Demanda Contínua
Recepção: 09 Novembro 2021
Aprovação: 25 Junho 2022
Resumo: O presente estudo teve como objetivo discorrer como a Educação Ambiental se apresenta no currículo dos cursos de Licenciatura em Ciências Sociais, História, Geografia e Ciências Biológicas da Universidade Federal da Paraíba - UFPB, Campus de João Pessoa. Para tanto, se pautou em uma pesquisa qualitativa, figurando o significado subjetivo das mensagens expressas nos conteúdos analisados, através da Análise Documental. Para o tratamento dos dados encontrados, foi utilizada, em associação à Análise Documental, a Análise de Conteúdo, na busca das condições contextuais e dos componentes valorativos e históricos, que são mutáveis. Como resultados, foi possível observar que, mesmo com características de uma educação crítica, os currículos ainda apresentam projetos tradicionais e pragmáticos que favorecem abordagens educativo ambientais conservadoras e comportamentalistas. Conclui-se que é primaz que os processos formativos, as capacidades desenvolvidas, os perfis profissionais e os conteúdos abordados no campo curricular estejam pautados na compreensão da realidade em sua totalidade. Que sejam fundamentados teórica, metodológica e epistemologicamente nas teorias críticas da educação, e que expressem a coerência necessária para que se alcance as transformações esperadas.
Palavras-chave: Currículo, Educação Ambiental Crítica, Formação Inicial de Professores.
Abstract: This study aimed to discuss how Environmental Education is presented in the curriculum of Licentiate Degree courses in Social Sciences, History, Geography and Biological Sciences at the Federal University of Paraíba - UFPB, Campus de João Pessoa. Therefore, it was based on a qualitative research, figuring the subjective meaning of the messages expressed in the analyzed content, through Document Analysis. For the treatment of the data found, Content Analysis was used, in association with Document Analysis, in the search for contextual conditions and evaluative and historical components, which are changeable. As a result, it was possible to observe that, despite the characteristics of critical education, the curricula still present traditional and pragmatic projects that favor conservative and behavioral environmental educational approaches. It is concluded that it is paramount that training processes, developed capacities, professional profiles and contents covered in the curricular field are based on the understanding of reality in its entirety. That they are theoretically, methodologically and epistemologically based on critical theories of education, and that they express the necessary coherence to achieve the expected transformations.
Keywords: Curriculum, Critical Environmental Education, Initial Teacher Training.
Resumen: Este estudio tuvo como objetivo discutir cómo la Educación Ambiental se presenta en el plan de estudios de los cursos de Licenciatura en Ciencias Sociales, Historia, Geografía y Ciencias Biológicas de la Universidad Federal de Paraíba - UFPB, Campus de João Pessoa. Por tanto, se basó en una investigación cualitativa, calculando el significado subjetivo de los mensajes expresados en los contenidos analizados, a través del Análisis Documental. Para el tratamiento de los datos encontrados se utilizó el Análisis de Contenido, en asociación con el Análisis de Documentos, en la búsqueda de condiciones contextuales y componentes evaluativos e históricos, los cuales son modificables. Como resultado, se pudo observar que, a pesar de las características de la educación crítica, los planes de estudio aún cuentan con proyectos tradicionales y pragmáticos que favorecen enfoques educativos ambientales conservadores y conductuales. Se concluye que es primordial que los procesos de formación, capacidades desarrolladas, perfiles profesionales y contenidos cubiertos en el ámbito curricular se basen en la comprensión de la realidad en su totalidad. Que se basen teórica, metodológica y epistemológicamente en teorías críticas de la educación, y que expresen la coherencia necesaria para lograr las transformaciones esperadas.
Palabras clave: Curriculo, Educación ambiental crítica, Formación inicial del profesorado.
1 CURRÍCULO, EDUCAÇÃO AMBIENTAL CRÍTICA E FORMAÇÃO DE PROFESSORES/AS
A compreensão do campo curricular como um campo de escolhas e decisões realizadas no contraditório e no conflito de interesses e valores, que representam a totalidade maior da realidade social e refletem as ideologias e crenças sociais, é um elemento significante para a construção e execução dos currículos, uma vez que o mesmo se concretiza na práxis, e é fruto das interações sociais e culturais de quem os constitui (SACRISTÁN, 2017).
Sacristán (2017) ressalva ainda a característica do currículo de não ser um objeto estático de modelo coerente para pensar a educação e a aprendizagem, mas ser uma expressão, uma função socializadora que expressa e simboliza diversas práticas, pedagógicas, docentes e educacionais.
Nesse sentido, é solícito estar atento e perceber as raízes históricas, sociais, culturais e políticas das ideias e ideais que permeiam o currículo, além de perceber a totalidade na qual o mesmo é percebido, construído e executado. De forma que seja possível desvelar ideologias e valores em forma de consenso e construir, coletivamente, elementos que possibilitem o rompimento com os mesmos.
O entendimento do currículo como um instrumento pedagógico que se realiza no processo de ensino e aprendizagem, e que é capaz de reproduzir os valores vigentes ou de transformar as condições determinantes, é essencial para a Educação Ambiental Crítica, que busca contribuir para a transformação das concepções, as ações e as práticas que se desenvolvem na sociedade.
Para a Educação Ambiental Crítica, é importante que o currículo rompa com os paradigmas modernos, representados pela individualidade, pelo pensamento cartesiano, e o positivismo, que separam, isolam e divide o conhecimento, relegando a compreensão da totalidade dos problemas ambientais (GUIMARÃES, 2004b).
A transposição dessas características reflete na busca por uma formação que transcenda a sensibilização e as mudanças comportamentais e individuais, e alcance as transformações coletivas, sociais e estruturais (LAYRARGUES, 2011). Isso traduz subvergir as determinações econômicas, políticas e sociais, que refletem em ações e concepções de visões reducionistas e conservadoras.
Para tanto, é necessário que o currículo, pensado em concordância com a Educação Ambiental Crítica, observe e abranja a totalidade da multidiversidade do ambiente, que se constitui em unidade na diversidade, e se fundamente em uma práxis dialética. Práxis que, conforme Guimarães (2011), se realiza no e pelo coletivo, a partir da realidade, através da ação e da reflexão.
