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Que rio é esse? A geografia escolar e o espaço vivido: impressão 3D e dados de sensoriamento remoto para o ensino de bacias hidrográficas
What river is this? School geography and lived space: 3D printing and remote sensing data for watershed teaching
Revista Presença Geográfica, vol. 11, núm. 1, Esp., 2024
Fundação Universidade Federal de Rondônia

Revista Presença Geográfica
Fundação Universidade Federal de Rondônia, Brasil
ISSN-e: 2446-6646
Periodicidade: Frecuencia continua
vol. 11, núm. 1, Esp., 2024

Recepção: 20 Dezembro 2023

Aprovação: 26 Dezembro 2023

Resumo: A presença de recursos tecnológicos tem se tornado uma realidade nas instituições de ensino público e privada em seus diferentes níveis (Educação Básica e Ensino Superior). Tecnologias como impressão 3D, corte a laser, realidade virtual, robótica e linguagem de programação e a própria Cartografia digital têm sido incorporadas às práticas pedagógicas. Entretanto, desafios emergem: a capacitação dos professores para o manuseio dessas ferramentas, a integração dos conteúdos disciplinares com as tecnologias. Contata-se por exemplo, que a carga horária de trabalho excessiva dos educadores limita a sua atuação e o uso recursos variados, uma vez que isso demanda tempo e preparo das aulas. Neste contexto, o objetivo deste trabalho é verificar a utilização da impressora 3D na prototipagem de bacias hidrográficas de um município da região oeste do Estado do Paraná a partir de dados de sensoriamento remoto – Modelo Digital de Elevação da Shuttle Radar Topography Mission, servindo como um modelo didático para ser utilizado no ensino de Geografia ao abordar esta temática nas aulas. O material 3D impresso tem sido aplicado em ações de extensão, em que os professores e alunos interagem com o recurso didático, como um teste prévio do público que tem contato com esse recurso, para adiante ser inserido em sala de aula. Os primeiros resultados indicam uma resposta satisfatória no que tange ao entendimento desse recurso, sua função e representação. Contudo, pontua-se que ainda seguem as validações desses protótipos, sendo necessário ampliar a testagem desses recursos para validar plenamente os benefícios didáticos e pedagógicos do uso da impressão 3D e do MDE na compreensão do conceito de bacias hidrográficas.

Palavras-chave: prototipagem, modelo digital de elevação, tecnologia no ensino.

Abstract: The presence of technological resources has become a reality in public and private education institutions at their different levels (Basic Education and Higher Education). Technologies such as 3D printing, laser cutting, virtual reality, robotics and programming languages and digital cartography itself have been incorporated into pedagogical practices. However, challenges emerge: training teachers to use these tools, integrating disciplinary content with technologies. For example, it is noted that the excessive workload of educators limits their performance and the use of varied resources, as this demands time and preparation for classes. In this context, the objective of this work is to verify the use of the 3D printer in the prototyping of river basins in a municipality in the western region of the State of Paraná based on remote sensing data – Digital Elevation Model from the Shuttle Radar Topography Mission, serving as a didactic model to be used in Geography teaching when addressing this topic in classes. The 3D printed material has been applied in extension actions, in which teachers and students interact with the teaching resource, as a preliminary test for the public that has contact with this resource, to later be inserted into the classroom. The first results indicate a satisfactory response in terms of understanding this resource, its function and representation. However, it is noted that validations of these prototypes are still ongoing, and it is necessary to expand the testing of these resources to fully validate the didactic and pedagogical benefits of using 3D printing and MDE in understanding the concept of river basins.

Keywords: prototyping, digital elevation model, technology in teaching.

INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas o ambiente escolar tem sido alterado com mudanças significativas no que se refere aos instrumentos e formas de ensinar. O contexto societário vivido, altamente tecnológico, gradativamente tem alcançado as escolas e os professores, sendo que novas ferramentas e metodologias estão sendo incorporadas nas escolas para ensinar (PAIXÃO, 2018; SOUZA et al., 2020; EVANGELISTA, 2021; QUOOS e FIGUEIRÓ, 2021).

