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Fatores de risco e associados ao comportamento suicida no Brasil: uma revisão sistemática
Risk factors and associated with suicide behavior in Brazil: a systematic review
Factores de riesgo y asociados con el comportamiento suicidio en Brasil: una revisión Sistemática
Revista Tempus Psicológico, vol. 6, núm. 2, pp. 116-132, 2023
Universidad de Manizales

Artículos de Investigación

Revista Tempus Psicológico
Universidad de Manizales, Colombia
ISSN-e: 2619-6336
Periodicidad: Semestral
vol. 6, núm. 2, 2023

Recepción: 26 Septiembre 2022

Aprobación: 10 Marzo 2023

Publicación: 30 Junio 2023

Universidad de Manizales

Esta obra está bajo una Licencia Creative Commons Atribución-NoComercial-SinDerivar 4.0 Internacional.

Resumo: O comportamento suicida é um grave problema de saúde pública, motivado por diversos fatores de risco que incluem aspectos genéticos, psicológicos, sociais e culturais. O objetivo do estudo é analisar a literatura específica destes fatores para tentativas de suicídio no Brasil. Trata-se, portanto, de uma revisão sistemática sobre este tema. Os dados foram coletados nas principais bases de dados a partir dos seguintes descritores: “fatores associados e de risco”; “tentativa de suicídio e suicídio”; “Brasil”. Os resultados demonstraram que os fatores apresentados pela literatura mundial também estão em sua maioria presentes no Brasil. Os estudos com fatores associados e de risco para o comportamento suicida podem colaborar com programas de intervenção para grupos específicos, mas estes ainda são escassos no Brasil e são necessárias novas pesquisas que abordem esta temática.

Palavras-chave: tentativas de suicídio, suicídio, fatores associados, fatores de risco, Brasil.

Abstract: Suicidal behavior is a serious public health problem motivated by several risk factors that include genetic, psychological, social and cultural aspects. The aim of the study is to analyze the specific literature on these factors for suicide attempts in Brazil. It is, therefore, a systematic review on this topic. Data were collected in the main databases from the following descriptors: “associated and risk factors”; “attempted suicide and suicide”; "Brazil". The results showed that the factors presented in the world literature are also mostly present in Brazil. Studies with associated and risk factors for suicidal behavior can collaborate with intervention programs for specific groups, but these are still scarce in Brazil and further research is needed to address this issue.

Keywords: Suicide attempts, Suicide.

Resumen: El comportamiento suicida es un grave problema de salud pública motivado por varios factores de riesgo que incluyen aspectos genéticos, psicológicos, sociales y culturales. El objetivo del estudio es analizar la literatura específica sobre estos factores para los intentos de suicidio en Brasil. Se trata, por tanto, de una revisión sistemática sobre este tema. Los datos se recogieron en las principales bases de datos a partir de los siguientes descriptores: “factores asociados y de riesgo”; “Intento de suicidio y suicidio”; "Brasil". Los resultados mostraron que los factores presentados en la literatura mundial también están presentes mayoritariamente en Brasil. Los estudios con factores asociados y de riesgo para la conducta suicida pueden colaborar con programas de intervención para grupos específicos, pero estos aún son escasos en Brasil y se necesita más investigación para abordar este tema.

Palabras clave: Intentos de suicidio, Suicidio, Factores asociados, Factores de riesgo, Brasil.

Introdução

O suicídio é um grave problema de saúde pública e os dados relativos à mortalidade são monitorados pela World Health Organization (WHO, 2019). Resultado de um processo complexo e multifacetado, o comportamento suicida pode ser explicado através de atos gradativos que se iniciam pela presença de ideias e pensamentos de morte, passando pelo planejamento, até chegar às tentativas de suicídio e, por fim, o ato que resulta na morte. As ideações suicidas são as condições pelo qual o indivíduo se relaciona com a ideia de terminar com a própria vida, além de ter pensamentos relacionados à motivação, intencionalidade e à letalidade. As tentativas de suicídio são ações autolesivas intencionais de interromper a vida, mas que não levam ao óbito. O suicídio contém ações intencionais que levam à morte (Botega, 2015).