O currículo que acompanha as perspectivas da Educação Ambiental Crítica e compreende a totalidade dos fenômenos e da problemática ambiental, observa os problemas naturais, ecológicos e éticos, mas também os problemas sociais, políticos, culturais, estéticos e ideológicos. Não de forma linear, ou como aspectos isolados, mas como um único problema, de raízes históricas.
Esse vem a ser um currículo produzido com a consciência da intencionalidade da prática educativa, assim como também da consciência de que é uma propriedade simbólica (APPLE, 2006), construído a partir da seleção daquilo que existe como consenso sobre habilidades necessárias, que expressa os sistemas econômicos, políticos e ideológicos de determinadas sociedades.
Nesse sentido, Freire (2016) adverte para não se contentar com mitificações das ideologias que refletem os interesses expressos nos consensos sociais, nem com a denúncia moral desses mitos, ideais e erros, mas realizar uma crítica rigorosa destes. Uma crítica que supere a negação do que está posto e apresente caminhos, a partir da ação-reflexão-ação para as transformações necessárias.
Essas são compreensões que precisam estar presentes na formação inicial de professores/as, posto que são estes/as que atuarão nas práticas educativas e na construção e execução dos currículos escolares. Dessa forma, é primaz que o campo curricular da formação de professores/as esteja de acordo, também, com as premissas de uma educação crítica, para que se promova transformações.
A Política Nacional de Educação Ambiental – PNEA (BRASIL, 1999) e as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Ambiental – DCNEA (BRASIL, 2012) compactuam com tais premissas e preveem sua abordagem com um enfoque humanista, holístico, democrático e participativo, concebendo o meio ambiente em sua totalidade e a interdependência entre os meios natural, social, econômico e cultural.
A PNEA e as DCNEA preveem ainda o estímulo e o fortalecimento de uma consciência crítica sobre a problemática ambiental e social, com incentivo da participação como um valor inseparável da cidadania. Reconhecendo o papel transformador e emancipatório da Educação Ambiental. E ainda compreendem que a inserção dos conhecimentos ambientais deva acontecer nos currículos da Educação Básica e da Educação Superior, através de conteúdos dos componentes curriculares.
Para a Educação Ambiental Crítica, é solícito que os conteúdos que permeiam o currículo e a própria construção e execução do currículo estejam de acordo com as premissas de participação, autonomia e emancipação. Uma vez que as transformações esperadas, coletivas e estruturais, só serão possíveis no engajamento de todos os atores sociais envolvidos no processo educativo.
Nesse sentido, cabe questionar de que forma ou em que medida os conhecimentos concernentes ao meio ambiente e à Educação Ambiental estão inseridos ou são abordados nos currículos da formação inicial de professores/as. Como eles se apresentam e que aspectos ambientais abordam? Compreendem a totalidade da problemática e das dimensões ambientais, ou se limitam a aspectos isolados e a busca de sensibilização, de conservação da natureza, ou de mudança de comportamentos individuais?
Diante dessa problemática e da compreensão dos elementos necessários a uma educação crítica, esse estudo teve como objetivo discorrer como a Educação Ambiental se apresenta no currículo dos cursos de Licenciatura em Ciências Sociais, História, Geografia e Ciências Biológicas da Universidade Federal da Paraíba - UFPB, Campus de João Pessoa.
2 CORPUS E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A abordagem metodológica adotada para a realização do objetivo desse estudo se pautou em uma pesquisa qualitativa, figurando o caráter social das mensagens expressas nos conteúdos analisados. Para Esteban (2010), o caráter social da pesquisa qualitativa amplia-se ao diálogo com as dimensões encontradas na linguagem, na organização social e nas suas representações.
O significado subjetivo da pesquisa, dessa forma, abre espaço para a orientação epistemológica do Materialismo Histórico-Dialético reconhecendo a ciência, a linguagem e as ideologias, como produto da história e da ação da própria humanidade. Masson (2014) aponta que, para isso, implica pensar a pesquisa como uma investigação da realidade que só pode ser compreendida se considerar a complexidade de suas relações com a totalidade e com as estruturas teóricas, práticas, de ideologias, utopias e categorias presentes no fenômeno estudado.
A Técnica utilizada para a abordagem qualitativa do estudo foi a Análise Documental, que busca analisar os materiais escritos e identificar informações sobre o comportamento humano e suas relações com o meio. Ludke e André (2017) afirmam que os documentos são uma fonte rica e natural de informações, não se caracterizando de forma descontextualizada, mas estabelecidos em um determinado contexto, do qual conduz e expressa as informações do mesmo.
O contexto no qual os Projetos Pedagógicos dos Cursos - PPCs das Licenciaturas da Universidade Federal da Paraíba foram produzidos e a totalidade da realidade que os mesmos estavam inseridos, nesse caso, se tornam características da análise do corpus do objeto investigado, uma vez que a interpretação dos dados levantadas não se perfaz através da objetividade de ocorrência, mas da subjetividade dessa ocorrência.
Para o tratamento dos dados encontrados, foi utilizada, em associação à Análise Documental, a Análise de Conteúdo, na busca das condições contextuais e dos componentes valorativos e históricos, que são mutáveis. Como um procedimento de fazer inferências interpretativas sobre os resultados apresentados, a Análise de Conteúdo busca as características do texto, as causas e antecedentes das mensagens expressas e os possíveis efeitos da comunicação expressa (FRANCO, 2018).
Encontrar as causas que antecederam a produção do texto analisado e sua mensagem, assim como os efeitos que os PPCs podem gerar sobre os processos educacionais, aqui, não se estabelece de forma linear, mas dialeticamente, de forma recursiva, em que os efeitos da realidade e do contexto no qual os PPCs são produzidos geram as causas da seleção, planejamento e execução dos mesmos.
Para Franco (2018), essa perspectiva da Análise de Conteúdo assenta-se em pressupostos epistemológicos e metodológicos de uma concepção crítica, expressando e investigando a realidade concreta, a totalidade da sociedade como uma expressão humana que elabora e desenvolve suas representações em diferentes momentos históricos, e que se materializa a partir da linguagem, do pensamento e da ação.
