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Experiência e valor percebido pelos seguidores de marcas de moda no Instagram¹
Experience and value perceived by the fashion brand followers in the Instagram
Experiencia y valor percibidos por seguidores de marca de moda en instagram
Revista de Ensino em Artes, Moda e Design, vol. 5, núm. 3, Esp., pp. 246-266, 2021
Universidade do Estado de Santa Catarina

Artigos

Revista de Ensino em Artes, Moda e Design
Universidade do Estado de Santa Catarina, Brasil
ISSN: 2594-4630
Periodicidade: Bimestral
vol. 5, núm. 3, Esp., 2021

Recepção: 24 Março 2021

Aprovação: 02 Agosto 2021

Autores mantém os direitos autorais e concedem à revista o direito de primeira publicação, com o trabalho simultaneamente licenciado sob a Licença Creative Commons Attribution 4.0 Internacional, que permite o compartilhamento do trabalho com reconhecimento da autoria e publicação inicial nesta revista.

Este trabalho está sob uma Licença Internacional Creative Commons Atribuição 4.0.

Resumo: Este estudo tem como objetivo investigar a natureza da experiência dos seguidores de marcas de moda no Instagram. Para isso, empreendeu-se um levantamento bibliográfico sobre o Instagram, consumo e valor do consumidor. Optou-se por uma abordagem qualitiva, cujo método fora entrevistas em profundidade com 21 sujeitos. Fundamentada pela axiologia de Holbrook (1999), a investigação constatou que o valor percebido pelos seguidores de marcas de moda nessa rede social on-line é multidimensional, auto-orientado, hedônico, utilitário e pode ser discricionado em oito tipos: epistêmico, eficiência, excelência, estima, status, entretenimento, estética e ética. Observou-se que os tipos de valor sempre aparecem inter-relacionados e são muito relevantes para a percepção positiva das marcas pelos seus seguidores.

Palavras-chave: Instagram, Valor Percebido, Consumo de Moda.

Abstract: This study aims to investigate the nature of the experience of followers of fashion brands on Instagram. To this end, a bibliographic survey was carried out on Instagram, consumption, and value for the consumer. We opted for a qualitative approach, whose method was in-depth interviews with 21 subjects. Based on Holbrook’s axiology (1999), the investigation found that the value perceived by the followers of fashion brands in this online social network is multidimensional, self-directed, hedonic, utilitarian and can be discretized into eight types: epistemic, efficiency, excellence, esteem, status, entertainment, aesthetics, and ethics. It was observed that the types of value always appear interrelated and are very relevant to the positive perception of brands by their followers.

Keywords: Instagram, Perceived Value, Fashion Consumption.

Resumen: Este estudio tiene como objetivo investigar la naturaleza de la experiencia de los seguidores de las marcas de moda en Instagram. Para ello, se realizó una encuesta bibliográfica sobre Instagram, consumo y valor del consumidor. Optamos por un enfoque cualitativo, cuyo método había sido entrevistas en profundidad a 21 sujetos. A partir de la axiología de Holbrook (1999), la investigación encontró que el valor percibido por los seguidores de las marcas de moda en esta red social online es multidimensional, autodirigido, hedónico, utilitario y puede discretizarse en ocho tipos: epistémico, eficiencia, excelencia, estima, estatus, entretenimiento, estética y ética. Se observó que los tipos de valor siempre aparecen interrelacionados y son muy relevantes para la percepción positiva de las marcas por parte de sus seguidores.

Palabras clave: Instagram, Valor Percebido, Consumo de Moda.

1 INTRODUÇÃO

Diariamente, milhões de pessoas no mundo se conectam por meio dos sites das popularmente chamadas redes sociais. Dentre essas, uma das que mais se destaca é o Instagram (SHELDON; BRYANT, 2015). Por ser um aplicativo gratuito, fácil de utilizar e oferecer variados recursos estéticos (filtros de luz para as imagens, recursos de vídeo, mensagens animadas, caracteres especiais, figurinhas etc.), rapidamente se tornou uma ferramenta estratégica no marketing das empresas de moda, atuando como uma vitrine para mostrar moda e estilo (PHUA; JIM; KIM, 2017). Para os autores, o aplicativo atrai as marcas por facilitar a comunicação do universo simbólico da marca e as experiências que seus produtos podem proporcionar de uma maneira muito atrativa para os usuários (PHUA; JIM; KIM, 2017).

No entanto, capturar a atenção do público tem sido desafiador para as marcas. Segundo Castro (2012), devido à concorrência, ao contexto cada vez mais saturado de mensagens publicitárias e à rapidez do fluxo de imagens, a mensagem precisa exercer um forte fascínio sobre o usuário no momento do contato. Além disso, no ambiente digital, ainda mais nas redes sociais, as informações que circulam sobre uma determinada marca não ficam exclusivamente sob seu controle, o que as torna mais vulneráveis a possíveis ruídos de comunicação (CASTRO, 2012).

Essa instabilidade exige ainda mais atenção em se tratando de marcas que oferecem produtos de moda cujo consumo se caracteriza por ser extremamente simbólico e emocional, pois são bens que são carregados de sentidos e funções subjetivas (MIRANDA, 2017). Dessa forma, pressume-se que marcas de moda que se comunicam por meio de estratégias tradicionais ou que se baseiam em atributos funcionais do produto tenham menores chances de manter o interesse dos seguidores nesse ambiente. Supõe-se também que, diante desse contexto competitivo, é de extrema importância que as marcas de moda tenham ciência de como são percebidas pelos seus seguidores e o que eles valorizam nesse relacionamento.