As instituições de ensino (tanto públicas como privadas) têm recebido investimentos em recursos que visam não só atrair, mas melhorar a forma de ensinar. Neste sentido, são cada vez mais presentes alguns recursos e metodologias tais como: a) realidade virtual e realidade aumentada; b) linguagem de programação, c) robótica, d) inteligência artificial, e) prototipação em impressora 3D, f) prototipação em máquina de corte e gravação a laser, g) prática da gamificação, h) aprendizagem colaborativa, i) utilização de lousas digitais, dentre outros. Tais práticas ou encaminhamentos metodológicos passam a se tornar uma realidade no ambiente escolar, favorecendo a criação de uma cultura que incorpora o domínio do campo digital.

Por exemplo, na região do oeste do Paraná, municípios como de Toledo, Marechal Cândido Rondon, Cascavel, Assis Chateaubriand incorporaram algumas dessas tecnologias ou recursos em suas escolas. O exemplo mais notável é o município de Toledo, em que 10 mil tablets foram distribuídos aos alunos atendidos pelo município. Adicionalmente, as escolas também possuem máquina de corte e gravação a laser, impressora 3D, kits de robótica, dentre outros. Os municípios de Marechal Candido Rondon e Assis Chateaubriand instalaram lousas digitais para as escolas atendidas pelos respectivos municípios.

Todas essas inserções tecnológicas comumente exigem recursos para serem postas em prática. Assim, os ambientes educacionais adquirem equipamentos diversos como impressoras 3D, óculos de realidade virtual, drones, máquinas de corte e gravação à laser, kits de robótica, computadores específicos para o desenvolvimento de conteúdos de programação, lousas digitais, tablets etc. Esta conjuntura não se limita a uma determinada área do conhecimento, atendendo a todos os componentes curriculares.

No ambiente universitário, também se encontram tais iniciativas. Algumas instituições de ensino superior têm-se dedicado a pesquisa e ao desenvolvimento de produtos e soluções que utilizam a robótica, impressão 3D, inteligência artificial, prototipação etc. Por exemplo, no último evento da SBPC – Reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, realizado entre 23 a 29 de julho de 2023 na cidade de Curitiba, estandes de universidades como a da UFPR – Universidade Federal do Paraná e da UNESPAR – Universidade Estadual do Paraná apresentaram soluções com o uso de impressão 3D. A UFPR implantou diferentes espaços, como o Laboratório de Modelagem, Prototipação e Inovação – LAMPI[1], o Laboratório de Prototipação em Impressão 3D[2], além de ofertar o Projeto de Extensão Labinc – Laboratório de Inclusão[3], em que desenvolve e cria materiais didáticos para o ensino-aprendizagem de pessoas com deficiência visual, auditiva, física e mental.

Na Universidade Estadual de Londrina inaugurou-se o Laboratório de Impressão 3D para inovação em produtos e serviços[4]. Na USP – Universidade de São Paulo o Departamento de Engenharia Mecânica possui o Lab 3D, destinado às disciplinas de graduação - incluindo Trabalhos de Conclusão de Curso e Atividades Extracurriculares - que necessitam de protótipos para fins didáticos e de projetos. Na UNESPAR, Liziero e Basniak (2016) utilizam da impressão 3D para o ensino de Matemática, Ciências Biológicas, Química e Geografia. Neste âmbito, assinala-se a importância de os cursos de licenciatura gradualmente investirem na criação dos chamados laboratórios maker e fazendo assim o uso de recursos como a impressora 3D, dentre outros recursos e tecnologias. Na Unioeste - Universidade Estadual do Oeste do Paraná, os cursos de licenciatura em Geografia e Pedagogia estão investindo para a criação do espaço maker. Especificamente, o curso de geografia do campus de Marechal Cândido Rondon já possui equipamentos como impressora 3D, máquina de corte e gravação a laser, óculos de realidade aumenta e virtual, tablets, dentre outros recursos.

Contudo, não se pode desconsiderar todas as discussões de cunho crítico e reflexivo sobre a inserção da tecnologia no ensino, bem como o uso excessivo de telas e computadores e sua influência direta no desenvolvimento das crianças e adolescentes, além da mercantilização da educação, do acesso a esses bens e equipamentos que não é igualitário dentre outras problemáticas e implicações. Do outro lado, é importante compreender as potencialidades desses meios e recursos tecnológicos e digitais como recursos facilitadores da aprendizagem, quando usados pedagogicamente. Os estudantes da geração atual, comumente chamados de “geração polegar” ou “nativos digitais” (PRENSKY, 2001), em função do seu cotidiano e modo de vida, tem demandado das escolas e professores por novos formatos de ensino e aprendizagem, o que consequentemente tem exigido dos docentes a familiarização e inserção desses recursos na sala de aula (PENHA; MELO, 2016; FRAGA GONÇALVES et al., 2019).

