Secciones
Referencias
Resumen
Servicios
Descargas
HTML
ePub
PDF
Buscar
Fuente


ASPECTOS DA NARRATIVA HISTÓRICA DA ETNOMATEMÁTICA DE D’AMBROSIO: INTERTEXTUALIDADE, RETÓRICA E FICÇÃO
ASPECTS OF D’AMBROSIO’S HISTORICAL NARRATIVE OF ETHNOMATHEMATICS: intertextuality, rhetoric and fiction
Revista de História da Educação Matemática, vol. 8, pp. 01-20, 2022
Sociedade Brasileira de História da Matemática

HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA: DIÁLOGOS A PARTIR DO VIII SIPEM

Revista de História da Educação Matemática
Sociedade Brasileira de História da Matemática, Brasil
ISSN-e: 2447-6447
Periodicidade: Frecuencia continua
vol. 8, 2022

Resumo: A História da Etnomatemática está, em muitos sentidos, intimamente associada à vida e obra de Ubiratan D’Ambrosio e, em particular, assume-se que é indissociável da sua produção textual. Um dos objetivos deste trabalho é evidenciar alguns dos aspectos relacionados aos modos como uma história da Etnomatemática foi escrita e, posteriormente, inscrita no mundo do texto etnomatemático de D’Ambrosio. A metodologia de análise e interpretação inspira-se na narratologia e na hermenêutica do filósofo francês Paul Ricoeur. O fio condutor da investigação é a composição da intriga (enredo) da narrativa das histórias e, nesse contexto, observaram-se alguns elementos, como, por exemplo, os personagens, as vozes da narrativa, os cenários e espaços da ação, as relações entre os personagens, algumas funções do discurso (poética e retórica) e os efeitos pretendidos pelo discurso. A pesquisa evidenciou que a história da Etnomatemática escrita por D’Ambrosio está assentada na intertextualidade, na retórica e em elementos da literatura ficcional.

Palavras-chave: Escrita da história, Etnomatemática, Aspectos poéticos, Intriga, Estória da História.

Abstract: The history of Ethnomathematics is, in many ways, closely associated with the life and work of Ubiratan D’Ambrosio and, in particular, it is assumed that it is inseparable from its textual production. One of the objectives of this work is to highlight some aspects related to the ways in which this history of ethnomathematics was written and, later, inscribed in the world of D’Ambrosio's ethnomatmatic text. The methodology of analysis and interpretation is inspired by the narratology and hermeneutics of the French philosopher Paul Ricoeur. The guiding thread of the investigation is the composition of the intrigue (plot) of the narrative of the stories and, in this context, some elements were observed, such as, for example, the characters, the voices of the narrative, the scenarios and spaces of the action, the relationships among the characters, some speech functions (poetic and rhetorical) and the effects intended by the speech. The research showed that the history of ethnomathematics written by D’Ambrosio is based on intertextuality, rhetoric and fictional literature.

Keywords: History writing, Ethnomathematics, Poetic aspects, story of History.

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Este trabalho é fruto de uma pesquisa realizada durante o doutoramento (do autor deste artigo), entre os anos de 2014 e 2018. Naquele momento investigaram-se os aspectos poéticos e retóricos (Ricoeur, 2012a, 2012b, 2012c; Veyne, 1982; White, 2014; Rancière, 2014) da produção textual de Ubiratan D’Ambrosio no contexto da Etnomatemática.

Atualmente, junto ao grupo de História e Educação Matemática (HEDUMAT) da Universidade Federal Fluminense (UFF), o interesse da pesquisa recai sobre a escrita da História e, em particular, a escrita da História da Educação Matemática. Neste sentido, revisita-se o trabalho realizado durante o doutoramento atentando-se para alguns dos aspectos que incidem sobre a escrita da narrativa histórica da Etnomatemática produzida por Ubiratan D’Ambrosio (1932-2021) no contexto da Educação Matemática.

Em Marchon (2018) observa-se que existe uma narrativa histórica da Etnomatemática escrita por ela mesma (D’Ambrosio, 1985, 1986, 1990, 1993, 2011a, 2011b); fala-se em uma estória .story. da história .history) (Ricoeur, 2012a, 2012b, 2012c) da Etnomatemática. Além disso, nota-se que a História da Etnomatemática, dentro do contexto da Educação Matemática, tem suas primeiras linhas timidamente tecidas durante a década de 1970 e, estas, apontam para os trabalhos de Ubiratan D’Ambrosio (Conrado, 2005; Knijnik, 2004; Rosa & Orey, 2005, 2014; Valente, 2007; Miarka, 2011; D’Ambrosio, 1986; Domite, 2007). Observa-se, por fim, que a narrativa histórica da Etnomatemática segue, em muitos sentidos, os passos do seu idealizador e divulgador: Ubiratan D’Ambrosio (Fantinato & Freitas, 2018; Marchon, 2018).

Ubiratan D’Ambrosio é apresentado ao público leitor — por ele mesmo ou pelos seus pares — como o idealizador do Programa de Estudos e Pesquisas Etnomatemática, ou, ainda, como o seu maior representante e divulgador no Brasil (e no mundo), ou, também, como o pai da Etnomatemática (D’Ambrosio, 1985, 1986, 1990, 2011b; Conrado, 2005; Domite, 2006; Valente, 2007; Rosa & Orey, 2014; 2012; Gerdes, 1996, 2010). Há uma espécie de paternidade intelectual enunciado na historiografia da Etnomatemática e que emerge no campo da Educação Matemática. A aparente predominância das ideias, discursos e textos de Ubiratan D’Ambrosio para a escrita de uma história da Etnomatemática é, também, em muitos momentos, reproduzida por outros pesquisadores desta área (Rosa & Orey, 2005, 2014; Passos 2017; Miarka, 2011; Conrado 2005) ao tratarem desta história, e, nesse sentido, supõe-se que exista direta ou indiretamente elementos discursivos que são apropriados de D’Ambrosio por outros pesquisadores que se debruçam sobre uma escrita histórica da Etnomatemática. Esta suposição aliada a observação de que a produção textual de D’Ambrosio ainda é uma das principais referências teóricas no interior da Etnomatemática (Fantinato & Freitas, 2018; Marchon 2018; Meira, 2021, Breda, 2011, Valente 2007), justificam o esforço desta pesquisa.

E, se a História da Etnomatemática tem sido contada por ela mesma, em particular por D’Ambrosio e seus seguidores (orientandos, amigos, pesquisadores afiliados aos grupos de pesquisa que compartilham os seus ideias, etc.), então algumas questões podem orientar nossa investigação e o nosso olhar, a saber: (a) “Que elementos caracterizam a narrativa histórica da Etnomatemática de D’Ambrosio?”, (b) “Quais estratégias discursivas foram empregadas por D’Ambrosio ao escrever uma história da Etnomatemática?”. O objetivo deste trabalho é, portanto, evidenciar algumas destas estratégias discursivas e narrativas empregadas na escrita da história da Etnomatemática de D’Ambrosio e, nesse movimento, exibir alguns dos modos como D’Ambrosio escreveu esta história da Etnomatemática.