Diante dessa problemática, este trabalho se propôs a investigar qual é a natureza do valor percebido pelo seguidor de marcas de moda no Instagram. Sendo o presente estudo um recorte de uma dissertação de mestrado, seu objetivo é apresentar parte do levantamento bibliográfico que aborda os aspectos simbólicos do consumo e a percepção de valor na perspectiva do comportamento do consumidor, com enfase ao trabalho de Holbrook (1999). Apresenta-se também parte dos resultados da pesquisa empírica de abordagem qualitativa cujo método foram entrevistas em profundidade com 21 respondentes.

Constatou-se que o valor percebido na experiência com as marcas de moda pelo Instagram é multidimensional, simultaneamente utilitário e hedônico. E que, além dos sete tipos de valor propostos por Holbrook (1999), também emerge dessas interações um tipo de valor associado ao aprendizado, categorizado como valor epistêmico por Sheth et al. (2001).

A estruturação do presente trabalho parte da Introdução, que apresenta o tema, contextualiza e problematiza a presença das marcas de moda no Instagram. Em seguida, o referencial teórico descreve o lócus do estudo, seus recursos de integração e características. Na sequência discorre-se sobre o consumo simbólico, sobre o valor percebido nas experiências de consumo e a teoria de valor percebido de Holbrook(1999) cujo modelo fundamenta a pesquisa empírica. A terceira seção trata da explicação da metodologia utilizada, seguida da discussão dos resultados; conclui-se o estudo com as considerações finais.

2 INSTAGRAM, UM AMBIENTE FAVORÁVEL ÀS MARCAS

O Instagram foi criado em 2010 como aplicativo para celulares (app) com a proposta de compartilhamento instantâneo de fotos e vídeos. Reside aí sua principal diferença para outras redes; no Instagram, a imagem é a base da interação entre os usuários (ELMAN, 2016). Segundo a autora, o aplicativo estimula a criatividade e a produção própria de conteúdo, oferecendo inúmeras possibilidades de experiências estéticas. Para Hinerasky (2014), o modo com que vem se desenvolvendo tecnicamente tem favorecido o encontro de pessoas com os mesmos gostos e motivações, gerando novos agrupamentos, linguagens, formas de se comunicar, de se associar, de ganhar visibilidade, reputação, novas competências e até profissões.

De acordo com Recuero et al. (2012), esse ambiente de compartilhamento e participação favoreceu que os usuários começassem de forma muito natural a trocar informações sobre as marcas, seus serviços e produtos. Os autores complementam que essas trocas ocorrem tanto nos perfis pessoais dos usuários e em grupos de fãs e admiradores das marcas como nos perfis das próprias marcas, por onde os usuários (seguidores ou não) podem acompanhar as suas propostas, atualizações e novidades. Recuero et al. (2012) ainda apontam que esse trânsito espontâneo de informações acabou beneficiando muito as marcas, pois viram no Instagram a possibilidade de publicizar seus produtos e serviços sem grandes custos. O que abriu um leque de possibilidades para alcançarem novos públicos, estreitarem laços com os seguidores, fortalecerem sua imagem, criarem valor e venderem (NEPOMUCENO, 2019).

Contudo, nem sempre os usuários que visitam ou seguem uma empresa no app são consumidores, fãs ou seguidores leais da marca. Reilling (2016) distingue dois tipos de seguidores: usuários que têm como único interesse as informações que os fãs compartilham sobre os produtos (para realizar tarefas práticas como pesquisar promoções, ofertas, sorteios e tomar melhores decisões de compra) e os motivados, que tanto se filiam por amor à marca quanto para se conectarem com outros fãs e obterem aprovação social (estes são mais predispostos a interagir e fazer recomendações favoráveis). Casaló et al. (2017) ressaltam que seguir marcas no Instagram é uma forma de passar o tempo, relaxar e até mesmo de escapar do tédio; portanto, é uma forma de entretenimento para os usuários da rede.

Nesse sentido, é muito provável que as marcas que se comunicam por meio de estratégias tradicionais baseadas em ressaltar os atributos funcionais dos produtos numa rede com essas características tenham menores chances de engajar e manter satisfatoriamente o interesse dos seguidores. Sendo assim, faz-se muito necessário compreender o que é relevante para ele nessa interação, o que ele valoriza nas experiências com a marca.

Partindo da ideia de que o valor é resultado do consumo e que ele é um processo, e não ato, pois não se reduz ao momento de compra (PEREZ, 2020), entende-se que seja fundamental a compreensão da dimensão simbólica do consumo. A seção a seguir discorre sobre consumo simbólico e emocional.

2.1 DE COISAS A SIGNOS: UMA BREVE VISÃO SOBRE O CONSUMO SIMBÓLICO

Embora o aspecto material dos produtos de moda tenha um papel relevante de satisfação das necessidades funcionais na vida das pessoas, eles fazem parte de uma das categorias de produtos mais eloquentes em termos de comunicação. São mídias expressivas e altamente visuais que atuam como mediadoras da subjetivação dos indivíduos (MIRANDA, 2017). Eles comunicam valores identitários, de grupos, do design, da tecnologia, enfim, de toda uma cultura, já que “[...] seus produtos são bens culturais de valor” (GODART, 2010, p. 16).

Miranda (2017) explica que o produto de moda, mais especificamente a roupa, mantém uma relação direta com o corpo e com as experiências do cotidiano; então, seu valor também está sujeito ao seu significado social, pois ele só adquire valor simbólico quando seu significado é compartilhado culturalmente, quando pode ser interpretado e possui uma capacidade de integrar o indivíduo ao meio social. Ou seja, o consumo dos produtos vai além da relação do consumidor com o próprio produto, envolve o consumo da imagem social que está associada a ele.

Segundo McCraken (2007), os objetos têm uma função performativa no meio social porque eles materializam os significados culturais. Douglas e Isherwood (2009, p.36) apontam que “os bens são neutros, seus usos são sociais, podem ser usados como cerca ou como pontes”. Ou seja, dentro de um determinado contexto cada objeto possui seu significado, e a compreensão e articulação desses significados posicionam as pessoas nesse contexto. Para os autores, os indivíduos usam os bens para fins simbólicos de diferenciação, pertencimento, status, gratificação pessoal etc.