Através de uma abordagem lógico-semântica, de compreensão do sentido das mensagens expressas nos documentos, o estudo foi dividido em uma pré-análise, caracterizada pela leitura flutuante dos documentos para elaboração dos indicadores dos resultados, através das regras de exaustividade e representatividade; e por uma análise, realizada através da interpretação dos resultados obtidos e das inferências que os mesmos promovem.
Para a elaboração dos indicadores dos resultados, foram criadas categorias de análise das mensagens expressas nos documentos, obedecendo o objetivo do estudo, as fundamentações teóricas, epistemológicas e metodológicas do mesmo, e as premissas da Educação Ambiental Crítica. Assim, além de evidenciar o conteúdo encontrado que expressa aspectos ambientais nos currículos, foram registrados também os aspectos que expressam uma educação crítica, e ainda os aspectos pedagógicos dos PPCs, com a finalidade de ampliar as inferências e a interpretação dos resultados.
O corpus do estudo se caracterizou pelos PPCs dos cursos de Licenciatura em Ciências Biológicas, Ciências Sociais, Geografia e História da Universidade Federal da Paraíba, Campus de João Pessoa. O recorte dos cursos selecionados diz respeito à representatividade das grandes áreas da educação e da ciência: as Ciências Naturais e as Ciências Sociais.
A identificação e caracterização dos cursos estudados pode ser observada no Quadro 1. Esta apresenta a Instituição dos cursos; o Centro ao qual cada curso está vinculado; o ano de criação dos cursos, assim como o ano de homologação dos currículos quem estão em curso; a carga horária – CH total dos cursos, especificando a CH obrigatória e a optativa; a quantidade de disciplinas que os cursos apresentam; e o turno dos mesmos.
Cabe ressalvar que, mesmo com a promulgação das novas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial de Professores para a Educação Básica e a instituição da Base Nacional Comum para a Formação Inicial de Professores da Educação Básica (BRASIL, 2019) e, consequentemente, a ocorrência de reformulação dos PPCs das licenciaturas, este estudo se perfaz na análise dos currículos vigentes.
É possível observar que, mesmo todos os cursos sendo Licenciaturas, a carga horária total, obrigatória e optativa dos mesmos diferenciam de forma significante, expressando formações pedagógicas e aplicadas distintas, o que também é ratificado pelo ano de implementação de cada currículo.
É indispensável destacar ainda que, na Licenciatura em Ciências Sociais, é possível verificar uma carga horária que não condiz com a Resolução nº 2/2015 do Conselho Nacional de Educação do Ministério da Educação (BRASIL, 2015), que estabelece o mínimo de 3.200 horas de efetivo trabalho acadêmico, demonstrando a urgência em atualização. E que, mesmo o currículo sendo implementado no ano de 2016, a Licenciatura em Geografia também não cumpre esse requisito.
3 DOS OBJETIVOS, PERFIS PROFISSIONAIS, COMPETÊNCIAS, ATITUDES E HABILIDADES DESENVOLVIDAS NOS CURSOS
Pensar a dimensão ambiental no campo curricular requer a compreensão do mesmo como uma totalidade, que se expressa e se concretiza na prática educativa, em que as características formativas do mesmo se estabelecem em um projeto pedagógico, carregado dos valores e interesses históricos de determinadas sociedades.
Nesse sentido, para além da realidade imediata expressa nos conteúdos que abordam aspectos ambientais e suas discussões, é imprescindível compreender em que medida a dimensão ambiental é abordada e integrada a esse projeto de formação. Assim, perscrutar as nuances ideológicas, políticas, pedagógicas e utópicas dos objetivos do currículo, se torna significante para o entendimento de como as problemáticas ambientais são consideradas pelo mesmo.
Da mesma forma, é considerável identificar o comprometimento com as discussões sobre as problemáticas ambientais expressas na formação que se espera alcançar, e que podem ser identificadas nos perfis profissionais que o currículo espera formar, assim como nas competências, atitudes e habilidades desenvolvidas nesses profissionais.
3.1 Dos objetivos
Na esteira da compreensão da dimensão ambiental no currículo das Licenciaturas em Ciências Biológicas, Ciências Sociais, Geografia e História da UFPB, que envolvem a formação inicial de professores/as, buscou-se identificar nos objetivos de tais cursos as dimensões formativas dos mesmos, mas também aquelas que se aproximam das abordagens de uma educação crítica, proporcionando o diálogo com a Educação Ambiental Crítica, e ainda as que apresentam explicitamente aspectos ambientais.
Compreender a abertura que as teorias críticas da educação revelam para a Educação Ambiental Crítica, e que podem estar expressas no currículo, significa caminhar junto a pressupostos epistêmicos, teóricos e metodológicos de uma prática educativa que visa a emancipação humana.
É estar atento ao conhecimento que é selecionado para os currículos, aos objetivos que o mesmo espera alcançar, à formação que é expressa nos elementos curriculares, e que representam uma totalidade maior, de conhecimentos e princípios sociais que perpassam na forma do que Apple (2006) chama de capital cultural. Um acúmulo de conhecimentos, perspectivas e crenças que são selecionados e implementados socialmente através do currículo.
No Quadro 2 é possível observar os objetivos formativos dos currículos de cada curso analisado nesse estudo. É importante destacar que, para além dos objetivos profissionais de atuação na docência voltada para a Educação Básica, os cursos de Ciências Biológicas e Ciências Sociais apresentam a concepção de professor-pesquisador e o comprometimento com a investigação.
Isso garante, na formação inicial de professores/as, a capacitação docente de apreender e aprender os processos de produção de conhecimento (SOARES, 2012). Da mesma forma, é possível construir o perfil questionador que problematiza e investiga os problemas encontrados na realidade escolar e social na qual estes futuros docentes estarão envolvidos. Um perfil essencial para as práticas da Educação Ambiental Crítica, que visa transformar a realidade concreta na qual é exercida.
Os cursos de Geografia e História apresentam características de uma educação tradicional, focada na instrumentação de conhecimentos teóricos e metodológicos, e na capacitação para o exercício profissional. Esse tipo de abordagem favorece práticas educativas reducionistas e conservadoras, não sendo possível a compreensão da totalidade dos processos educacionais, que fazem parte da totalidade social na qual se encontram (LIBÂNEO, 1985). Entretanto, é possível observar no Quadro 3 que, mesmo com características de uma educação tradicional, todos os cursos apresentam objetivos com aspectos de uma educação crítica.
