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Da teoria à prática: o uso de espectroradiometria para o ensino de sensoriamento remoto
From theory to practice: the use of spectroradiometry for the teaching of remote sensing
Revista Presença Geográfica, vol. 11, núm. 1, Esp., 2024
Fundação Universidade Federal de Rondônia

Revista Presença Geográfica
Fundação Universidade Federal de Rondônia, Brasil
ISSN-e: 2446-6646
Periodicidade: Frecuencia continua
vol. 11, núm. 1, Esp., 2024

Recepção: 13 Dezembro 2023

Aprovação: 26 Dezembro 2023

Resumo: Recursos tecnopedagógicos podem auxiliar no ensino de sensoriamento remoto (SR), cujo conceitos físicos podem ser de difícil compreensão no processo de aprendizagem. Pensando nisso, este trabalho tem por objetivo elaborar uma proposta de aula prática utilizando a espectroradiometria para o ensino de SR em nível superior, como produto de um estágio docência. Com a disponibilidade de um espectrorradiômetro como recurso tecnológico na instituição, foram coletados dados não-imageadores acerca do comportamento espectral de diferentes alvos da superfície terrestre (vegetação, solo, água e materiais diversos). Os discentes foram estimulados a caracterizar os equipamentos, fazendo relação com o conteúdo teórico ministrado durante as aulas. Após a coleta dos dados, os mesmos elaboraram um relatório sobre a análise da assinatura espectral dos alvos. Durante a prática foi possível sanar dúvidas e motivar o interesse dos discentes sobre o tema de SR, além de promover a experiência e contato com recursos tecnológicos empregados na coleta de dados. Os relatórios produzidos evidenciaram a efetividade da atividade prática para compreensão de diversos conceitos, como fonte da radiação eletromagnética e tipo de sensor (passivo ou ativo), assim como a resposta dos alvos na região do visível. Entretanto, algumas deficiências ainda encontradas e se relacionaram, sobretudo, à interpretação da resposta espectral na região do infravermelho (próximo, ondas curtas e longas), assim como no processo de diferenciar um sensor imageador e não-imageador. Os resultados alcançados possibilitam um aprimoramento da didática apresentada para maior efetividade no ensino de SR.

Palavras-chave: Comportamento espectral, Ensino superior, Espectrorradiômetro, Roteiro didático.

Abstract: Technopedagogical resources can assist in teaching remote sensing, whose concepts related to Physics may be difficult to understand in the learning process. This work aims to develop a proposal for practical classes using a spectroradiometer for teaching RS at graduation courses, as a product of a teaching internship. With the availability of a spectroradiometer as a technological resource at the institution, non-imaging data were collected on the spectral behavior of different targets on the Earth's surface (vegetation, soil, water, and various materials). The actors involved were encouraged to characterize the equipment, making a relationship with the theoretical content taught during the classes and, after collecting the data, they prepared a report to analyze the spectral signature of the analyzed targets. During the practice, it was possible to solve any questions and motivate the interest of the actors on the subject of SR, in addition to promoting experience and contact with technological resources used in data collection. The reports produced showed that the practical activity was effective in understanding concepts such as the source of electromagnetic radiation and the type of sensor (passive or active), as well as the response of targets in the visible region. Some of the gaps still found were related to the interpretation of the spectral response in the infrared region (near, short and long waves), and also in the process of differentiating imaging from non-imaging products. The results produced make it possible to improve the presented didactics presented for greater effectiveness in transferring SR content.

Keywords: Spectral analyses, Undergraduate education, Spectroradiometer, Didatic routine.

INTRODUÇÃO

O avanço tecnológico tem propiciado novas práticas de ensino e aprendizagem e deve ser compreendido como ferramenta para estimular o interesse (NÚÑEZ et al., 2020) e a criatividade dos discentes que estão ingressando na graduação. Neste contexto, unir a teoria e a prática com auxílio de abordagens tecnopedagógicas se torna uma alternativa interessante para o ensino de SR dm nível de ensino superior.