Campbell (2001) defende que o consumo contemporâneo não tem nada de superficial e materialista, e que a satisfação das necessidades em algum tempo histórico foi apenas utilitária. Para esse autor, o consumidor moderno é essencialmente hedonista e possui dois traços marcantes: um enorme poder de imaginação e um total domínio sobre os estímulos que experimenta, apresentando uma grande competência para lidar com as sensações como se elas fossem reais. Assim, o hedonismo não envolve somente um campo de emoções espontâneas e inconscientes; para Campbell (2001) ele é uma forma racionalizada e autoilusiva de buscar o prazer. A motivação hedônica vem do desejo de experimentar na realidade as encenações agradáveis que já se viveu na imaginação.

O que distingue um produto do outro é a imagem e os sentidos que ele permite articular, a experiência que ele permite viver. Assim, a valoração dessa experiência possui uma dimensão individual e uma social. A próxima seção irá discorrer sobre a percepção de valor na experiência da perspectiva do marketing.

2.2 O VALOR PERCEBIDO NA EXPERIÊNCIA DE CONSUMO

Segundo Bradley e Sparks (2012) o valor percebido nas experiências de consumo é multidimensional, pois é resultado de múltiplas interações: busca, troca de informações, compra, experiência direta e uso, conselhos de boca a boca e assim por diante. Apesar de o valor ser uma concepção pessoal, o indivíduo não está isolado na experiência, ele é parte de um ecossistema composto por uma rede de atores, atividades e práticas que moldam e são moldadas pelas experiências (HEINONEN; STRANDVIK; VOIMA, 2013).

Assim, cada interação deve ser vista como parte de uma ampla rede de experiências, pois os indivíduos reconstroem as experiências de valor com base nas anteriores, em um contexto social. Desse modo, eles nunca iniciam uma experiência a partir de uma tela em branco, sem que haja uma memória anterior (HELKKULA; KELLEHER, 2012; HÖPNER, 2017).

No entanto, ainda que o valor das experiências seja influenciado pelo meio (em um ponto específico no tempo, em um local específico, no contexto de um evento específico), ele é o resultado das percepções e interpretações individuais exclusivas de cada indivíduo. Além disso, em uma esfera individual, o valor envolve muitas outras dimensões: o valor utilitário, que é instrumental e está relacionado à tarefa, expressando o caráter funcional do consumo (mais racionalizado e voltado às questões objetivas), e o valor hedônico, que reflete o prazer da experiência de consumo em si mesma, é derivada de uma resposta hedônica espontânea, ligada ao entretenimento, e expressa o caráter subjetivo e afetivo do consumo (BABIN; DARDEN; GRIFFIN, 1994).

Sheth, Mittal e Newman (2001) também partem de uma compreensão multidimensional do valor, afirmando que as decisões de compra são tomadas a partir de uma rede complexa, em que as dimensões da percepção de valor se manifestam em diferentes graus e em diferentes situações. Os autores consideram cinco dimensões independentes de valor: funcional, social, emocional, condicional e epistêmico.

Para Holbrook (2006) o consumo nunca é uma experiência neutra, ele é sempre intencional. O valor não é resultado apenas da compra, da posse do produto ou da marca, mas das ações nas quais o consumidor se envolve: na busca, diretamente com o bem, na interação com a marca ou com os outros consumidores, ou seja, nas diferentes situações de consumo, mediante a comparação que se qualifica e atribui valor às experiências de consumo. Holbrook (1999) criou uma axiologia que identifica e classifica a natureza e os tipos de valor percebidos pelas pessoas em suas experiências de consumo; a seção a seguir detalha alguns conceitos defendidos por esse autor.

2.3 MATRIZ DE HOLBROOK

Através da teoria de Holbrook (1999), compreende-se que o valor percebido no consumo é resultado de uma experiência pessoal, interativa, relativa e preferencial. Dito de outro modo, o valor percebido é pessoal porque envolve uma pessoa e um objeto (um serviço, uma outra pessoa, um bem intangível, uma imagem, enfim, uma oferta); o valor é interativo porque depende de uma interação, uma troca entre uma pessoa e o objeto; é relativo porque o valor depende do contexto em que ocorre (uma malha de lã no ponto de venda é adequada no inverno, mas causa arrepios no alto verão); e é preferencial porque o valor dado à experiência difere de um indivíduo para outro, depende do gosto, das inclinações e valores pessoais (no plural, ou seja, os critérios) nos quais essa preferência é baseada.

Holbrook (1999) considera que o valor percebido no consumo pode ser representado em uma matriz de 2x2x2 que contempla as três dimensões-chave e as discrimina oito tipos distribuídos em células, como se pode analisar no Quadro 1:


Quadro 1
Tipologia do Valor do Consumidor de Holbrook
Holbrook (1999)

Para o autor, a natureza extrínseca do valor se refere à funcionalidade dos bens ou serviços e pode ser verificada quando a satisfação provém da utilidade percebida. Já o valor intrínseco ou hedônico resulta de experiências de consumo autojustificáveis (com um fim em si mesma), para si próprio, para o próprio prazer, ou lúdicas (experiências estéticas e de entretenimento).

A dimensão do valor orientado para o outro diz respeito a experiências de consumo que envolvem outra pessoa, a efeitos que provocam sobre ela ou têm uma função objetiva em relação à reação de uma outra pessoa. Já o valor auto-orientado está ligado a uma situação de consumo onde há uma intenção de benefício próprio.

O valor de consumo é ativo quando resulta do envolvimento físico ou mental de um consumidor com um objeto e existe a manipulação do produto como parte da experiência de consumo. De modo contrário, o valor é reativo quando a pessoa somente contempla, aprecia ou responde a algum estímulo da situação de consumo (HOLBROOK, 1999). Quanto aos tipos de valor, considera-se que os dados do quadro sejam autoexplicativos.