Estas mudanças são tão significativas que muitos países atualizaram os currículos escolares para que se adequem a uma formação mais condizente com o mundo contemporâneo (CAMPOS; DIAS, 2020). No ambiente acadêmico também há a atualização da grade curricular dos cursos de graduação. No cenário nacional, destaca-se a aprovação da Política Nacional de Educação Digital (Lei n. 14.533/2023), em que apresenta os seguintes eixos estruturantes: inclusão digital, educação digital escolar, capacitação e especialização digital e pesquisa e desenvolvimento (P&D) em tecnologias da informação e comunicação (TICs).

Diante das problemáticas mencionadas anteriormente, este trabalho apresenta os resultados preliminares de uma das ações que vem sendo desenvolvida no Geo Lab Maker, recentemente criado no curso de Licenciatura em Geografia, da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), campus de Marechal Cândido Rondon-PR. Um dos objetivos do Geo Lab Maker é o de elaborar soluções educacionais personalizadas com o uso de tecnologias (impressão 3D, máquina de corte e gravação a laser, realidade virtual e aumentada etc.), estando o mais próximo e condizentes com a realidade dos estudantes e professores da educação básica. Além disso, propiciar aos futuros professores (que estão tendo a formação docente inicial) o contato e formação teórica e prática com esses recursos tecnológicos (impressora 3D, tablets, lousa digital, óculos de realidade aumentada e virtual, máquina de corte e gravação a laser, etc.), uma vez que alguns desses recursos estão presentes nas escolas e serão seus instrumentos de trabalho.

A partir do pressuposto da elaboração de recursos didáticos por meio de tecnologias, o presente trabalho tem o objetivo de verificar a utilização da impressora 3D na prototipagem de bacias hidrográficas de um município da região oeste do Estado do Paraná, servindo como um modelo didático para ser utilizado no ensino de Geografia ao abordar esta temática nas aulas.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Para desenvolver esse modelo didático os materiais utilizados foram: impressora 3D Creality, modelo Ender 3 v2, filamento PLA (Poliácido Lático), software livre de Sistema de Informação Geográfica QGIS, software Blender e Modelo Digital de Elevação (MDE) proveniente da SRTM (Shuttle Radar Topography Mission) com resolução espacial de 30 metros e obtido da Earth Explorer - https://earthexplorer.usgs.gov/.

A área do estudo refere-se a uma bacia hidrográfica localizada no município de Toledo[5], oeste do Estado do Paraná. Cabe destacar que o município de Toledo desenvolve uma atividade pedagógica com os estudantes do Ensino Fundamental, anos iniciais denominada “Conhecendo Toledo”. Uma das ações desta atividade consiste em executar um roteiro de campo na área urbana e rural. Dessa forma, considerando a importância de apresentar conteúdos relacionados ao espaço de vivência do estudante, selecionou-se a bacia hidrográfica do rio Lageado Grande (Figura 1).


FIGURA 1
Carta imagem da Bacia Hidrográfica do rio Lageado Grande, Toledo-PR.
Fonte: os autores (2023)

Após a definição da bacia hidrográfica, procedeu-se com a obtenção do MDE SRTM. Por não haver uma base de dados disponível, primeiramente foi delimitado manualmente a Bacia Hidrográfica do rio Lageado Grande, no município de Toledo-Pr utilizando-se do QGIS v.3.30. Com a delimitação da bacia hidrográfica, procedeu-se com o recorte do MDE SRTM. Com o recorte da bacia hidrográfica no QGIS, exportou-se como imagem em *.formato (*.jpg) (Figura 2A). Utilizou-se o gradiente de cores do branco para o preto para ser posteriormente manipulado em ambiente 3D no software Blender. Neste software reproduziu-se a topografia da área (Figura 2B).


FIGURA 2
a) MDE SRTM exportado no formato .JPG para manipulação no software Blender; b) MDE já manipulado e configurado para a impressão 3D.
Fonte: os autores (2023)

Por fim, o modelo foi exportado para o formato STL, que é um tipo de arquivo universal para impressão 3D e que é reconhecido pelo software fatiador Ultimaker Cura, que divide o modelo 3D em camadas finas gerando um código G-Code correspondente, que é a linguagem utilizada pelas impressoras 3D para criar objetos camada por camada (Figura 3).