A relação teoria-prática apresentada nos objetivos dos cursos de Ciências Biológicas e Ciências Sociais demonstram uma formação que compreende a prática educativa enquanto práxis, que se estabelece na ação-reflexão-ação. Para a Educação Ambiental Crítica, esse pressuposto é primaz na formação inicial de professores/as, uma vez que garante a ação como elemento necessário nas práticas educativas.
Garantir que a ação esteja presente nas práticas educativas significa incorporar nestas o elemento que provoca as mudanças esperadas, assim como revisitar as teorias a partir das práticas realizadas e produzir novas teorias ou dialogar com as que fundamentam as práticas docentes.
Ferrari, Maestrelli e Torres (2014) ponderam que, nesse tipo de prática educativa, todos os sujeitos envolvidos nas ações e reflexões se reconhecem como parte da totalidade educacional e social na qual se encontram, e se estabelecem como os sujeitos ativos das mudanças sociais, históricas e culturais que são necessárias e esperadas pela Educação Ambiental Crítica.
As contradições encontradas nos objetivos dos cursos de Geografia e História dizem respeito a buscar a formação de sujeitos críticos e reflexivos, pautados na democracia e cooperação, em um processo de educação bancária (FREIRE, 2005), que apresenta características de instrumentação conceitual e capacidades profissionais.
Quanto aos aspectos ambientais encontrados nos objetivos dos cursos e demonstrados no Quadro 4, é possível observar a inexistência em alguns destes. Apesar da quantidade de disciplinas que abordam aspectos ambientais no curso de Ciências Sociais e, especialmente, no curso de Geografia (pode ser observado nos Quadros 11 e 12), nenhum dos mesmos apresentam a dimensão ambiental em seus objetivos.
Em outra via, o curso de Ciências Biológicas se propõe a construir conhecimentos sobre as questões ambientais e o curso de História busca permitir a compreensão da necessidade de ações sociais e culturais frente à diversidade socioambiental. Por se tratar de um conceito amplo (meio ambiente; socioambiental), cabe investigar e analisar como esse conceito é estabelecido e abordado nos componentes curriculares, para que seja elucidado se encontra-se de forma reducionista/conservadora, ou abrangendo toda a complexidade da totalidade do meio ambiente, em suas múltiplas dimensões: natural, social, cultural, ecológica, ética, estética, política e ideológica (LAYRARGUES, 2011).
O conflito educacional e curricular de buscar implementar uma educação crítica e estar vinculado a objetivos e práticas tradicionais, ou de tentar abordar a educação ambiental mesmo recaindo em propostas reducionistas, diz respeito aos paradigmas epistemológicos e educacionais impostos pelo pensamento moderno e cartesiano, que separam e isolam o conhecimento e compreende a educação como um processo de transmissão (CHAUÍ, 2012).
Dessa forma, para a Educação Ambiental Crítica, é essencial que os objetivos formativos do currículo estejam pautados na compreensão da realidade em sua totalidade. Que sejam fundamentados teórica, metodológica e epistemologicamente nas teorias críticas da educação, e que expressem a coerência necessária a esses pressupostos para que se alcance as transformações esperadas.
3.2 Dos perfis profissionais
Para a compreensão da dimensão ambiental inserida no contexto da formação docente, os perfis profissionais dos cursos estudados foram caracterizados entre os aspectos pedagógicos e os aspectos ambientais. Dessa forma, é possível identificar as práticas docentes e pedagógicas que se espera dos estudantes das licenciaturas, assim como as possíveis posturas diante da docência, do conhecimento e das problemáticas ambientais.
Franco (2012) aponta para a necessidade de o professor desenvolver, em sua formação, os saberes necessários à docência: os saberes práticos, mas também os saberes teóricos, pedagógicos e dos conteúdos dos quais vai precisar lidar. Nesse sentido, para a Educação Ambiental Crítica, é necessário que a formação inicial de professores/as esteja permeada por todos esses saberes.
No Quadro 5 é possível observar os aspectos pedagógicos da atuação dos profissionais que se espera formar nas Licenciaturas em Ciências Biológicas, Ciências Sociais, Geografia e História da UFPB. Para além do caráter essencial da formação em uma licenciatura, que vem a ser a docência, é possível considerar alguns elementos pedagógicos significantes para uma prática docente problematizadora da realidade e concernente à Educação Ambiental Crítica.
A docência vinculada à pesquisa da própria prática pedagógica é um desses elementos, tornando possível a abertura da apreensão e aprendizagem dos processos de produção de conhecimentos já discutidos nesse trabalho. Possuir aporte teórico, metodológico e filosófico vem a ser um outro elemento importante, no sentido de indagar e questionar sempre os determinantes históricos, econômicos, sociais e culturais, que promovem a crise civilizatória na qual nos encontramos.
Chauí (2012) observa que a forma inicial da consciência é a alienação, onde a humanidade não se percebe como produtora da própria sociedade e transformadora da natureza. Se tratando de objetivo essencial da Educação Ambiental Crítica, o desenvolvimento de uma consciência crítica, os aportes filosóficos, na formação inicial de professores/as, vêm a ser um elemento pedagógico significante, nesse sentido.
Compreender o fenômeno da prática educativa, assim como desenvolver a capacidade de identificar problemas socioculturais educacionais propondo respostas criativas às questões pedagógicas como parte de um universo complexo, e compreender o processo de construção do conhecimento dos indivíduos inseridos em seu contexto sociocultural, são características primazes à formação docente que visa a consideração dos determinantes históricos, políticos e econômicos sobre as problemáticas ambientais.
Essas características abrem caminho para uma consciência ecológica crítica, que não subsiste à consciência política. Layrargues (2011) aponta que essa consciência ecológica, necessária à Educação Ambiental Crítica, é uma consciência para enfrentar a padronização cultural, a exclusão social, a apatia política, a alienação ideológica, uma vez que os problemas ambientais decorrem das práticas sociais. Quanto a isso, um currículo que é construído com a preocupação de formar docentes sensíveis a esta problemática, abre caminhos para a realização da Educação Ambiental Crítica.