1. REFERENCIAL TEÓRICO E METODOLÓGICO

O objeto analisado/interpretado neste trabalho é o chamado mundo do texto(Ricoeur 2012a; 2012b; 2012c) – “O que é, com efeito, interpretado em um texto é um mundo pró-posto (pro-posé), um mundo que eu poderia habitar e no qual eu poderia projetar minhas capacidades mais próprias” (Ricoeur, 2012C, p. 300). E, mais precisamente, o mundo do texto etnomatemático de Ubiratan D’Ambrosio, seus livros (D’Ambrosio, 1985, 1986, 1990, 2011) e, neles, sua escrita da História da Etnomatemática. A noção de mundo do texto (Ricoeur, 2012a, 2012b, 2012c) explora a ideia de que as narrativas que pretendem contar uma história apresentam um mundo possível no qual as pessoas podem se orientar, refletir-se e pensar-se, assim como pensar o outro. Somos levados a concordar com o filósofo e romancista Umberto Eco (1932-2016) quando afirma que “a narrativa é, acima de tudo, uma questão cosmológica. Para narrar algo, começamos como uma espécie de demiurgo que cria um mundo — um mundo que deve ser tão preciso quanto possível” (Eco, 2018, p. 15).

Os pensamentos textualizados, as ideias enunciadas, as crenças proferidas, os valores defendidos e, também, e não menos significativos, os conhecimentos enredados na trama textual de D’Ambrosio fazem parte deste mundo. A noção de texto, em particular, relaciona-se com a de discurso, a inscrição do discurso: “o texto é uma entidade complexa de discurso” (Ricoeur, 2015, p.336). Cabe destacar, no entanto, algumas concepções e entendimentos que emanam dos estudos da linguagem, saber:

O termo texto, como também ocorre com o termo discurso, tem sido conceituado de maneiras bastante diversas. Basicamente, pode-se tomá-lo em duas acepções: em sentido lato, para designar toda e qualquer manifestação da capacidade textual do ser humano, quer se trate de um romance ou de um poema, quer de uma música, uma pintura, um filme, uma escultura etc., isto é, de qualquer tipo de comunicação realizada através de um sistema de signos. Em se tratando da linguagem verbal, tem-se o discurso, atividade comunicativa de um locutor, numa situação de comunicação determinada, englobando não só o conjunto de enunciados por ele produzidos em tal situação — ou os seus e os de seu interlocutor, no caso do diálogo — como também o evento de sua enunciação. O discurso manifesta-se linguisticamente por meio de textos — em sentido estrito — que consistem em qualquer passagem falada ou escrita, capaz de formar um todo significativo, independente de sua extensão. Trata-se, assim, de uma unidade semântico-pragmática, de um contínuo comunicativo textual que se caracteriza, entre outros fatores, pela coerência e pela coesão, conjunto de relações responsáveis pela tessitura do texto (Koch, 2011, pp. 19-20, grifos do autor)

Retornando ao filósofo francês, tem-se a ideia de que o texto é uma obra decomposição literária, isto é, é textura, tessitura: “Por texto não entendo somente nem principalmente a escritura [...] Antes de tudo, o discurso é a sede de um trabalho de composição” (Ricoeur, 2015, p. 336). Para o filósofo, a obra literária, o texto, sua escrita, dependem de regras específicas que não necessariamente se relacionam com a linguística do texto, mas sim com a poética: “o problema de composição não depende da linguística, para a qual a última unidade é a frase, mas da poética” (Ricoeur, 2011, p. 30). Assim, compreende-se que a manifestação dos discursos, em particular nas narrativas, faz parte de uma arte: a arte de compor narrativas; ela evidencia o artesão do texto, aquele que tece o texto, produz discursos, inscreve palavras, argumenta e busca convencer e/ou persuadir o seu ouvinte/leitor.

E, como nos diz Rancière (2014), as articulações dos nomes e acontecimentos na narrativa, apesar dos constrangimentos da indeterminação ontológica que suscitam na história-ciência, é o único caminho adequado para se manter o caráter histórico da história. A narrativa histórica realiza uma “ordenação de um espaço de conjunção dos contraditórios” (Rancière, 2014, p. 10) e que, de acordo com o historiador, “diz respeito a uma elaboração poética do objeto e da língua do saber” (idem); donde afirma que “a poética do saber se interessa pelas regras, segundo as quais, um saber se escreve e se lê” (Rancière, 2014, p. 12).

O aspecto poético da escrita da história e o caráter ficcional das narrativas históricas colaboram, neste sentido, para este projeto (Ricoeur, 2012a, 2012c; Veyne, 1982; White, 2014; Rüssen, 2016; Lima, 2016; Topolski, 2016). Assim, ao contrário de opor as especificidades da escrita literária aos rigores da escrita científica, em um sentido quase matemático, a narrativa histórica se pauta em procedimentos literários para inscrever no texto suas histórias, algo que corresponde e se aproxima da perspectiva ricoeuriana aqui adotada.

O hermeneuta francês destaca que as narrativas que emergem dos rastros das memórias, apesar de históricas com intenções de verdade, são ainda, histórias (Ricoeur, 2007). As estórias (stories) da História (history) criam em seus mundos próprios, em seu mundo do texto, as condições de compreensão dos acontecimentos desordenados, caóticos, dispersos e não necessariamente dependentes que partem do mundo da ação humana. E, nesse contexto, podem ser entendidas, grosso modo, como ficções verbais (Ricoeur, 2012a) em um mundo possível.

No plano textual muitos discursos fazem emanar muitas vozes e, estes, apesar de plurais (Cunha, 2011; Bakhtin, 2014), apontam para uma origem enunciativa — o autor, aquele que assina o texto—. Pode-se neste caso concordar com Maingueneau (2015): “O discurso só é discurso se estiver relacionado a um sujeito, a uma EU” (Maingueneau, 2015, p. 27) e, mais que isso, ele “se coloca ao mesmo tempo como fonte de referências pessoais, temporais, espaciais (EU-AQUI-AGORA) e indica qual é a atitude que ele adota em relação ao que diz e a seu destinatário” (Maingueneau, 2015, p. 27). Assim, com intuito unicamente de localizar o sujeito que assina determinada produção textual, e que, nesta produção, cria o seu mundo próprio, sua ficção de mundo, opta-se por criar uma adjetivação; diz-se “d’ambrosiana” ao fazer menção ao que é dito pelo autor do texto em seus discursos e, de modo geral, emprega-se a expressão mundo do texto etnomatemático d’ambrosiano. Este autor distingue-se do personagem, do matemático, do educador, ou do narrador; é aquele que assume para si a responsabilidade de dizer o que diz em determinado discurso e em certo contexto enunciativo.

Observa-se que na escrita deste artigo operar-se-á uma constante movimentação dos nomes e das figuras que emergem na análise: o matemático propõe algo, o educador matemático fala alguma coisa, o personagem encena uma fala, o narrador conta uma história, o autor escreve o seu texto, e assim por diante. Separação puramente analítica.