3 METODOLOGIA DO ESTUDO

Tendo em vista que os sites de redes sociais se apresentam como um fenômeno em constante transformação e suas interrelações com a moda requerem mais investigações, este estudo pode ser definido como uma pesquisa exploratória. Partindo-se da ideia de que investigar as dimensões do valor percebido no consumo da experiência do seguidor de marcas de moda via Instagram envolve uma interpretação dos signos e manifestações desse fenômeno na vida desses indivíduos, entendeu-se que a abordagem qualitativa seria a mais coerente com os propósitos da investigação.

Como técnica de coleta, optou-se por entrevistas em profundidade e roteiro de perguntas semiestruturado – baseado na literatura e na matriz de Holbrook (1999). A técnica possibilita a coleta de dados essencialmente subjetivos e é indicada quando se pretende conhecer as ideias das pessoas sobre determinado tema, compreender suas visões de mundo, crenças e valores, ou seja, dar voz ao outro para entender de que perspectiva ele fala e como constrói seu mundo ( ROVER, 2012).

O roteiro de entrevista foi elaborado de acordo com os objetivos da pesquisa de modo a revelar indícios sobre a natureza das experiências dos seguidores de moda no Instagram, segundo a tipologia proposta por Holbrook (1999). No entanto, julgou-se relevante incluir um aspecto que não foi considerado como resultado da experiência de consumo na matriz de Holbrook (1999) e que está bastante presente no consumo de moda: a curiosidade e o desejo de aprender (que pode ser interpretado como desejo de pertencer, de estar na moda).

Dessa forma, buscou-se no conceito/categoria valor epistêmico, proposto por Sheth et al. (2001), o embasamento teórico para preencher essa possível lacuna na investigação, sendo incluído tanto no roteiro de entrevistas como na análise dessas. Segundo os autores, valor Epistêmico é o resultado da satisfação dos consumidores em buscar novidades, em conhecer novos produtos, novos usos, em adotar novas práticas, costumes e comportamentos. E como a marca é mediadora desse aprendizado, o valor se transfere para ela (SHETH et al., 2001). Assim, o desenho do presente estudo pode ser representado pela figura a seguir:


Figura 1
Representação gráfica dos tipos de valor considerados no estudo
Elaborado pela autora (2018)

Por questões de viabilidade a seleção dos entrevistados foi por conveniência. Esse método consiste em selecionar uma população que seja acessível e esteja disponível ao pesquisador, sendo uma estratégia de pesquisa que oferece facilidade operacional e baixo custo (CRESWELL, 2007). Pela mesma questão de viabilidade, optou-se por buscar respondentes entre os seguidores de marcas de moda pelo perfil de usuária do Instagram da própria autora.

Depois de duas semanas de observação da atuação de algumas marcas de moda brasileira no Instagram, optou-se por iniciar o processo de seleção dos respondentes a partir de três marcas relevantes na rede nessa categoria. Uma marca de calçados femininos de plástico: Petite Jolie (@petitejolie_), uma grande varejista de produtos de moda: Renner (@lojasrenner) e uma marca de moda jovem: Colcci (@colccioficial). O envio do convite foi feito via mensagem direta pela conta pessoal da pesquisadora, ao qual foi anexado um documento oficial comprovando o vínculo institucional, informações sobre os objetivos da pesquisa e considerações éticas sobre sigilo das informações e identidade dos participantes.

A partir da primeira resposta positiva e realização da entrevista, seguiu-se com a técnica de bola de neve. Segundo Vinuto (2014), é uma forma de seleção não probabilística que utiliza cadeias de referência. Para o pontapé inicial, lança-se mão de informantes-chave, nomeados como sementes, a fim de localizar algumas pessoas com o perfil necessário para a pesquisa, dentro da população geral. Em seguida, solicita-se que as pessoas indicadas pelas sementes apontem, a partir de sua própria rede pessoal, novos contatos com as características desejadas e assim sucessivamente, compondo dessa forma o quadro de respondentes da pesquisa.

Os critérios de seleção dos seguidores aplicados foram: os que interagiam com maior frequência com a marca, ter mais de 18 anos, seguir marcas de moda no Instagram há pelo menos um ano e ser ativo na rede social. O quadro a seguir resume o perfil demográfico dos 21 entrevistados:

Quadro 2
Perfil dos entrevistados

Elaborado pela autora (2018)

Quanto ao número ideal de entrevistas, Michelat (1982, p. 209) considera que o próprio processo determina a seleção dos respondentes, pois torna-se “[...] necessário parar quando se considera que o estado atual do modelo obtido [de interpretação] atinge certa estabilidade”. Entende-se que a partir dessa situação pode se dar essa fase por encerrada.

Na presente pesquisa, atingiu-se certa estabilidade por volta da 19ª entrevista. No entanto, mais dois respondentes foram ouvidos, pois os encontros já haviam sido agendados. A ideia de estabilidade está ligada ao princípio de saturação do corpus de pesquisa, que é a percepção do pesquisador sobre um momento em que elas se tornam repetitivas e as respostas não somam novos dados, havendo uma homogeneidade nos discursos (MIRANDA, 2017).

Para a análise dos dados, aplicou-se a análise de conteúdo semântica (BARDIN, 2004). Michelat (1982) propõe que a análise de conteúdo de entrevistas em profundidade seja estruturada alternando-se as leituras verticais e horizontais entre elas. Isso quer dizer que se deve ler cada entrevista individualmente, para que se compreenda cada fala dentro de numa perspectiva maior. Ao mesmo tempo, realiza-se a leitura das outras entrevistas, identificando temas comuns.

