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100 anos de Leonel Brizola: entrevista com João Pedro Stédile
100 años de Leonel Brizola: entrevista con João Pedro Stédile
100 years of Leonel Brizola: interview with João Pedro Stédile
Argumentos - Revista do Departamento de Ciências Sociais da Unimontes, vol. 19, núm. 1, pp. 118-132, 2022
Universidade Estadual de Montes Claros

Dossiê

Argumentos - Revista do Departamento de Ciências Sociais da Unimontes
Universidade Estadual de Montes Claros, Brasil
ISSN: 2527-2551
ISSN-e: 1806-5627
Periodicidade: Semestral
vol. 19, núm. 1, 2022

Recepção: 12 Abril 2022

Aprovação: 22 Abril 2022

Em 2021, quando estávamos em conversa com o editor da Argumentos: Revista do Departamento de Ciências Sociais da Unimontes, Gustavo Dias, para decidirmos sobre este dossiê especial dos 100 anos de Leonel Brizola, comentamos acerca da relevância de Brizola para a luta pela democratização do acesso à terra no Brasil. Brizola, até mesmo pelas suas origens e trajetória pessoal, teve grande proximidade com a luta dos trabalhadores rurais, promovendo e apoiando à organização dos camponeses e à Reforma Agrária durante seu mandato de governador do Rio Grande do Sul (1959 – 1963). Brizola incentivou e auxiliou o surgimento do Movimento dos Agricultores Sem Terra (Master) e criou o Instituto Gaúcho de Reforma Agrária (IGRA) um dos responsáveis, junto com o Conselho de Desenvolvimento do Estado (CDE), em executar os Projetos de Reforma Agrária e Desenvolvimento Econômico-social (PRADE) no Rio Grande do Sul. Assim, durante nossa conversa ano passado, comentamos que talvez sem Brizola um dos maiores e mais importantes movimentos sociais do Sul Global não existiria, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

O MST, na ocasião da morte de Brizola, soltou uma nota considerando o ex-governador do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro em “avô” do Movimento (MST, 2004). Em diversas outras ocasiões, o MST prestou homenagens a Leonel Brizola e importantes ativistas do Movimento sempre demonstrou gratidão e admiração pelo “melhor governador de esquerda do Brasil” (STÉDILE, 2022). Então, quando estávamos deliberando para decidirmos quem iríamos entrevistar para este dossiê especial da Argumentos, um nome foi unanimidade, o ativista do MST João Pedro Stédile. Era preciso resgatar este papel histórico do Brizola e apresentá-lo para as novas gerações. E acreditamos que João Pedro Stédile é o nome ideal para tal feito.

João Pedro Stédile nasceu em Lagoa Vermelha no Rio Grande do Sul em 1953. Conheceu Leonel Brizola quando criança e estudava em uma “Brizoleta”, apelido das escolas construídas pelo governo de Brizola em todas as comunidades rurais no estado. João Pedro Stédile se tornou economista, graduado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) e pós-graduado pela Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM), e é um dos mais importantes e influentes ativistas sociais do Sul Global por meio de sua atuação no MST.

Como membro do coletivo da Coordenação Nacional do MST, João Pedro Stédile realizou diversos empenhos, diálogos e articulações político-sociais. Por exemplo, em nível internacional, contribuiu com as articulações do MST com a Via Campesina, a Assembleia Internacional dos Povos (AIP) e ALBA Movimentos (Alternativa Bolivariana para as Américas) e participa do Encontro dos Movimentos Populares com o Papa Francisco.

Podemos dizer que João Pedro Stédile é um homem de entrega e de dedicação a uma causa. Que encara seu ativismo como um “sacro-ofício”, ou seja, aquele que faz algo para o bem maior, pois entende que o bem maior, o desenvolvimento social-econômico do coletivo, é também seu bem, da sua família e de seu país. Exatamente como Leonel Brizola foi. E isso está cada vez mais raro em um mundo dominado pela retórica, pelo relativismo moral e pelo individualismo do pós-modernismo. João Pedro Stédile, assim como Brizola foi, é um ativista que ainda se mantém com a mente modernista e com lutas sólidas em uma sociedade, como diria Bauman (1998, 2001), cada vez mais líquida e sem comprometimento.

O bem maior de João Pedro Stédile é a luta pela democratização do acesso à terra no Brasil. Exatamente como Leonel Brizola, ambos entenderam a importância da reforma agrária para a dinamização e a democratização do capital em um projeto de nação e de desenvolvimento econômico inclusivo e sustentável. O mecanismo para atingir esse bem maior, tanto no pensamento de Brizola quanto de João Pedro Stédile, é por meio de movimentos sociais em níveis locais e internacionais empenhados em exigir do Estado uma eficiência social, econômica e comunitária. É por meio de ações sólidas, modernas, racionais e científicas e não por meras relações superficiais, discursos subjetivos-relativistas e especulações abstratas típicas da liquidez do neoliberalismo e do pós-modernismo.

