimuendajú (1981), grupos Karajá, Caiapó, Xavante, Xerente, Apinajé e Avá-Canoeiro já ocupavam o vale do rio Araguaia no século XVII. Magalhaes (1946, p. 82) menciona grupos indígenas que viviam junto às margens do rio Araguaia, principalmente “Chavantes, Carajás, Chambioás, Canoeiros, Caiapós, Carajais, Apinagés e Gradús, os dominadores destes desertos do Araguaia”. Barbosa (1985) apresenta uma síntese de relatos que confirmam os contatos entre indígenas e colonizadores, tanto no rio Araguaia como em alguns afluentes.
O presente artigo apresenta um quadro aproximado em relação à pesquisa arqueológica na bacia hidrográfica do rioAraguaia, com base bibliográfica e de dois estudos de casos. Também são abordadas algumas limitações, pelas dificuldades de acessar relatórios de projetos de arqueologia preventiva, bem como de trabalhos acadêmicos da década de 1970. Nesse sentido, o objetivo principal é unir informações dispersas referentes à ocupação pré-colonial da área, em decorrência da importância das mesmas para a compreensão da ocupação humana no Planalto Central brasileiro, o que contribuirá para o desenvolvimento de novas pesquisas.
O texto foi desenvolvido abordando, de forma sintética, a estruturação da bacia do rio Araguaia, tratamento esse pouco comum em textos de arqueologia, por considerar fundamental um conhecimento básico do tema. O conjunto de dados apresentados colaborará com pesquisas futuras sobre a análise da distribuição espacial dos sítios arqueológicos na área, bem como as relações entre eles e os diversos aspectos que envolvem os sistemas fluviais.
Os estudos de casos apresentados detalham os resultados das pesquisas realizadas nos sítios arqueológicos Cangas I e Lago Rico, ambos no município de Aruanã no estado de Goiás, abarcando mais de 10 anos de pesquisas na área por onde atuaram gerações de estudantes do curso de Arqueologia da Pontifícia Universidade Católica de Goiás. O texto também foi estruturado para receber complementações e atualizações, permitindo que sejam inseridas novas informações, para que o conhecimento sobre a arqueologia da bacia hidrográfica do rio Araguaia siga se desenvolvendo e estimulando pesquisadores.
Caracterização geral
Como as demais bacias hidrográficas brasileiras, a do rio Araguaia originou-se de processos evolutivos, envolvendo continuadas atividades geotectônicas e epirogenéticas, associadas a mudanças climáticas no decorrer do tempo geológico (Bayer 2002, 2010). A rede hidrográfica do rio Araguaia (Figura 1) é o principal curso da bacia Tocantins-Araguaia. Por sua vazão e área de abrangência, teria sido implantada adaptando-se a lineamentos norte-sul, durante a elaboração do pediplano Pliopleistocênico (Mamede et al. 1981).
Processos de avulsão, datados por termoluminescência (TL), mostram idades inseridas no Pleistoceno superior, entre 17.200 e 56.600 anosAntes do Presente (AP) (Valente 2007). São reconhecidos no trecho médio do rio Araguaia e afluentes, sugerindo a presença de eventos neotectônicos na configuração atual da planície aluvial, os quais também se refletem em distintos traços geométricos da depressão do Bananal. Da mesma forma, avulsões dos canais fluviais, relacionadas à atividade neotectônica, também têm sido descritas em diferentes rios da bacia amazônica, tais como: Solimões, Moa, Beni ou Ipixuna (Valente & Latrubesse 2012a).
Unidades da planície aluvial
No trecho de aproximadamente 200 km entre Registro do Araguaia e Cocalinho, Bayer (2002) identificou três unidades geomorfológicas na planície aluvial do rio Araguaia, que incluem a planície (atual) de bancos acrecionados;planície dominada por paleomeandros e planície com escoamento impedido (Figura 2).
Unidade 1. Planície (atual) de bancos acrecionados
A unidade denominada por planície de bancos acrecionados representa um grande volume de sedimentos arenosos que são remobilizados periodicamente. Trata-se de uma superfície suavemente ondulada, composta por bancos arenosos, frequentemente de forma elipsoidal, depositados durante a fase final de cada ciclo de águas altas, que se acrecionam lateralmente conformando uma superfície ou plataforma arenosa inundável (Bayer 2002, 2010; Bayer & Zancopé 2014).
Na época de cheia, essa faixa alongada com escassos ressaltos topográficos, mais ou menos estreita,que acompanha ao canal na maior parte do seu percurso, é parcialmente coberta pelas águas e substancialmente modificada por processos de erosão e sedimentação (Bayer 2002). A superfície parcialmente inundada é cortada por pequenas correntes (chute channel), que remobilizam parte dos sedimentos para as depressões situadas entre os bancos de areias. Nessas depressões, acumulam-se delgadas espessuras de material mais fino, geralmente mais escuro (silte-argilas), e restos orgânicos em decomposição, que possibilitam a ocorrência dos primeiros estágios da sucessão vegetal denominada “pioneira”, composta principalmente pela associação de gramíneas baixas (Bayer 2002, 2010; Bayer & Zancopé 2014).
Unidade 2. Planície dominada por paleomeandros
Esta unidade ocupa uma posição intermédia entre a planície de bancos acrecionados e aquela com escoamento impedido. Dessa maneira, comporta-se como uma divisória entre os depósitos arenosos e de alta energia, associados à dinâmica do canal principal e aos depósitos mais finos (silte e argila) de inundação, gerados pela decantação dos sedimentos em áreas distantes do canal principal.
Representa a unidade com maior participação areal na planície. Dominada pela predominância de morfologia de espiras de meandros, a unidade está caracterizada por uma topografia irregular com crestas e depressões de até 2 m de altura relativa. Em alguns trechos, a sua superfície mostra o alinhamento paralelo de crestas e depressões curvas e de escassa profundidade, geradas pela migração dos depósitos de barras em pontal (point bar) nas curvas do canal (Bayer 2002, 2010).
Na sua composição predominam depósitos arenosos de canal na base dos perfis, sendo que a parte superior está composta por uma maior proporção de sedimentos finos e matéria orgânica, que geram pacotes maciços de areias finas, siltes e argilas parcialmente bioturbados, de até um metro de espessura, produzidos por acreção vertical, em regimes de fluxo de baixa energia. Essas características somadas ao fato de que raramente são afetadas pelas enchentes, devido à maior cota relativa, promovem a instalação de uma espessa cobertura vegetal de grande porte (Bayer 2002, 2010).
A migração lateral do canal, na fase meandrante do Araguaia, conduziu à formação dessa unidade, com idades próximas aos 4.000 anos AP (termoluminescência), cujos processos de sedimentação e evolução das morfologias, a ela associados, podem ser identificados como migração das curvas de meandros à jusante, que geram a deposição de barras em pontal, formando lineamentos curvos com crestas e depressões (afiliadas ao desenvolvimento de lagos do tipo espiras de meandro), e o abandono de canal por corte de meandros que evoluem para lagos em crescente (oxbow lake), muito frequentes nessa superfície (Bayer 2002, 2010).
Unidade 3. Planície de inundação com escoamento impedido
As planícies de inundação com escoamento impedido apresentam grande expressão em todo o trecho analisado e ocorrem em ambas as margens como faixas descontínuas, ocupando os setores externos da planície aluvial, distantes da influência direta do canal principal. De acordo com a posição e a relação que apresentam com os outros elementos constituintes da planície, pode-se considerar essa unidade como a mais antiga das reconhecidas (Bayer 2002).
Essa unidade se constitui em uma área aplanada, ocupando uma posição topográfica mais baixa do que as demais da planície. Está caracterizada pela grande quantidade de lagoas, pântanos e canais menores abandonados. Os canais menores são ativos somente durante o período de águas altas (ao início e final das inundações) e geralmente permanecem desconectados do canal principal e das lagoas interiores o resto do ano. Algumas dessas lagoas constituem o produto do bloqueio do vale tributário pela planície do canal principal (Bayer 2002).
Considerando que, no passado, o rio Araguaia exibia um padrão do tipo meandrante, os sistemas de drenagem de seus afluentes, que entravam na planície, estabeleciam conexões diretas com o canal principal. Ao longo do tempo, esses pequenos canais foram sendo bloqueados devido à acreção vertical da planície de meandros. Assim, o bloqueio do sistema de drenagem interno dessa unidade ficou confinado topograficamente em um nível mais baixo em relação à planície do antigo canal (Bayer 2002).
O rio, a bacia e os sítios arqueológicos
Até o momento, de acordo com o Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos, existem 174 sítios arqueológicos cadastrados na bacia hidrográfica do rio Araguaia nos estados de Goiás e Mato Grosso, compreendendo sítios de superfície e em abrigos, tanto de grupos de caçadores e coletores quanto de agricultores e ceramistas, que resultam de projetos de pesquisas acadêmicas e de arqueologia preventiva. Neste artigo, são abordados, prioritariamente, os sítios inseridos ou próximos à planície aluvial e aos terraços, seguindo o recorte estabelecido para a publicação, centrado na relação entre os sítios e os rios.
Desses sítios, 71 situam-se na planície aluvial e nos terraços do rio Araguaia (caso do sítio Cangas I) e de afluentes ou próximos, na encosta inferior (caso do sítio Lago Rico). Além desses, optou-se pela apresentação de sítios arqueológicos localizados fora da planície aluvial e dos terraços, especialmente em relação aos aspectos da cultura material e da cronologia deles.
Considerando as questões relacionadas à dinâmica fluvial, também são abordados alguns dos sítios próximos à planície aluvial e aos terraços, uma vez que a proximidade os insere em um contexto relacionado com o sistema fluvial. Dessa forma, foram estabelecidos dois padrões principais de distribuição dos sítios na paisagem: aqueles que margeiam o canal do rio Araguaia, as planícies e os terraços; e os circunvizinhos do rio ou de seus afluentes.