Bauer e Gaskell (2002) ressaltam que o objetivo amplo dessa análise é procurar pelos sentidos e a compreensão dos dados, sendo recomendado que durante as interpretações se volte às anotações e gravações, pois um comentário pode sugerir novos caminhos ou um novo modo de olhar. Os autores ressaltam que é fundamental garantir que toda interpretação esteja enraizada nas próprias entrevistas, para que durante a análise o corpus possa ser trazido para justificar as conclusões.

Após as transcrições das entrevistas foram feitas leituras e releituras, chegando-se a temas que se repetiam com frequência. Esses temas foram intrepretados a partir da matriz de Holbrook (1999) e cada tipo de valor virou um código. O corpus foi analisado e interpretado à luz da literatura revisada.

4 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

As entrevistas foram realizadas nos meses de fevereiro, março e abril de 2018, presencialmente com respondentes da capital de São Paulo e via Skype com os demais. Conforme a recomendação de Bauer e Gaskell (2002), as entrevistas foram gravadas (com a anuência do entrevistado) e transcritas. A primeira parte dessa seção (discussão dos resultados) abordará os indícios sobre a natureza do Instagram analisados à luz da teoria de Holbrook (1999): extrínseco (valor utilitário) e intrínseco (valor hedônico). Em seguida se discorrerá sobre os indícios de tipos de valor.

Todos os entrevistados destacaram o Instagram como a sua mídia social favorita. Para eles, estar na rede significa ter autonomia, ter acesso a inúmeras possibilidades de gerir seus interesses, gostos, aptidões, vontades e crenças. Trata-se de expandir as próprias fronteiras para além das relações de amizade e familiares que se desenvolvem no Facebook ou relações profissionais no LinkedIn. Sobretudo, está ligado à possibilidade de ampliação do próprio universo via informação e conexão com o mundo, sendo a mídia definida como: revista, vitrine, janela.

A percepção dos entrevistados é de que as informações chegam em tempo real. O app é um meio de descobrir o que de mais legal está acontecendo: lugares, viagens, estilos de vida, costumes, culturas, marcas de serviços, de produtos e pessoas. Logo, relaciona-se com ampliar o conhecimento, com o autodesenvolvimento e a constituição do eu, com a identidade. Em outras palavras, para os respondentes o Instagram é uma ferramenta que auxilia na construção da própria imagem, na definição de quem são ou de quem querem ser. É útil à medida que facilita a identificação e mapeamento do mundo a que pertencem ou querem pertencer. O app ainda possibilita experimentar uma sensação de conexão com o que é atual, de fazer parte do que está acontecendo, de se apropriar do Zeitgeist.

Segundo a literatura e modelo Holbrook (1999), essa busca por informação é um valor de natureza extrínseca; porém, nos discursos analisados, a experiência de conhecer melhor os produtos e os conteúdos da marca, além de utilitária (motivada pelo desejo de melhorar a reputação, a competência ou de ter status), demonstrou ter um aspecto de satisfação e prazer. Esse “estar por dentro” das novidades se revelou (pela fisionomia e tom da voz) uma forma particular de se entreter. Assim, considerou-se que o valor percebido pelos entrevistados não decorre somente pelo seu resultado de aprovação social, mas também do desejo de viver a experiência como um fim em si mesma, como aponta Campbell (2001).

De acordo com os respondentes, o mergulho no universo de imagens do Instagram possibilita viver o estado de flow, uma experiência de imersão, como num jogo em que um post leva a outro e se abandonam momentaneamente as preocupações, deixando-se levar pelo escapismo, dimensão de natureza intrinseca que Holbrook (1999) relaciona com o entretenimento.

Observou-se que, em geral, a experiência dos entrevistados segue um mesmo fluxo: várias vezes ao dia, abrem o app no celular para dar uma espiadinha, uma espairecida ou somente passar o tempo, deslizando as imagens de maneira rápida. Todos enfatizaram que esse fluir varia conforme a motivação e o momento, e a percepção de as publicações que ‘fisgam’ a atenção serem as que impactam pela cor, luz, pela beleza da imagem foi unânime. A estética como valor intrínseco. O modo com que são afetados (que emoções são evocadas) estimula a olhar as imagens com mais atenção ou não, a procurar por detalhes, a ler a legenda da postagem ou a assistir o vídeo na íntegra. Quando fisgados tendem a gostar da publicação (curtir); contudo, o curtir é uma reação quase automática e sem muito critério.

Já os comentários foram descritos como uma atitude motivada pela curiosidade por mais informações ou mesmo como retribuição a quem publicou (agradecimento, elogio, forma de incentivo e até ainda recomendação do conteúdo para outros usuários). Os entrevistados alegaram que por vezes comentam somente porque desejam se expressar (quando a imagem é muito impactante), mas que podem sim significar um efetivo envolvimento com a marca. Os trechos a seguir ilustram essa dimensão:

Curtir é tipo assim: gostei, não gostei, mas o comentar é quando aquilo realmente te tocou. Aquilo mexeu de alguma forma com você e você quer secolocar, elogiar, ou você quer mais informação sobre aquilo, tem uma dúvida. Quando você comenta, você já tem um interesse diferente sobre aquele assunto. O curtir, às vezes, você nem tem tanta certeza sobre aquilo, você sai curtindo (informação verbal – pedagoga3, 52 anos).

Sobre isso, vale ainda destacar também a fala da culinarista de 42 anos:

Merece uma curtida tudo o que é bonito, colorido, que chama atenção pela beleza da foto, que você se identifica. Já quando é muito, muito top você tem que comentar, né? Não tem como... você tem de deixar sua opinião (informação verbal – culinarista4, 42 anos).