É com este espírito de entrega e de comprometimento com o bem maior de sua luta e com o legado de Brizola que João Pedro Stédile nos recebeu para um “bate-papo” virtual de mais de duas horas no dia 24 de agosto de 2021. Importante destacar que este encontro só foi possível graças ao empenho do companheiro Oswaldo Samuel Costa Santos do MST.

Gustavo Cepolini: João Pedro, nós, editores, colaboradores e organizadores do dossiê sobre os 100 anos de Brizola, conversamos sobre algumas questões que são centrais para um debate que são oriundos da postura política de Brizola que a gente tem mecanismos hoje e outros tantos que os movimentos sociais seguem construindo. Então, não é uma pergunta inicial, mas gostaria que você comentasse dessa trajetória, o Brasil enquanto um país com a origem camponesa, você comentasse quem é esse João Pedro Stédile, filho de camponeses, migrantes, nascido em 25 de dezembro no Rio Grande do Sul em Lagoa Vermelha. Quem é o João Pedro, qual é a sua luta, qual é sua trajetória?

João Pedro Stédile: Como você mesmo disse, a minha família é de imigrantes trentinos, veio 1899, dois jovens solteiros, como camponeses fugindo da fome, da pelagra, que era a doença da anemia que atacava os camponeses porque só tinha polenta para comer. E eles foram para essa região, que é conhecida hoje no Brasil da região colonial italiana do Rio Grande do Sul. E eu me criei nesse ambiente de família camponesa. É uma região que produz uva, um dos meus avôs para o lado da mãe foi tropeiro, levava cargas de Vacaria e Vila Ipê até Sorocaba, enfim, esse era o ambiente. Na minha adolescência e juventude, eu fui marcado por duas influências: a primeira essa influência, que não é do Brizolismo, que foi chamado depois, mas do Brizola que universalizou o ensino fundamental no Rio Grande do Sul durante seu governo de 1959 a 1963. Acredito que só por isso o Brizola já foi crucial, porque a rede de ensino público gaúcho era muito falha e as escolas ficavam longe de tudo no interior. Durante seu governo, Brizola levou escolas para tudo quanto é comunidade rural. Nós, as crianças naquela minha época, começamos a ter escolas próximas, não havia mais a necessidade de caminhar longas distâncias ou depender de cavalos para estudar, dia de chuva não tinha aula, aquelas histórias todas do interior do Brasil. Brizola construiu escolas do tipo CIEPs (Centros Integrados de Educação Pública) já, só que era uma escolinha menor, multifuncional porque como era interior várias classes do ensino fundamental funcionavam juntas. A direita apelidou essas escolas de “Brizoletas”, porque eram todas iguais, mas eram escolas de alvenaria muito resistentes e protegiam muito bem do frio do Rio Grande do Sul. Essa escola, construída pelo governo de Brizola, na comunidade rural onde eu vivia me marcou porque se não fosse por ela quem sabe eu nem tinha terminado o ensino fundamental. A segunda influência, na minha juventude, foi a Teologia da Libertação. Eu tinha parentes na família que eram padres progressistas e que se identificavam com a Teologia da Libertação. Vários padres da região procuravam conscientizar as pessoas naquela época da Ditadura Militar no Brasil. Como ativista, minha primeira militância foi no Sindicato de Trabalhadores Rurais de Bento Gonçalves, que coordenava toda a região de produtores de uva. Eu já estava estudando economia, naquela ânsia “filho de camponês só tem uma saída para progredir: é estudar”. Todo mundo é educado para estudar, estudar, estudar, estudar, então quando me tocou a vez eu fui para Porto Alegre para estudar, trabalhava de dia e estudava de noite, e como toda minha geração, muito sacrifício para poder fazer faculdade. Neste período, como eu tinha essas origens e era lá da região, eu me vinculei com o Sindicato de Trabalhadores Rurais de Bento Gonçalves que coordenava a região produtora de uva e era dirigido por um jovem sindicalista que era de esquerda, em tempos de Ditadura e tudo. Então, nós começamos a fazer todo um trabalho através do sindicato de organizar os produtores de uva para lutarem por um preço justo. A definição do preço é a forma de eles serem explorados no seu trabalho, como os seus familiares e os seus parentes todos. A exploração ocorre através do preço final da uva. Os produtores de uva trabalham o ano inteiro e quando chega na safra vendem sua produção, neste caso uva, o preço que eles te pagarem vai ser o preço do