Estima-se que, para cada caso de suicídio, existam de dez a vinte ocorrências de tentativas, o que pode trazer além de impactos sociais e psicológicos para pessoas que convivem diretamente com os sujeitos, considerável impacto nos serviços de saúde (WHO, 2014). Dados referentes às lesões autoprovocadas e às tentativas de suicídio no Brasil, foram registrados através do boletim epidemiológico do Ministério da Saúde em 2021. O documento descreve que no em 2019, foram identificados 124.692 casos de lesões autoprovocadas, sendo 71,3% em mulheres e 28,6% em homens. A ocorrência das lesões se concentrou nas faixas etárias de 20 a 39 anos, e observa-se presença importante nos casos entre 15 e 19 anos de idade. Evidencia-se que a repetição dos atos estava presente em 41% dos casos e em 60% dos o método utilizado, foi por algum tipo de envenenamento (Ministério da Saúde, 2021).

A interação de fatores biológicos, sociais, psicológicos e culturais pode levar uma pessoa ao comportamento suicida e sua prevenção inclui a identificação dos fatores associados e de risco na população. Segundo a WHO (2014), os principais fatores de risco para o comportamento são: a história prévia de tentativas, a presença de transtornos mentais, o abuso de álcool e outras drogas, barreiras de acesso aos sistemas de saúde, o acesso a métodos letais, divulgações inadequadas da mídia, discriminações, história de traumas ou abusos, sentimentos de solidão e falta de apoio social, conflitos de relacionamento, perda de emprego, desesperança, doenças crônicas, história familiar de suicídio e fatores genéticos. A presença de um transtorno mental é um importante fator de risco e ainda é o principal fator de maior vulnerabilidade para o comportamento suicida. A situação de risco se agrava quando há associação dessas condições, como, por exemplo, depressão e alcoolismo (WHO, 2019).

A identificação dos fatores de risco para o comportamento suicida tem um importante valor preditivo para a construção de ações preventivas específicas para cada grupo populacional. Botega (2015) relata que o coeficiente nacional de mortalidade por suicídio pode encobrir importantes variações regionais, fatores socioculturais e econômicos. Tendo em vista as especificidades socioculturais das tentativas de suicídio, torna-se relevante identificar, no Brasil, quais são os fatores de risco identificados na literatura, uma vez que são escassos trabalhos que analisam sistematicamente as pesquisas brasileiras.

Sendo assim, o objetivo do presente trabalho é identificar os fatores de risco e associados às tentativas de suicídio presentes em estudos com amostras brasileiras. Os resultados podem ajudar a direcionar as políticas públicas para a prevenção do suicídio no Brasil. Os fatores de risco descritos pelos estudos desta revisão foram classificados e avaliados em sete subgrupos: marcadores genéticos e história familiar de suicídio; condições de saúde; abuso de álcool e outras drogas; violência; fases do desenvolvimento; acesso a serviços de saúde e acesso a psicofármacos.

Método

A pesquisa foi aprovada pela International Prospective Register of Systematic Reviews (PROSPERO) e incluiu as seguintes etapas: (1) estabelecimento da questão norteadora do estudo: “Quais os fatores de risco e associados para as tentativas de suicídio no Brasil?”; (2) seleção e obtenção de artigos nas bases de dados; (3) avaliação dos estudos pré-selecionados com exclusão de duplicatas com a plataforma Rayyan QCRI (Ouzzani et al., 2016); (4) construção e preenchimento da tabela de extração de dados. O artigo foi preparado com o uso dos itens de relatórios preferenciais para análises sistemáticas e meta-análises (PRISMA) (Liberati et al., 2009).