No primeiro caso, alguns sítios encontram-se sob o impacto da erosão hídrica, com acúmulo de sedimentos e material orgânico, em decorrência dos transbordamentos do rio Araguaia, como o sítio arqueológico Cangas 1. Nessa situação, alguns sítios cadastrados em Goiás e no Mato Groso apresentam padrões semelhantes, com desnível médio da ordem de 2,5 m em relação ao canal, além da presença de material cerâmico e de vasilhames, geralmente fragmentados e frequentemente impactados por atividades da agropecuária, urbana e de erosão hídrica. A maior parte dos sítios apresenta o horizonte de ocupação com profundidade média de 0,80 m. Corresponde aos sítios condicionados pela dinâmica do rio Araguaia, sendo que muitos deles estão preservados ou pouco impactados, devido aos afloramentos do nível conglomerático basal laterizados da Formação Araguaia, unidade terciária contendo sedimentos mal selecionados e inconsolidados de coloração variando entre amarelo e castanho-avermelhado (Moreira et al. 2008), localmente chamados por cangas ou cangas lateríticas, que sustentam os terraços.
No segundo caso, estão incluídos alguns sítios próximos à planície aluvial e aos terraços do rio Araguaia, principalmente sobre a Formação Araguaia ou rochas do embasamento, ou ainda planície aluvial e terraços, ou junto a elas, de afluentes do rio Araguaia. Esses tributários apresentamordem diversificada, conforme hierarquização de Strahler (1952), como é o caso do sítio Lago Rico, localizado basicamente na encosta inferior na margem esquerda do rio do Peixe, município de Aruanã, Goiás. A proximidade desses sítios com a planície aluvial e os terraços, seja do rio Araguaia, seja de seus afluentes, resulta em um ambiente em que o rio, a planície e os terraços representam elementos importantes na dinâmica dos grupos humanos. Considerando esses elementos, a proposta é de uma abordagem ampliada em que o rio Araguaia e seus afluentes configuram uma unidade de pesquisa analisada sob a perspectiva da ocupação humana pré-colonial.
Dessa forma, os sítios arqueológicos pré-coloniais, situados na ampla unidade de análise considerada acima, em sua maioria, estão cadastrados no Instituto Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). A tabela 1 apresenta os 39 sítios elencados no estado de Goiás e a tabela 2 mostra os 32 sítios arqueológicos catalogados no Mato Grosso.
O registro de sítios arqueológicos na bacia do rio Araguaia compreende dois momentos significativos. O primeiro incluiu a região do vale do Araguaia, quando foram cadastrados 72 sítios arqueológicos até a década de 1980, por meio do Projeto Alto Araguaia, iniciado em 1972 (Martins 1993; Oliveira & Viana 1999-2000).
Os primeiros oito sítios arqueológicos (GO-JU-17, GO-JU-18, GO-JU-19, GO-JU-20, GO-JU-21, GO-JU-22, GO-JU-23, GO-JU-24) foram classificados como pertencentes à Tradição Uru, fase Aruanã, todos no município de Britânia (Schmitz et al. 1982). Segundo Oliveira (2009), a fase Aruanã foi definida pela representação desses oito sítios localizados em uma microrregião no baixo rio Vermelho. Para efeito de normatização, optou-se por utilizar preferencialmente a classificação por tradições. Schmitz et al.(1982) obtiveram duas datas radiocarbônicas para esses sítios, sendo 760+/˗75 anos AP (SI-2773), para o GO-JU-17, e 690+/˗ 70 anos AP (SI-2772), para o GO-JU-23.
Ainda em relação ao Projeto Alto Araguaia, Wüst (1975) estudou o sítio cerâmico GO-JU-41 que recebeu o nome de sítio arqueológico Patrimônio de Aruanã, por se tratar de uma antiga aldeia Karajá, associada à Tradição Uru, localizada a 500 m ao norte da sede municipal de Aruanã.
Barbosa (1985) cadastrou os 10 sítios arqueológicos identificados pelo Projeto Ilha do Bananal, todos cerâmicos e filiados à Tradição Uru, no município de São Miguel do Araguaia,época em que Tocantins ainda não havia sido criado, o que ocorreu em 1988. Atualmente, a ilha pertence ao estado tocantinense, mas como também se encontra próximaa Mato Grosso e a Goiás e está plenamente relacionada com o recorte do texto, optou-se por incluí-la na discussão. De acordo com o autor, o sítio IB-05 foi considerado como uma possível aldeia, sendo que alguns sítios foram objeto de coleta superficial (IB-03, IB-04, IB-06, IB-07 e IB-08), enquanto em outrosnão foram coletados vestígios culturais (IB-01, IB-02, IB-09 e IB-10).
Barberi-Ribeiro (1988) elencou 19 sítios arqueológicos próximos às nascentes do rio Araguaia, sendo 13 no município de Doverlandia, cinco em Mineiros e um em Portelândia, dos quais 10 sítios localizados em abrigos (com presença de manifestações rupestres) e nove em superfície predominantemente lito-cerâmico. De acordo com Schmitz et al. (2004), foi obtida uma datação de 2.500 anos AP para a ocupação pré-cerâmica no sítio GO-CP-46 e 1.420 +/- 70 anos AP e 850 +/-60 anos AP para horticultores da Tradição Uru, não especificando para quais sítios.
O segundo momento iniciou nos anos 2000, com projetos acadêmicos e de arqueologia preventiva. O projeto[2] desenvolvido por Telles & Silva (2006) é responsável por cadastrar quatro sítios arqueológicos (Cangas I, II, III e IV), o qual iniciou as escavações no sítio Cangas I, identificado pelos autores como um sítio lito-cerâmico de superfície, situado no terraço fluvial do rio Araguaia. Os sítios Cangas II, III e IV não foram objeto de qualquer tipo de intervenção arqueológica ou coleta de material. A escavação do sítio Cangas I teve continuidade a partir de 2007 com o projeto acadêmico[3] desenvolvido pelo Laboratório de Geoarqueologia[4] até o ano de 2012 (Rubin 2007), cujos resultados são apresentados mais adiante.
No ano de 2012, um novo projeto acadêmico[5]deu continuidade à pesquisa na bacia hidrográfica do rio Araguaia (Rubin et al. 2013), no sítio arqueológico Lago Rico, identificado por Marcos (2011). Os resultados dessa pesquisa também estão apresentados na sequência do texto. Em relação às pesquisas de arqueologia preventiva, alguns projetos se destacam na identificação e escavação de sítios arqueológicos, citados na sequência.
A Fundação Aroeira (2012) identificou e cadastrou 10 sítios arqueológicos, sendo nove pré-coloniais, dos quais oito são lito-cerâmicos (Unha-de-Gato, Toufic, Laterita, Buritis, Louro José, Núbia, Lobete e Complexo Arqueológico das Bacias) e um cerâmico (Morcego), além de um sítio histórico (Cerradão). O Complexo Arqueológico das Bacias é constituído pelos sítios Tinta Fresca, Saúvas Queimadas, Abrigo das Bacias, Abrigo do Armário e Bacias para Parede e vice-versa. No Complexo, foram identificadas pinturas e gravuras rupestres; obtidas datações por LOE entre 547 anos AP (Toufic) e 212 anos AP (Abrigo das Bacias).
No relatório da Fundação Aroeira (2012), verificaram-se análises da cerâmica ainda não concluídas e que apenas os sítios Toufic e Laterita puderam ser associados à Tradição Uru. Cabe ressaltar que as escavações dos sítios Núbia e Lobete tiveram continuidade pela própria Fundação, pelo projeto intitulado Levantamento, Monitoramento, Resgate Arqueológico e Educação Patrimonial na Rodovia BR-070/GO (Fundação Aroeira 2015).
O relatório do Projeto de Levantamento, Resgate e Monitoramento Arqueológico e Educação para o Patrimônio da Obra de Implantação e Pavimentação Na RodoviaBR-080/GO,realizado no ano de 2014, indica que foram escavados os sítios arqueológicos São Miguel do Araguaia I, São Miguel do Araguaia II, São Miguel do Araguaia III, São Miguel do Araguaia IV, Pintado, Bonópolis I, Bonópolis II, Serrinha e Pato (Fundação Aroeira 2015).
Os sítios São Miguel do Araguaia I, II, III e IV são caracterizados como lito-cerâmicos de superfície, sendo que o último foi associado à Tradição Uru. As análises realizadas nos sítios arqueológicos Bonópolis I e II, São Miguel do Araguaia I, II e IV, Pintado, Pato e Serrinha indicaram que a cultura material apresenta semelhança com a Tradição Uru. O sítio arqueológico Serrinha está caracterizado como sem localização definida. Obtiveram-se cronologias por LOE entre 411 anos AP (Sítio São Miguel do Araguaia II) e 216 anos AP (São Miguel do Araguaia I) (Fundação Aroeira 2015).
O projeto de arqueologia preventiva, intitulado Levantamento, Monitoramento, Resgate Arqueológico e Educação Patrimonial, na Rodovia BR-070/GO, resultou na escavação e no cadastro dos sítios Lobete, Núbia (oriundos de outro projeto, como já mencionado), Aragarças I e Jussara I. Os sítios pré-coloniais Lobete e Jussara I foram caracterizados como cerâmicos de superfície e os sítios Núbia e Aragarças I como lito-cerâmicos também de superfície. No sítio Aragarças I, não ocorreram atividades de resgate, em virtude da negativa por parte do proprietário da área (Fundação Aroeira 2015).
A Zanettini Arqueologia (2005) identificou 12 sítios arqueológicos no município de Alto Horizonte, sendo 11 lito-cerâmicos, denominados por Jenipapo, Juquira, Baco-Parí I, Baco-Parí II, Três Meninas, Alto Horizonte, Rio dos Bois, Tapiocanga, Tonalito I, II e III, e um cerâmico chamado Capoeira, predominantemente associado à Tradição Uru, porém, com presença de cerâmica das tradições Aratu e Tupiguarani. Os sítios Jenipapo, Juquira, Baco-Parí I, Baco-Parí II, Três Meninas e Alto Horizonte foram interpretados como aldeias, os sítios Rio dos Bois e Tapiocanga como acampamentos sazonais e os sítios Tonalito I, II e III e Capoeira como acampamentos temporários associados a atividades específicas.
Apresentaram-se duas datações radiocarbônicas: uma para o sítio Baco Pari I (1870+/˗60 anos AP) e outra para o sítio Juquira (1540+/˗ 60 anos AP). A primeira está relacionada aos sítios de caçadores-coletores. Para a segunda foram estabelecidas algumas considerações, como a cronologia, uma vez que é mais recuada do que as que se conhece para a Tradição Uru, século XI. Chama a atenção também para possíveis reocupações da área e que no sítio Juquira obteve-se uma datação mais recente por TL, em área diferente da radiocarbônica. Para o sítio Jenipapo, as cronologias por TL foram de 525 +/- 30 anos AP e 300 +/- 20 anos AP (Zanettini Arqueologia 2005).