seu trabalho o resto do ano todo. É fundamental, portanto, discutir o preço do produto na exploração camponesa. Sabendo disso, nós como sindicato de toda a região, fizemos um movimento, já no fim da Ditadura, de lutar pelo preço justo da uva. Como eu era estudante de economia, organizei uma metodologia para calcular o custo de produção da uva. A gente ia de comunidade em comunidade para debater junto com os camponeses quanto custa produzir 1 kg de uva e qual deveria ser seu preço, desenvolvendo, assim, a metodologia. Os encontros eram de noite nos salões paroquiais das comunidades. A gente organizou um método em todos os municípios do Sindicato, levando em conta, por exemplo, que o camponês não tinha muito trabalho na roça durante o inverno, logo era preciso calcular o preço para quando chegasse a safra em janeiro. Era preciso defender um preço justo perante as cantinas, na época coincidiu que chegavam as cantinas multinacionais, que não tinham na região. Lá era mais cooperativas e o próprio agricultor ficava um pouco com receio de brigar com a direção da cooperativa porque no fundo ele era sócio também, mas muitas vezes ele era explorado pela diretoria da cooperativa. A chegada das multinacionais mudou a correlação de forças na região e nos animou a brigar com as vinícolas para ter o preço mais justo. Em 1979, eclodiu um conflito de terras com camponeses sem-terra lá do Norte do Rio Grande do Sul no município chamado Nonoai, e os índios recuperaram a sua área e expulsaram esses posseiros pobres. Os políticos da região incentivaram, como até hoje fazem né, os posseiros a se armarem e voltarem para atacar os índios. Um padre da região adepto da Teologia da Libertação e que conhecia meu trabalho me chamou: “João Pedro, tu que és sabido aí desses métodos colonos – como nós chamávamos – não quer vir aqui ajudar a organizar esse povo, se não vai dar guerra, os camponeses querem voltar para a área e os índios estão armados e a área é deles. Tu não topas vir aqui para organizar essa turma? ” E eu topei e fui lá. Essa é minha primeira experiência de trabalho com trabalhadores sem-terra, algo que não tinha tanto na minha região, a minha região era de camponeses migrantes produtores de uva, mas eu tinha essa sensibilidade, quem sabe, que herdei das influências culturais, políticas e ideológicas. Fui lá ajudar a organizar a turma e estou nessa até hoje. Naquela época o trabalho da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e dos padres da Teologia da Libertação era fundamental. Eu nunca esqueci da mensagem que os padres diziam para os camponeses pobres, eles diziam assim: “Deus só ajuda a quem se organiza, então tratem de se organizar caso contrário não vai ter ninguém que vai resolver os teus problemas”. Isso impulsionou demais a luta pela terra nos primeiros anos do movimento que coincide com o fim da Ditadura Militar de 1979 a 1985. As lutas eram localizadas pelo Brasil a fora, mas todas elas estimuladas ou por Sindicatos combativos, ou pela Igreja combativa, ou às vezes militantes de esquerda que estavam perdidos pelo Brasil, que começavam a ter espaços para retomar as ligas camponesas ou outras experiências das lutas antes da Ditadura. E tudo isso deu um caldo bom para a efervescência da retomada da luta pela terra. Em janeiro de 1984, nós fizemos um encontro nacional com as lideranças de todas essas lutas que haviam pipocado pelo Brasil. A reunião foi em Cascavel no Paraná, e foi deliberado que para nossa luta ter uma abrangência maior, para ter uma efetividade maior, nós teríamos que se organizar na forma de movimento em defesa da reforma agrária, que é no fundo mudar a estrutura fundiária em todo o país e não só resolver problemas locais. Aquele encontro foi histórico, juntou lideranças de 16 países e de vários estados do Brasil. Nós fomos para o encontro com o coração aberto, assim: “vamos lá se conhecer”. Ninguém se conhecia, uns eram gaúchos, capixabas, veio a turma de Santarém do Pará. Havia até um infiltrado da Ditadura Militar, da aeronáutica, que fomos descobrir somente depois.

Gustavo Dias: No próximo ano, 2022, celebramos o centenário do nascimento de Leonel Brizola, uma figura política de suma importância para a esquerda brasileira e que deixou um importante legado para pensarmos um projeto de país inclusivo e, sobretudo, autônomo. Como você avalia o legado de Brizola e a relevância dele para pensarmos o Brasil hoje?