Destaca-se que os tipos de valor apresentados nos discursos apareceram sempre relacionados, de modo que, para facilitar sua descrição e interpretação, se considerou o valor que mais se sobressaiu na fala em questão (levando-se em conta as expressões faciais, o tom de voz, as pausas e os silêncios dos entrevistados). Cada tipo de valor virou um código e as palavras relacionadas que apareceram com mais frequência viraram subcódigos (palavras-chave), sendo apresentados a seguir.

O valor Eficiência foi categorizado por Holbrook (1999) como extrínseco e ligado à conveniência. As palavras-chave relacionadas a ele foram: Funcionalidade; Atualidade; Presença na Rede; Inovação; Agilidade; Imediatismo, Facilidade de Comunicação e Conexão Eficiente.

Da experiência com a marca no Instagram resulta um valor utilitário, efeito da percepção da habilidade da marca em usar os recursos do app e pela conveniência em encontrar produtos e serviços facilmente; nas palavras dos entrevistados: a informação pula na tela. Como ilustra o trecho a seguir:

É muito rápido, é diferente de você se postar diante do computador, ter que entrar no site da marca pra ver. A coisa pula na sua frente, se você segue a marca, a coisa pula na sua tela. Você não precisa lembrar: o que será que a Prada lançou? A informação chega sem você pedir (informação verbal – bibliotecário5, 52 anos).

Para eles, as marcas respondem com mais agilidade no Instagram e sua comunicação é mais eficaz, pois as imagens informam melhor e mais rapidamente do que os textos. O valor resulta da velocidade com que se recebem as promoções, os lançamentos e novas tendências. A eficiência da marca também é percebida na sua boa capacidade de demonstrar as ofertas, de articular sua proposta e de se associar com pessoas interessantes. É conveniente ter acesso ao conteúdo da marca e dos seus colaboradores em um único espaço. Como se percebe no trecho a seguir:

Então, se você quer comprar alguma coisa... é muito mais fácil você comprar pelo Instagram. A gente encontra publicações sobre vendas, a gente encontra a matéria de consultores que falam sobre o que está em alta no próximo verão ou no próximo inverno... o que fica bom para cada tipo de corpo (informação verbal – enfermeira6, 52 anos).

Esse valor também vem através das resenhas sobre os produtos e da opinião de outros seguidores (que dá credibilidade pela legitimação do grupo). A conveniência foi ainda relacionada com a possibilidade de comparar, avaliar e escolher melhor os produtos e marcas pelo aplicativo, agilizando a busca delesno ponto de venda, economizando tempo no dia a dia. E ainda da facilidade de comprar diretamente pelo link do app. O trecho a seguir ilustra essa percepção:

[...] eu não preciso ir na loja, eu já fico sabendo do que tá rolando e de repente posso até comprar de casa mesmo. Por exemplo, a C&A ou a Riachuelo, eles estão sempre postando fotos, então eu não preciso ir lá e ficar revirando aquele monte de araras, eu já tenho na cabeça, economiza tempo, é praticidade. Hoje em dia a gente não tem como ficar indo a todo lugar (informação verbal – culinarista7, 42 anos).

O valor Excelência/Qualidade Percebida caracterizado como extrínseco por Holbrook (1999) foi representado pelas palavras-chave: Conformidade; Autenticidade; Exclusividade; Elegância; Modernidade; Estilo; Personificação.

Interpretou-se que a qualidade percebida na marca pelo Instagram está mais atrelada a como o produto é comunicado do que ao produto em si. A qualidade é percebida no apuro estético, no estilo, na autenticidade, na capacidade de inovar e na coerência da oferta e do seu preço. O valor vem da expertise da marca em publicizar suas propostas e produtos e envolve tanto o plano do conteúdo como o plano plástico. A percepção da qualidade da publicação impacta no conceito do produto e na percepção de superioridade, transferindo-se para a imagem que os seguidores têm da marca. Para eles, a comunicação é de qualidade se os enunciados são coerentes e consistentes. O trecho a seguir ilustra essa percepção:

Primeiro eu vou seguir pela qualidade de imagem que eles estão postando, porque se é uma marca meio assim... amadora, eu já não boto muita fé na coisa. E aí também não atrai muito os meus olhos; então, eu já não dou muita bola. Primeiro de tudo vem a qualidade na imagem que eu tô vendo, em relação à beleza, estética, tudo... e aí depois eu vou pela qualidade da informação; ué, o quanto eu gosto daquilo, o quanto bate com meu gosto, o quanto aquilo me traz informação (informação verbal – publicitária8, 32 anos).

A fotografia é tudo, o jeito que eles vão fotografar, a produção acho que é super chamativo. O pessoal posta muito assim: uma blusa pendurada num cabide, com fundo de madeira, só com um filtrinho... não tem... a produção que eu acho legal tem que ter um contexto (informação verbal – executiva de negócios9, 42 anos).

O Valor Epistêmico é extrínseco e refere-se à capacidade pedagógica das experiências de consumo. As palavras-chave ligadas a esse valor foram: Troca de experiências; Aprender coisas novas; Autoconhecimento; e Conexão. Conforme já foi dito, esse valor aparece no trabalho de Sheth et al. (2001) e não faz parte da matriz de Holbrook (1999), mas foi integrado ao estudo por aparecer com frequência nas entrevistas.

Para Sheth et al. (2001),o valor utilitário epistêmico está ligado à percepção de conhecimento adquirido com as informações de moda que as marcas publicam. É resultado de entender os códigos da moda e com isso ser capaz de fazer melhores escolhas. De usar e adaptar os produtos às situações do dia a dia, satisfazendo também uma necessidade de pertencimento e de aprimoramento pessoal. Essa percepção de valor pode vir do conteúdo que a marca publica ou das informações de moda que os colaboradores da marca compartilham (blogueiros, influenciadores e fãs da marca). Esse conhecimento facilita o trânsito por diferentes grupos e ajuda a consolidar estilos de vida específicos, pois também é efeito de aprender a articular esse repertório e de conseguir distinguir os papéis dentro dos grupos. A fala a seguir ilustra essa percepção:

Eu gosto de saber o que as pessoas estão usando, me deixa com vontade de experimentar coisas novas, quero usar também; eu gosto de estar na moda, estar por dentro. A moda é muito importante pra te fazer sentir mais próxima das pessoas, a moda me ajuda a sentir que estou dentro daquele grupo, que faço parte, que sei o que está acontecendo, me deixa confiante (informação verbal – representante comercial10, 26 anos).