Entre as dificuldades para compreensão do SR, os conceitos de Física relacionados à energia eletromagnética (REM), seu caráter dual (onda-partícula) e a resposta registrada pelo sensor após a REM interagir com alvos na superfície terrestre são, muitas vezes, de complexa compreensão no processo de aprendizagem (SANTOS et al., 2022). Dessa forma, recursos tecnológicos podem atuar como facilitadores para concepção de novos conceitos pelos atores envolvidos no processo educacional (KLEIN et al., 2020; SANTOS et al., 2022).

Unir teoria e prática estimula o interesse, o compartilhamento de experiências e a interação com diferentes contextos, além da motivação, aspectos fundamentais para a aprendizagem (SANTOS, 2008). Assim, uma vez que a instituição disponha de infraestrutura e recursos tecnológicos adequados (p. ex.: Veículos Aéreos Não Tripulados – VANT; sensores multiespectrais e hiperespectrais), esses devem ser utilizados no ensino de SR (KLEIN et al., 2020).

Estruturar e disponibilizar modelos para replicação dessas atividades é uma maneira de encorajar os docentes a utilizarem os equipamentos e recursos disponíveis (KHOLOSHYN et al., 2019). Neste sentido, este trabalho teve como objetivo desenvolver uma atividade prática para apresentar conceitos e princípios de SR, unindo conteúdo teórico expositivo e uma atividade em campo com o uso de um espectrorradiômetro.

Como resultado de um estágio docência realizado na disciplina de Princípios de Geotecnologias no curso de bacharelado em Gestão e Análise Ambiental, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), um roteiro didático descritivo foi elaborado e aqui disponibilizado para replicação da atividade de coleta e análise do comportamento espectral de diferentes alvos da superfície.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O estágio docência foi realizado ao longo de um semestre na disciplina de Princípios de Geotecnologias e consistiu no acompanhamento das aulas ministradas pelo docente responsável e auxílio em atividades práticas. O termo SR consiste na técnica de adquirir informações acerca de alvos na superfície terrestre, sem que haja contato físico entre alvo e sensor (JENSEN, 2009), sendo um dos eixos da disciplina em questão. A partir disso, a principal atividade realizada no estágio foi a elaboração de uma aula teórica e uma prática sobre SR, executadas com base nas abordagens de ensino: I) Teórica expositiva; e II) Prática tecnopedagógica.

As aulas tiveram duração de 4h cada e foram realizadas em duas semanas. Na primeira aula foi adotada a abordagem I, na qual foram explorados os conceitos e princípios físicos acerca do SR, contemplando: breve histórico e contextualização, REM e suas propriedades e características, espectro eletromagnético, grandezas radiométricas e aspectos gerais sobre plataformas e sensores (resoluções, regiões do espectro eletromagnético em que operam, nível de coleta, produto gerado e interação da REM com alvos na superfície terrestre).

A segunda aula foi fundamentada na abordagem II e dedicada à prática de espectroradiometria para a coleta de espectros de reflectância (R) ou assinatura espectral dos alvos vegetação, solo, água e materiais, com o auxílio de um espectrorradiômetro portátil ASD Fiel-Spec 4 Hi-Res (ESCOBAR-SILVA; HADDAD; BOURSCHEIDT, 2019). Também foram utilizados: uma placa lambertiana ideal Spectralon (Labsphere, Inc., North Sutton, NH), um tripé de suporte ao sensor, placas de petri para alocar os alvos a serem medidos e as respectivas amostras, dispostos sobre uma mesa que auxiliou na montagem dos equipamentos. A prática foi realizada em um ambiente externo.

Os discentes foram divididos em grupos de acordo com os alvos a serem analisados e, posteriormente à coleta, eles realizaram a análise e produziram um relatório. Para o relatório, foi solicitado que os docentes caracterizassem todos os equipamentos utilizados e a relação com os conceitos apresentados na aula teórica. Ademais, a análise sobre o comportamento da R dos alvos em diferentes regiões do espectroeletromagnético, feições de absorção da REM e a construção de gráficos com as curvas espectrais foram requisitados nestes relatórios.