Sobre a relação entre a ficção e a História, o filósofo francês diz que “a realidade quotidiana se metamorfoseia em favor daquilo que poderíamos chamar de variações imaginativas que a literatura opera sobre o real” (Ricoeur, 1978, p. 57). E, neste contexto, a categoria da intriga(enredo), seguindo-se as indicações e pistas deixadas por Ricoeur (2012a, 2012b, 2012c; 2007), é a que funciona como mediadora de todas as demais categorias de análise. Ricoeur (2007) afirma que “a composição da intriga constitui um autêntico componente da operação historiográfica” (Ricoeur, 2007, p. 250), pois, a saber, segundo esse filósofo, “a intriga é a forma literária dessa coordenação: ela consiste em conduzir uma ação complexa de uma situação inicial para uma situação terminal por meio de transformações regradas” (Ricoeur, 2007, p. 255). Dentro desta ampla categoria analítica outras colaboram, como é o caso, por exemplo, dos personagens, dos cenários e espaços, da voz da narrativa e do foco narrativo.

Tendo como foco de preocupação a escrita da história da Etnomatemática, então uma parte da análise efetuada sobre o texto — sobre o discurso do texto e sobre a narrativa da história —, buscou inspirações em outras fontes teóricas, como, por exemplo, Maingueneau (1996, 2008, 2015), Citelli (1989), Perelman e Olbrechts-Tyteca (2000), e, ainda, Reuter (2000).

2. OBSERVAÇÕES ANALÍTICAS

O discurso da narrativa possibilita a aparição de muitas vozes que, ao dizer algo a alguém, contam ou informam fatos e acontecimentos, e, nesse sentido, observa-se no movimento analítico, no nível do texto, a existência de muitos D’Ambrosios, a saber:

(i) o personagem D’Ambrosio (Candido et al., 1974; Eco, 2018; Ricoeur, 2014), distinto do homem de carne e osso (o sujeito socio-histórico e empírico), e que é objeto de auto referenciação (D’Ambrosio, 2011b, 1986); personagem que se confunde com a própria “Etnomatemática” — Poder-se-ia concordar, neste caso, com a perspectiva ricoeuriana que atesta que o escritor, ao narrar suas histórias, projeta-se no texto e cria uma espécie de personagem de si mesmo no qual faz emergir uma identidade narrativa (Ricoeur, 2014) que habita o espaço discursivo do texto —; (ii) o narrador da história que, em alguns casos, distancia-se tanto do personagem quanto do autor/escritor do texto para narrar uma história possível ou factual; (iii) o homem de carne e osso, escritor do texto, aquele que assina uma produção impressa, o autor; (iv) o matemático, cuja formação específica delimita seu campo de interesse e de discurso, (v) o educador matemática, que, afastando-se da figura do matemático, se dedica ao ensino, a educação, aos debates pedagógicos e outros temas de cunho social, cultural e político.

Além desta proliferação de vozes, há também as vozes que se inscrevem na textualidade da narrativa e que são apropriadas pelo escritor/autor para compor a sua trama; são outras vozes (Cunha, 2011; Bakhtin, 2014) que advém de outras fontes e autores e que são convocadas para por D’Ambrosio para auxiliá-lo a dizer o que pretende dizer. As diferentes caracterizações e nomeações acima expostas podem ser observadas tanto na literatura que é produzida pela Etnomatemática (em seus estudos e pesquisas) quanto na historiografia da Etnomatemática que emerge no campo da Educação Matemática e, ainda, também, no que diz respeito às histórias referentes ao sujeito sócio-histórico (Miarka, 2011; Pellanda, 2008; Valente, 2007; Vianna, 2000; Muniz, 2013; Domite, 2007; Fantinato & Freitas, 2018; Conrado, 2005; Passos, 2017; Monteiro, 2006; Knijnik, 2004; Gerdes, 1996, 2010).

Obviamente os muitos nomes, as distintas vozes e as diferentes classificações (personagem, narrador, autor/escritor, matemático, educador, orientador, amigo, etc.) fazem parte da opção metodológica da investigação e diz respeito unicamente ao movimento analítico efetuado na pesquisa. Não se pretende com isso propor uma fragmentação do Ser do homem sócio-histórico (entendido aqui como totalidade em seu mundo próprio).

Observa-se que grande parte da produção escrita analisada na pesquisa foi inicialmente elaborada e pensada por para o discurso oral; sejam os livros de D’Ambrosio (1985, 1986, 1990, 1999, 2011) ou suas entrevistas Miarka (2011), Pellanda (2008), Valente (2007), Vianna (2000), Muniz (2013), ou, ainda, nas apresentações em eventos que posteriormente foram textualizados — como em D’Ambrosio (2003; 2014) ou, ainda, nos Anais dos Encontros Nacionais de Educação Matemática, ou nos Congressos Brasileiros de Etnomatemática, etc.; os textos foram inicialmente escritos para o discurso oral, para apresentação em palestras e seminários, congressos e encontros da Educação Matemática. Esta produção percorre o caminho que vai da enunciação ao enunciado, da oralidade à textualidade/escritura. Sendo assim, entende-se que parte da obra textual que chega até o leitor foi inicialmente idealizado para a apresentação diante de uma plateia[2].

Nos Anais dos Encontros Nacionais de Educação Matemática[3], vê-se a inscrição das palavras de D’Ambrosio e os modos como ele operou o discurso no sentido de promover suas propostas. Na palestra de abertura do I Encontro Nacional de Educação Matemática (I ENEM), em fevereiro de 1987, observa-se uma caracterização da Educação Matemática (D’Ambrosio, 1987) que aponta para a Etnomatemática:

Ao examinar as tendências da Educação Matemática para a década seguinte nos defrontamos com desafios das mais diversas áreas do conhecimento. Começamos por preocupações de natureza histórica e epistemológica, visando a uma compreensão mais adequada da própria natureza do conhecimento matemático e científico, que passa agora por profunda revisão, sobre tudo em consequência do reconhecimento de diversas formas de explicação até então consideradas marginais, tais como a etnomatemática (D’Ambrosio, 1987, p. 4).

Um exemplo emblemático dos muitos D’Ambrosios da Etnomatemática pode ser observado na história em quadrinhos produzida pelo Grupo de Amigos do Ubiratan (GAU), em anexo; a narrativa apresenta um personagem icônico, o D’Ambrosio da Etnomatemática.

Há de se considerar, portanto, para fins interpretativos, os distanciamentos (Ricoeur, 2011) existentes entre o que foi dito, falado, pronunciado pelo sujeito sócio-histórico (empírico, de carne e osso) em certo espaço-tempo, para um determinado público, com sua intencionalidade específica/original, e o que posteriormente foi transcrito e/ou textualizado, direcionado para um leitor potencial qualquer, contado pela voz de um personagem (que participa da ação ou que apenas observa) e pela voz de um narrador .heterodiegético ou homodiegético).

A narrativa histórica que emerge da produção textual de D’Ambrosio, principalmente aquela entre as décadas de 1980 e 2000, apresenta um mundo pra o seu leitor e, ao fazê-lo, enlaça o leitor no interior daquele mesmo mundo. Juntos, personagem, narrador e leitor, fazem parte da densa estrutura social tecida no texto: (a) “Science, and in particular mathematics in rich countries, is impregnated with the smell of this glorious past!”[4] (D’Ambrosio, 1985, p. 77); (b) “we see the future of elementar education turning into instrumentation subject...”[5] (D’Ambrosio, 1985, p. 63); (c) “this concept of transgressing the limits, we are lead to the idea of breaking rules, overturning conventions and even abrogating laws and codes”[6] (D’Ambrosio, 1985, p. 19).