Bancos de dados e estratégia de pesquisa

Os critérios de inclusão dos artigos foram o desenho de estudo (epidemiológicos, transversais, coorte, caso-controle e randomizados), que apresentassem análises apenas das tentativas de suicídio e que contemplassem apenas amostras brasileiras. Não houve restrição de tempo de publicação ou da língua utilizada nas produções. Como critérios de exclusão, foram retiradas as pesquisas com indicação de associação de variáveis sem cálculo estatístico; os estudos que avaliaram apenas o risco de suicídio; os estudos multicêntricos sem detalhamento da amostra brasileira e os estudos com uso de escores compostos que correlacionam tentativas e suicídio.

Inicialmente para as buscas nas plataformas, foram considerados estudos que apresentavam fatores de risco e associados tanto para tentativas de suicídio, quanto para o suicídio. Esta decisão se deu para verificar se em estudos que tratavam sobre o suicídio, também apresentavam resultados para as tentativas. Ao final da análise, foram excluídos todos os estudos que apresentavam fatores relacionados apenas ao suicídio. Para uma melhor compreensão das causas relacionadas às tentativas de suicídio foram analisados estudos de coorte, ensaio clínico randomizado e caso controle para análise dos fatores de risco, e demais delineamentos para análise dos fatores associados.

A coleta de dados da revisão sistemática foi realizada até setembro de 2020 nas bases de dados, Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE) via PubMed, PsycINFO, CINAHL via EBSCO, Web of Science e na Biblioteca Virtual em Saúde (BVS). Uma estratégia de busca foi elaborada com os termos attempted suicide, Parasuicide, Parasuicides, suicide, suicides, suicide risk, Brazil e Brazilian verificados no DeCS e MeSH. Utilizou-se de operadores booleanos AND e OR para a articulação dos termos usados apenas no idioma inglês.

Seleção de estudos e critério de elegibilidade

O resultado da busca foi analisado por meio da plataforma Rayyan QCRI (Ouzzani et al., 2016). A seleção foi feita por dois juízes através da leitura dos títulos e dos resumos. Os conflitos foram resolvidos por um terceiro revisor. A análise da qualidade metodológica dos estudos foi feita pelo Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE).

Coleta de dados

A coleta de dados foi realizada por meio da leitura completa e extração de informações do artigo. Foram extraídos o desenho do estudo, os fatores de risco ou associados, o contexto e objetivo, a localização geográfica, as características amostrais e os resultados das publicações.

Resultados

Foram selecionados 1.265 artigos nas bases de dados. Destes, 290 foram retirados por motivo de duplicidade, 585 artigos pelo delineamento de estudos. Restaram 389 que tiveram os resultados analisados pelos fatores de inclusão e exclusão. Após análise por fatores de inclusão da revisão excluíram-se 359 estudos e um total de 30 artigos preencheu os critérios de elegibilidade para leitura completa e análise dos resultados (Figura 1). A literatura cinzenta foi pesquisada no Banco de Tese CAPES onde foram localizados 37 artigos.




Elaboração dos autores.

Os estudos foram realizados com amostras da população geral brasileira, contemplando as seguintes regiões: sudeste (16), sul (6) e nordeste (3). Dos 30 artigos incluídos, cinco utilizaram dados secundários de sistemas brasileiros (ex. DATA-SUS, Sistema de Informação sobre Mortalidade, Ministério da Saúde, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística e Instituto Médico Legal).

A data de publicação dos estudos está entre 2000 e 2020 com aumento das publicações a partir do ano de 2009. Os artigos obtiveram a pontuação STROBE entre 15 e 22 (Tabela 1, 1a), o que caracteriza um percentual de qualidade alto. Os itens não pontuados nos estudos que não obtiveram pontuação máxima relacionavam-se à falta da descrição dos elementos-chave do desenho do estudo, clareza em todos os desfechos, das medidas adotadas para evitar viés, dentre outros. Os artigos foram categorizados segundo a variável dependente (tentativa de suicídio) e as variáveis independentes (fatores associados e de risco).