O valor Status/Exibicionismo classificado como extrínseco por Holbrook (1999), apareceu nos discursos associados às palavras-chave: Exclusividade; Vaidade; Distinção Social e Diferenciação. O status emergiu muito mais relacionado à possibilidade de melhorar o repertório de moda por meio da marca e gerenciar melhor a própria imagem do que por exibicionismo ou disputas de poder (ter uma melhor performance do que os outros). Revelou-se como ferramenta para obter reconhecimento e ocupar um melhor espaço no jogo social, confundindo-se com o valor Estima.

Eu não consigo pegar qualquer coisa do meu armário e sair, eu vou me sentir mal, é um estilo de vida [...] não dá para a gente seguir uma moda sem levar em conta o nosso estilo, porque senão a gente vai se tornar aquele padrãozinho que a gente vê de vez em quando (informação verbal – estudante de Direito11, 23 anos).

A Estima emergiu como valor extrínseco e intrínseco, sendo relacionado com a: Identidade; Estilo próprio; Singularidade; Personalidade; Autenticidade; Autoestima; Pertencimento;Autonomia; Reputação. O valor é percebido na possibilidade dentificação com as propostas das marcas, já que são vistas como facilitadoras no processo de integração social e na construção da própria identidade. Sobretudo para o público feminino, a percepção de valor está ligada aos conteúdos que envolvem questões desse universo, como recurso para o desenvolvimento da autoestima e da autoconfiança. Os trechos citados a seguir ilustram essa dimensão:

Eu fui ganhando identidade e estilo próprio quando fui vendo umas referências no Instagram. Fui acompanhando perfis de modelo de roupa e foi me agradando; eu fui seguindo mais, eu queria mais referências, mais conhecimento e fui seguindo bastante marca, porque eu acho que foi mais aquela fase que você está mudando de estilo de adolescente para mulher (informação verbal – estudante de Urbanismo12, 20 anos).

Tem acontecido mais das [sic] marcas darem um incentivo às mulheres, é um negócio legal, que realmente faz você tomar coragem. Por que eu moro no interior e no interior é assim, né? O povo fala, comenta, então às vezes eu deixava de vestir uma coisa que eu queria por conta disso (informação verbal – publicitária13, 32 anos).

O valor hedônico Estética presente na matriz de Holbrook (1999), emergiu associado a palavras-chaves como: Harmonia; Beleza; Estética. Ele foi percebido no simples prazer da experiência, no fruir das imagens, na sua beleza e harmonia. Basicamente é o que afeta e captura a atenção do seguidor: a isca é a emoção. Em geral, essa emoção se transforma em euforia e desperta a curiosidade, levando o seguidor a ler a legenda, a procurar saber mais sobre o conteúdo, a interagir e até a comprar. Esse valor também é resultado de uma percepção que não é só passiva, é efeito ainda de um reconhecimento criterioso das qualidades plásticas das imagens. Eles sabem reconhecer uma boa luz, um bom enquadramento, a harmonização dos temas e cores, que são observados tanto nas fotos e vídeos como no conjunto geral das imagens publicado na grade do perfil da marca.

Eu acho que uma foto esteticamente produzida é mais legal. Pra mim, o que me pega é o design e, no segundo momento, se aquela proposta tem a ver com o conteúdo, se eles realmente se complementam. Eu olho bastante a cor e a composição, elas se complementam (informação verbal – representante comercial14, 47 anos).

Já a categoria de Holbrook (1999) correspondente ao valor Entretenimento foi associada a: Fantasia; Diversão; Lazer; Imaginação; Devaneio; e Nostalgia. Esse valor hedônico é percebido em publicações que favorecem a imaginação e o devaneio. Fotos contextualizadas dos produtos, em cenários ou situações que estimulam os seguidores a se transportar para aquela circunstância e viver breves momentos de fuga ou imaginação. Foi muito associado a vídeos e fotos de humor ou descontraídas que apresentam assuntos e os signos próprios da cultura digital (memes, stickers, filtros etc.). Os trechos a seguir demonstram essa dimensão:

O que me faz comprar um produto é isso, essa fantasia que ele me proporciona. Se eu olhar para um produto e não conseguir me imaginar usando ele numa determinada situação, ou num determinado lugar, eu nem compro, ele não serve, pra que que eu vou comprar? Pra eu comprar uma coisa, eu preciso conseguir imaginar ela em mim (informação verbal – auxiliar administrativo15, 25 anos).

O valor Ética também presente no modelo de Holbrook (1999), emergiu em associações com o Consumismo e Comunicação Transparente, podendo ser representado pelas palavras-chave: Compras por impulso; Moda ética; Autocrítica.

A Ética na experiência dos seguidores apareceu na autocrítica, em um escrutínio da própria conduta no app. A autoanálise envolveu como reagem às publicações das marcas de moda e de que forma se tornaram mais consumistas depois que passaram a usar o Instagram. Esse valor surgiu inclusive em uma análise crítica dos posicionamentos das marcas que seguem na rede, demonstrado pelas reflexões sobre os propósitos da marca e a coerência entre comunicados e as ações. Esse valor também é resultado da observação do relacionamento que a marca estabelece com os outros seguidores do seu perfil. Os trechos a seguir ilustram essas percepções:

A cobiça começa no olho, mas aí como não tenho tanta grana eu deletei algumas. Eu seguia muitas. Eu deletei pra não ver, pra não ter vontade de comprar. Porque se você está baixo astral a gente se dá presente... comprava e depois não usava. É tanta coisa que tem que não usa (informação verbal – culinarista16, 42 anos).