No entanto, cabe ressaltar que, apesar dos elementos pedagógicos expressos nos perfis profissionais dos cursos apresentarem aproximação para a realização da Educação Ambiental Crítica, um outro elemento que se consolida como a base para a promoção dos demais, não é apresentado como um aspecto profissional: a práxis. Nesse sentido:
Para vivenciar as contradições existentes na realidade, realizar a potencialidade do ser através das relações políticas, sociais e com o meio ambiente, é que se faz necessário em um processo de EA associar a atitude reflexiva com a ação, a teoria com a prática, o pensar com o fazer, para realizar um verdadeiro ‘diálogo’, como bem define Paulo Freire em sua proposta educacional, ou seja, ter a práxis em EA. Apenas a ação gera um ativismo sem profundidade, enquanto apenas a reflexão gera uma imobilidade que não cumprirá com a possibilidade transformadora da educação, já dizia Freire (GUIMARÃES, 1995, p. 32).
Pensar o perfil profissional docente sem a incorporação de uma práxis educativa de ação-reflexão-ação sobre os processos educacionais e sobre as problemáticas estudadas, é recair nos mesmos pressupostos tradicionais e pragmáticos da educação, que permeiam o pensamento cartesiano e as propostas educativas modernas.
No Quadro 6 é possível observar que os cursos da área das Ciências Humanas e Sociais não apresentam nenhum aspecto ambiental em seus perfis profissionais previstos no currículo. Enquanto os cursos da área das Ciências Naturais apresentam a relação dos seres vivos com o meio ambiente e as transformações ocorridas no meio natural causadas pela humanidade.
Cabe ressalvar a necessidade de estar atento a não reproduzir o reducionismo das problemáticas ambientais aos aspectos naturais e biológicos do meio ambiente, o que é concernente às práticas pedagógicas conservadoras e tradicionais, que não incluem a práxis nas práticas docentes.
Para Loureiro (2011), além de possibilitar abordagens lineares e reacionárias, os resultados de abordagens reducionistas podem ser refletidos na perspectiva de resolução dos problemas ambientais através do equilíbrio das espécies no ecossistema. O que ignora as determinações históricas e políticas e o desequilíbrio existente entre grupos e indivíduos, que refletem e condicionam o modo como a humanidade interage com o restante da natureza.
3.3 Das competências, atitudes e habilidades
As Competências, Atitudes e Habilidades – CAH previstas nos currículos dos cursos foram divididas entres as capacidades pedagógicas que se espera dos profissionais formados, as capacidades com aspectos de uma educação crítica, e as capacidades com aspectos ambientais. Essa divisão possibilita compreender os saberes formativos que se propõem as Licenciaturas e como estes dialogam com a Educação Ambiental Crítica.
Como nos objetivos e nos perfis profissionais dos cursos, é possível observar no Quadro 7 que os currículos das Licenciaturas da UFPB preveem habilidades e competências para a pesquisa na docência. A integração da pesquisa como uma característica da docência demonstra a preocupação, no campo curricular, de desenvolver capacidades profissionais de investigação das práticas educativas e da própria prática docente.
Essa é uma capacidade docente solícita na busca do rompimento com os determinantes políticos, ideológicos e culturais que perpassam as práticas educativas. Gilberto e Franco (2017) observam que sem a compreensão daquilo que se faz, as práticas docentes se tornam meras reproduções dos hábitos existentes, por isso, é preciso ter compreensão e consciência da prática pedagógica que entrecruza a própria prática docente.
Para além dos conhecimentos teóricos e metodológicos necessários à formação pedagógica para a docência, um outro elemento surge nas habilidades propostas pelos currículos dos cursos: a interdisciplinaridade. Proposta pela Política Nacional de Educação Ambiental – PNEA (BRASIL, 1999), Japiassu (1992) compreende a interdisciplinaridade como um processo de intercomunicação entre as disciplinas.
Apesar da característica de rompimento com o pensamento cartesiano que isola e separa o conhecimento, dividindo-o em disciplinas e hiper especializando os docentes/profissionais, assim como acontece na divisão social do trabalho, e também da abertura que a interdisciplinaridade promove para o diálogo entre os saberes, necessário à Educação Ambiental, é preciso estar atento ao tipo de prática interdisciplinar que é desenvolvida nas práticas educativas.
O diálogo interdisciplinar necessário à Educação Ambiental Crítica não pode ser pragmatista, não pode se confundir como um dialogar entre o que cada disciplina diz sobre determinado tema, nesse caso, os problemas ambientais. Para Ferrari, Maestrelli e Torres (2014), é preciso a apreensão mútua entre os conhecimentos e as práticas que são desenvolvidas nas disciplinas, cujo eixo estruturante desse diálogo é a problematização dos conhecimentos e da realidade.
No Quadro 8 observa-se as competências, atitudes e habilidades com aspectos de uma educação crítica desenvolvidas nos cursos de Licenciatura da UFPB. Características como: reflexão crítica sobre o papel da escola; compreensão do processo histórico de produção de conhecimento e suas implicações políticas, culturais, sociais, éticas e econômicas; reconhecer e posicionar-se de forma crítica diante das discriminações; atuar na consolidação de uma sociedade democrática, justa e inclusiva; identificação das estruturas de poder e dominação; entre outras, são encontradas nos currículos.
Para a Educação Ambiental Crítica, que se apoia nas teorias críticas sociais e educacionais, o apreço à democracia, o combate às discriminações e a identificação das estruturas de poder e dominação que perpassam as práticas educativas é essencial na busca de emancipação e transformação individual e coletiva, como pontua Freire (2016).
Uma vez que o ensino e o currículo se concretizam nas aprendizagens que produz, é primordial dotar docentes em formação dos instrumentos formativos que ajudem a ampliar a compreensão das determinações históricas, políticas e sociais que perpassam suas práticas, assim como das oportunidades e ferramentas de poder de escolha e transformação de suas atividades profissionais e da realidade (FRANCO, 2012).