As estórias escritas por D’Ambrosio (1985, 1986, 1990, 1999, 2011) podem, em muitos casos, nos remeter ao trágico — “Um escape para os índios tem sido a prática de suicídio” (D’Ambrosio, 2011a, p. 79) — ou ao sublime e, em geral, remete-nos à proposição de que a Etnomatemática se apresenta como uma espécie de solução poética ao desafio que emerge da trama por ele tecida (Marchon, 2018). Assim, por exemplo:

Ao mesmo tempo que se conhece a matéria nos seus componentes mais básicos e se é capaz de produzir fontes de energia que são como minissóis na Terra, essas mesmas fontes de energia são concentradas em artefatos militares e utilizados como elemento de pressão política, aterrorizando populações inteiras e efetivamente representando uma ameaça para a própria continuidade da vida, em todas as suas formas, no nosso planeta (D’Ambrosio, 1990, p. 41).

E, nesse sentido, tendo apresentado um mundo e a sua problemática, enunciado os profundos e complexos problemas que exigem uma resolução, o escritor produz as cenas que possibilitam a emergência da Etnomatemática —“Um modelo adequado para se facilitar esse novo estágio na evolução da nossa espécie é chamado Educação Multicultural, que vem se impondo nos sistemas educacionais de todo o mundo” (D’Ambrosio, 2011a, p. 62); e, mais que isso, “A abordagem a distintas formas de conhecer é a essência do Programa Etnomatemática” (D’Ambrosio, 2011a, p. 63); pois, em seus termos, “Nossas responsabilidades, como educadores numa democracia, vão além de reproduzir o passado e os modelos atuais. Estamos preocupados em construir um futuro… Melhor que o presente” (D’Ambrosio, 1990, p. 24).

Nota-se que a voz do personagem D’Ambrosio pode ser considerada a principal voz da narrativa histórica da Etnomatemática, para a Etnomatemática, no contexto da Educação Matemática (Passos, 2017; Valente, 2007; Domite, 2006; Muniz, 2013; D’Ambrosio 2011b, Rosa & Orey, 2014; Marchon, 2018). Mesmo quando a figura do enunciador desaparece — o Eu que diz algo—, ainda assim a voz que narra os acontecimentos da história permanece presente. E, vez por outra, o autor/escritor se deixa captar a partir das suas inserções discursivas no conteúdo do enunciado textualizado. E, assim, muitas vozes contam uma estória da história da Etnomatemática no mundo do texto etnomatemático d’ambrosiano.

E, no caso da oralidade cabe tomar de empréstimo a noção de cena e cenografia como empregada por Maingueneau (2015), pois, para o analista do discurso, “enunciar não é apenas ativar as normas de uma instituição de fala prévia; é construir sobre essa base uma encenação singular da enunciação: uma cenografia” (Maingueneau, 2015, p. 122). Quem diz algo, quem fala alguma coisa, quem enuncia, nos diz ele, “organiza a situação a partir da qual pretende enunciar” (Maingueneau, 2015, p. 123), pois, busca “suscitar a adesão dos destinatários instaurando uma cenografia que o legitima” (idem).

Poder-se-ia dizer que o início da estória da História da Etnomatemática ocorre em função do estranhamento dos personagens que dividem a cena enunciada; o conflito surge das atuações destes atores[7] na cena narrada. Ao assumir um modelo actancial, toda a história progride “das relações possíveis entre actantes em direção à rica combinatória de ações, sejam estas chamadas contratos, provas, buscas ou lutas” (Ricoeur, 2014, p. 152). Os actantes são os seres ou as coisas que, ativamente ou passivamente, participam do processo narrativo alterando a configuração da cena, levando-a de um estado inicial a um estado final. No modelo actancial, fala-se em sujeito e antissujeito, herói e vilão, e a narrativa estrutura-se em torno de uma polêmica, uma disputa, uma oposição entre os personagens em torno de um interesse comum[8].

Assim, por exemplo, lê-se que as ideias expressas por D’Ambrosio representam “esperança de redenção” (D’Ambrosio, 1986, p. 8) para uns, mas, por outro lado, são uma ameaça para outros; muito possivelmente para o grupo dos seus opositores — “sou levado a acreditar que minha proposta educacional representa esperança de redenção para alguns e ameaça para outros” (D’Ambrosio, 1986, p. 8) —. O escritor se apropria das palavras “esperança” e “redenção”, efetuando um deslocamento de sentido em relação a estas palavras.

O foco da argumentação d’ambrosiana, em seus primeiros textos, orientados para a Etnomatemática, parece ser a persuasão do público (auditório/leitor) (Citelli, 1989). Ora, está em jogo muito mais que uma história narrada, mas, também, a figura do homem que narra tal história; e como nos diz a teoria da retórica, “A vida do orador, na medida em que é pública, constitui um longo preâmbulo ao seu discurso” (Perelman & Olbretchts-Tyteca, 2000, p. 364), ou seja, contribui para compor o cenário do discurso que é encenado diante do público.

Comunicar suas ideias educacionais acerca do ensino da matemática para um auditório real, resistente às suas ideias, é algo que deve ser considerado pelos leitores do mundo do texto etnomatemático d’ambrosiano. O desafio do educador matemático não era propriamente, e tão somente, o de informar algo a alguém, mas sim, fundamentalmente, o de conquistar a simpatia e adesão de um público hostil às ideias enunciadas — ver, por exemplo, o prefácio em D’Ambrosio, 1986; “aqueles que a rejeitam como um todo” (D’Ambrosio, 1986, p.8); “juntam-se ao lado mais cômodo dos que atacam, e o fazem de maneira maldosa” (idem) —. O Eu da voz da narrativa convoca o nós, leitores do texto, para dentro da argumentação. Tem-se na composição da intriga do texto etnomatemático de D’Ambrosio um efeito de enlace; o leitor é trazido para dentro do texto . “A responsabilidade dos educadores de matemática com relação ao futuro é central e precisamos entender nosso papel nessa rede complexa de responsabilidades divididas” (D’Ambrosio, 1990, p. 25).

Nota-se ainda que D’Ambrosio (1986), ao dialogar com o leitor em seu prefácio, narra uma história de luta, disputa e tensão ao falar da emergência da Etnomatemática na Educação Matemática. O narrador conta uma história em que ele é testemunha ocular dos acontecimentos e protagonista da ação — autor, personagem e narrador misturam-se nesta cena.

Uma verdade histórica é apresentada ao leitor, a saber, que “A história nos ensina que a crítica e censura têm sempre estado presentes na REALIDADE na qual se desenvolve a AÇÃO inovadora” (D’Ambrosio, 1986, p.8. grifo do autor). Esta história fala ainda, neste contexto próprio da sua argumentação, de uma Matemática obscura, viciada, mística — “continuo na luta contra sistemas educacionais e modelos de desenvolvimento repressivos, inclusive combatendo o seu instrumento discriminatório mais eficaz, que é uma Educação Matemática viciada, obscurantista e mistificada” (D’AMBROSIO, 1986, p. 8) —. Novamente, deslocamentos de sentidos a partir do uso das palavras de modo a criar no público/leitor simpatia e/ou repulsa. Os juízos de valor afloram no texto. O que se lê é uma história a partir do olhar de um personagem.