João Pedro Stédile: A trajetória pessoal e política do Brizola é fantástica, então certamente o dossiê de vocês vai abranger os vários aspectos, isso significa um legado para as novas gerações, para os homens públicos. O Brizola teve uma carreira impressionante, que eu acho que foi marcada por sua origem pessoal. O fato dele ser um menino pobre, também filho de camponês, o pai era vaqueiro, cuidava de umas vacas lá no interior de Cruz Alta, depois nos conflitos entre maragatos e chimangos acabou sendo assassinado muito cedo. Brizola ficou órfão de pai. Sua mãe tinha uma forte influência da Igreja, porque a mãe, pelo o que ele me falou uma vez, era adventista. Brizola cresceu com a visão de mundo elaborada e de apego ao estudo. Sua mãe dizia: “meu filho, tu tens que estudar, tu tens que estudar, senão tu vais ser pobre o resto da vida”. Esses fatos o marcaram para o resto da vida. Ainda moço, Brizola migrou para Porto Alegre. Ele foi estudar no colégio agrícola, algo que até hoje a moçada do colégio agrícola de Viamão se orgulha e sempre recordam. Mesmo de origem humilde e sozinho em Porto Alegre, Brizola consegue ser aprovado no vestibular da federal para cursar engenharia civil. Imagina isso? Em 1942-1945, nem sei as datas direito, mas foi na década de 1940, ele passou na universidade federal. Ele era um gênio né, porque só fazia engenharia e medicina os filhos da elite. Na universidade, Brizola começou a chamar a atenção pela retórica e logo chamou atenção de algumas lideranças do PTB gaúcho. Ele se formou engenheiro civil, cresceu dentro do PTB e se elegeu jovem prefeito de Porto Alegre. Em seguida, porque não completou o mandato, foi eleito governador do Rio Grande do Sul. Foi o mais jovem governador eleito pelo Rio Grande até hoje. O Leite (Eduardo Leite do PSDB e atual governador do RS) ficava se exibindo de ser jovem para se comparar ao Brizola. Como se a idade fosse determinante. O que é determinante é a ideologia. Em agosto de 1961, Brizola ganhou destaque nacional e emergiu para o cenário da luta de classe com a resistência da Legalidade.[1] Brizola teve coragem de se insurgir contra o golpe que iria tirar o João Goulart da Presidência da República. Nesta época, minha professora lá na escola da comunidade rural falava: “hoje, na primeira aula, nós vamos ouvir nosso governador”. Ela botava um rádio em cima da mesa dela e ligava na Rádio Farroupilha para nós escutarmos a mensagem de Brizola. E lá vinha ele com uma hora, duas horas de discurso, explicando a conjuntura. Nós, gurizada de tudo, não entendíamos da conjuntura, mas entendíamos daquele fervor para defender os gaúchos, para defender a democracia, para defender a pátria. Essa era a visão e eu nunca me esqueço disso. Como governador do Rio Grande de 1959 a 1963, ele fez, na minha opinião, o melhor governo de esquerda de todo o Brasil, ainda que tenha sido num só estado. Tudo que nós temos lá no Rio Grande em termos de infraestrutura, de pensar para longe foi gestado no seu governo, desde a siderúrgica rio-grandense até o zoológico, a companhia estadual de leite, porque naquela época o leite era levado a cavalo para a cidade. Ele construiu a companhia estadual de laticínios, leite gaúcho, que agora voltaram a ter marca, que era estatal para poder industrializar o leite, criar mercado para os camponeses e garantir um leite saudável, pasteurizado, para as pessoas. Até hoje, eu me lembro desse leite que vinha em litros. Você trocava o leite na padaria ou onde fosse comprar. Ele estatizou a ITT (International Telephone & Telegraph) que era telefônica e teve a coragem de pagar 1 real, naquela época o real no valor deles, porque ele mandou os contadores fazerem as contas e a ITT devia mais de impostos do que o seu patrimônio. Então Brizola afirma: “está aqui o decreto de desapropriação”. Olha a coragem do governador e pelas contas vocês têm de crédito 1 real, 1 cruzeiro. Uma verdadeira revolução. Mas era fundamental, ele tinha essa visão de que para se construir um Estado moderno, com soberania nacional, o Estado tinha de ter o controle da infraestrutura básica: estrada, comunicação, siderúrgica, aço e alimento. Brizola era um visionário. Como acabei de dizer, eu sou beneficiário dos investimentos que ele fez em educação. O governo dele foi o primeiro que universalizou o acesso ao ensino fundamental no Brasil, portanto, acabou com o analfabetismo no Rio Grande. As pessoas passaram a aprender a ler e a escrever na idade certa. Por isso que, até hoje, o Rio Grande é uma referência nos índices de escolaridades porque se você faz fundamental, como foi o meu caso, logo você quer fazer ensino médio e logo vai para a frente. No campo da reforma agrária, ele foi, também, um visionário. Na minha modesta opinião, acho que ele foi influenciado pela Revolução Cubana, porque ele era governador de 1959 a 1963 e a Revolução Cubana foi em 1959. Ele foi influenciado pela Revolução Cubana, na minha opinião, em dois aspectos: o primeiro foi no aspecto da reforma agrária e o segundo no Grupo dos Onze. Na reforma agrária, Brizola com o PTB começaram a organizar os camponeses sem-terra no Master (Movimento dos Agricultores Sem-Terra). Agora o sem-terra, o caboclo e o pobre, lá dos fundões do Rio Grande do Sul, organizados começaram a identificar os latifúndios improdutivos que havia no estado e começaram a organizar a turma para ocupar. Outra influência da Revolução Cubana no pensamento de Brizola é a ideia de organizar grupos de pessoas ao estilo dos Comitês de Defesa da Revolução (CDR) em Cuba. É isso que eu quero dizer para vocês, ele não era só retórica que nós se entusiasmávamos de ouvir ele discursando no rádio. Brizola tinha sentido organizativo e, eu acho, arrisco meu diploma, que ele copiou o Grupo dos Onze do CDR da Revolução Cubana porque ele acompanhava muito o que acontecia em Cuba, entendeu? E eu acho que ele trouxe de lá a ideia de organizar Grupos de Onze pessoas para defenderem as mudanças estruturais propostas. A ideia de Onze pessoas foi ele que deu porque no CDR o número de membros é variável, mas, em sentido, eram células organizativas de militância partidária, clandestina, e que não precisavam ficar fazendo propaganda, mas que atuam na organização do povo. Brizola, então, sabia que tinham de ter programa de rádio, sabia que tinham de formar mais gente, sabia que tinha de organizar os sem-terra. Por isso, quando veio o Golpe Militar de 1964, Brizola e seu grupo foram os mais afetados pela repressão, muitos foram assassinados, perseguidos, muitos tiveram que fugir para o Uruguai, cruzar o Rio Uruguai, infelizmente. Inclusive, eu comentei com a turma da comissão de anistia que, talvez, os brizolistas tenham sido os mais esquecidos na reparação dos direitos da repressão que eles sofreram pela ditadura porque eles foram os primeiros. Em abril de 1964, lembrem-se o governo do Rio Grande já era de direita com o Ildo Meneghetti. E o Ildo Meneghetti usou a brigada militar, que era a polícia local, para fazer a repressão contra os brizolistas daí o grau e também a amplitude da repressão.