Todos os procedimentos adotados estão descritos em um documento disponível para consulta e replicação da prática executada (Roteiro atividade prática SR). O material elaborado consiste em um roteiro didático para aplicação da atividade e exploração dos conceitos e princípios de SR. Para fundamentar o conteúdo apresentado foram utilizados os livros: “Sensoriamento Remoto da Vegetação” (PONZONI; SHIMABUKURO; KUPLICH, 2012), “Reflectância dos materiais terrestres: análise e interpretação” (MENESES; ALMEIDA; BAPTISTA, 2019) e “Sensoriamento Remoto do Ambiente: uma perspectiva em recursos terrestres” (JENSEN, 2009).

Participaram da aula prática cerca de 30 discentes, e no dia da coleta as condições climáticas eram de céu limpo, sem a presença de nuvens, ensolarado e a atividade ocorreu entre 14h30min e 16h30min. Para evitar intercorrências nos dados, é recomendada a coleta entre 11h e 13h, quando o Sol se encontra mais a pino e as medidas sofrem menos interferência do ângulo de incidência da iluminação. Para essa atividade, o posicionamento do Sol não foi considerado por não afetar substancialmente as coletas para os fins didáticos apresentados e não ser alvo de estudo. Com isso, os discentes foram divididos em seis grupos compostos por aproximadamente cinco integrantes, que ficaram responsáveis por analisar os dados referentes aos alvos descritos na Quadro 1. A atividade foi sistematizada em duas etapas descritas nos tópicos a seguir.

QUADRO 1
Alvos analisados por cada grupo com seus respectivos objetivos e fotos para ilustrar

Fonte: Os autores (2023)

Fonte de REM

O primeiro tema abordado foi acerca da fonte de REM, tendo o Sol como fonte. Nesse contexto foi realizada a descrição do sensor como passivo, uma vez que a fonte de REM foi o Sol, e os discentes foram estimulados a responder sobre essa questão e diferenciar sensor ativo e passivo. Sobre esse tema, os membros dos grupos demonstraram confusão na aula teórica, porém, ao observar na prática, eles apontaram maior clareza em relação à fonte de REM. Alguns grupos fizeram perguntas sobre como seria o resultado do experimento se a fonte fosse artificial (p.ex.: lâmpada halógena), propiciando abertura para um diálogo mais ativo entre os atores envolvidos.

Plataforma e nível de coleta dos dados

Como forma de conduzir e estimular a participação, foi perguntado aos integrantes de cada grupo qual instrumento atuava como plataforma e qual o nível de coleta. Neste caso, um tripé foi utilizado como plataforma para suportar o sensor e o nível de coleta foi o de campo/terrestre. Para fins de comparação, dois veículos aéreos não tripulados (VANTs) foram apresentados junto aos sensores que podem ser acoplados nessas plataformas aéreas.

Neste momento, os discentes manifestaram um grande interesse pelas plataformas aéreas, que se revelaram como uma excelente alternativa para a integração e fixação do conhecimento sobre os níveis de coletas e plataforma/sensor utilizados. Uma possibilidade seria obter imagens áreas ou orbitais de sensores multiespectrais dos locais onde foram realizadas as coletas dos alvos (solo exposto, vegetação, vegetação em floração e corpos d’água) e, posteriormente, comparar os resultados obtidos pelos diferentes sensores e plataformas.

Resolução espectral do sensor e faixa em que opera

O espectrorradiômetro ASD Fiel-Spec compreende um sensor hiperespectral. Assim, foi apresentado aos discentes as informações de que o sensor realiza medidas de 350 nm a 2500 nm do espectroeletomagnético, no intervalo de 1,4 nm e totaliza 2151 canais espectrais coletados. Diante disso, os membros dos grupos tinham que classificar o sensor como hiperespectral ou multiespectral, e justificar a resposta, sendo estimulados a indicar as faixas espectrais em que o sensor atua (visível, infravermelho próximo, médio, de ondas curtas e longas).