Tabela 1.
Características estudos incluídos por análise dos fatores associados e de risco nas tentativas de suicídio




Elaboração dos autores

Classificação e análise dos estudos por subgrupos

Marcadores genéticos e histórico familiar de suicídio

Quatro estudos (Correa et al., 2002; Correa et al., 2004; Segal e Manfro, 2009; Viana et al., 2006) investigaram a relação entre marcadores genéticos e biológicos 5HT2A, 5HTTLPR e A218C à tentativa de suicídio. Os resultados não foram significativos para estes marcadores. Destes estudos, dois investigaram adicionalmente a presença de histórico familiar de suicídio. Correa et al. (2004) encontraram presença de história familiar em 44% da amostra enquanto os resultados de Viana et al. (2006) encontraram uma taxa de 50% no grupo estudado.

Condições de saúde

Santos et al. (2009) investigaram a presença de transtornos mentais relacionados às tentativas de suicídio. Os mais prevalentes foram o transtorno depressivo, dependência de substâncias psicoativas, transtorno de estresse pós-traumático, abuso de álcool e esquizofrenia. Especificamente com relação ao transtorno de humor, Neves et al. (2009) buscaram investigar se a polaridade do primeiro episódio poderia ser um marcador do comportamento suicida nos pacientes. As conclusões foram que pacientes deprimidos tiveram mais histórias de tentativas de suicídio ao longo do tempo. Por outro lado, os pacientes maníacos têm maior tendência às tentativas com métodos mais violentos. Silva et al. (2017) também estudaram pacientes com transtorno bipolar, investigando a correlação dos insights e o comportamento suicida. As tentativas de suicídio correlacionaram com o maior comprometimento e do insight nos pacientes deprimidos.

Gomes et al. (2010) investigaram a relação entre a história de TS e obesidade em pacientes com transtorno bipolar, encontrando quase duas vezes mais história de tentativas no grupo de obesos. Na mesma direção, Vargas et al. (2013) encontraram uma associação entre maior índice de massa corporal com tentativa de suicídio

Stefanello et al. (2010) compararam as características clínicas de pacientes com epilepsia e outros sem o diagnóstico. Foi verificado que, no grupo de epiléticos, prevaleciam mais pacientes com história de TS. Em outro estudo, o mesmo grupo de pesquisa verificou a presença de ansiedade e depressão em pacientes com epilepsia, encontrando uma associação destes agravos com tentativas de suicídio (Stefanello et al., 2011).

Ainda em relação a condições de saúde, Malbergier e Guerra de Andrade (2001) investigaram a prevalência e associação de transtorno depressivo e TS em usuários HIV- soropositivos de drogas injetáveis, não sendo encontrada associação entre as variáveis.

Abuso de álcool e outras drogas

Três estudos (Zilberman et al., 2001; Silveira et al., 2014; Abdalla et al., 2019), buscaram avaliar a associação de abuso de álcool e drogas e TS. Os resultados das três pesquisas demonstraram associação tanto do álcool, quanto ao uso de outras drogas como a maconha e cocaína. Roglio et al. (2020) encontraram associação de TS com depressão e alucinação em pacientes internados por uso abusivo de crack e cocaína.

Violência

Albuquerque et al. (2018) estudaram a presença de violência física, sexual e abuso de drogas em indivíduos LGBT e encontraram uma associação de violência física e sexual com TS. Devries et al. (2011) pesquisaram a violência contra a mulher e encontraram associações com abuso sexual na infância e violência sofrida por parceiro íntimo com TS. Da mesma forma, a presença de estigma sexual aumenta em 60% a presença de TS e jovens brasileiros quando comparados com aqueles que não sofreram esta violência.

Um grupo de pesquisas investigou a presença de adversidades na infância e tentativa de suicídio. Foram encontradas associações de TS com abuso físico (Coêlho et al., 2016), abuso e negligência emocionais e físicas (Zatti et al., 2020) e abusos emocional, físico e sexual e negligência emocional (De Araújo e Lara, 2016).