Os sítios arqueológicos identificados na planície aluvial e nos terraços do rio Araguaia, no estado do Mato Grosso, foram descritos, a partir do Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos do IPHAN, que apresenta normalmente poucas informações. De acordo com os registros, ocorre na planície aluvial/terraço um sítio com pintura rupestre (Centopéia) e um com gravuras (MT-GA-02), além de dois sítios cerâmicos de antigos cemitérios Karajá, conhecidos por Aldeia e Barreira dos Karajá. Telles & Silva (2006) se reportam aos sítios cerâmicos de superfície Globo, localizado a 5 km da Cidade de Cocalinho, e Três Luas, associados à Tradição Uru.
Durante a implantação da PCH Lajari, identificaram-se os sítios arqueológicos Lajari 01, Lajari 03, Lajari 04, Bela Manhã, Barreira do Djahú, Velha, Sr. Messias e Manoel Martins, descritos nas fichas do banco de dados do IPHAN como sítios cerâmicos. Os sítios Lajari 06 e Lajari 07 como lito-cerâmicos e o sítio Lajari 02 correspondem a um afloramento de arenito, disposto sobre o leito de um córrego, onde foram encontradas algumas lascas se constituindo em uma possível área de obtenção de matéria prima, segundo o cadastro do IPHAN.
No quadro com o registro dos sítios no estado do Mato Grosso, constam também os sítios identificados pelas siglas MT-GA-01, MT-GA-03, MT-MR-01, MT-MR-02, MT-MR-03 e MT-MR-04, caracterizados como lito-cerâmicos de superfície, associados a áreas de possíveis habitações. Os registros contemplam os sítios de superfície cadastrados como TELPI-01, TELPI-02, TELPI-03A, TELPI-03B e TELPI 04, que apresentam fragmentos de rocha lascada. O sítio registrado como SE-Ribeirãozinho corresponde a uma área de obtenção de matéria prima (CNA, 2018).
A figura 3 apresenta alguns dos sítios arqueológicos associados à Tradição Uru no estado de Goiás e na bacia hidrográfica do rio Araguaia, distribuídos predominantemente em duas áreas, o que pode ser resultado do maior número de pesquisa, principalmente de Arqueologia Preventiva. Também se deve considerar que o Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos do Centro Nacional de Arqueologia/IPHAN não estava atualizado na data da consulta.
Dos 29 sítios identificados como inseridos na planície aluvial e nos terraços do rio Araguaia e de tributários no estado de Goiás (rios do Peixe, Vermelho e Crixás-açu) (Tabela 1), inseriram˗se no mapa apenas 17, sendo 16 com coordenadas e um sem, o Cemitério Karajá[6]. Os demais sítios não foram registrados, em decorrência de falta de informações. Alguns sítios nas proximidades da planície aluvial e dos terraços (parte do grupo em vermelho) podem estar inseridos na planície. Entretanto, as informações disponíveis, em algumas situações, não permitem definir a localização exata deles. Por outro lado, há sítios claramente localizados em interflúvios e vertentes, evidenciando a distribuição espacial dessa tradição. Para o estado do Mato Grosso, catalogaram-se apenas três sítios: Globo e Três Luas, que apresentam coordenadas, e Antigo Cemitério Karajá de São Félix do Araguaia. A distribuição dos sítios com coordenadas pode ser evidenciada na figura 3.
Sítio arqueológico Cangas I
O sitio arqueológico lito-cerâmico Cangas I encontra-se em um terraço aluvial na margem direita do rioAraguaia (UTM 22L 8384780N/499330E), local em que se situa o Hotel das Cangas, em área de pesquisacoordenada por Rubin (2007), onde foram delimitadas e escavadas a Unidade de Escavação 1 (UE-1) e aUnidade de Escavação 2 (UE-2) com respectivamente 16 m² (escavados 10m²) e 100 m² (escavados 51m²) de área superficial. Lima (2011) delimitou a área do sítio em 80.000 m2, a partir de uma prospecção sistemática.Posteriormente,encontram-sefragmentos de cerâmica fora da área delimitada pelo autor, o que permite aventar a hipótese de uma área da ordem de 150.000 m2. O sítio foi identificado e cadastrado por Telles & Silva (2006), que escavaram um segmento em processo de destruição pela dinâmica do rio Araguaia. Nessa ocasião, realizaram 14 sondagens de 1 x1 m, além de um poço-teste de 1 x 1 m de onde retiram 432 fragmentos de cerâmica, 33 peças líticas e fragmentos de ossos humanos. A área do sítio (Figura 4) também foi impactada pelas atividades relacionadas ao hotel. O terraço, no qual se encontra o sítio arqueológico, apresenta um desnível de 5 a 6 m em relação à cota mais baixa do rio Araguaia, expondo um perfil natural que permite a identificação de diferentes unidades estratigráficas (Rosa 2009).
A ocupação da área e os impactos naturais e antrópicos resultaram na estruturação de uma unidade superficial de coloração predominantemente marrom (10 YR 5/3), com granulometria variada e presença de rejeitos atuais, tais como: metal, vidro e plástico, além da cultura material pré-colonial, sotoposta aos sedimentos de coloração destacadamente amarelada da Formação Araguaia que constitui a base da sequência (Rosa 2009; Melo 2009; Lima 2011; Rubin et al. 2009; Rubin & Silva 2010). A figura 4 apresenta também a delimitação aproximada do sítio (Lima 2011), onde se encontram ressaltadas as áreas com vegetação que foram prospectadas e evidenciaram escassa existência de vestígios culturais pré-coloniais.
A partir dos resultados da pesquisa de Telles & Silva (2006) e do estado de conservação do sítio, optou-se pela escavação de uma unidade em área notadamente impactada pela erosão fluvial e antrópica (UE-1) e de outra menos impactada e mais afastada do rio (UE-2). A UE-1 de 16 m2 foi subdividida em quadrículas de 1 m2 e escavada por níveis artificiais que variaram entre 0,10 m, 0,20 m e 0,50 m. Essa última especificamente nos sedimentos da Formação Araguaia, em decorrência principalmente do fato de terem sido encontrados materiais contemporâneos até 0,40 m (Rosa 2009; Melo 2009). Escavaram-se 10 quadrículas (Figura 5), sendo que a 3,5 m de profundidade (quadrícula 2A) foi alcançado o nível conglomerático da Formação Araguaia.
A UE-2 prevista para 16 m2 foi ampliada para 100 m2, devido à frequência e às concentrações de cerâmica pré-colonial. A escavação realizou-se por níveis artificiais de 0,10 m, totalizando 51 quadrículas de 1 m x 1 m com profundidades entre 0,10 e 4,0 m (Figura 6A). Essa unidade caracterizou-se pelas concentrações de cerâmica (área de aproximadamente 35 m2 delimitadas pelas linhas 1 e 5 e colunas B e F), estruturas de combustão (delimitadas nas quadrículas 1A, 1B, 2A e 2B) e marcas de esteios (quadrícula 5D entre 0,20-0,40 m de profundidade e quadrícula 5F entre 0,40-0,50 m de profundidade) (Figuras 6 B, C y D).
Ela apresentou também alguns fragmentos líticos semelhantes aos encontrados na UE-1, mais tarde descartados, conforme tratado mais adiante, raros ossos da fauna local e material contemporâneo, como plástico, vidro e metal. O nível laterítico foi alcançado a 3,6 m de profundidade, de forma descontínua e menos espesso do que na UE-1, conforme destacaram Rosa (2009), Melo (2009) e Rubin et al. (2009).
A partir das escavações realizadas nas UE-1 e UE-2 e dos dados provenientes de Rosa (2009), foram identificadas quatro camadas estratigráficas que caracterizam as duas unidades de escavação. A estratigrafia da UE-2, mais precisamente a camada A e a Formação Araguaia, além dos processos de bioturbação são semelhantes à da UE-1. Entretanto, a camada B não se faz presente na UE-2, o que pode ser consequência deprocessos erosivo-deposicionais relacionados principalmente ao rio Araguaia ou mesmo aos processos geoquímicos (Figuras 6B, C y D).
A camada A, mais superficial, apresenta coloração entre cinza muito escuro (5 Y 3/1) e marrom acinzentado muito escuro (2,5 YR 3/2), com base em Cailleux (1948), e espessura entre 0,15 m e 0,90 m (quando associado a estruturas de combustão). Foi interpretada como solo antrópico pela coloração e associação com a cultura material (Rosa 2009). Posteriormente, complementando a caracterização da camada, identificaram-se lentes de cores cinza (10 YR 5/1 e 10 YR 6/1) e marrom (10 YR 5/3). Quanto à composição mineralógica, predomina quartzo hialino com bom arredondamento e esfericidade, destacando-se também fragmentos de rocha e de concreções ferruginosas, além de pedaços de raízes e folhas. A granulometria apresentou-se entre silte e areia muito fina e fina, com alguns grãos de areia muito grossa, além de grânulos de concreções.
A camada B foi subdividida em B1, com coloração entre marrom acinzentado escuro (2,5 YR 4/2), cinza claro (5 Y 7/1) e castanho claro (10 YR 6/3), e em B2, com as cores da anterior, acrescidas de marrom amarelado claro (2,5 Y 6/4), possivelmente em decorrência do contato com a Formação Araguaia. A espessura varia entre 0,45 m e 0,97 m com mineralogia semelhante à camada A, sendo que, além dos grânulos de concreções, constaram-se alguns fragmentos de arenito. A camada B1 apresenta granulometria silte grosso (Rosa 2009) e a B2 variando entre silte grosso e areia fina, com algumas lentes de areia média. Observaram-se também lentes e nódulos de óxido de ferro marrom escuro (10 YR 4/3 e 7,5 YR 4/2).
A camada C mostra coloração entre amarelo claro (2,5 Y 9/4), cinza claro (5 Y 7/1) e amarelo avermelhado (5 YR 6/6), e espessura entre 2,23 m e 2,45 m. A camada D com cores entre amarelo claro (2,5 Y 9/4) e amarelo (5 Y 9/8) (Rosa 2009). Nessa camada, ainda foram identificados segmentos marrons avermelhado claro (5 YR 6/4), amarelo avermelhado (5 YR 5/8), marrom (7,5 YR 5/4) e cinza (2,5 Y 6/0).