Produto gerado

Diferente dos sensores imageadores, o ASD Fiel-Spec realiza a coleta de dados pontuais, não gerando imagens (sensor não-imageador). Assim, os dados coletados possibilitaram o cálculo da Refectância (R) e a representação gráfica no momento da coleta, a qual foi observada em um monitor. Posteriormente, os dados foram organizados em tabelas e disponibilizados para exploração pelos discentes.

Comportamento espectral de alvos

Após a caracterização da plataforma e sensor, foi iniciada a coleta dos espectros de R por alvo/grupo. Para a coleta de cada alvo foi realizada a calibração do sensor a partir da placa lambertiana, com aproximadamente 100% de R. Nesse momento, o gráfico demonstrava R igual 1, com faixas ruidosas entre 1350–1450nm, 1800–1950nm e > 2350nm.

Nessa etapa foi discutido junto aos grupos o tema de janelas atmosféricas e a interação dos elementos da atmosfera com a REM. Nas regiões onde foram observados os ruídos, o vapor d’água (H2O) é o elemento que provoca maior atenuação da REM (MENESES; ALMEIDA; BAPTISTA, 2019). Nesse momento os discentes levantaram diversas possibilidades para explicar os ruídos, demonstrando criatividade e interesse sobre o tema. Para posterior análise pelos grupos, os dados obtidos nessas faixas espectrais foram descartados.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Análise de cada alvo

Alvo vegetação: fenologia

As mudanças na estrutura física, química e biológica da vegetação ao longo dos estádios fenológicos gera uma elevada diversidade de informações que podem ser obtidas pelo SR. Nesse sentido, o objetivo da análise desse alvo foi apresentar aos discentes as mudanças na resposta espectral das folhas de uma mesma espécie ao longo do processo de “envelhecimento”, que revelam a degradação de pigmentos fotossintetizantes, a degradação da estrutura celular e redução da umidade até a senescência.

A Figura 1 apresenta os espectros de R obtidos na aula, nos quais é possível observar os comprimentos de onda em que a REM é reflete ou absorvida nas diferentes regiões do espectroeletromagnético. Na região do visível (VIS), entre 350 nm e 750 nm, destaca-se a feição de absorção (“vales” onde a R reduz) na região do vermelho (~700 nm), associada à presença de pigmentos fotossintetizantes, e as regiões espectrais associadas à coloração das folhas (folha amarela em ~580 nm e folha verde em ~550 nm). A folha de coloração marrom, em processo avançado de senescência, já não apresentava mais feições de absorção na região do VIS, demonstrando a ausência de pigmentos fotossintetizantes (PONZONI; SHIMABUKURO; KUPLICH, 2012; MENESES; ALMEIDA; BAPTISTA, 2019).


FIGURA 1
Espectro de reflectância da folha em diferentes estádios fenológicos (verde, amarela e marrom)
Fonte: Os autores (2023)

Sobre a região do infravermelho-próximo (IVP), entre 750 nm e 1350 nm, foram feitas associações sobre a estrutura celular da folha, uma vez que com o avanço dos estádios fenológicos a estrutura é degradada e o teor de ar e umidade são perdidos, refletidos no aumento da R. Ademais, na região do infravermelho de ondas curtas (IVC, ~1450nm a ~1800nm) e infravermelho de ondas longas (IVL, ~2000nm a ~2300nm), ficou evidente a perda de água líquida nas folhas. Em aproximadamente 2150 nm, a folha marrom revelou uma feição pronunciada de absorção da celulose, sendo um dos últimos componentes a serem degradados nas folhas (PONZONI; SHIMABUKURO; KUPLICH, 2012; MENESES; ALMEIDA; BAPTISTA, 2019).

Todas as informações descritas anteriormente foram discutidas ao longo da coleta da assinatura espectral das folhas e exemplos de aplicações foram dados, como o uso dessas informações na agricultura e monitoramento da vegetação. Os dados coletados para esse alvo podem ser utilizados em cálculos de índices de vegetação (HADDAD et al., 2020), possibilitando novas abordagens de ensino.