O texto etnomatemático de D’Ambrosio também recorre, no nível da composição da intriga, a uma poética apocalíptica (Kermode, 2000). A crise instituída pelo pensamento apocalíptico permite que a narrativa se estruture a partir de uma sequência de ações, até o momento que antecede o fim emblemático, de modo que seja possível reverter a crise enunciada. A narrativa deve sofrer, portanto, uma reviravolta emblemática na ação. O tempo da história narrada depende do final mítico descrito e da crise que a antecede e, por isso, inevitavelmente, a história afirma que o tempo presente é o tempo da transição, da transformação, é o tempo de um estar entre. D’Ambrosio (1990) cria em seu mundo do texto uma história que narra um momento crítico, perturbador e angustiante para a espécie humana. Todos os homens se encontram, em sua história (story) da História (history), à beira da extinção.

Estaremos atingindo o final de um modelo cognitivo em que ao mesmo tempo em que nos permite nos aproximarmos de uma verdade totalizadora, que nos desvenda o pequeno e o grande, o interior e o exterior, nos força a dar o passo final em direção ao sacrifício total, e assim atingirmos a meta existencial, estendendo para toda a espécie a meta da extinção em direção à qual inexoravelmente caminhamos como indivíduos? (D’Ambrosio, 1990, p. 44)

A mudança é necessária para que a trama tenha um desfecho não apocalíptico. Busca-se enlaçar o leitor, comprometê-lo eticamente, para evitar o “sacrifício total” (idem) anunciado. Mas, pergunta-se, como evitar o fim apocalíptico? O que poderá solucionar a crise enunciada? Dentro da argumentação d’ambrosiana a matemática e o seu ensino estão na base de todas as transformações tecnológicas e científicas que podem para o bem ou para o mal transformar a humanidade; mudança desejável antes de um possível fim emblemático, antes da catástrofe total (Kermode, 2000).

Uma solução proposta pelo matemático é agir no campo educacional e, mais especificamente, a partir da fala do educador matemático, modificar o ensino da matemática escolar.

O autor do texto defende a transformação da sociedade a partir de um novo modelo de Educação Matemática: “A Etnomatemática surge, nesse caso, como uma solução poética para a crise instituída na história” (Marchon, 2018, p. 149). E, nesse contexto, a esperança de redenção enunciada (D’Ambrosio, 1985) parece fazer ainda mais sentido para os leitores do texto de D’Ambrosio.

3. INTERTEXTUALIDADE E VOZES DO DISCURSO

Ao investigar o aspecto literário e poético da composição do texto etnomaemático d’ambrosiano o seu caráter transtextual[9], no discurso que compõe a sua narrativa, ficou evidenciado (Marchon, 2018). No entanto, antes, pode-se pergunta qual o papel e o valor da literatura para Ubiratan D’Ambrosio? Em uma entrevista, no ano de 2008, o educador matemático fornece algumas pistas sobre o papel que a literatura desempenha em sua formação, em seu modo de ver e entender o mundo e, também, em sua própria escrita[10]. Segundo ele, na adolescência, cresceu o seu interesse pelas leituras históricas e também pela literatura de ficção - Shakespeare (em inglês), Cervantes (em espanhol), Balzac e Flaubert (em francês). Ele nos revela que:

Não aprendi alemão — lamento — e não conheci Goethe, Thomas Mann e tantos outros escritores alemães, que eu só iria encontrar um pouco mais tarde, em traduções. Esses autores muito me marcaram. Num momento da vida, aproximando-me dos quarenta anos, descobri uma outra direção de leitura, uma maior intimidade com o autor e a busca de algo que ele não quis tornar explícito. Foi uma busca de uma dimensão mística, talvez psíquica, da espiritualidade intrínseca à obra. Situo o ponto de partida para o redirecionamento de minhas leituras meu acesso ao livro de Rollo May: Love and Will. Aprendi a ler o meu íntimo (D’Ambrosio apud Pellanda, 2008, p.20).

Segundo ele, “Daí foi uma re-fascinação pela História e pela releitura dos clássicos gregos” (D’Ambrosio, 2008, p.20), e, além disso, também “Freud, Jung e William Reich [...] Thomas Mann, Aldous Huxley, Hermann Hesse e o impressionante Robert Musil” (D’Ambrosio, 2008, p. 20). O matemático prossegue:

Também fui muito influenciado pelo pensamento crítico francês do pós-guerra. Particularmente Lacan, Derrida, Sartre, Merleau-Ponty, Foucault e daí por diante. Foi uma forma de me descobrir. O cinema alemão, particularmente Fassbinder e Herzog, como já havia acontecido com Bergman, se encaixaram muito bem no meu crescente interesse pela visão transdisciplinar e transcultural do mundo simbólico. As leituras populares sobre esse mundo simbólico, então best-sellers entre os mais jovens, me atraíram muito. Li, com muito interesse, o J.D.Salinger, e o interessantíssimo Zen e a Arte de Manutenção de Motocicletas, de Pirsig. Essa aproximação com o Oriente, característica do início da segunda metade do século XX, foi e continua sendo, para mim, muito atrativa. (D’Ambrosio apud Pellanda, 2008, p. 20)

Neste ponto poder-se-ia assumir que a produção textual d’ambrosiana possui uma dimensão literária/ficcional implícita e, em certos casos explícitos. Conscientemente ou não, intencionalmente ou não, ele projeta em seu texto elementos poéticos, literários, ficcionais. Uma hipótese a ser explorada, é a de que na intertextualidade d’ambrosiana tem-se uma multiplicidade de vozes que ecoam em seu mundo próprio. Pode-se afirmar que “a intertextualidade, que supõe a co-presença de pelo menos dois textos (alusões, citações, plagiato...), é a relação mais visível” (Maingueneau, 1996, p. 27) da transtextualidade observada na composição da intriga da narrativa que emerge do mundo do texto etnomatemático d’ambrosiano.

No terceiro capítulo de D’Ambrosio (1985), entre as páginas 51 e 56, o narrador da história se apoia em um fragmento de uma obra literária — As confusões do jovem Törless (publicado em 1906), de Robert Musil (1880-1942) — para exemplificar e reforçar seus argumentos em favor de uma nova postura diante da matemática escolar e, simultaneamente, contra uma tradição do ensino da matemática escolar. As quatro páginas exibem os diálogos de uma obra ficcional. É o que Maingueneau (2008) chama de intertextualidade externa: “um discurso define, além do mais, certa relação com outros campos, segundo sejam citáveis ou não” (Maingueneau, 2008, p. 78); e, assim, Musil (2003) e o seu jovem Törless são tanto parte do intertexto do discurso que compõe o mundo do texto etnomatemático d’ambrosiano — isto é, um fragmento citado por D’Ambrosio —, como, também, de outro modo, estabelece a co-presença de outros personagens.

Elas agem como dispositivos de sensibilização do público (auditório/ leitor) e visam reforçar a defesa que se faz da necessidade de mudar a realidade histórica descrita em seu texto. Pode-se, também, afirmar que os diálogos dos personagens fictícios da obra literária desempenham um papel central em sua argumentação, pois reforçam a cenografia do discurso encenado. Implicitamente tem-se uma correspondência entre a realidade sócio-histórica (mundo da ação humana) e a realidade ficcional literária (mundo do texto).