As camadas C e D correspondem à Formação Araguaia. São constituídas basicamente de quartzo com alto arredondamento e esfericidade e granulometria, variando entre silte e areia média, com presença de grânulos de concreções ferruginosas, além de um processo de laterização acentuado (Rosa 2009).
Quanto aos vestígios culturais, predominantemente cerâmicos, foram constatados na camada A, enquanto as estruturas de combustão foram identificadas e registradas nas paredes, alcançando até a camada B, intermediária entre a Formação Araguaia e a camada de ocupação. De acordo com Rosa (2009), na camada A, verificaram-se a presença de ossos da fauna local, material lítico (21 peças), além de material histórico e contemporâneo. Certificaram-se também 505 fragmentos de cerâmica, sendo 44 bordas, com antiplástico predominantemente composto por cariapé B e cauixi, esse último em menor quantidade.
Ponderando variáveis como distribuição vertical e horizontal dos fragmentos de cerâmica, a ação antrópica, os processos erosivos, a área de escavação correspondente a 10 m2 e suas limitações, Rosa (2009) apresenta também três hipóteses e considerações sobre o contexto da UE-1. Uma abordagem considera que
[...] os artefatos pré-históricos foram retirados de pontos distintos do sítio arqueológico por ações antrópicas contemporâneas e depositadas juntamente na área da sondagem. Uma segunda interpretação considera que ocorreram dois ou mais momentos de deposição distinta de artefatos pré-históricos, também relacionados a ações antrópicas contemporâneas e em uma terceira concepção a área de sondagem 1 corresponde a uma área de descarte relacionada a um contexto sistêmico pré-histórico sucessivamente utilizada para tal fim. Nesse caso, o material arqueológico pré-histórico consistiria ao que Schiffer denominou de refugo secundário (Rosa 2009, p. 85).
Outras informações inserem-se nas hipóteses formuladas por Rosa (2009), ampliando as variáveis utilizadas na caracterização da unidade, como as de Telles & Silva (2006). Eles encontraram fragmentos de ossos humanos próximos à UE-1, os quais poderiam estar relacionados com área de enterramento. Nesse sentido, aos 10 m2 da UE-1 podem ser adicionados os 15 m2 de Telles & Silva (2006), totalizando 25 m2, os quais resgataram 432 fragmentos de cerâmica, completando 937, cujas características são semelhantes àquelas apresentadas por Rosa (2009).
Quanto à cronologia do sítio Cangas I, foram obtidas datações, sendo três radiocarbônicas para amostras de carvão e três por Luminescência Oticamente Estimulada (LOE) em fragmentos de cerâmica, todas da UE-2, apresentadas na tabela 3. Para facilitar às discussões, as cronologias por LOE ajustaram-se para AP.
A amostra de carvão obtida a 0,60 m de profundidade na estrutura de combustão das quadrículas 1A, 1B, 2A e 2B foi datada por 14C em 610 +/_30 anos AP, enquanto a datação por LOE em fragmento de cerâmica da mesma quadrícula, posicionada a 0,50 m de profundidade, apresentou uma datação de 284 +/_ 40 anos AP, indicando um intervalo de aproximadamente 330 anos em um desnível de 0,10 m.
As datações radiocarbônicas das quadrículas 3E e 1F, ambas obtidas na profundidade de 0,50 m, apresentaram datas de 460+/_ 30 anos AP (1F) e 570+/_30 anos AP (3E), caracterizando uma diferença de 110 anos. As datações por LOE, nas mesmas quadrículas e profundidades, foram de 244+/_ 40 AP (1F) e 234+/_ 30 anos AP (3E), portanto, uma diferença de 10 anos, além de mais recentes do que as fornecidas pelo método radiocarbônico.
Em relação às cronologias mencionadas acima, nas quadrículas 3E e 1F, estão associados a 0,50 m de profundidade dois conjuntos cronológicos distintos. As datações radiocarbônicas indicam 460+/_30 anos AP (1F) e 570+/_30 anos AP (3E), evidenciando uma diferença de 110 anos. Aquelas por LOE apontam 244+/_ 40 AP (1F) e 234+/_30 anos AP (3E), diferença de 10 anos. A diferença mais acentuada se apresenta nas radiocarbônicas, sendo praticamente inexpressivas nas obtidas por LOE. Considerando as cronologias médias de cada conjunto, a disparidade é de 276 anos.
Quanto às quadrículas 1A, 1B, 2A e 2B, o intervalo de tempo entre as cronologias obtidas por diferentes métodos pode ser interpretado e relacionado a distintos momentos de ocupação. Por outro lado, as cronologias e as considerações, apresentadas para as quadrículas 3E e 1F, indicam intervalos que podem estar associados a diferentes ocupações, perturbações na estratigrafia em decorrências dos fatores naturais e antrópicos que afetaram o sítio ou em consequência dos métodos de datações utilizados. Essa hipótese é reforçada pelo fato de que as três datas por LOE encontram-se em uma faixa temporal muito próxima, com 50 anos de distância entre elas.
Com base na cronologia, a UE-2 apresenta dois momentos de ocupação, sendo que as estruturas de combustão sustentam hipóteses relacionadas com as atividades específicas. Entretanto, não foram encontrados restos alimentares em contexto, ao contrário da UE-1. Os sentidos e os ângulos de mergulhos nos fragmentos de cerâmica não indicam um padrão definido e as marcas de esteios apontam para possíveis estruturas de moradiasque podem estar relacionadas a ocupações mais recentes.
Contextualizando as variáveis apresentadas, três hipóteses podem ser formuladas, mesmo considerando o fato de que a área de escavação representa 0,06% da área do sítio, com base na delimitação apresentada por Lima (2011):
1. A unidade abrange diferentes momentos de ocupação, sendo a mais recente representada pela concentração de cerâmica, possível área de descarte, evidenciada nas figuras 6B-D, e doméstica pelas estruturas de combustão;
2. Compreende as mesmas argumentações da hipótese anterior considerando que as estruturas de combustão associadas à concentração superficial não se preservaram, devido à ação antrópica ou mesmo pelo fato de que a unidade de escavação não a identificou;
3. As marcas de esteios indicam antigas áreas domésticas e estão associadas à concentração superficial de cerâmica.
As hipóteses acima, assim como aquelas estabelecidas para a UE-1 por Rosa (2009), são preliminares, uma vez que para o pleno desenvolvimento da abordagem seria necessária uma análise espacial da distribuição da cultura material, resultante de uma escavação por superfície ampla ou uma análise intra-sítio, o que não constituía objetivo do projeto.
Em relação à cultura material, das 4500 peças cerâmicas recuperadas, foram analisadas 227 por Melo (2009), sendo 141 bordas, 85 bases e um apêndice, que apontou também para as limitações das conclusões, em decorrência dessa triagem, associando o material com a Tradição Uru, definida por Schmitz et al. (1982).
Sítio arqueológico Lago Rico
O projeto Escavação do sítio arqueológico Lago Rico (UTM 8341393N/519055E), interflúvio dos rios Araguaia e Peixe, Nova Crixás/Goiás (Rubin et al. 2013), permitiu a delimitação do sítio em 360.000 m2, onde foram escavadas três unidades de 25 m2 (UE-1, UE-2 e UE-3) (Figura 7).
Em relação ao contexto geoarqueológico da área, constatou-se uma migração do canal do rio do Peixe naplanície aluvial,identificadaem campo assim como na análise de imagens de satélite (Silva 2015; Muniz 2016; Rubin & Silva 2016). Esse comportamento indica distintas estruturações da paisagem, ao longo do tempo,diferentes formas de apropriação dessa paisagem pelo homem pré-colonial, assim como dos contextos arqueológicos que envolvem o sítio Lago Rico.
No sítio Lago Rico, foram realizadas quatro etapas de campo. Na etapa 1, foi executada a delimitação do sítio, por meio de Prospecção Superficial Visual (PSV), conforme sugerida por Renfrew & Bahn (1998) e Bicho (2006). Nas etapas 2, 3 e 4, foram realizadas as escavações das unidades, que consistiram em áreas de 25 m², subdivididas em 25 quadrículas de 1 m², as quais receberam nomenclaturas alfanuméricas (Figuras 8A e B).
Na UE-1, utilizou-se o método de decapagem prioritariamente por níveis naturais, com presença de vestígios culturais até 0,20 m de profundidade. Nas UE-2 e UE-3, adotou-se a técnica de escavação por níveis artificiais de 0,10 m, sendo evidenciados vestígios culturais até 0,40 m de profundidade na UE-2 e até 0,30 m de profundidade na UE-3. Nas três unidades, registraram-se a predominância de fragmentos cerâmicos e uma arqueoestratigrafia apresentando basicamente três camadas, sendo as duas primeiras visivelmente relacionadas às atividades agrícolas desenvolvidas na área nos últimos 20 anos. Os dados e as informações apresentados e relacionados com a arqueostratigrafia do sítio estão fundamentados em Barbosa (2015) e Ribeiro-Freitas (2017).
O objetivo da variação metodológica foi a identificação de uma possível continuidade horizontal e vertical. Wheeler (1954) menciona que toda escavação horizontal deve ser precedida de cortes verticais (Figuras 9 e 10).
A análise das unidades de escavação possibilitou a definição de três camadas. A camada A superficial apresenta em amostra seca uma coloração predominantemente marrom escura (7,5 YR 4/2), enquanto as úmidas evidenciam cores entre marrom acinzentado (10 YR 3/2) e vermelho escuro (2,5 YR 3/2). Na camada B, as amostras secas variam entre marrom escuro (7,5 YR 4/4) e marrom (7,5 YR 5/2), enquanto as úmidas exteriorizam coloração entre marrom escuro (7,5 3/2 YR 3/2) e marrom acinzentado levemente escuro (10 YR 3/2). A camada C, de pouca expressão no perfil da figura 9, exibe cor predominantemente amarelo claro (2,5 Y 7/4, sendo que, nessa camada, apareceram alguns fragmentos (areia muito grossa e grânulos) de gnaisses, que podem estar relacionados com a rocha do embasamento, conforme mapa geológico de Moreira et al. (2008).