Fases do Desenvolvimento

Com relação aos adolescentes, Silva et al. (2014) encontraram maior frequência de TS no grupo feminino, com presença de comportamentos agressivos e usuárias de álcool e cigarro. Resultados similares foram encontrados em estudantes de escolas estaduais e particulares (Jatobá e Bastos, 2007; Carlini-Cotrim et al., 2000), com maior frequência de TS no sexo feminino em ambas as escolas. Ainda na adolescência, Freitas et al. (2008) compararam jovens grávidas e não grávidas, encontrando maior frequência de TS no grupo de gestantes.

Acesso a serviços de saúde

Centro de Atenção Psicossocial (CAPS). Os resultados mostraram que naqueles municípios com cobertura de serviço de saúde mental possuíam taxas mais baixas de hospitalização por tentativa de suicídio.

Já o estudo de Cais et al. (2009) compararam as características sociodemográficas e clínicas de pacientes que tentaram suicídio pela primeira vez com um grupo de tentativas repetidas que foram atendidos em um hospital geral. O estudo verificou que a repetição das TS está associada ao sexo feminino com maior presença de mulheres dona de casa e com diagnósticos de depressão. A hospitalização por TS também foi investigada por Meyer et al. (2010). Eles compararam as taxas de hospitalização por TS entre agricultores de áreas com alto uso de pesticidas em duas regiões distintas. Os resultados deste estudo demonstraram maior taxa de hospitalização por TS e presença de transtorno do humor entre os agricultores que faziam uso de produtos químicos nas lavouras.

Acesso a psicofármacos

Trevisan e Oliveira (2012) buscaram verificar o acesso, a disponibilidade e a finalidade do uso de psicofármacos nas tentativas de suicídio de mulheres com TS. Este estudo apontou forte relação em pacientes que tentaram suicídio e eram diagnosticadas com depressão, em uso de benzodiazepínicos e que adquiriam as medicações com receita médica.

Discussão

Esta revisão buscou identificar e analisar os fatores associados e de risco para as tentativas de suicídio em estudos com amostras brasileiras. O conjunto de publicações evidenciou a diversidade de pesquisas e de fatores associados com as tentativas.

A maior concentração de pesquisas relaciona as tentativas à presença de transtornos mentais. Os transtornos do humor, mais especificamente a depressão foram os mais frequentemente encontrados, seguido de esquizofrenia, transtornos relacionados ao uso abusivo de substâncias, mais comum o uso de álcool e transtornos de personalidade. Apesar de ser um fator risco amplamente descrito na literatura, é importante destacar que a presença do transtorno por si só não determina a tentativa de suicídio. Desse modo, seria relevante investir em pesquisas que buscassem associar, para além dos transtornos mentais, o sofrimento e as relações sociais frágeis como fatores associados.

A revisão apresentou um estudo (Trevisan e Oliveira, 2012), que apontou forte relação em pacientes que tentaram suicídio e eram diagnosticadas com depressão, em uso de medicamentos com venda restrita no país. O mesmo raciocínio pode ser feito para os medicamentos de venda livre, facilmente comprados em farmácias e drogarias no Brasil. Este achado descreve a importância da construção de políticas públicas no âmbito da saúde mental que colaborem com a restrição do acesso a métodos, particularmente da disponibilidade destes medicamentos a populações mais vulneráveis ao comportamento suicida. A restrição ao método é uma importante ferramenta e precisa ser ensinada aos familiares de pacientes que tentaram suicídio.

A presença de mais de um caso de suicídio na família sugere que marcadores genéticos são fatores significativos para o suicídio. Para Segal e Manfro (2009), as pesquisas já permitiram identificar inúmeras variações na sequência de DNA em casos de suicídio, entretanto esses efeitos ainda são insuficientes. O autor ainda ressalta que um único gene ou conjunto deles não é suficiente para responsabilizar o comportamento suicida. Os estudos nacionais com marcadores genéticos aqui apresentados, da mesma forma, não encontraram a associação dos genes específicos com pacientes que tentaram suicídio.