O exemplo de Törless pode ser repetido. Embora colocados no início do século, onde muitos questionamentos profundos eram conceito comum — não se esqueça do desafio da sociedade industrial por meio dos movimentos trabalhistas, a construção da Primeira Guerra Mundial, a aparição da psicanálise na mesma Áustria de Musil — a profundidade do questionamento de nossos dias atuais é semelhante (D’Ambrosio, 1985, p. 55). Tradução livre.

O autor, pela voz do narrador, oferece ao leitor um resumo do texto de Musil (2003).

Na estória da história enunciada afirma-se a possibilidade de repetição em outros cenários e contextos, em outros momentos históricos, do que houve com o jovem austríaco do texto de Musil (2003). Repetição dos acontecimentos ficcionais no real da realidade socio-histórica que reconfigura as cenas até então encenadas pelo discurso de D’Ambrosio. As indagações e experiências do personagem ficcional poderiam ser replicadas para outros estudantes (reais, empíricos, de carne e osso) para além da obra literária.

D’Ambrosio (1985) apresenta ainda, neste contexto, uma versão das experiências dos adolescentes, de todos os adolescentes, ao redor do mundo. Coordenação da heterogeneidade da vida em um espaço homogêneo, a sua narrativa histórica. Em sua versão romanceada, dir-se-á poética, ele nos diz: “the obvious identification of youth all over the world with their pairs” (D’Ambrosio, 1985, p. 55); em tradução livre, existe uma “óbvia identificação da juventude em todo o mundo com seus pares” (D’Ambrosio, 1985, p. 55). A afirmação categórica induz os leitores a assumir tal obviedade. Esta é uma verdade em seu mundo próprio. Seria um fato sócio-histórico observável? Seria uma espécie de verdade antropológica? Cabe ao leitor do texto etnomatemático d’ambrosiano averiguar.

A hipótese aceita por D’Ambrosio é a de que a visão do escritor Robert Musil acerca da matemática e do seu ensino, uma visão externa à matemática e distinta daquela compartilhada por matemáticos e professores de matemática, é totalmente repassada para a ação encenada pelos personagens do mundo ficcional e, além disso, neste caso, ela retrata a realidade como ela é de fato.

D’Ambrosio, hábil orador e um escritor cuidadoso, constrói seu discurso de modo a inspirar a confiança e a simpatia dos seus leitores. Dentre as muitas estratégias retóricas empregadas pelo autor na tentativa de persuadir o seu público (Citelli, 1989) observa-se que o escritor convoca para interior do seu mundo do texto as vozes de personagens do mundo ficcional (literário). O escritor recorre às palavras do “grande mestre” (D’Ambrosio, 1986, P.8) Cervantes e toma de empréstimo a fala do cavaleiro da triste figura, Dom Quixote: “Perdoname, amigo, de La ocasion que te He dado de parecer loco como you, haciendote caer em El error em que yo He caído, de que hubo y hay caballeros andantes em El mundo” (D’Ambrosio, 1986, P.8). A citação, no contexto da obra de Cervantes, faz parte dos momentos finais da vida do anti-herói que, acometido de uma febre, pede desculpas ao leal escudeiro Sancho Pança. O matemático, então, assume algo que, até aqui, apenas se insinuou, a saber, que “A literatura de ficção científica, com cenários de um futuro imaginoso e fantasioso, tem me atraído e se incorporou aos meus cursos e palestras” (D’Ambrosio, 2008).

O futuro possível, distinto do momento presente enunciado, parece ser especialmente importante para a escrita desta história da Etnomatemática. Alguns destes personagens são (ou foram) partes da realidade socio-histórica, são seres reais identificados por seus nomes, são não fictícios. Outros habitam apenas as páginas das obras de ficção.

Analogamente, quando o narrador-autor atesta que “ideology, implicit in dressing, housing, titles, so superbly demounced by Aimée Cesaire in La Tragédie du Roi Christophe”[11] (D’AMBROSIO, 1985, p. 77), tem-se um personagem não-fictício (Aimée Cesaire) e um personagem fictício (Rei Christophe) que surgem na composição do enredo para fundamentar as reflexões acerca da ideologia (Marchon, 2018, p. 180).

O texto produzido e assinado por D’Ambrosio é habitado por diferentes personagens. Ocorre, de fato, uma proliferação de personagens. Tem-se, portanto, que uma multiplicidade de vozes ecoam em seu mundo do texto. Ao compor sua intriga D’Ambrosio explora, ainda, o aspecto dramático (no sentido teatral), encenando falas e acontecimentos (Maingueneau, 1996) para uma plateia virtual. E, como a história da Etomatemática no Brasil acompanha, em muitos momentos, a história de vida do próprio D’Ambrosio, muitos acontecimentos emergem da sua narrativa autobiográfica.

O Cecconi precisava de um assistente; conversou: tem algum colega? Ah! tenho o Ubiratan que está dando aula na PUC lá em Campinas e em São Paulo. Dá aula em um monte de lugar, mas talvez ele se interesse, em tempo integral — tinha que ser tempo integral. Aí me telefonaram, puxa! Eu falei com minha mulher, minha noiva: o que que nós vamos fazer? — A casa já pronta Vamos? E ela: vamos, vai ser bom, morar lá no interior é bom e para sua carreira vai ser bom... (D’Ambrosio apud Vianna, 2000, p. 102).

Aceitar a proposta exige do casal uma decisão que implica mudança. Há uma encenação, uma dramatização da narrativa. Lembra-se aqui o que afirma Ricoeur (2012c); para o filósofo francês, “No rico repertório das formas adotadas pela voz do autor implicado, o narrador se distingue do autor implicado sempre que é dramatizado por ele mesmo” (Ricoeur, 2012c p. 276). Nota-se ainda que alguns dos personagens são tipos-genéricos – “A ciência, e em particular a matemática nos países ricos, é impregnada com o cheiro desse passado glorioso” (D’Ambrosio, 1985, p.77) - Eles preenchem a narrativa. Representa uma coletividade, um grupo, uma massa indistinta de seres; a ciência, a matemática, os gregos, o homem ocidental, países ricos, países do terceiro mundo, nossa espécie, pessoas iletradas, pobres da classe média, professores, pensamento ocidental, etc. Há, supostamente, uma identidade compartilhada no plano do texto.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A trama tecida no texto etnomatemáttico mostra-se como um reflexo do seu próprio tempo histórico. É sob o olhar de D’Ambrosio, protagonista e narrador das histórias, que muitos acontecimentos são descritos e interpretados. Pode-se dizer que a obra textual assinada pelo educador matemático abriu um novo caminho dentro da Educação Matemática ao dialogar com a literatura ficcional, com as produções cinematográficas, com as novas mídias digitais, e como todo um amplo universo simbólico que ultrapassa o da Matemática e da Educação matemática do seu tempo. Pode-se mesmo afirmar que os escritos de D’Ambrosio traçaram uma linha de fuga no mapa até então existente na Educação Matemática. Seu trabalho estabeleceu uma rota alternativa aos pesquisadores que buscavam novas possibilidades, para agir e pensar a Educação Matemática. Ao criar uma realidade sobre a irrealidade da ficção (e vice-versa), ao narrar uma história por vir e enunciar uma crise, um momento de transição, e apontar para o provável fim apocalíptico do ser humano, o escritor subverte e amplifica os fatos da realidade socio-histórica para, em sua argumentação, conduzir nossos pensamentos e reflexões em direção a outro mundo, o seu próprio mundo materializado em seus escritos. Mundo idealizado, utópico, poético.