A impressão realizada na impressora Creality 3D v2 considerou a área útil de impressão de 220x220x250mm. Partindo do sistema cartesiano x, y e z, configurou-se a impressão nas dimensões de 20cm x 9cm x 1,8cm respectivamente. Definiu-se os seguintes parâmetros para a impressão: bico extrusor ou hotend com aquecimento de 215°C e a mesa a 60°C. O preenchimento interno que influência no tempo de impressão e na quantidade de material utilizado, foi de 20%


FIGURA 3
Modelo exportado no formato .STL para impressão 3D. Software fatiador Ultimaker Cura e as divisões do modelo em finas camadas gerando um código G-Code correspondente.
Fonte: os autores (2023).

Após a conclusão da impressão, o modelo foi pintado com tinta para artesanato PVA (Acetato de Polivinila), ressaltando-se os canais de drenagem e ficando pronta para ser utilizada como material didático para o aprendizado de conteúdos relacionados a bacias hidrográficas.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

A prototipação e impressão da bacia hidrográfica (Figura 4) integra um estudo preliminar de soluções didáticas elaboradas para aplicação no ensino de diversos conceitos e temáticas ensinados na disciplina de Geografia. Considerando os parâmetros utilizados, a impressão demorou aproximadamente 8 horas para ser finalizada e consumiu cerca de 65 gramas de filamento. O item tem a dimensão de nove centímetros de largura por vinte centímetros de comprimento. O setor correspondente a montante da bacia tem espessura de 10 mm e o exutório de aproximadamente 3 mm.


FIGURA 4
Modelo final da bacia hidrográfica do rio Lageado Grande impresso e pintado.
Fonte: os autores (2023)

Esse material tem sido testado e utilizado (juntamente com outros protótipos) em ações de extensão desenvolvidas pelos autores tais como feiras cientificas e exposições. A bacia hidrográfica e os demais materiais ainda não foram testados e avaliados em ambiente escolar, com uma turma de estudantes especifica, mas nos atendimentos de extensão realizados, os professores manifestam interesse e mencionaram o potencial desse recurso em sala de aula. Segundo os docentes, a bacia hidrográfica impressa pode facilitar a aprendizagem de diversos conteúdos relacionados a Geografia Física, especialmente esse conteúdo que depreende a necessária abstração do relevo para compreender o fenômeno geográfico. A partir da interação com os professores, foram mencionadas as possíveis formas de explorar o protótipo da bacia hidrográfica do rio Lageado durante as aulas de Geografia:

- A área da bacia: Os estudantes poderão observar toda a extensão de terra que abrange a bacia hidrográfica, reforçando como esse limite territorial é importante para diferentes objetivos da sociedade na gestão e planejamento. Pode-se explorar que através das vertentes toda a água da chuva flui para o rio principal, processo que poderá ser demonstrado com a simulação da precipitação através de um pulverizador manual ou com um pouco de água. Os elementos naturais e antrópicos também podem ser ressaltados como componentes fundamentais que interferem diretamente nas condições físicas do rio, seja na forma do leito ou na qualidade da água;

- A declividade do relevo: através do protótipo é possível visualizar a inclinação do relevo. É possível explorar a bacia compartimentando-a em alta, média e baixa bacia, ou alto, médio e baixo curso do rio Lageado. Pode-se explorar também demais conceitos como montante e jusante, nascente e foz dos rios, divisores de água, forma da bacia, comprimento do canal, afluentes, dentre outros. Os processos erosivos também devem ser explicitados durante a demonstração, no qual toda carga de sedimentos pode ser carreada para os setores mais baixos da bacia, chegando ao rio principal, associado ao tema de uso e cobertura da terra;

- A rede de drenagem: ao visualizar o protótipo pode-se identificar e compreender a categoria dos rios em: rio principal, rio afluente, nascentes, exutório ou foz, talvegue, canal principal, a classificação dos rios (perenes, intermitentes e outros) e sua hierarquia (1°ordem, 2°ordem, 3° ordem, 4°ordem), conforme a classificação seguida;

- As geotecnologias: pode-se explorar os procedimentos e materiais de geotecnologias necessários para a obtenção do produto. Por exemplo, expor conteúdos de modelo digital de elevação, suas formas de obtenção, demais imagens de satélite, softwares de sistema de informação geográfica, áreas de atuação profissional, aplicações das geotecnologias no dia a dia, dentre outros.