As camadas arqueoestratigráficas foram caracterizadas com base na textura, espessura, coloração, estruturas sedimentares e vestígios culturais, além da presença de bioturbações (Tabela 4). As análises físico-químicas das amostras de solos evidenciaram uma alta concentração de fósforo total, o que pode estar relacionada com a ocupação da área. Essa confirmação ainda está em estudo, assim como as investigações palinológicas.
Os perfis evidenciaram pouca variabilidade em relação à coloração e à textura, assim como a destacada bioturbação. Apesar de o sítio se localizar em uma vertente de baixa declividade e comprimento médio de 2 km, identificaram-se processos erosivos de pequeno porte como sulcos, pouco visíveis, consequência da cobertura de gramíneas. O fato de não terem sido identificados esses processos nos perfis pode estar relacionado com a bioturbação, que minimizou o efeito.
A variação da coloração da camada A para a camada B pode ser explicada pela incorporação de matéria orgânica das atividades agrícolas desenvolvidas na área nos últimos 50 anos. Em relação à variação de arredondamento e esfericidade dos grãos, uma das hipóteses trabalhadas é a de que, na camada A, o maior arredondamento pode estar condicionado ao maior transporte e a maior esfericidade, variável original dos grãos, a episódios de transbordamento do rio do Peixe que tenham alcançado a base da vertente. Por outro lado, os menores arredondamento e esfericidade da camada B podem estar relacionados com a proximidade da rocha alterada.
Para esse sítio, obtiveram-se somente datações por LOE em fragmentos de cerâmica, uma vez que não se encontrou carvão em contexto arqueológico. De acordo com a tabela 5, as datações obtidas em fragmentos de cerâmica evidenciam um conjunto mais antigo (534+/_ 35 AP e 484+/_75 AP) e uma data mais recente (254+/_35 AP), sugerindo dois momentos de ocupação.
Quando se comparam as cronologias dos sítios Cangas I e Lago Rico (tabelas 3 e 5 respectivamente), é possível constatar que as datações mais recentes obtidas por LOE para o sítio Cangas I (234+/_30 anos AP, 284+/_40 anos AP e 244+/_40 anos AP) são próximas àquela data para o sítio Lago Rico (254+/_35 anos AP), e que a datação radiocarbônica do sítio Cangas I (460+/_30 anos AP) se aproxima das obtidas por LOE para o sítio Lago Rico (484+/_75 anos AP) e (534+/_ 35 anos AP).
A data radiocarbônica mais antiga encontra-se no sítio Cangas I atingindo 610+/_ 30 anos AP, bem como a mais recente de 234+/_30 anos AP. No sitio Lago Rico, a mais antiga de 534+/_ 35 anos AP e a mais recente de 254+/_35 anos AP situam-se entre as datas obtidas para o Cangas I (Figura 11). A partir desses dados, é possível aventar a hipótese de que os sítios foram ocupados concomitantemente, uma vez que as diferenças cronológicas entre os limites superior e inferior são de 20 e 70 anos respectivamente.
A planície aluvial e os terraços do rio Araguaia têm sido habitados há milênios por grupos de agricultores ceramistas que instalaram suas aldeias nos interflúvios e nas margens de drenagens. Essas constantes ocupações produziram um amplo e diversificado contexto arqueológico, em que a diversidade é representada por três grandes tradições ceramistas, que se distinguem entre si, tanto por aspectos tecnológicos quanto morfológicos, os quais servem como indicadores de escolhas culturais, alimentares e econômicas (Schmitz & Barbosa 1985; Robrahn-González 1996a, b, 1999; Silva et al. 2016).
A Tradição Aratu é associada a grupos que habitavam comumente terrenos próximos a encostas de morros e a áreas de cerrado aberto, preferencialmente nas bordas das planícies aluviais (Veroneze 1992). Caracterizam-se principalmente pela presença de vasilhames cerâmicos de formas ovoides e globulares, bases cônicas e arredondadas, manufaturados com uso de rolete e apresentando como antiplástico predominante o mineral quartzo (Schmitz & Barbosa 1985; Veroneze 1992).
A Tradição Tupiguarani se apresenta dispersa em quase todo território nacional, incluindo o Planalto Central brasileiro (Robrahn-González 1996a, b), onde está presente tanto em abrigos como em áreas abertas e nos horizontes mais recentes dos sítios arqueológicos (Fensterseifer & Schmitz 1975). A cerâmica é caracteristicamente acrescida de caco moído e modelada em formas abertas (tigelas, bacias, pratos ou assadores) e fechadas infletidas (jarros) (Schmitz & Barbosa 1985; Fensterseifer & Schmitz 1975). As decorações identificadas são normalmente engobo branco sob pinturas vermelhas e/ou pretas, com raros exemplares de decoração plástica, como corrugado e apliques zoomorfos, dentre outros (Schmitz & Barbosa 1985).
A Tradição Uru predomina na planície aluvial e nos terraços do rio Araguaia, tanto no estado de Goiás como no de Mato Grosso, e compreende os grupos agricultores que habitaram grandes aldeias localizadas próximas aos ambientes de matas, cerrados fechado e cursos d’água de primeira ou segunda ordem (Schmitz & Barbosa 1985; Robrahn-González 1996a, b). Para Robrahn-González (1996a, b), 21,8% dos sítios arqueológicos do Brasil Central seriam atribuídos à Tradição Uru, estando sua cultura material composta principalmente por vasilhames cerâmicos, produzidos a partir do uso de roletes, antiplástico cariapé (tipos A e B) e o espongiário cauixí (Schmitz & Barbosa 1985; Ortega 2016; Estrela 2017). As formas possuem bases planas e em pedestal, sendo característica a presença de assadores que, etnograficamente na bibliografia, estão associados ao processo de manipulação da mandioca brava (Schmitz & Barbosa 1985).Partindo-se da variabilidade de contextos cerâmicos arqueológicos presentes na planície e terraços do rio Araguaia, foi possível analisar os sítios Cangas I e Lago Rico, uma vez que a hipótese original considerava que ambos seriam originários da ocupação de um mesmo grupo.
Tradição Uru na planície aluvial e terraços do rio Araguaia/Goiás
A indústria cerâmica da Tradição Uru esteve presente na região do alto e médio curso do rio Araguaia, alto rio Tocantins, Goiás, e vale do rio São Lourenço, Mato Grosso, a partir do século XIII (Robrahn-González 1996a, b). A figura 12 apresenta sítios arqueológicos inseridos na planície aluvial e nos terraços ou próximos do rio Araguaia e de afluentes em dois núcleos, um no interflúvio dos rios Araguaia e Peixe e outro na sub-bacia do rio Crixás-açu. Essas concentrações de sítios podem indicar as relações entre ocupações permanentes e temporárias, reocupações ou mesmo preferências pelo ambiente, abordagem que ainda se encontra em aberto.
Com relação à origem e ao deslocamento de grupos filiados à Tradição Uru, a hipótese original considerava que os mesmos poderiam ser originados da Amazônia devido à presença não somente de aditivos vegetais à cerâmica, como também do antiplástico cauixi, que tem sido identificado nos vasilhames da Tradição Uru do centro-oeste do Brasil, como no caso dos sítios Lago Rico (Ortega 2016; Estrela 2017), São Miguel do Araguaia II, São Miguel do Araguaia IV e Serrinha (Fundação Aroeira 2015), Cangas I (Pereira 2010) e GO-JU-17 e 19 (Oliveira 2009). Entretanto, em pesquisas mais recentes, constatou-se que o espongiário cauixi pode ser identificado em lagoas e rios na região Centro-Oeste, o que não implicaria necessariamente a uma origem amazônica para a manufatura da cerâmica ou a escolha cultural do antiplástico (Batista & Volkmer-Ribeiro 2002). Nesse contexto, considera-se que o rio Araguaia poderia ter atuado como um elemento facilitador de locomoção, conforme já mencionado anteriormente.
A cerâmica do sítio Cangas I
O sítio arqueológico Cangas I apresentou uma variedade de materiais arqueológicos[7], predominando amplamente a cerâmica, com 3.244 fragmentos (Melo 2009; Rosa 2009; Pereira 2010). O material foi estudado tecnomorfológicamente, segundo considerações de autores clássicos da análise cerâmica como Rye (1981), Sheppard (1985), Orton (1991) e Chmyz (1976), resultando em dados que possibilitaram associar o referido sítio à Tradição Uru (Melo 2009; Rosa 2009; Pereira 2010).
O primeiro atributo observado foi o aditivo acrescido à cerâmica, a fim de torná-la menos plástica, para proporcionar a melhor manipulação, possibilitando compreender as opções culturais do grupo que ocupou esse sítio, bem como para buscar uma correlação cultural (Orton et al. 1991; Sheppard 1985). Nesse sentido, no material cerâmico do sítio Cangas I, observou-se a ocorrência de mineral, cariapé A, cariapé B, carvão, cauixi e espícula vegetal, os quais se distribuíram em 20 combinações distintas (tabela 6), com predominância do cauixi, em relação aos demais (Melo 2009; Rosa 2009; Pereira 2010).
Essa predominância poderia estar relacionada a diversos fatores, entre os quais a preferência cultural do grupo por esse tipo de aditivo, a disponibilidade dessa matéria prima no entorno, a aquisição facilitada e a presença natural desse aditivo na pasta cerâmica, ou seja, a própria argila natural já conteria cauixi (Pereira 2010). Esses fatores, por sua vez, poderiam estar relacionados entre si, hipótese possível de verificação, a partir da análise da composição das áreas de captação de recursos e sua comparação com o material cerâmico (Tite 2008; Santacreu 2014).
A técnica de manufatura majoritariamente observada foi por sobreposição de roletes (roletada), com alguns exemplares de produção modelada e por placas. As peças estão associadas a queimas predominantemente completas de coloração clara (entre bege e alaranjado) (46%) e incompletas (associação de faixas claras e escuras) (33%), contando com superfícies alisadas e, em raros casos, polidas (Melo 2009; Rosa 2009; Pereira 2010). Há pouca representatividade de peças com decoração (Figura 13), sendo que com base nas considerações de Chmyz (1976), essas foram agrupadas em escovado, ponteado, engobo, pintura, entalhado, marcado com corda, acanalado, inciso e inciso paralelo (Melo 2009; Rosa 2009; Pereira 2010).