Observa-se que a oralidade e seu aspecto retórico marcam os discursos inscritos na narrativa das histórias que emergem da Etnomatemática d’ambrosiana. Nota-se ainda, na composição da intriga da narrativa histórica da Etnomatemática d’ambrosiana, que não raro um homem genérico, herdeiro de um passado histórico clássico, grego, que cresce na modernidade e se converte em produto dos avanços tecnológicos que ele mesmo cria é apresentado para o leitor. O belo e o feio, a destruição e a construção do mundo, o bom e o mau, disputam espaço na trama desta história. O homem deve se implicar eticamente nesta história da História e, assim, tornar-se o salvador do próprio homem (tradicional, obsoleto, destrutivo, etc.). Um homem-tecnológico-científico que dependente totalmente da Matemática. Pode-se ainda dizer que o modo como o matemático narra suas histórias da História, elencando personagens reais e irreais, descrevendo cenários prováveis e pintando um presente e um passado em declínio, em mudança, em transição, contribuem para a construção de novas subjetividades no contexto das pesquisas em Educação Matemática.

Seu trabalho, por fim, não se limitou a descrever o que estava diante dos olhos, mas, sim, ultrapassou os limites do factual e se lançou à fabulação de um provável mundo novo, inspirando e movendo a pesquisa.

REFERÊNCIAS

Bakhtin, M.[ Volóchinov]. (2014). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico da linguagem. Hucitec.

Breda, A. & Lima, V. M. R. (2011). Etnomatemática sob dois pontos de vista: a visão “D’Ambrosiana” e a visão Pós-Estruturalista. Revista Latinoamericana de Etnomatemática. 4(2), 4 – 31. https://www.revista.etnomatematica.org/index.php/RevLatEm/article/view/31

Candido, A.; Rosenfeld, A.; Prado, D. A. & Gomes, P. E. S.(1974). A personagem de Ficção. Editora Perspectiva.

Citelli, A.(1989). Linguagem e Persuasão. Série Princípios. Ática.

Conrado, A. L. A (2005). A pesquisa brasileira em Etnomatemática: desenvolvimento, perspectivas, desafios. (Dissertação de Mestrado em Educação) Programa de Pós-graduação em Educação, Universidade de São Paulo. São Paulo: USP.

Cunha, D. (2011). Formas de presença do outro na circulação dos discursos. Bakhtiniana. Revista De Estudos Do Discurso, (5), 116–132. https://revistas.pucsp.br/index.php/bakhtiniana/article/view/5185

D’Ambrosio, U. (1985). Socio-Cultural bases for Mathematics education. Transcrição de uma palestra realizada pelo autor. UNICAMP.

D’Ambrosio, U. (1986). Da realidade à ação: reflexões sobre Educação e Matemática. Ed. Da Universidade Estadual de Campinas.

D’Ambrosio, U. (1987, fevereiro). A Educação Matemática na década de 1990: Perspectivas e desafios. Anais do I Encontro Nacional de Educação Matemática. http://www.sbembrasil.org.br/files/enemI.pdf

D’Ambrosio, U. (1990). Etnomatemática: Arte ou técnica de explicar ou conhecer. Ática.

D’Ambrosio, Ubiratan. (1993). Etnomatemática: Um Programa. Educação Matemática em Revista, SBEM, (1), 5-11.

D’Ambrosio, U. (1999). Educação para una sociedade em transição. Papirus.

D’Ambrosio, U. (2011a). Etnomatemática: Elo Entre as Tradições e a Modernidade. Autêntica.

D’Ambrosio, U. (2011b). Uma História Concisa da Matemática no Brasil. Vozes.

D’Ambrosio, U. (2003, julho). Reminiscências pessoais de minha atuação enquanto Presidente do Comitê Interamericano de Educação Matemática/CIAEM. Sessão plenária na XI Conferência InterAmericana de Educação Matemática.

D’Ambrosio, U. (2014, setembro). Como foi gerado o nome etnomatemática ou alustapasivistykselitys. Anais do Encontro de Etnomatemática do Rio de Janeiro (ETNOMAT-RJ).

Domite, M. C. (2007).Ubiratan D’Ambrosio e a Etnomatemática. In VALENTE, W. R. (Org). Ubiratan D‘Ambrosio: conversas; memórias;vida acadêmica;orientandos; educação matemática; etnomatemática; história da matemática;inventário sumário do arquivo pessoal. (pp. a – b) Annablume.

Eco, U. (2018). Confissões de um joven romancista. Record.

Fantinato, M. C. & Freitas, A. V. (Orgs.). (2018). Etnomatemática: concepções, dinâmicas e desafios. Paco.

Genette, G. (2006). Palimpsestos: a literatura de segunda mão. FALE/UFMG.

Gerdes, P. (1996). Etnomatemática e Educação Matemática: Um panorama geral. Revista Quadrante. 5(2), 105-138.

Gerdes, P.(2010). Da Etnomatemática a arte-design e matrizes cíclicas. Autêntica.

Kermode, F.(2000). The sense of an ending: studies in the theory of fiction. Oxford University Press.

Knijnik, G. (et Al.). (2012). Etnomatemática em movimento. Editora autêntica.

Knijnik, G. (2004). Itinerários da Etnomatemática: questões e desafios sobre o cultural, o social e o político na educação matemática. In: Knijnik, G.; Wanderer, F. & Oliveira, C.J.(Org.). Etnomatemática, currículo e formação de professores.(pp.19–38). EDUNISC.

Koch, I. G. V. (2011). Argumentação e linguagem. Cortez.

Lima, L. C. (2016). A ficção externa e a historiografia. Malerba, J. (org.). História e Narrativa: ciência e a arte da escrita histórica. (pp. 75-84).Vozes.

Maingueneau, D. (1996). Pragmática para o discurso literário. Martins Fontes.

Maingueneau, D. (2015). Discurso e análise do discurso. Parábola Editorial.

Maingueneau, D.(2008). Gênese dos discursos. Parábola Editorial.

Marchon, F. L. (2018). A Poética, a Retórica e a Narrativa do Mundo do Texto etnomatemático d’ambrosiano. (Tese de Doutorado em Educação). Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense.

Miarka, R. (2011). Etnomatemática: do ôntico ao ontológico. (Tese de doutorado em Educação Matemática). Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho.

Meira, C. J. (2021). As concepções de cultura nas teses de Etnomatemática: uma presença ausente. (Tese de Doutorado em Educação). Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense.

Monteiro, A. (2006). Etnomatemática: papel, Valor e significado. In: Domite, M. & Ferreira, R. (orgs.). Etnomatemática: papel, valor e significado. (pp. 13 – 37). Zouk.