Como observado, são diversas as possibilidades de utilização deste recurso obtido com a impressão 3D de uma bacia hidrográfica. Vale destacar que além dessas sugestões o professor em sala de aula terá liberdade para utilizá-la conforme achar necessário e de acordo com as indagações referente a temática. Ressalta-se que a impressão tridimensional já é utilizada por outras disciplinas (como a Biologia, Matemática) como recurso didático. Por exemplo, é comum a utilização desse recurso nas disciplinas de Biologia ao abordar o ensino da embriologia e suas estruturas (SOUTO et al., 2021), ou também no desenvolvimento de recursos assistivos para alunos universitários com alguma necessidade especial (LUZ et al., 2022).

Neste contexto, a Geografia, presente no currículo escolar, desempenha papel importante na formação de cidadãos conscientes e críticos frente às dinâmicas estabelecidas no espaço geográfico. Sendo a bacia hidrográfica um importante instrumento para pensar e problematizar diferentes ações de gestão e planejamento, sua impressão em três dimensões e sua proximidade com a realidade dos alunos potencializa o entendimento dessas possibilidades.

A Geografia escolar tem paulatinamente no passar das últimas décadas considerado como abordagem o espaço vivido dos estudantes, mais especificamente o cotidiano por eles vivenciado, pois a partir dele torna-se possível a leitura geográfica proporcionada por meio do entendimento espacial (QUEIROZ, 2020). Os estudantes são orientados a compreender seu entorno e a partir dele identificar os elementos geográficos presentes em sua comunidade, bairro ou cidade. Essa prática incentiva o sentimento de pertencimento, a valorização da identidade local e a percepção de que eles fazem parte de uma totalidade.

A presença de recursos como o apresentado em tela que retratam a realidade vivida dos alunos os aproxima do conteúdo e facilita o trabalho do professor em sala de aula. Nos anos iniciais do Ensino Fundamental é significativo o trabalho com o espaço vivido (CALLAI, 2005). Por exemplo, com o trabalho escalar abordando suas moradias, as ruas da localidade onde vivem, as características do seu município para depois de conhecer o seu "lugar" explorar o mundo (DAPPER, 2021), ou neste caso, uma bacia hidrográfica presente no município. Isso permite que os estudantes explorem e compreendam o mundo ao seu redor, a qual desperta o olhar espacial para a distribuição dos fenômenos e sua espacialização, além das diversas formas de apropriação do espaço pela sociedade (CALLAI, 2014).

Conforme Almeida e Passini (1991), a construção do conhecimento espacial é concebida a partir de três dimensões: “[...] do vivido ao percebido e deste ao concebido”. De acordo com as autoras, no "espaço vivido", a criança explora o ambiente físico através de movimentos e brincadeiras, adquirindo compreensão espacial. Através de exercícios rítmicos e psicomotores, o corpo é utilizado para conhecer o espaço. Na fase do "espaço percebido", a experiência física não é mais necessária, pois as crianças usam a memória para lembrar trajetos e identificar elementos paisagísticos. Isso ocorre nas Operações Concretas, permitindo que a criança distinga distâncias e localize objetos em fotografias. A "dimensão espacial concebida" surge por volta dos 11-12 anos, com as Operações Formais. As crianças podem estabelecer relações espaciais através de representações cartográficas, raciocinando sobre áreas sem tê-las visto previamente.

Salientamos que a ausência de conteúdos que retratem os aspectos locais e regionais (como a Geografia e a História local) para o ensino, por exemplo, ainda é uma problemática enfrentada pelos professores. Em alguns casos, o município ou escolas até adquirem recursos didáticos de editoras ou através de propagandas em redes sociais. Porém, tais materiais são generalistas ou tratam da realidade de onde foram produzidos e não do local onde serão utilizados. Dessa forma, o professor ainda precisará adequar ou elaborar o seu próprio material, adaptando para a realidade vivida. Tratando-se das novas tecnologias como a impressão 3D, a presença de materiais personalizados e conectados com o espaço vivido é ainda mais raro.

A integração de tecnologias no ambiente educacional tem alterado a forma como os alunos aprendem e como os professores ensinam. Diante disso, as universidades têm um papel importante para refletir sobre essas mudanças e propor algumas soluções. Conforme Barbosa et al. (2021) essas mudanças devem superar o modelo de práticas tradicionais para um processo dinâmico e flexível, incorporando as demandas e inovações do mundo contemporâneo na escola.