Alvo vegetação: flores

O segundo alvo, dentro do tema vegetação, foram as flores com diferentes colorações. A partir das feições de R na região do VIS (Figura 2), foi possível diferenciar a tonalidade das flores utilizados. Os discentes puderam observar a flor roxa com um pico de R em ~450 nm e a feição de absorção no vermelho (~700 nm) referente à presença de pigmentos fotossintetizantes. A flor amarela revelou sua cor em ~600nm e apresentou absorção no vermelho. A flor vermelha, eleva sua R a partir de 650nm, em que se inicia o final do espectro do VIS, e se associa à cor vermelha. As demais regiões espectrais não estão associadas à coloração aparente à visão humana (amarela, vermelha e roxa), mas possivelmente à perda de água pelas flores, uma que a roxa perdeu maior conteúdo de umidade entre o período de coleta e obtenção das medidas.


FIGURA 2
Espectro de reflectância das flores com colorações distintas (amarela, vermelha e roxa)
Fonte: Os autores (2023)

Com o comportamento da R das flores na região do VIS, foi possível discutir sobre essa região do espectro eletromagnético e sua relação com as cores. Assim, os discentes puderam fazer associações e compreender melhor que o alvo detinha determinada composição que estava refletindo o comprimento de onda relacionado à cor que se estava enxergando, enquanto absorvia a maior parte da REM nos demais comprimentos de onda do VIS.

Alvo vegetação: espécies

Ao analisar a R das diferentes espécies de folhas (Figura 3), verificou-se diferenças associadas principalmente à intensidade do verde da folha. As espécies cuja folha possuía coloração de verde mais escuro (espécies 2 e 4) apresentou R menor nas regiões do VIS e IVP, enquanto aquelas com coloração mais clara, a R foi maior (espécie 1 e 3). As feições de absorção foram mais frequentes no IVP caracterizando uma assinatura espectral específica da vegetação, sendo a intensidade da R outro elemento que diferenciou as espécies. Cabe ressaltar que a resposta espectral das espécies sofreu influência do fundo e, para a replicação do procedimento, deve-se assegurar maior cobertura do campo de visão do sensor pelas amostras.

A coloração verde mais escura ou mais clara tem relação com o conteúdo de pigmentos fotossintetizantes e adaptações das espécies. Neste caso não houve a determinação das espécies; apenas assumiu-se que elas eram diferentes, mas ao identificar os nomes seria possível fazer interpretações mais específicas sobre o comportamento espectral das folhas.


FIGURA 3
Espectro de reflectância de folhas de diferentes espécies e tonalidade de verde
Fonte: Os autores (2023)

Alvo água

A água limpa foi o alvo que apresentou maiores dificuldades para obtenção das medidas. A R deste alvo é baixa, pois a REM possui uma maior transmitância na água. Por isso, a presença de elementos opticamente ativos é necessária para alcançar algumas respostas e, nesse caso, foram “simuladas” amostras contendo sólidos suspensos (diluição de solo argiloso em água), fitoplâncton (extrato de couve em água), além da água coletada em um lago presente na instituição e da água limpa.

Devido a essas dificuldades as medidas obtidas não foram eficientes para caracterizar o comportamento espectral do alvo e para replicação dessa prática, a recomendação é o uso de um volume de água de maior porte, simulando uma coluna d’água maior, para evitar interferência do material de fundo. Com isso, esperamos que seja possível obter curvas de R mais características dos alvos estudados. Esta questão foi discutida com o grupo responsável pela água e propiciou um maior interesse em compreender os processos envolvidos.

Alvo solo

Sobre o alvo solo, o objetivo foi observar a influência de características como umidade, teor de matéria orgânica, granulometria e a presença de óxido de ferro na resposta da R. Para isso, amostras de areia fina e solo argiloso (marrom) foram utilizadas e, neste caso, a diferença na R entre ambos os solos secos foi em resposta à granulometria, pois as feições de absorção características em ~1400 nm e ~1900 nm não puderam ser analisadas devido à remoção das faixas com ruídos (Figura 4).