A WHO (2019) declarou que a maior parte dos óbitos por suicídio em adolescentes ocorre em países de baixa e média renda. Os estudos apresentados na revisão em relação aos adolescentes relacionam as tentativas de suicídio com fatores como, ser do sexo feminino com presença de sintomas depressivos e de ansiedade, além da relação dos jovens com comportamentos agressivos, uso de álcool e cigarro.

O fortalecimento de políticas públicas é um importante fator de prevenção no caso das TS. Os autores Machado et al. (2018) demonstram em sua pesquisa que existe baixa hospitalização por tentativas de suicídio em municípios com cobertura dos CAPS, o que é corroborado pela WHO (2014), que preconiza que o acesso a sistemas de saúde mental e oferta adequada de tratamento para pessoas com doenças mentais são diretrizes importantes para a prevenção do comportamento suicida. Ter acesso a serviços especializados pode ser um fator protetivo importante para a prevenção uma vez que o foco do trabalho é o cuidado e tratamento das doenças mentais. Desse modo, os dados de estudos brasileiros apontam para a necessidade de fortalecimento do sistema público de saúde como política de prevenção a novas tentativas.

Casos de violência de gênero e abuso infantil são descritos pela WHO (2014) como fatores fortemente associados ao comportamento suicida. As publicações apresentadas neste estudo corroboraram com os achados quando os resultados apresentados demonstram que crianças que sofreram violências física ou sexual na infância têm maiores chances de tentar suicídio na fase adulta. O estigma sexual também foi demonstrado como fator associado ao comportamento suicida e é descrito pela WHO (2014) que em países onde as minorias sofrem com maior discriminação, há presença de altas taxas de suicídio.

Conclusão

A revisão demonstrou que no Brasil os fatores de risco encontrados para tentativas de suicídio são semelhantes aos apresentados pela literatura mundial. Os achados reforçam a importância das ações estratégicas de prevenção do comportamento suicida assim como o incentivo aos serviços de saúde mental para as pessoas mais vulneráveis removendo inclusive as barreiras de acesso a esses locais, a mobilização dos sistemas de saúde incluindo treinamento de profissionais da saúde, a redução de acesso a métodos letais e o incentivo a pesquisas que contribuam com a vigilância e melhoria da qualidade de dados.

Os resultados apresentados e discutidos sugerem que, levando em consideração os fatores associados e de risco, programas de intervenção específicos para a população em risco de suicídio podem ser grandes aliados para a prevenção de novos casos. Estes programas ainda são escassos no Brasil e a partir disso sugere-se a realização de estudos futuros com a população brasileira que contemplem a temática de programas de intervenção e grupos de risco ao comportamento suicida, demonstrando eficácia dos resultados. Da mesma forma, o planejamento e implantação de políticas públicas que facilitem o acesso aos equipamentos de saúde possuem impacto positivo na sua prevenção.

O comportamento suicida é um problema sério e precisa ser acompanhado por uma abordagem multidisciplinar. Aos profissionais da saúde mental é essencial que eles conheçam sua complexidade, fazer a correta identificação dos fatores de risco apresentados pelos indivíduos para garantir que eles recebam intervenções de prevenção e tratamento adequados.

O Brasil tem uma ampla extensão territorial e pode esconder importantes variações regionais nos índices do comportamento suicida. A revisão demonstrou diferenças quantitativas de estudos por localização no país, incluindo a ausência de estudos em duas regiões (norte e centro-oeste) com a temática abordada. Portanto, verifica-se a necessidade de pesquisas abrangendo as populações menos estudadas. Sobre trabalhos de compilação de metadados, recomenda-se a estratificação dos resultados e a identificação de fatores de riscos comuns e específicos das regiões.

Referências

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