A abertura epistêmica e educacional que as perspectivas críticas da educação produz nos currículos, para a Educação Ambiental Crítica, traduz os objetivos de uma prática educativa imersa na dimensão ambiental que visa proporcionar emancipação humana e a compreensão de que, assim como os problemas ambientais caminham junto aos problemas sociais, as transformações das determinações ambientais caminham juntas das transformações das condições sociais, que são superpostas pelas determinações econômicas, políticas e ideológicas.
Com exceção do curso de Ciências Sociais, os demais cursos aqui estudados apresentam aspectos da Educação Ambiental entre as competências, atitudes e habilidades desenvolvidas nos/as professores/as em formação. Responsabilidade social e ambiental; formação de cidadãos na perspectiva socioambiental; capacidade de estabelecer a relação entre sociedade e natureza; concepções de educação ambiental; e compreensão das relações que as diferentes sociedades estabelecem com a natureza, são habilidades previstas pelo currículo dos cursos e podem ser encontradas no Quadro 9.
A perspectiva de compreensão das mudanças ambientais indo além das mudanças culturais, mas perpassando as mudanças sociais, no entendimento das relações que existem entre estas, é essencial para a Educação Ambiental Crítica. Nesse sentido, Layrargues (2011) aponta para a necessidade do diálogo entre o plano material e plano simbólico, caracterizados pela cultura e pelas determinações históricas entre a relação do trabalho e a transformação da natureza, para que seja possível uma prática educativa emancipatória.
Do contrário, recai-se novamente em perspectivas reducionistas que se apoiam em abordagens naturalistas, conservacionistas ou comportamentalistas, e que não observam a base material da crise ambiental, tampouco as questões ontológicas, epistêmicas e as categorias necessárias às discussões da Educação Ambiental.
4 DOS ASPECTOS AMBIENTAIS NAS DISCIPLINAS DOS CURSOS
Na esteira da compreensão de como os aspectos ambientais são contemplados nas disciplinas dos cursos aqui estudados, foi realizado um detalhamento criterioso, a partir da ementa de todas as disciplinas dos cursos, de quais conteúdos se aproximam das discussões e das problemáticas ambientais.
Cabe ressalvar que, mesmo não espelhando a totalidade do que é abordado e discutido nas disciplinas, as ementas das mesmas revelam os conteúdos e as intencionalidades daquilo que se espera e se objetiva trabalhar. Dessa forma, é possível identificar como a dimensão ambiental é pensada, planejada e trabalhada nos currículos das licenciaturas.
Para que fosse possível perscrutar a dimensão ambiental no currículo dos cursos, a apresentação dos resultados encontrados foi dividida por cada curso estudado, demonstrando a diversidade na unidade da formação inicial de professores/as da UFPB. Nessa perspectiva, é possível identificar como cada curso aborda a dimensão ambiental, suas características e quais aspectos ambientais apresentam, assim como compreender a unidade da diversidade encontrada na formação inicial de professores/as.
Nesse sentido, é possível observar nos Quadros 10, 11, 12 e 13, os aspectos naturais, ecológicos, políticos, sociais, econômicos, culturais, históricos, críticos, educacionais, de gestão e de saúde ambientais que os currículos apresentam. Esses aspectos “naturalmente” apresentados em sobreposição de uns sobre outros, representam as relações e concepções históricas e sociais, e que são traduzidos e refletidos no currículo (APPLE, 2006).
Apesar de, majoritariamente, os aspectos ambientais apresentados nas disciplinas, no currículo da Licenciatura em Ciências Biológicas – observar Quadro 10 – se demonstrarem na dimensão natural do ambiente, representada por questões biológicas e ecológicas, é possível observar na disciplina obrigatória Bases de Educação Ambiental, fundamentos, princípios, estratégias, vertentes, práticas e metodologias em Educação Ambiental – EA.
Não obstante o curso de Licenciatura em Ciências Biológicas se apresentar, através do currículo, na perspectiva natural do meio ambiente, a presença de uma disciplina obrigatória que busca pensar pedagogicamente a aplicação e os princípios da EA, garante que esta seja incorporada na formação inicial de professores/as em Ciências e Biologia.
No entanto, apesar de apresentar as práticas educativas para a EA, outros elementos pedagógicos que se apresentam significantes para a realização de uma Educação Ambiental para emancipação não se fazem presentes. A incorporação da práxis (ação-reflexão-ação) e a adesão a práticas pedagógicas críticas são essenciais para a implementação de práticas educativas que visam transformar a realidade.
Enquanto prática social que necessita de engajamento de todos os sujeitos envolvidos, a EA necessita ser pensada enquanto uma prática com adesão a uma intencionalidade lúcida para todos e todas. Assim como expressar, de forma transparente, os objetivos que visa alcançar e como alcançá-los. De forma que, para a Educação Ambiental Crítica:
Percebe-se a necessidade de que as práticas pedagógicas explicitem sua intencionalidade e dialoguem com os coletivos sobre os quais atua. Práticas pedagógicas impostas, sem tais explicitações, tendem a ser superficialmente absorvidas e carecer de adesão do grupo que as protagoniza (FRANCO, 2012, p. 156).
Nesse sentido, a disciplina optativa Educação Ambiental e Práticas Pedagógicas apresenta um arcabouço pedagógico mais próximo das premissas da Educação Ambiental Crítica, quando expressa aspectos sociais, culturais, políticos, históricos, educacionais e epistemológicos das práticas educativas que envolvem a dimensão ambiental, porém, é uma disciplina optativa.
A incorporação da participação política como um elemento necessário à EA também se apresenta como um pressuposto crítico dessa prática educativa. Layrargues (2014) defende que as mudanças estruturais, das quais a EA se propõe a contribuir na sociedade, têm melhores condições de ocorrer quando são desenvolvidas através de ações políticas, da luta social, da participação democrática, uma vez que é perceptível as limitações nas soluções de âmbito comportamental.
Dessa forma, professores/as em formação na Licenciatura em Ciências Biológicas da UFPB, do Campus de João Pessoa, apesar de estar em contato com as prerrogativas da EA e ter domínio de conteúdo das relações biológicas e ecológicas do meio ambiente, poderão encontrar um campo produtivo e crítico sobre a EA, se realizarem a disciplina optativa que se apresenta no currículo do curso.