Quando os solos foram umedecidos, a R se reduziu e sutis feições de absorção que se relacionam com a presença de água em 760 nm, 970 nm e 1190 nm (IVP), foram observadas (MENESES; ALMEIDA; BAPTISTA, 2019). Para replicação dessa prática, recomenda-se a obtenção das medidas em ambiente controlado (fonte de REM luz halógena artificial) para uma melhor caracterização das assinaturas espectrais dos alvos. Além disso, explorar uma maior diversidade de tipos de solos (p. ex.: arenosos, argilosos e orgânicos) trará maior riqueza de informações ao longo de diferentes regiões do espectro eletromagnético.


FIGURA 4
Espectro de reflectância dos solos com coloração, granulometria e umidade distintos
Fonte: Os autores (2023)

Alvo materiais

A análise sobre a resposta espectral dos materiais (Figura 5) utilizados em construções humanas e outros fins foi realizada para mostrar que é possível diferenciá-los por SR. No geral, o comportamento dos alvos no VIS foi similar, onde apenas a telha de argila apresentou uma ascensão abrupta da R em 550 nm. Na região do IVP duas feições de absorção foram observadas (950-750 nm) no concreto, sendo que a R deste alvo se manteve similar à brita.

Ainda no IVP, o papelão apresentou diferenças na R com feições de absorção mais acentuadas. Feições similares entre a pedra branca e o concreto foram observadas, no entanto a R da pedra branca foi maior. No IVC e IVL, a telha apresentou a maior R, seguido do papelão com uma feição de absorção em ~2100 nm, seguido da pedra branca, concreto e brita.


FIGURA 5
Espectro de reflectância de diferentes materiais de uso humano
Fonte: Os autores (2023)

Análise dos relatórios

A análise dos relatórios possibilitou verificar potencialidades e deficiências acerca do conteúdo trabalhado durante a atividade prática. No tópico de caracterização da plataforma e sensor, os grupos demonstraram compreensão sobre a fonte de REM ser o Sol e, com isso, o sensor utilizado foi caracterizado como passivo, reforçando a compreensão sobre essa temática observada durante a aula prática. Em relação ao produto gerado pelo sensor, nem todos os grupos souberam discernir que se tratava de um dado pontual (não-imagem), indicando uma lacuna a ser explorada a partir da comparação entre sensores imageadores e não imageadores.

Outro fator de confusão observado foi sobre o sensor ser considerado a plataforma por alguns grupos. Esse tema pode ser mais bem explorado com auxílio de outras tecnologias como os VANTs, para maior esclarecimento sobre a condição de a plataforma ser o equipamento que suporta o sensor. Além disso, plataformas aéreas se tornam mais atrativas e podem captar maior interesse por parte dos atores envolvidos.

A resolução espectral do sensor também foi um tema de deficiência verificado. Os grupos fizeram a caracterização do mesmo em termos da abrangência de leitura ao longo do espectro eletromagnético e as respectivas regiões, porém não definiram o sensor como sendo hiperespectral. Na Figura 6, a seguir, podem ser observados alguns registros feitos pelos discentes durante a realização da prática de radiometria.


FIGURA 6
Registro da atividade prática: A) Caracterização dos equipamentos utilizados; B) Coleta do espectro de reflectância do alvo água com fitoplâncton e C) água com sólidos dissolvidos
Fonte: Discentes da turma de Princípios de Geotecnologias (2023)

Em posse dos dados coletados, os alunos foram estimulados a analisar a R dos alvos na região do VIS, IVP, IVC e IVL, assim como relacionar esses valores com as características dos alvos analisados. As discussões apresentadas pelos grupos revelaram uma maior compreensão acerca do comportamento dos alvos na região do VIS, enquanto para as demais regiões foram verificadas dificuldades em compreender a resposta da R.