Isaías Moraes: João Pedro, qual foi a influência do Movimento dos Agricultores Sem Terra (Master), incentivado e impulsionado por Leonel Brizola enquanto governador do Rio Grande do Sul (1959 – 1963), para a organização do MST?

João Pedro Stédile: Um dos primeiros líderes dos sem-terra no Rio Grande do Sul se chamava Jair Calixto, ele era prefeito de Nonoai do PTB. Jair Calixto era praticamente analfabeto, mas ele liderou a ocupação na Fazenda Sarandi, havia 2 mil pessoas, era um exército. E o Jair, quase analfabeto, só assinava o nome, mas era muito bom de frente de massa. Como é que ele conseguiu granjear o apoio dos sem-terra? Bom, ele era prefeito, então, tinha uma certa projeção lá em Nonoai, daquele jeito, naquele tempo. Jair Calixto costumava dizer que era primo de Brizola e tinha se criado junto com ele em Cruz Alta. E isso dava uma moral extraordinária para ele. Imagina, um cara sem-terra, meio analfabeto, mas era um líder político que era parente do Brizola? E o Brizola nunca negou tal fato, e o tratava como parente, mas ninguém sabe até hoje se eram parentes ou não, mas isso é para tu vês como se criavam os laços da mística na política. Havia outro líder sem-terra, mais próximo de Porto Alegre, que organizou o assentamento do Banhado do Colégio. Era João Machado dos Santos, João Sem-Terra[2]. Essas figuras compuseram o Master, que surgiu com apoio do PTB. Então, como é que o MST aprendeu com o Master? Aprendeu de várias maneiras, mas, sobretudo pela história e pela pedagogia do exemplo. Aprendemos, também, por essa conexão que foi possível, porque nós tínhamos esse, digamos, essa vocação de aprender com o que nos antecederam. Ninguém está inventando nada nesse mundo da luta de classe, muita gente ia dizer “nós fizemos a luta pela reforma agrária”, mas nós tivemos que aprender com eles antes. Nos primeiros anos do MST, nós nos encontramos com importantes ativistas do Master, como o João Sem-Terra. Ficávamos conversando com ele e perguntando: “como que vocês faziam? Como que foram os erros? ” E nós sempre acostumamos a fazer só duas perguntas: “Quais os erros? Quais os acertos”. Tu imaginas, um líder camponês somado com a retórica que usa sobretudo o verbo, como nós dizemos, para convencer os outros, você faz essa pergunta: “João Sem-Terra, quais foram os erros que vocês cometeram? ” Ele falou 8 horas, entendeu? Nós conversamos muito sobre o Master, com João Sem-Terra. Infelizmente, com Jair Calixto que já estava morto não teve como. Mas conheci Paulo Schilling aqui em São Paulo e recém vindo do exílio do Uruguai. Eu conversei muito com Paulo Schilling e fiz amizade com ele até o fim da vida dele, grande figuraça, o alemão, como era conhecido no PTB. Ele era um sujeito muito alto, quase 2 metros, fisionomia alemã, Paul, Paulo Shilling, da colônia alemã lá do Rio Grande. E tinha um outro alemão, Muller, só me lembro do sobrenome, Muller, que também tinha sido prefeito de Encruzilhada do Sul, eleito daí depois dos assentamentos do Brizola, ou seja, os assentamentos do Brizola deram base social para ele virar prefeito lá. Do Muller eu vi mais depoimentos dele em jornal, mas eu conheci o filho dele que era delegado. O filho tinha um carinho muito grande pelo pai, óbvio né, sabia tudo da luta do pai. O delegado Muller, que eu conheci, falou muito do pai dele, como que eram as lutas na época, as perseguições, etc.