Além das decorações, identificaram-se as marcas que possibilitam inferir a sua funcionalidade no contexto doméstico, tais como: esfumarado, tecido, dedos, cestaria, folhas e furo (Figura 14). Foi observada também a presença de marca d’água e de fuligem, as quais permitem deduzir que os recipientes foram utilizados para manipular líquidos e para cocção, respectivamente. Entretanto, não se pode descartar completamente que partes dessas marcas decorram de processos pós-deposicionais, como escoamento de água no solo e queimadas (Melo 2009; Rosa 2009; Pereira 2010).
A partir das considerações de Chmyz (1976), as bases cerâmicas do sítio Cangas I foram agrupadas em três conjuntos: arredondadas, planas e com pedestal não vasado (Melo 2009; Pereira 2010). As bordas observadas apresentaram lábios planos e arredondados, acompanhados por formas normais, expandidas, ou com reforço (interno ou externo), em contornos diretos e extrovertidos, possibilitando, de acordo com Sheppard (1985), a reconstituição de quatro tipos de vasilhames caracterizados como Abertos Simples, Aberto Infletido, Fechado Simples e Fechado Infletido (Figura 15).
A cerâmica do sítio Lago Rico
A cerâmica proveniente do sítio Lago Rico está associada à Tradição Uru (Ortega 2016), a qual se destaca na região do médio Araguaia e está relacionada, por estudos etnoarqueológicos, a antigas aldeias indígenas da nação Iny, popularmente conhecida por Karajá de Aruanã (Wüst 1975). É importante frisar que a cerâmica da Tradição Uru perpassa por outras nações do tronco linguístico Macro-Jê, como os Bororo no vale do São Lourenço, Mato Grosso, que, a partir do século XVIII, teriam incorporado atributos tecnológicos da Tradição Uru à sua sociedade (Wüst 1999; Robrahn-González 1996a).
De acordo com Schmitz & Barbosa (1985), os sítios da Tradição Uru, fase Aruanã geralmente se localizam adjacentes a lagos. No caso do sítio Lago Rico, esse se apresenta próximo à lagoa Aguapé, na margem esquerda do rio do Peixe. A presença de paleodrenagens e paleolagoas na região e no entorno do sítio indicam que essas poderiam ter atuado na captação de recursos para confecção de vasilhames cerâmicos e até como área de fonte alimentar.
No caso do sítio Lago Rico, as escavações realizaram-se por amostragem, sendo abertas quatro unidades de escavação de 25 m², das quais as UE-2 e 3 foram as que atingiram maior profundidade. Nesse sítio, a profundidade média não ultrapassou 0,50 m, porém os níveis ocupacionais mais representativos sob a perspectiva qualitativa e quantitativa estavam entre a superfície e 0,20 m de profundidade. Nesses, pôde-se observar em campo e mais detalhadamente durante as análises laboratoriais grande variabilidade de formas, proporcionando questionamentos relacionados à distribuição dos vestígios cerâmicos, fato que, de acordo com Schiffer (1976), possibilita compreender as relações comportamentais.
Entretanto, no caso do sítio Lago Rico, a distribuição dos vestígios cerâmicos, tanto em superfície como em sub-superfície, não apresentou um padrão tradicionalmente associado à fase Aruanã, que é linear, segundo Robrahn-González (1996a; b), o que pode estar relacionado à antropização ou ao percentual da área escavada. Relevante também no sítio é a concentração de vestígios cerâmicos identificados na UE-3, que apresentaram alta variabilidade tecnomorfológica, o que eventualmente poderia indicar uma possível área de descarte especializado (lixeira) ou uma região de uso intensivo.
Quanto ao aspecto quantitativo do material cerâmico coletado no sítio, obteve-se um total de mais de 10.000 fragmentos nas quatro unidades escavadas, sendo que desse montante apenas 7.715 peças puderam ser analisadas, uma vez que os demais fragmentos, por apresentarem dimensões inferiores a 2 cm², foram apenas contabilizados (Ortega 2016; Estrela 2017).
A técnica de manufatura predominantemente é a roletada, havendo algumas peças modeladas. O tratamento de superfície (Meggers & Evans 1970) se apresenta alisado, realizado antes da queima da peça. A queima mais expressiva é a oxidante, contudo pôde-se observar também a presença de queimas redutoras; nucleares (núcleo com coloração diferente das faces) e incompletas (Rye 1981; Ortega 2016; Estrela 2017). Os antiplásticos (Chmyz 1976; Shepard 1985; Rice 1987) identificados, por ordem de maior a menor expressividade, são o quartzo hialino e leitoso, com grãos angulosos menores que 1 mm, cariapé A e B, cauixi, mica, carvão e hematita (Meggers & Evans 1970; Wust 1975, 1976, 1989; Lima 1987; Batista & Volkmer-Ribeiro 2002; Ortega 2016; Estrela 2017).
Na UE-3, ao contrário das demais onde o antiplástico cauixi está presente em mais de 50% dos vestígios cerâmicos, essa porcentagem se reduz a 38%, com aumento considerável na proporção de peças com antiplástico cariapé A e B. Essa diferenciação poderia estar diretamente relacionada à variabilidade quantitativa e qualitativa observada nessa unidade, corroborando com a hipótese de tratar-se de uma área de descarte especializado.
De maneira geral, as peças com decorações pictóricas foram pouco representativas (Figura 16), com alguns exemplares apresentando engobo vermelho, branco e alaranjado. A decoração plástica, por sua vez, foi mais significativa nas bordas com incisões unguladas, ponteadas e entalhadas, enquanto, nas paredes, essas são pouco expressivas (Ortega 2016; Estrela 2017).
Algumas peças se distinguem de todo o conjunto pela presença de eventual pintura vermelha, pintura preta em faixas e de apliques semelhantes à zoomorfos (Ortega 2016; Estrela 2017). Tais ocorrências compõem certas características da Tradição Uru (Robrahn-González 1996a; b), que também foram identificadas na bacia do rio Vermelho em outros sítios da mesma tradição (Wüst 1989).
As bases cerâmicas são planas ou em pedestal e as bordas, diretas e extrovertidas, reforçadas e simples, com lábios arredondados, planos e apontados. As projeções dos vasilhames (Figura 17) indicaram, pelo menos, três grandes formas: abertas (popularmente representadas por pratos e tigelas), fechadas de contornos simples e fechadas de contornos infletidos (Chmyz 1976; Shepard 1985; Ortega 2016; Estrela 2017).
Os artefatos cerâmicos foram os mais expressivos nesse sítio, contudo, cabe ressaltar que a presença de raras lascas em sílex (menores que 5 cm), eventuais instrumentos e vestígios botânicos de carvão e frutos de palmeiras poderiam indicar a apropriação e os usos cotidianos (Ortega 2016). Porém, cestarias e outros elementos mais frágeis da cultura material não foram identificados ou preservados.
Os estudos realizados no médio curso do rio Araguaia, considerando a análise do material cerâmico, têm indicado que a mesma foi ocupada por grupos associados principalmente à Tradição ceramista Uru, sugerindo não só a presença como o compartilhamento cultural do saber-fazer da cerâmica. Esses grupos estavam se movimentando e se apropriando do território e, apesar de seu remanescente principal ser a cerâmica, é preciso ter em conta que essa se insere em um sistema cultural e social maior com tradição oral, organização política, manejo do ambiente, gestão de recursos, costumes, criatividade e conhecimentos aprendidos e ensinados, nem todos possíveis de serem estudados em contextos pré-históricos.
Alguns dos sítios arqueológicos no Planalto Central brasileiro contam com a presença de vestígios cerâmicos, associados a mais de uma tradição arqueológica ceramista (Fensterseifer & Schmitz 1975; Robrahn-González 1996a, b). Sobre esse assunto, Robrahn-González (1996a, b, 1999) discute a questão da interação cultural entre grupos pré-coloniais, com um fluxo de objetos, pessoas e/ou conhecimentos. Esse fato pôde ser observado no sítio GO-JU-39 localizado em Montes Claros de Goiás, cerca de 100 km do sítio Lago Rico, que apresenta vestígios das tradições Tupiguarani e Uru (Fensterseifer & Schmitz 1975; Robrahn-González 1996a, b).
Dentro desse contexto, para o sítio Lago Rico, Estrela (2017), sugere a hipótese da provável interação cultural entre as tradições Uru e Tupiguarani, devido à ocorrência de atributos decorativos e morfológicos característicos de ambas, porém, sem evidências conclusivas até o momento, talvez porque as escavações realizadas no sítio abrangeram apenas uma pequena parcela.
A cerâmica do sítio Lago Rico possui uma funcionalidade propícia às atividades do cotidiano, relacionadas ao cozimento, ao transporte e ao estoque de conteúdos (Ortega 2016). Uma variedade de recursos alimentícios, medicinais, artesanais e de lazer poderia estar sendo utilizada, manejada[8] e domesticada[9]. Ainda que não tenham sido encontrados vestígios diretos desses procedimentos, aventa-se a sua existência, tendo em vista que, na área do sítio, os solos apresentam condições favoráveis ao cultivo de plantas como a mandioca, sugestiva de ser a base alimentar do grupo que ocupou a área (Correa 2014; Barbosa 2015). Essa dieta poderia ser complementada com pesca, coleta e caça de espécies do cerrado e da mata (Silva 2014; Silva 2015). Os recursos hídricos e a dinâmica fluvial na área do sítio apresentam ainda a possibilidade de coleta de argilominerais para produção da cerâmica.
À cerâmica, seguramente, cabe participação nessas atividades; entretanto, se houver uma extrapolação para as funções hipotéticas, essas só poderiam ser indicadas por meio de estudos de micro vestígios e resíduos nos vasilhames (Ortega 2016), uma vez que não se pode determinar que a presença de formas de assadores seja o único testemunho do processamento de mandioca no sítio Lago Rico.Quanto a esse tema, Perry (2001) apresenta um estudo sobre assadores venezuelanos, nos quais não foram identificados vestígios de manipulação de mandioca, mas uma variedade maior e mais rica de outras plantas em que tais vasilhames eram também utilizados.