No Quadro 11 é possível observar as disciplinas que abordam aspectos ambientais no curso de Ciências Sociais. Enquanto disciplina obrigatória, Antropologia e Mudança apresenta o estudo da Ecologia Cultural sob a perspectiva de ambiente, energia e cultura como adaptação.
Apesar de apresentar a cultura como mediação entre os processos econômicos e os processos ecológicos, como forma de adaptação aos problemas ambientais vividos na modernidade, é necessário destacar os modos de produção dessa última, que são fundados no consumo destrutivo da natureza e que, mesmo sendo discutidas à luz das necessidades energéticas (fruto da mesma modernidade), minam as condições de sustentabilidade (LEFF, 2009).
A característica de ter apenas uma disciplina obrigatória que contempla a dimensão ambiental no currículo do curso, e de forma reduzida, revelando aspectos culturais e ecológicos, faz com que o curso de Licenciatura em Ciências Sociais esteja aquém das necessidades apontadas pela PNEA (BRASIL, 1999), que prevê conceber o meio ambiente em sua totalidade e a interdependência entre os meios natural, social, econômico e cultural.
Nesse sentido, fica relegado às disciplinas optativas adentrar às discussões ambientais abordando outros aspectos ambientais, assim como promover a concepção da Educação Ambiental como uma prática educativa que visa contribuir para as transformações necessárias. Sejam elas individuais, comportamentais e culturais, assim como coletivas, políticas e estruturais.
Aspectos como saberes tradicionais, biodiversidade, consciência crítica e criativa, manejo sustentado, políticas ambientais, mudanças sociais, história ambiental, entre outros, que apontam para a totalidade da diversidade na unidade da crise ambiental na qual a sociedade moderna se encontra, encontram-se espraiados e dispersos entre disciplinas optativas, ficando à oferta das mesmas e à disposição de intenção dos/as estudantes de cursá-las.
Enquanto disciplina optativa, Seminário de Educação Ambiental apresenta as discussões solícitas a uma formação crítica que compreende a dimensão ambiental como um aspecto a ser trabalhado na educação e na modernidade. A mesma pensa a contribuição para uma consciência crítica, considerando os aspectos biológicos, físicos e químicos, bem como os socioeconômicos, políticos e culturais.
Essa vem a ser a perspectiva necessária na formação inicial de professores/as, sob a ótica de uma educação crítica sobre as problemáticas ambientais. Uma educação que “busca reorientar as premissas do pensar e do agir humano, na perspectiva de transformação das situações concretas e limitantes de melhores condições de vida dos sujeitos – o que implica mudança cultural e social” (FERRARI; MAESTRELLI; TORRES, 2014, p. 14).
Nesse sentido, mesmo contemplando a discussão entre natureza e cultura em uma disciplina obrigatória, o curso se demonstra escasso quanto às discussões e problemáticas ambientais. O que implica em práticas educativas que, mesmo bem-intencionadas, recaiam em atividades fundamentadas pelos paradigmas da sociedade moderna (GUIMARÃES, 2011).
No Quadro 12 é possível observar os aspectos ambientais apresentados nas disciplinas do curso de Licenciatura em Geografia. Enquanto um curso das Ciências Naturais com a característica da atuação humana no espaço e no ambiente em que vive, a Geografia denota ser o curso com um espectro maior de abordagem das discussões ambientais.
No entanto, nas disciplinas obrigatórias e na maioria das optativas é recorrente o aspecto natural da dimensão ambiental nos conteúdos. Perspectivas ecológicas, de extinção e dispersão, conservacionismo, recursos hídricos, poluição, recursos naturais, entre outros, são encontradas nos conteúdos abordados nestas disciplinas.
Cabe ressaltar que, mesmo com a aparente discussão sobre o impacto da ação humana sobre os recursos naturais, assim como as políticas de gestão, o foco das disciplinas se apresenta em superposição dos estudos ecológicos. O que caracteriza uma concepção de EA que se tornou hegemônica, como aponta Layrargues (2011), de promoção de mudança cultural como contribuição para a reversão da crise ambiental. Quanto a isso:
[...] é insuficiente querer mudar o indivíduo sem mudar a realidade social em que este se situa como sujeito. É simplista, linear e dicotômico achar que a sociedade é um desdobramento direto da soma das esferas pessoais, sem relações de construção multidirecional, numa formulação que peca pela falta de dialética entre parte-todo e que reforça o projeto neoliberal de sociedade (LOUREIRO, 2011, p. 109).
A exortação de Loureiro (2011) expressa o caráter político da EA, onde as mudanças culturais e individuais não podem ser suplantadas pelas mudanças sociais e coletivas. Em que a dimensão cultural e ética da EA não relega a dimensão política e ideológica da intencionalidade de mudanças estruturais na realidade.
Como nos demais cursos, as premissas de uma Educação Ambiental para emancipação, conexa com a totalidade das problemáticas ambientais, encontra-se expressa em uma disciplina optativa: Seminário de Educação Ambiental. Caracterizando, dessa forma, a necessidade eminente de implementação de discussões que abordem a totalidade da dimensão ambiental no campo curricular do curso.
Do contrário, recai-se nas mesmas perspectivas conservadoras da EA, que reproduzem e se reproduzem em armadilhas paradigmáticas. Armadilha que, para Guimarães (2004a), expressam a compreensão do mundo moldada pela racionalidade hegemônica, de discursos ecológicos, que geram práticas discursivas e pragmáticas, porém incapazes de fazer diferente dos próprios caminhos prescritos por essa racionalidade.
Quanto a isso, Leff (2008) exorta para urgência de uma racionalidade ambiental, que se fundamenta na reflexão crítica sobre os problemas ambientais e leva em consideração os problemas locais para atuação no global e a situação global interferindo nas estratégias locais. Uma racionalidade que se desenvolve na produção de conhecimento e saber que levam às mudanças culturais, mas também à atuação social.
Quanto ao curso de Licenciatura em História, é possível observar no Quadro 13 que o mesmo apresenta aspectos preservacionistas e geopolíticos do ambiente, em disciplinas obrigatórias. Cabe destacar que, apesar das 180 disciplinas ofertadas no curso (majoritariamente optativas), a dimensão ambiental se apresenta de forma reducionista no currículo do curso.