A diferença das ocupações deles para as nossas é que, naquela época, iam só os homens nas ocupações porque eles achavam que iam ter conflitos. Então, adotavam aquela mentalidade de camponês “vamos proteger nossas mulheres e crianças”, logo iam só os homens. O MST, depois, atualizou isso e vai todo mundo, vai gato, cachorro, idoso, tudo e já vai de mudança. O Master fez isso, ocupava os grandes latifúndios – a tática é a mesma histórica, isso ninguém inventa – e o movimento teve sorte, pois imediatamente uma das grandes áreas que eles ocuparam foi a chamada Fazenda Sarandi que ficou marcada na história da reforma agrária por 1960-1961. A Fazenda Sarandi tinha 20 mil hectares completamente improdutivos porque a origem da fazenda era um proprietário uruguaio de sobrenome Mailhos e lá na fazenda eles só queriam explorar pinheiros. Eles iam tirando a madeira e ganhando dinheiro e não se preocupavam com a produção agrícola. E as terras eram muito boas naquela região, até hoje são, tanto é que dessa fazenda resultou 3-4 municípios agora. A firma Mailhos era tipo transnacional daquela época de origem uruguaia. Ela tinha muita terra no Uruguai, tinha uma usina de cana em Cuba, para exportar açúcar para os Estados Unidos, e lá o Fidel desapropriou a usina, de maneiras, que eu acho, que isso foi um impulso na correlação de força. Eu meio que imagino o Brizola na ousadia dele pensando: “se os cubanos desapropriaram por que eu não posso desapropriar? São os mesmos que vem aqui explorar”. Brizola acompanhava muito o que acontecia em Cuba. Tanto para essa experiência da reforma agrária não é casual que ele desapropriou a primeira, uma multinacional uruguaia que tinha sido desapropriada também em Cuba. Depois de duas semanas da ocupação de Sarandi, para espanto de todo mundo, lá vai Brizola, como governador, visitar os acampados e levou junto a rádio Farroupilha, que o ajudava na difusão, e levou também um padre, era aquele cenário do Concílio Vaticano II e da Teologia da Libertação. O padre foi a rigor, tem fotos do padre ao lado do Brizola, e fizeram comício com os acampados prometendo terra em nome de Deus, em nome do evangelho, em nome do Papa, em nome de todo mundo. A camponesada pensou: “bom, se o Papa, o padre e o governador estão do nosso lado, nós vamos ganhar” e ganharam. Brizola, de novo na ousadia dele, desapropriou a fazenda de 20 mil hectares, desapropriou e distribuiu para os sem-terra. Ele desapropriou com uma lei estadual, um decreto estadual, pois não tinha lei de reforma agrária no Brasil, não tinha Incra, não tinha cadastro, era terra de latifúndio desde a escravidão. Então, o Master tem origem partidária, digamos, ainda que seja autêntico dos camponeses pobres, mas quem organizava eram os militantes do PTB e tinham o suporte do governador. O governador Brizola meio que chancelou “pode ocupar que eu garanto desde que seja improdutivo”. Ele tinha também essa visão de que é verdadeira, mas você pode imaginar o impacto para aquela época. Nessa relação, Master, PTB e Brizola, houve várias fazendas improdutivas que ele desapropriou, por exemplo, em Viamão – o famoso assentamento Banhado do Colégio – em Cachoeira do Sul – assentamento Camaquã. E aí, para ir dando forma a essa vontade política pela reforma agrária, Brizola foi inovador porque ele criou uma lei de reforma agrária estadual, isso em 1960-1963. Tu imaginas isso hoje, Isaías? Os governadores, hoje, morrem de medo de desapropriar uma área. Naquela época, tu imaginas o governador dizer “aqui é comigo mesmo”, entendeu? Era preciso ter muita autoridade moral. E Brizola tinha. Então, ele criou uma lei da reforma agrária gaúcha e criou um instituto para aplicar a lei que foi o IGRA, Instituto Gaúcho de Reforma Agrária, também uma referência. Usando uma metáfora do futebol, podemos afirmar que Brizola sempre foi centroavante na luta política, aquele centroavante que vinha buscar a bola no meio de campo e ia para cima, que chamava a responsabilidade do jogo para si. Só que Brizola, também, tinha um assessor muito sábio que era uma espécie de intelectual orgânico na retaguarda, Paulo Schilling. Ele era o quarto zagueiro do time. Paulo Schilling era um intelectual que vinha da esquerda, na juventude, eu acho que tinha sido do PCB, e no governo Brizola, ainda muito jovem, ele virou secretário da Casa Civil. Schilling virou o responsável que preparava as leis da reforma agrária. Ele tinha uma visão mais organizada da reforma agrária. Schilling tinha uma visão cepalina da reforma agrária, ou seja, fazer a reforma agrária para desenvolver a indústria no Brasil. A reforma agrária, assim, não é uma questão somente de camponês. Schilling, por exemplo, foi um dos precursores do desenvolvimento do cultivo de trigo no Rio Grande do Sul. Ele tem, inclusive, um ensaio sobre isso. Pela lógica dele, como política agrícola, se nós aqui do Rio Grande, nós temos um bioma que nos permite produzir trigo, temos de desenvolver e não continuar importando dos Estados Unidos ou da Argentina. Nós temos que produzir aqui. Na época do Brizola, com sua ousadia, eles fizeram uma grande campanha de fomento da produção de trigo, que por trás tinha essa visão cepalina de desenvolver o trigo, desenvolver a indústria, de desenvolver as forças produtivas que elevariam o desenvolvimento econômico do estado gaúcho. A importância de Paulo Schilling no pensamento de Brizola e da reforma agrária é tamanha que eu até publiquei um texto dele em uma das minhas coletâneas.[3] A atuação de Brizola no PTB, no Master e na formação de seu governo demonstra que ele tinha uma visão organizativa da política partidária fantástica, a gente costuma se lembrar do Brizola muito pelos seus discursos, porque ele tinha uma oratória muito boa, mas é importante destacar sua capacidade de organização partidária e política também. Ele era um líder. E é isso que eu quero dizer para vocês, ele não era só retórica que nós se entusiasmávamos de ouvir quando ele discursava no rádio. Ele tinha sentido organizativo apurado, vejam o Master e o Grupo dos Onze.