Os grupos relacionados a vegetação destacaram a presença dos pigmentos fotossintéticos e fizeram associações com a tonalidade das folhas e flores no VIS, entretanto, tiveram dificuldade em descrever o comportamento da R no IVP. O grupo de solos ressaltou as diferenças relacionadas à tonalidade e teor de umidade ao longo de todo o espectro. O grupo que analisou a água trouxe o conceito de elementos opticamente ativos presentes ou não na água, em resposta às curvas de R. O grupo responsável por materiais apresentou uma análise voltada a absorção, compreendendo que a tonalidade e propriedade dos materiais mais escuros atuaram na maior absorção da REM ao longo de todo o espectro eletromagnético e, consequentemente, refletem menos, ao passo que os materiais mais claros refletiram mais.

Diante dos resultados apresentados nos relatórios, foi verificado que houve a compreensão por parte dos discentes sobre a resposta dos elementos da superfície terrestre quando interagem com a REM. Dessa forma, ao longo dos próximos semestres diferentes disciplinas que utilizem SR poderão explorar atividades associados às respostas dos alvos como classificação e índices espectrais, entre outros.

Todos os grupos exploraram a apresentação dos espectros de R através de gráficos (Figura 7). Alguns buscaram ressaltar informações como feições de absorção e picos de R. Outros fizeram gráficos individuais (Figura 7 – A e B) e unificando as informações (Figura 7 – C) com diferentes cores para associar aos alvos analisados. Cabe ressaltar que poucos foram os grupos que discutiram a ausência de dados em regiões que sofreram interferência da atmosfera, fazendo com que os dados apresentassem ruídos, tendo sido eliminados da análise.


FIGURA 7
Exemplos de gráficos elaborados pelos discentes para discussão dos espectros de reflectância das espécies (A e B) e solos (C)
Fonte: Discentes da turma de Princípios de Geotecnologias (2023)

Como se trata de uma turma do primeiro ano do curso de graduação, os discentes tiveram a oportunidade de explorar elementos textuais e não textuais para trabalhar as informações adquiridas. Diversas dificuldades puderam ser observadas como a inadequada configuração dos gráficos, muitos sem título e com valores incorretos nos eixos, ausência de numeração das figuras, tabelas e gráficos, padronização e concordância textual. A partir desses resultados, foi estruturado um documento de resposta aos discentes sobre estas e outras dificuldades apresentadas para que os mesmos erros não sejam repetidos em atividades futuras.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diferentes abordagens tecnopedagógicas de ensino do SR podem ser encontradas na internet. No entanto, a maioria é direcionada à análise de imagens obtidas por sensores remotos em órbita (satélites). Este trabalho buscou viabilizar a manipulação de dados pontuais (não imageadores) e a interação da REM com alvos comuns na superfície terrestre, como forma de estimular o interesse e o entendimento dos conceitos de SR. A aula prática possibilitou maior contato com os conceitos apresentados na teoria e mostrou-se uma abordagem facilitadora na aprendizagem de SR. Os relatórios apresentados pelos discentes revelaram aspectos que devem ser aprimorados na atividade para uma maior efetividade da mesma, como a resposta da R nas regiões do infravermelho e a distinção entre plataforma e sensor.

Como se trata de um curso multidisciplinar, o desenvolvimento da atividade sobre diferentes alvos da superfície (vegetação, solo, água e materiais) possibilitou a integração com outras disciplinas do curso. Ademais, o produto gerado como roteiro para replicação da prática, permite adaptações e aperfeiçoamento para diferentes contextos. Os dados coletados também poderão ser utilizados em outras disciplinas para aprofundar o conhecimento sobre o SR e as suas aplicações práticas.

Agradecimentos

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP, nº: 16581-1/22 e nº: 11435-4/21). Ao docente Dr. Vandoir Bourscheidt e a todos os discentes da turma de Princípios de Geotecnologias do ano de 2023 do curso de Gestão e Análise Ambiental da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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