Muniz, N. C. (2013). Relatos de memórias: a trajetória histórica de 25 anos da Sociedade Brasileira de Educação Matemática (1988-2013). Editora Livraria da Física.

Musil, R. (2003). O Jovem Törless. Ed. Folha de São Paulo.

Passos, C. M. (2017). Condições de produção e legitimação da Etnomatemática. (Tese de Doutorado em Educação). Universidade Federal de São Carlos.

Pellanda, L. H. (2008, outubro). Manifestações criativas. Revista Rascunho. (9), n. 102. http://rascunho.com.br/wp-content/uploads/2012/05/Book_Rascunho_102.pdf.

Perelman, C. & Olbrechts-Tyteca, L. (2000). Tratado da argumentação: a nova retórica. Martins Fontes.

Reuter, Y. (2014). A análise da narrativa: o texto, a ficção e a narração. Difel.

Ricoeur, P. (1978). O Conflito das interpretações: ensaios de hermenêutica. Imago Editora LTDA.

Ricoeur, P. (2007). A Memória, a história, o esquecimento. Editora da Unicamp.

Ricoeur, P. (2011). Teoria da interpretação: o discurso e o excesso de significação. Edições 70.

Ricoeur, P. (2011a). Tempo e narrativa 1: A intriga e a narrativa histórica. Martins Fontes.

Ricoeur, P.(2012b). Tempo e narrativa 2: A configuração do tempo na narrativa de ficção. Martins Fontes.

Ricoeur, P. (2012c).Tempo e narrativa 3: O tempo narrado. Martins Fontes.

Rosa, M. & Orey, D. C. (2014). Fragmentos Históricos do Programa Etnomatemática. In Anais do 6o. Encontro Luso-Brasileiro de História da Matemática (pp.535-558). https://docplayer.com.br/11025075-Fragmentos-historicos-do-programa-etnomatematica.html

Rosa, M. & Orey, D. C.(2005). Raízes históricas do programa Etnomatemática. Educação Matemática em Revista, v. 12 (18-19), 5-14.

Rüssen, J. (2016). Narração histórica: fundações, tipos, razão. Malerba, J. (Org.) História e Narrativa. A ciência e a arte da escrita histórica. (pp. 45 – 58).Vozes.

Topolski, J. (2016). O papel da lógica e da estética na construção de totalidades narrativas na historiografia. Malerba, J. (Org.) História e Narrativa. A ciência e a arte da escrita histórica. (pp. 59 – 74).Vozes.

Valente, W. R. (Org.). (2007). Ubiratan D’Ambrosio: conversas; memórias; vida acadêmica; orientandos; educação matemática; Etnomatemática; história da matemática; inventário sumário do arquivo pessoal. Annablume.

Vianna, C. R. (2000). Vidas e circunstâncias na Educação Matemática. (Tese de doutorado em Educação). Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. http://www2.fc.unesp.br/ghoem/trabalhos/27_7_tese_carlos_vianna.pdf

Veyne, P. M. (1982). Como se escreve a história; Foucault revoluciona a história. Editora Universidade de Brasília.

White, H. (2014). Trópicos do Discurso: Ensaios sobre a crítica da cultura. Editora da Universidade de São Paulo.

ANEXO




Facebook do Grupo de Amigos de Ubiratan (GAU). Disponível em: https://www.facebook.com/grupodeamigosdoubi/photos/a.736089533150250.1073741827.736084856484051/918125501613318/?type=3&theater Acesso em: 29/09/2022.

Notas

[2] Entenda-se aqui, neste contexto, que muitas das ideias defendidas por D’Ambrosio foram apresentadas em seminários, palestras, mesas redondas, congressos, etc. Assim, pessoas de carne e osso, sujeitos socio-históricos, alguns simpatizantes e outros críticos das ideias proferidas, estavam presentes na plateia. Pessoas a quem D’Ambrosio se dirigiu.
[3] Disponível em http://www.sbembrasil.org.br/sbembrasil/index.php/anais (visualizado em 01/10/2022).
[4] Tradução nossa: "A ciência, e em particular a matemática nos países ricos, é impregnada com o cheiro desse passado glorioso".
[5] Tradução nossa: "Vemos o futuro da educação elementar se transformando em objeto de instrumentação ...".
[6] Tradução nossa: "esse conceito de transgressão dos limites, somos levados à idéia de violar regras, revogar convenções e até abrogar leis e códigos"
[7] Obs.: Este fragmento foi retirado da tese do autor. Os personagens são entendidos como atores (actantes) que encenam um acontecimento em um espaço-tempo específico. Sobre isso Ricoeur (2014) comenta que: “É com o modelo actancial de Greimas que a correlação entre enredo e personagem é levada ao nível mais elevado de radicalismo, anteriormente a qualquer figuração sensível. Por isso, não se fala aí de personagem, mas de actante, a fim de subordinar a representação antropomórfica do agente à sua posição de operador de ações no percurso narrativo” (Ricoeur, 2014, p. 151-152) [itálico no original]. E, mesmo que não estejamos buscando na semiótica de Greimas (1917-1992) as bases para nossa perspectiva analítica, estas noções emergem a partir da teoria ricoeuriana adotada nesta empreitada.
[8] De acordo com o filósofo francês: “[...] eu gostaria de insistir no lugar ocupado – num plano mediano entre estruturas profundas e plano figurativo — por uma série de noções que só têm espaço numa concepção narrativa da coesão íntima da vida: primeiramente, a de programa narrativo e depois a de relação polêmica entre dois programas, donde resulta a oposição entre sujeito e antissujeito. Encontramos aquilo que pré-compreendemos no plano da simples inteligência narrativa, a saber, que ação é interação, e a interação, competição entre projetos que ora são rivais e ora convergem” (Ricoeur, 2014, p. 152).
[9] A intertextualidade, segundo Genette (2006), é um tipo de transtextualidade, algo que transcende os limites de um texto que, de modo restrito, é uma “relação de co-presença entre dois ou vários textos” (Genette, 2006, p. 8); a citação é a sua forma mais usual. Todo empréstimo, declarado ou não, cujo caso extremo é o plagiato, pode ser enquadrado como parte da intertextualidade de uma obra. Pode-se afirmar que “a intertextualidade, que supõe a co-presença de pelo menos dois textos (alusões, citações, plagiato...), é a relação mais visível” (Maingueneau, 1996, p. 27) da transtextualidade. Maingueneau (1996), ao realizar um estudo do discurso literário a partir da perspectiva da pragmática, afirma que muitos textos são “como uma verdadeira encruzilhada intertextual em que a palavra do enunciador é constantemente habitada por outras, tecida de seu eco” (Maingueneau, 1996, p. 26). Este parece ser o caso do texto etnomatemático d’ambrosiano, uma encruzilhada intertextual.
[10] Fonte: Revista Rascunho, ano 9, número 102, outubro de 2008. Entrevista com Luis Henrique Pellanda.
[11] Tradução nossa: "Ideologia, implícita em vestimentas, moradia, títulos, tão devidamente denunciadas por Aimée Cesaire em La Tragédie du Roi Christophe"


Buscar:
Ir a la Página
IR
Modelo de publicação sem fins lucrativos para preservar a natureza acadêmica e aberta da comunicação científica
Visor de artigos científicos gerado a partir de XML JATS4R