Gustavo Dias: Stédile, como é que diante de todo esse legado do Brizola você olha o caminho que o Rio Grande do Sul vem tomando nos últimos tempos?

João Pedro Stédile: A política no Rio Grande do Sul sempre foi branca ou preta, maragato ou chimango, que era lenço vermelho e lenço branco, então, olha, sempre foi um, digamos, muito dividido, grêmio e colorado, tudo é muito dividido. Tem a direita bem definida, tem a esquerda bem definida e no meio tem um setor da classe média, um setor com pouca tradição política. Então, quando um dos polos consegue, por algum motivo, conquistar o apoio dessa turma do meio, ganha as eleições. Notem como isso é algo cultural, o Brizola, repito, que foi o melhor governador de esquerda do Brasil em toda a história, mesmo assim, perdeu a eleição de 1962 para a direita e para a democracia cristã que apoiaram Ildo Meneghetti. Brizola acabou se elegendo deputado federal pela Guanabara. Quem poderia dizer que um governo daquele tipo, com todo apoio dos pobres, iria perder. No Rio Grande do Sul, tem essa direitona clássica, reacionária, com base nos fazendeiros e nos militares. No Rio Grande tem muitos quartéis e os descendentes dos militares acabam casando com os descendentes dos fazendeiros. Então, nasce disso um laço de classe que vai alimentando essa ideologia de direita, esse é o Rio Grande. Não é um padrão clássico de luta de classes. Brizola tentou acabar com essa estrutura.

Isaías Moraes: João Pedro, como última pergunta, a gente deixa em aberto para você ponderar algo mais sobre o Leonel Brizola que você considera essencial para nosso dossiê.