Salienta-se que as próximas etapas do desenvolvimento deste projeto referem-se à elaboração de uma sequência didática para cada item impresso, testando-os e validando nas escolas verificando quais serão suas contribuições para o ensino de Geografia. Santos e Andrade (2020) corroboram a ideia de que a utilização de recursos como a impressora 3D pode contribuir no ensino de diversos conteúdos do currículo escolar, seja na construção ou no manuseio de objetos impressos, ou na sua inserção nas aulas pelo professor como um recurso didático.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A incorporação das tecnologias nas escolas quando amparadas pedagogicamente podem dinamizar e beneficiar as práticas de ensino. O uso das tecnologias por si só não surtirá um resultado positivo, em função dos vários obstáculos mencionados neste trabalho, contudo, com o correto encaminhamento e intervenção intencional do professor acredita-se que é possível potencializar o ensino. Por isso, destaca-se a importância de pesquisas que busquem produzir soluções e testá-las para o ensino, com o propósito de auxiliar o professor e suas práticas em sala de aula.

Dentre os recursos comumente observados nos espaços Maker, a impressora 3D é destaque em função da sua versatilidade em aplicação para diferentes disciplinas e conteúdos. Essa tecnologia tem potencial para reproduzir objetos relacionados ao conteúdo, assim, o conceito que antes era explicado de forma abstrata torna-se visível e concreto na forma do objeto impresso.

No ensino de Geografia, a impressora 3D tem sido utilizada para representar a superfície terrestre, principalmente em conteúdos relacionados aos aspectos físicos. Neste trabalho evidenciou-se a elaboração de modelos de bacias hidrográficas considerando o espaço de vivência dos alunos e professores. Com a impressão 3D foi possível representar de maneira precisa a bacia hidrográfica, o que pode facilitar a explicação sobre conceitos como divisor de água, afluentes, rede de drenagem, vertente, foz, dentre outros. É fundamental a ampliação de estudos como esse, para disseminar e introduzir essa tecnologia em sala de aula amparada geograficamente e pedagogicamente.

Agradecimentos

Ao CNPq (Processo 313757/2021-6), a Fundação Araucária, SETI e Programa Universidade sem Fronteiras (Convênio 703/2022 e 111/2023) do Governo do Paraná. Ao FINEP – PROINFRA – 02/2014 – Convênio Ref. 150/16 (Convênio 01180080 00). O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001”

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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BARBOSA, F. D. D.; MARIANO, E. F.; SOUSA, J. M. Tecnologia e Educação: perspectivas e desafios para a ação docente. Conjecturas, v. 21, n. 2, p.38-60, abr./jun., 2021. Disponível:

BRASIL. Lei nº 14.533, de 11 de janeiro de 2023. Institui a Política Nacional de Educação Digital e altera as Leis nºs 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), 9.448, de 14 de março de 1997, 10.260, de 12 de julho de 2001, e 10.753, de 30 de outubro de 2003. Brasília, DF: Presidência da República, 2023. Disponível em:

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CAMPOS, F. R.; DIAS, R. A. Currículo de referência – Itinerário Formativo em Tecnologia e Computação. São Paulo: CIEB (Centro de Inovação para a Educação Brasileira), 2020. E-book em pdf.

DAPPER, Vanderson Rafael Muller. Os saberes e as práticas dos professores do ensino fundamental-anos iniciais sobre a alfabetização cartográfica para a implementação da bncc no território brasileiro. 2021. 174p. Dissertação (Mestrado acadêmico em Geografia) - Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Centro de Ciências Humanas, Programa de Pós-Graduação em Geografia, Marechal Cândido Rondon, 2021.

EVANGELISTA, F. L. Estudo das consequências da aplicação de impressoras 3D no ambiente escolar. Physicae Organum, v. 7, p.39-58, 2021. Disponível em:<https://periodicos.unb.br/index.php/physicae/article/view/35946>. Acesso em: 10 ago. 2023.

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Notas

1 www.degrafufpr.wix.com/lamp
2 https://www.eletrica.ufpr.br/p/noticias:delt_implanta_seu_laboratorio_de_prototipacao_o_fab_lab
3 http://www.exatas.ufpr.br/portal/degraf_andrea/extensao/
4 https://operobal.uel.br/saude/2022/05/09/hu-uel-inaugura-laboratorio-de-impressao-3d-para-inovacao-em-produtos-e-servicos/
5 O município de Toledo foi escolhido como piloto para a prototipação e elaboração de materiais didáticos com recursos tecnológicos para o ensino de Geografia local.


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