Por outro lado, é possível que a frente de colonização na região da Cidade de Goiás, no século XVIII, fosse uma das razões para deslocamentos de grupos de agricultores ceramistas, associados à fase Aruanã, em direção ao rio Araguaia, conforme pode ser observado nos sítios Cangas I, II, III e IV, localizados à margem direita desse rio. Nesse sentido, trabalhou-se fundamentalmente com a hipótese de que o sítio Cangas I descrevesse uma aldeia de ocupação sazonal, relacionada à aldeia principal representada pelo sítio Lago Rico (Marcos 2011). Colabora com essa hipótese o fato de que, em épocas de cheias, o rio Araguaia atinge, parcial ou totalmente, o terraço onde se insere o sítio Cangas I (Rosa 2009; Pereira 2010).
Tal hipótese foi aventada em função da semelhança da área de implantação de ambos os sítios, bem como da semelhança inicial, observada nos materiais cerâmicos (Marcos 2011). Entretanto, as pesquisas desenvolvidas não puderam comprová-la, uma vez que, mesmo havendo semelhança no material cerâmico, não é possível afirmar seguramente que se trata de um mesmo grupo, pois é preciso ponderar a existência de interações entre agrupamentos diferentes, com circulação de pessoas, objetos e/ou informações (Robrahn-Gonzáles 1996a, b; Ortega 2016).
As escavações dos sítios Cangas I e Lago Rico expõem dois sítios contemporâneos, com cultura material cerâmica associada à Tradição Uru e com diferentes processos de formação dos registros arqueológico, apesar de estarem localizados próximos a cursos d`água. No caso do sítio Cangas I, o rio Araguaia é o elemento fundamental em relação ao processo de apropriação e à construção da paisagem, assim como do registro arqueológico e da subsistência do grupo. Nesse sentido, a ocupação da área estaria condicionada à vazão do rio, uma vez que, em períodos de cheias, quando ocorrem os transbordamentos, o sítio e uma ampla área circundante se apresentariam inadequados ou impossibilitados para ocupação.
Quanto ao sítio Lago Rico, o rio do Peixe está mais relacionado com a questão da subsistência do grupo, uma vez que o sítio se encontra em uma vertente de baixa declividade e o registro arqueológico não está condicionado ao sistema fluvial. Nesse caso e em relação aos aspectos naturais, condiciona-se mais à dinâmica da vertente.
Material lítico
Os conjuntos líticos presentes nos sítios lito-cerâmicos da planície e dos terraços do rio Araguaia são escassos, assim como os de suas áreas limítrofes, se comparados às coleções cerâmicas. Essa escassez também ocorre em sítios dessa natureza, localizados em outras bacias hidrográficas do estado de Goiás, entre elas, os sítios habitacionais nas bacias do rio Corumbá (Mello et al. 1996), do ribeirão João Leite (Viana & Barbosa 2004), do rio Canastra (Wüst & Carvalho 1996) e do rio Caiapó (Lima 2013), entre outras.
Por outro lado, registram-se, em áreas específicas, contextos opostos em que ocorrem sítios com densidade de material lítico muito superior à cerâmica (ocasionalmente, a localização de sítios com baixa ou alta incidência de componentes líticos pode coincidir). Sítios com expressiva representatividade de objetos líticos foram identificados em certos abrigos de Palestina de Goiás, bacia do rio Caiapó (Mundim 2018). No estado de Mato Grosso, sítios com tais características foram reconhecidos nos terraços do rio Araguaia, mais precisamente no sítio Globo (Telles & Silva 2006), e em áreas próximas à planície, como é o caso de sítios das bacias dos rios Manso (Viana et al. 2006), Vermelho e São Lourenço (Wüst 1990; Vilhena Vialou 2009).
Essa escassez e dessemelhança podem ser decorrentes de diversos fatores, entre eles: a função dos sítios, o contexto temporal em que estão inseridos, além dos processos de formação dos sítios. Em outra perspectiva, o desprovimento de objetos líticos, em certos sítios, pode ser devido à substituição dos objetos de matéria prima rochosa, por suportes orgânicos. Esses, por serem vulneráveis à preservação, são difíceis de serem encontrados nos contextos arqueológicos, em decorrência principalmente da acidez do solo no bioma Cerrado com pH médio de 5,2 de acordo com Fageria & Stone (1999).A metodologia de escavação e/ou a análise do material lítico, assim como a sensibilidade do arqueólogo em campo, frente aos objetos líticos de baixa visibilidade, também podem influenciar nessa exiguidade do material lítico presente nas coleções arqueológicas (Gallay 1986).
Buscando entender o papel dos objetos líticos, assim como os conhecimentos e as estratégias técnicas empregadas entre os grupos humanos que ocuparam a planície e os terraços do rio Araguaia, mas ciente das limitações expostas, acrescidas do fato das escassas publicações, são apresentadas algumas considerações baseadas nos conjuntos líticos provenientes de sítios localizados 1) diretamente na planície aluvial e nos terraços e 2) em áreas limítrofes à planície e terraços, em especial, no município de Itapirapuã e Jaupaci, situados no estado de Goiás. Somam-se a esse recorte os sítios que dispúnhamos de referencial bibliográfico[10]e aqueles cujas cerâmicas foram vinculadas à Tradição Uru, já que ela está presente de forma majoritária ao longo da bacia do rio Araguaia.
Os componentes líticos desses sítios permitiram o estabelecimento de duas amplas categorias de ferramentas: “instrumentos produzidos a partir de matrizes inteiras” e “instrumentos produzidos a partir de lascas suporte”, advindos da fase de debitagem de núcleos. Foi também registrada a presença de detritos de lascamento, onde se incluem núcleos, lascas de retoques relacionadas à confecção de instrumentos e fragmentos de matéria prima não utilizada (Tabela 7).
No que se refere à Categoria 1 (Figura 18), ela se divide em duas possibilidades: instrumentos produzidos a partir de matrizes inteiras, nas quais não foram identificadas marcas intencionais de transformação do suporte ou tais estigmas ocorrem sutilmente na forma de picoteamento e/ou alisamento. Em ambos os casos os indivíduos escolheram matrizes que naturalmente apresentavam as estruturas técnicas desejadas (forma, volume, densidade, peso). Aqui, estão inclusos os almofarizes, pratos, bigornas, batedores, em quartzito, gnaisse, esteatita, granitoide, talco-xisto e talco-clorita-xisto, as duas últimas vulgarmente conhecidas por pedra sabão.
Na segunda possibilidade, as matrizes foram intencionalmente modificadas, tendo recebido como última fase de produção o polimento. Algumas peças apresentam ainda vestígios de picoteamento e negativos de lascamento. Essas fases de produção antecedem o polimento e, segundo Semenov (1981), são importantes por impor a primeira forma ao objeto, enquanto o polimento oferece o acabamento. Nessa categoria, incluem-se, principalmente, os machados e as mãos de pilão.
Sobre os instrumentos da Categoria 2 (Figura 19), eles foram produzidos a partir de suportes lascados. Tratam-se de instrumentos confeccionados de lascas-suportes pré-determinadas, provenientes de concepção de debitagem, classificada como “adicional” (Boëda 2013). Pela análise dos raros núcleos encontrados nos sítios, assim como das características das lascas suportes dos instrumentos, infere-se que os núcleos tenham sido explorados por debitagem em fatiagem e em bipolar sobre bigorna (Brito 2013).
Também estão presentes nos sítios, instrumentos produzidos a partir de suportes em lascas provenientes da fase de façonnage e/ou retoque de gume de ferramentas. Não se trata de suportes pré-determinados, mas escolhidos dentre um conjunto de lascas advindas do processo de confecção de ferramentas, assim sendo não aproveitadas ao acaso. Esse tipo de suporte foi considerado por Fogaça et al. (1997) como “suporte parasita”. Sua presença é recorrente em outros contextos regionais como, por exemplo, em sítios de Palestina de Goiás (Viana et al. 2016; Mundim 2018), localizados na bacia do Araguaia, não vinculados à Tradição Uru.
A principal matéria prima dos instrumentos lascados é o sílex, com presença ou não de córtex de seixo proveniente de ambiente aquático. De forma menos recorrente, há objetos em quartzo nos sítios Cangas I e Lago Rico e, com baixa representatividade, está o arenito silicificado presente, por exemplo, no São Miguel do Araguaia 1.
Sobre a produção dos instrumentos advindos de lascas suportes pré-determinadas, Brito (2013) identificou que os negativos de retoques se restringem à produção do gume das ferramentas, de modo que parte expressiva do suporte original foi mantida. A parte preênsil da ferramenta, em geral, também foi aproveitada a partir das características originais da lasca suporte. Essa apresenta, algumas vezes, uma considerável área cortical evidenciando a morfologia angulosa de seixo como critério de seleção. Tais ferramentas apresentam poucos gumes transformativos e os seus delineamentos variam entre contornos retilíneos, côncavos, convexos e, em ponta, com angulações diversas.
Também estão presentes em alguns sítios fragmentos de matéria prima não lascadas, mas introduzidos no local, assim como há lascas indicativas de retoques de instrumentos. Novamente, observa-se que o sílex é a matéria prima mais recorrente, seguido do quartzo e arenito silicificado.
A partir dessa breve caracterização e partindo de uma perspectiva espacial mais ampla, observa-se que os instrumentos da Categoria 1 estão presentes em 16 sítios (tabela 7). A presença de tais ferramentas é coerente ao desenvolvimento de atividades de manejo agrícola e de processamento de vegetais, realizadas possivelmente pelos integrantes dos sítios da Tradição Uru, conforme as investigações relacionadas aos objetos cerâmicos (Ortega 2016; Estrela 2017) e as análises de solo (Correa 2014). Sobre a pouca quantidade dos objetos supracitados, dados etnográficos informam que a utilização deles se insere na lógica de uso coletivo, entre famílias indígenas.
No que se refere aos instrumentos da Categoria 2, os instrumentos e demais objetos lascados presentes em 10 sítios permitem emitir algumas considerações:
(1) A presença de lascas de volumes e dimensões pequenas, com vários negativos na face externa e talões pouco espessos, relaciona-se a lascas de retoques decorrentes da confecção de gumes ativos de ferramentas. Tal atividade, considerada como uma das últimas fases de uma cadeia operatória de produção de instrumentos lascados (Leroi-Gourhan 1964), teria sido realizada no próprio sítio, enquanto a produção do suporte poderia ter sido feita em outros locais, já que os núcleos, os percutores e as lascas suportes não utilizados são raros.