João Pedro Stédile: O Brizola foi um homem público, eu não vou falar do Rio porque eu não conheço com mais detalhes, mas ele foi um homem público que foi ousado nas suas políticas públicas, sempre a favor dos pobres. Você não vai encontrar no governo de Brizola nenhuma política de benefício para as oligarquias, de favorecimento a este ou aquele grupo da elite. Brizola foi um homem sempre vinculado com a ideia da educação, que eu acho ser influência da trajetória pessoal dele, só a educação, só o conhecimento pode salvar os pobres. Brizola era prova disso, órfão de pai com 5 anos de idade lá no interior de Cruz Alta, se não fosse a educação ele seria explorado para o resto da vida nas mãos de fazendeiros da região. Se tivesse sorte iria virar soldado no exército, Cruz Alta estava cheia de quartel, até hoje tem. Finalmente, o que eu acho que é importante nós resgatarmos o legado dele, além dessa contribuição do homem público, da visão que ele tinha, da organização partidária. Não é por acaso que o Golbery roubou a sigla PTB dele e deu para os pilantras lá dá Ivete Vargas, porque o PTB tinha uma marca mística por toda essa luta brizolista. Brizola ainda tentou restaurar essa mística política com o PDT, mas não deu. A coisa na política funciona por mística, por ideias, por legados culturais, não é simplesmente uma sigla, então ele foi derrotado pelo Golbery, muito esperto porque sabia o peso e a carga ideológica que o PTB tinha. Mas eu queria, por último, então, reconhecer o valor do Brizola como homem público, como um ser visionário e ousado. Ele não era só retórica e tinha uma moral capaz de impor respeito por onde passasse. É a pedagogia do exemplo. Os bens que Brizola possuía eram de sua mulher, Neusa Goulart, irmã de Jango. A fazenda que eles possuíam no Uruguai, lá em Durazno, era de origem dos bens da mulher dele e o apartamento no Rio é a mesma coisa. Brizola podia ter amealhado, como ele usava esse termo, muitos bens públicos se quisesse, mas morreu pobre, não deixou nada para os filhos. Até o apartamentinho no Rio, um apartamento todo mundo tem direito, e aquela fazenda do Uruguai que depois ele vendeu. Mas um homem público no Brasil que morre pobre, você pode mandar erguer status. Brizola é de uma geração de homens que se dedicavam à causa pública por vocação, por compromisso com o povo e não como essa tropa que nós estamos vivenciando nas últimas décadas que só pensam em se candidatar para tirar proveito de alguma coisa.

Referências

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. Tradução, Plínio Dentzien. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2001.

BAUMAN, Zygmunt. O mal-estar da pós-modernidade. Rio de Janeiro: Zahar Ed., 1998.

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). MST homenageia Brizola, considerado avô do Movimento. Brasil: MST, 2004. Disponível em: https://mst.org.br/2004/06/25/mst-homenageia-brizola-considerado-avo-do-movimento/. Acesso em 11 de abi. 2022.

STÉDILE, João Pedro. Brizola foi o melhor governador de esquerda do Brasil. São Paulo: CartaCapital, 2022. Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/opiniao/brizola-foi-o-melhor-governador-de-esquerda-do-brasil/. Acesso em 11 de abri. 2022.

STÉDILE, João Pedro. A questão Agrária no Brasil, vol. I.: o debate tradicional – 1500 – 1960. São Paulo: Expressão Popular, 2006.

Notas

[1] Quando Jânio Quadros renuncia à presidência do Brasil, o vice-presidente João Goulart torna-se o sucessor natural ao cargo. No entanto, setores entreguistas da sociedade e de militares clamavam pelo impedimento da posse de Jango, temerosos de suas posições de esquerda. Liderado por Leonel Brizola, o movimento Legalidade é criado para garantir a posse do vice-presidente e a defesa da Constituição, colocando grande parte do Rio Grande do Sul contra um núcleo do exército. Em 2011, a Revista do Programa de Pós-Graduação em História da UFRGS, Anos 90, lançou um dossiê especial sobre os 90 anos da Campanha da Legalidade, disponível em https://seer.ufrgs.br/index.php/anos90/issue/view/1327. Em 2019, foi realizado um filme sobre o movimento, o filme se chama Legalidade, direção de Zeca Brito.
[2] Há um excelente documentário sobre o líder popular gaúcho que atuou no Master, denominado João Sem Terra, direção de Tereza Noll Trindade.
[3] A coletânea que João Pedro Stédile se refere é: “A questão agrária no Brasil – vol.I – O debate tradicional: 1500 – 1960”.

Autor notes

i Pesquisador do Núcleo de Extensão e Pesquisa em Economia Solidária, Criativa e Cidadania da Unesp (NEPESC-Unesp), Brasil. E-mail: isaias.a.moraes@unesp.br. Orcid: 0000-0003-1839-803X
ii Professor do Departamento de Geociências e do Programa de Pós-Graduação em Geografia - PPGEO na Universidade Estadual de Montes Claros (UNIMONTES), Brasil. E-mail: gustavo.cepolini@unimontes.br. Orcid: https://orcid.org/0000-0003-1010-501X

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