A característica da observação ambiental do ponto de vista preservacionista e das transformações naturais causadas pela geopolítica, não englobando os outros aspectos das problemáticas ambientais, expressa uma visão ambiental naturalista. Outra observação importante é o fato de que, as disciplinas optativas que abordam temas ambientais, são disciplinas do curso de Geografia que foram aproveitadas no currículo do curso de História.
Para Loureiro (2019), pensar de forma disjunta, sem a compreensão da totalidade do fenômeno educativo ambiental e das problemáticas ambientais, não surge de forma espontânea na sociedade e na educação, aqui expressas nos currículos dos cursos. Mas, nasce nas próprias relações sociais e na materialidade histórica da qual a modernidade aparelha as instituições sociais.
Nessa perspectiva, pensar o currículo na formação inicial de professores/as, a partir da educação crítica, requer a compreensão da totalidade dos fenômenos que serão estudados, da necessidade da participação enquanto projeto em construção, da assunção de que o currículo, não obstante a ser um objeto estático emanado para pensar a educação e as aprendizagens que se espera alcançar, é uma práxis, de expressão e função socializadora e cultural, construído e desenvolvido em um contexto histórico e social (SACRISTÁN, 2017).
Sem essas premissas, corre-se o risco de fundamentar práticas educativo ambientais reducionistas e conservadoras, que se pautam nas mudanças comportamentais e individuais em detrimento das mudanças sociais, coletivas e estruturais, necessárias ao enfrentamento da crise e das problemáticas ambientais da realidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A compreensão da dimensão ambiental nos currículos das Licenciaturas da UFPB, Campus de João Pessoa, aqui estudados, caminha junto a pressupostos epistêmicos, teóricos e metodológicos das teorias críticas da educação, que entendem a prática educativa e o campo curricular como elementos que podem contribuir na emancipação humana e nas transformações necessárias da realidade.
Nesse sentido, a análise dos objetivos, dos perfis profissionais, das competências, atitudes e habilidades, e dos aspectos ambientais encontrados nas ementas das disciplinas dos cursos, possibilitaram a realização do objetivo desse estudo, de discorrer como a Educação Ambiental se apresenta no currículo dos cursos de Licenciatura em Ciências Sociais, História, Geografia e Ciências Biológicas da Universidade Federal da Paraíba - UFPB, Campus de João Pessoa.
Quanto aos objetivos dos cursos, foi possível observar que, mesmo apresentando características de uma educação crítica, como a relação teoria-prática e a expressa busca pela formação de sujeitos críticos e reflexivos, os cursos estão focados na instrumentação de conhecimentos teóricos e metodológicos e na capacitação para o exercício profissional.
Os aspectos ambientais não são encontrados nos objetivos de todos os cursos. Excepcionalmente, apesar de diversas disciplinas optativas abordarem aspectos ambientais no curso de Ciências Sociais e, especialmente, no curso de Geografia, inclusive nas disciplinas obrigatórias, nenhum destes apresenta a dimensão ambiental em seus objetivos.
Essas são características conflitivas e contraditórias encontradas na educação e no currículo, na medida que, mesmo buscando implementar uma educação reflexiva e crítica, continuam vinculados a objetivos e práticas tradicionais. Isso reflete os paradigmas epistemológicos e educacionais impostos pelo pensamento cartesiano, pelo positivismo e pela modernidade, que separa o conhecimento e entende a educação como um processo de transmissão.
Essa relação contraditória pode ser observada ainda nos perfis profissionais planejados nos currículos dos cursos. Uma vez que, mesmo prevendo a capacitação para a pesquisa na docência, o que abre perspectivas para apreensão e aprendizagem dos processos de produção de conhecimento, não expressam a realização da docência através da práxis.
Nesse sentido, pensar um profissional docente que investiga a sua prática, sem incorporar a práxis educativa de ação-reflexão-ação sobre a realidade na qual se trabalha e se vive, é recair nas mesmas práticas tradicionais ou pragmatistas que permeiam a episteme da modernidade, o que dialoga com as perspectivas encontradas nos objetivos dos cursos.
As competências, atitudes e habilidades desenvolvidas nos cursos, expressas nos currículos, apresentam ainda contradições quanto aos aspectos ambientais observados nas ementas das disciplinas dos cursos. Enquanto as CAH apresentam características da pesquisa e da interdisciplinaridade e ainda preveem aspectos múltiplos da dimensão ambiental, as disciplinas concentram-se nos aspectos naturais e ecológicos do ambiente.
Habilidades como: responsabilidade social e ambiental; formação de cidadãos na perspectiva socioambiental; capacidade de estabelecer a relação entre sociedade e natureza; concepções de educação ambiental; e compreensão das relações que as diferentes sociedades estabelecem com a natureza, são previstas pelos currículos dos cursos.
No entanto, tais características não são encontradas em sua totalidade nas disciplinas obrigatórias dos cursos. Apenas em disciplinas optativas é encontrada a diversidade da unidade da dimensão ambiental, com características como a práxis, a participação política e social, os aspectos sociais, culturais, políticos, históricos, educacionais e epistemológicos, além dos naturais.
Essa característica faz com que nem todos os/as professores/as em formação tenham acesso à Educação Ambiental amparada em pressupostos críticos e que visa a emancipação humana e as transformações individuais e culturais, mas também as sociais, as coletivas e as estruturais da realidade.
A prática educativo ambiental expressa em parâmetros tradicionais da educação e concentrada em apenas alguns dos aspectos ambientais, favorece abordagens educativas reducionistas e conservadoras, não sendo possível a compreensão da totalidade dos processos educacionais, tampouco das problemáticas ambientais que a educação se propõe a contribuir nas transformações necessárias.
Dessa forma, para a Educação Ambiental Crítica, é primaz que os processos formativos, as capacidades desenvolvidas, os perfis profissionais e os conteúdos abordados no campo curricular estejam pautados na compreensão da realidade em sua totalidade. Que sejam fundamentados teórica, metodológica e epistemologicamente nas teorias críticas da educação, e que expressem a coerência necessária para que se alcance as transformações esperadas.
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