(2) Os modos diversificados de exploração de núcleos (sistema de debitagem) por bipolar sobre bigorna, por fatiagem e exploração de núcleos com plano de percussão e superfície de debitagem não produzidos, mas com critérios técnicos adequados (seleção de seixos com superfície aplainada, adjacente à superfície com convexidades laterais e distais), foram importantes para a retirada de sequências curtas de lascas suportes. Tais esquemasexigem estratégias diferenciadas de seleção de matriz e aplicação de métodos e técnicas específicas para destacamento das lascas suportes.
A ocorrência de lasca de reconfiguração de gume, assim como a intensidade dos desgastes de gumes de algumas ferramentas e a presença de instrumentos compostos indicam que havia uma significativa gestão dos objetos, visando a uma economia de matéria prima.
O sílex, enquanto matéria prima majoritária entre os objetos lascados de todos os sítios, caracteriza uma preferência cultural que pode estar fundamentada na particularidade inquestionável dessa matéria prima para o lascamento e pela qualidade funcional para as ações de corte (Pèrles 1991). Esses critérios técnicos juntamente com o componente cultural teriam reforçado as estratégias de seleção dessa matéria prima, presente na forma de seixos nos cursos de água das áreas dos sítios, inclusive no rio Araguaia.
Considerando que os conhecimentos tecnológicos não se restringem aos fenômenos físicos da técnica e que, nela, estão entremeadas considerações de natureza simbólicas e de sociabilidade entre indivíduos (Lemonnier 1993), é possível pensar sobre a interação dos grupos humanos tradicionais que ocuparam a bacia do rio Araguaia, com suas técnicas de produção de ferramentas.
Para ampliar essa questão, considera-se que os conjuntos líticos apresentados sugerem vários potenciais de análise, entre eles: a investigação acerca da recorrência paralela de objetos lascados associados àquelas tradicionalmente vinculadas à agricultura (machados, almofarizes, maceradores). Segundo Vilhena Vialou (2009), com base em suas pesquisas em sítios de Mato Grosso e São Paulo, a exemplo de outros contextos temporais, como no Neolítico europeu, a introdução de novas tecnologias de produção não exclui a continuidade de outras bem estabelecidas. Nesses contextos, elas também são indicadoras de mudanças econômicas e sociais. A concomitância desses objetos, associados às práticas agrícolas, com os lascados, reforça as proposições de Boëda (2013) e Lemonnier (1993), entre outros, de que as tradições culturais são resistentes às mudanças tecnológicas.
A coexistência de conhecimentos técnicos, representada pelas tecnologias de produção de ferramentas das categorias 1 e 2, assim como a presença marcante da produção cerâmica nesses sítios, possibilita pensar em relações integradoras entre indivíduos, técnicas, objetos (líticos, cerâmicos e outros não preservados) e ambiente, aqui, considerando o rio, assim como a bacia do rio do Araguaia em toda sua amplitude física, biótica e simbólica. Tal entrelaçamento teria sua fluidez, a partir de uma “rede de significação” (Ingold 1993), de natureza distinta dos grupos humanos mais antigos, não conhecedores do manejo agrícola e/ou da produção cerâmica. No horizonte cultural mais recente, estamos diante de contextos em que, além da “apropriação” do ambiente, nos termos apresentados pelo autor anteriormente citado, os grupos humanos que ocuparam a bacia do rio Araguaia também “transformaram” seus ambientes, satisfazendo suas necessidades e seus desejos.
Considerações finais
A bacia hidrográfica do rio Araguaia apresenta sítios em abrigos e de superfície, líticos, cerâmicos e lito-cerâmicos, corroborando com a diversidade de ocupações pré-colonial dos estados de Goiás e Mato Grosso, que indica a necessidade de intensificação das pesquisas, uma vez que a bacia ocupa uma posição estratégica no Brasil e na América do Sul para a compreensão dos processos de ocupação do território brasileiro e sul-americano. Carvalho & Cavalcante (2010, p. 3) referem-se ao Araguaia como “uma estrada fluída natural”, portanto, uma via de deslocamento ao logo do tempo, como discutido na pesquisa arqueológica.
A cultura material já identificada, a tipologia, a distribuição espacial dos sítios e os processos de formação do registro arqueológico são campo aberto para investigações, tanto na planície aluvial e nos terraços, quanto fora. Nesse sentido, a cronologia disponível, até o momento, é mínima considerando as dimensões da área, o quantitativo de sítios cadastrados, as informações orais ainda não verificadas e a diversidade cultural.
Também considera-se que as caraterísticas da paisagem ou do ambiente favoreceram a diversidade de ocupações, e que a bacia apresenta variáveis ou qualificações que podem preservar ou impactar os sítios arqueológicos, além do fato de que o rio Araguaia foi um elemento determinante na forma de ocupação da região (Silva et al. 2008; Rosa 2009; Melo 2009; Rubin et al. 2009; Rubin et al. 2010; Garcia & Rubin 2010; Garcia2010; Lima 2011; Silva et al. 2014; Silva et al. 2016), em que pese as possíveis dificuldades de deslocamento pela área, no período cronológico que abrange a artigo, especialmente na planície aluvial e nas proximidades, como registrado por Oliveira (1976), durante a expedição Roncador-Xingu, realizada entre 1943 e 1944.A respeito das caraterísticas da área, Magalhães (1975, p. 101), em obra comemorativa ao centenário da primeira edição de 1876, menciona que “o grande rio é precedido por uma zona chata de seis a dezesseis léguas de largura, que o acompanha em ambas as margens”.
A bacia hidrográfica do rio Araguaia apresenta uma significativa potencialidade arqueológica, que se torna ainda maior quando se considera a Bacia Fluvial Quaternária do Bananal (BFQB), bacia intracratônica, que faz parte da Bacia do Araguaia (médio Araguaia), resultante de processos denudacionais e que abrange uma área de aproximadamente 106.000km2. Ao norte da bacia, situa-se a Ilha do Bananal, no estado do Tocantins, que ocupa uma área de 20.000 Km2 para a qual Barbosa (1985) já havia indicado a presença de sítios arqueológicos de agricultores e ceramistas. Na BFQB, ocorrem unidades deposicionais inseridas no Pleistoceno Médio (240.000+/_29.000 e 159.600+/_18.542 anos AP), no Pleistoceno Superior (121.000+/_15.000 e 17.200+/_2.300 anos AP) e no Holoceno (9.800+/_1.100 anos AP) e que apresentam registros de mudanças paleohidrológicas e paleoclimáticas (Valente & Latrubesse 2012a, b; Rubin et al. 2015).
Também significativas para a arqueologia são as datações obtidas em sedimentos da Formação Araguaia que indicam que a BFQB foi objeto de alterações no padrão fluvial em tempos recentes, mais precisamente durante o Pleniglacial médio (56.600+/_5.900 e 34.000+/_ 4.600 anos AP), que se situa no Estágio Isotópico do Oxigênio (OIS) 3 e no Pleniglacial superior (26.400+/_3.100 e 17.200+/_2.300 anos AP) inserido no OIS 2. As informações referentes à BFQB apresentam uma significância científica para a arqueologia da região, quando analisados os aspectos como a distribuição espacial, a espessura do pacote deposicional e a cronologia já conhecida (Valente & Latrubesse 2012a, b; Rubin et al. 2015). A ocupação précolonial da bacia hidrográfica do rio Araguaia, em relação ao rio, à planície aluvial e aos terraços, ainda é pouco conhecida. Muitas lacunas do texto se devem a essa realidade as quais espera-se, que possam ser dirimidas nos próximos anos.
Agradecimentos
Os autores agradecem aos discentes e docentes do curso de Arqueologia da Pontifícia Universidade Católica de Goiás, que participaram das escavações dos sítios Cangas I e Lago Rico. À Griphus Consultoria Ltda., pelo apoio na escavação do sítio Cangas I, à família Sousa Melo do Hotel das Cangas e à comunidade de Araguapaz.
À Matheus Martins de Araujo e Ismael Martins na preparação de algumas figuras. À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (FAPEG), pelo apoio financeiro obtido por meio do Processo 201210267001174, ao Conselho Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq): Processos 309072/2010-7; 307907/2013-9; 407771/2013-1 e 456737/2014-6 e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) pelo apoio no desenvolvimento da pesquisa de Jordana B. Barbosa. Aos colegas, às empresas e às fundações, que disponibilizaram dissertações, teses e relatórios. Aos revisores que contribuíram para a qualidade do manuscrito.
Notas
[1]http://portal.iphan.gov.br/cna
[2]Projeto de Levantamento Arqueológico na Área de Implantação de uma ponte sobre o Rio Araguaia nos Municípios de Aruanã – GO e Cocalinho – MT.
[3]Abordagem Geoarqueológica na Prospecção do Sítio Cangas I, terraço aluvial do rio Araguaia, Goiás.
[4] Instituto Goiano de Pré-história e Antropologia da Pontifícia Universidade Católica de Goiás.
[5]Prospecção Arqueológica e Escavação do Sítio Arqueológico Lago Rico, Interflúvio dos Rios Araguaia e Peixe, Municípios de Aruanã e Nova Crixás/Goiás.
[6]Identificado pelos próprios Karajá.
[7] Lítico, cerâmico, zooarqueológico, histórico/contemporâneo e carvão.
[8] Adotou-se a definição de manejo como “a alteração do meio ambiente para a criação de plantas e/ou animais de interesse para o homem. Esta alteração pode ser feita de muitas formas, conforme a intensidade de manipulação” (Anderson & Posey, 1985, pp.77).
[9]Optou-se pela definição de domesticação como “todo processo de interação ecológica ou dependência coevolutiva entre o ser humano e o meio ambiente” (Aceituno & Loaiza, 2007, pp.22).
[10] As considerações sobre o material lítico deste artigo se basearam na obra de Schmitz et al. (1982) e em documentos não publicados, disponíveis nas formas de relatório de pesquisas e trabalhos de conclusão de curso: Fundação Aroeira (2012, 2015); nas análises tecnológicas de Brito (2013), que revisitaram os objetos líticos das áreas arqueológicas de Caiapônia e Jussara; nas caracterizações de Rosa (2009), Ortega (2016) e Estrela (2017). Acrescenta-se, neste repertório, a análise direta e pontual do material lítico de alguns dos sítios, tendo em vista a relativa facilidade de acesso a algumas das coleções. Os sítios de Mato Grosso serão considerados de uma forma geral, haja vista o problema de acesso ao material bibliográfico.
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