[...] algumas marcas no dia a dia me surpreenderam no sentido positivo como também no negativo, de ter gostado do projeto, de começar a acompanhar, e quando conheci no físico não tinha nada a ver com aquilo. O que eles estavam vendendo não é exatamente o que eles praticam. O discurso não batia. Porque se o que você vende não é coerente com o que você está falando, as pessoas vão acabar descobrindo, uma hora ou outra (informação verbal – representante comercial17, 47 anos).

Eu também procuro muito ver o relacionamento que ela tem com os consumidores, com os fãs. Se ela tem uma relação saudável, né. Porque também não adianta seguir uma marca, começar a acompanhar e ela não se preocupar com as pessoas que estão consumindo os produtos dela; então eu avalio muito isso quando eu vou seguir uma marca. Não são só os produtos, vai um pouco além disso aí, eu observo como é o comportamento dela... é mais ou menos como se ela fosse uma pessoa (informação verbal – estudante de arquitetura18, 23 anos).

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Buscou-se construir um repertório capaz de demonstrar como a experiência do usuário do Instagram pode ser entendida como um episódio muito mais rico em significados do que um breve contato com o anúncio da marca seguida. Procurou-se demonstrar como o produto de moda envolve um consumo essencialmente simbólico e como seus significados se manifestam e são valorados pelos seguidores.

Em síntese, as entrevistas sugerem que a experiência de fato é multidimensional e interativa. Pôde-se depreender que o caráter da experiência dos seguidores de marcas de moda é ativo e em geral individualista (orientado para si), mas quando muito estimulante tem um forte potencial integrador, socializador.

Em resposta ao objetivo da pesquisa, a análise dos dados demonstrou que, apesar de a rede social ter um forte caráter hedônico, por ser visual e sua navegação facilitar a imersão no fluxo de imagens, para os entrevistados, as experiências com a marca, além de atender as expectativas de diversão, fruição estética e devaneio, precisam também ser funcionais. Ou seja, sua natureza é simultaneamente utilitária e hedônica.

Numa mesma experiência, o estado de ânimo do seguidor pode transitar de uma navegação relaxante de contemplação para uma busca entusiasmada sobre um assunto que desperta a sua atenção. Ela pode começar de um jeito e tomar outro rumo, dependendo do teor das publicações. Desse modo, é possível inferir que, durante o período em que o episódio ocorre, a natureza do valor percebido pode alternar de hedônico a utilitário. Já sua natureza é sempre ativa, pois, por mais que o usuário tenha uma atitude passiva em relação aos conteúdos recebidos, ele ainda atua sobre o aplicativo (sem a sua ação, a experiência no Instagram não se realiza).

Quanto aos tipos de valor encontrados, o que se notou foi que, de fato, os entrevistados se mostraram bastante exigentes em relação às suas experiências com as marcas e os que os valores funcionais de eficiência, excelência, epistêmico, de estima e exibicionismo nessa rede social são fundamentais para que os valores hedônicos possam emergir. Sendo assim, considera-se que todos os valores são importantes para que o seguidor tenha uma experiência valiosa com a marca.

Sugere-se até que algumas marcas têm desperdiçado a potencialidade criativa e comunicativa do aplicativo, já que os entrevistados afirmaram que deixaram de seguir marcas que se tornaram repetitivas e que apresentam poucas novidades e autenticidade. E que os aspectos percebidos nos comportamentos dos usuários como a estetização do cotidiano, a sedução, o devaneio, o escapismo e a espetacularização, encontram convergência com particularidades do consumo de moda contemporâneo, intensamente simbólico. Por fim, entende-se que os indícios levantados possam transcender interesses estritamente acadêmicos e contribuir com gestores, agências de comunicação e até mesmo empreendedores de moda autônomos que produzam e gerenciem os conteúdos das marcas de moda na rede.19

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Notas

1 Esta pesquisa contou com financiamento da CAPES.
2 Mestre em Têxtil e Moda (EACH-USP), pós-graduada em Comunicação e Cultura da Moda pelo Centro Universitário Bellas Artes e bacharel em Design de Moda pelo Centro Universitário Senac. Conhecimentos em Design de Produto com ênfase em moda, atuando nos temas: Desenvolvimento de Produtos, Pesquisa de Tendências, Sustentabilidade, Comunicação e Imagem Pessoal. Lattes: http://lattes.cnpq.br/9827318650362280 | Orcid: https://orcid.org/0000-0002-2353-6153 E-mail: pahubner@hotmail.com
3 PEDAGOGA. Entrevista 13. [abr.2018]. Entrevistador: Paula Elisa Hubner Duarte Lima. São Paulo, 2018, 1 arquivo. Mp3 (51 min.).
4 CULINARISTA. Entrevista 19. [abr.2018]. Entrevistador: Paula Elisa Hubner Duarte Lima. São Paulo, 2018, 1 arquivo. Mp3 (94 min.).
5 BIBLIOTECÁRIO. Entrevista 10. [mar.2018]. Entrevistador: Paula Elisa Hubner Duarte Lima. São Paulo, 2018, 1 arquivo. Mp3 (53 min.).
6 ENFERMEIRA. Entrevista 11. [abr.2018]. Entrevistador: Paula Elisa Hubner Duarte Lima. São Paulo, 2018, 1 arquivo. Mp3 (65 min.).
7 CULINARISTA. Entrevista 19. [abr.2018]. Entrevistador: Paula Elisa Hubner Duarte Lima. São Paulo, 2018, 1 arquivo. Mp3 (94 min.).
8 PUBLICITÁRIA. Entrevista 5. [mar.2018]. Entrevistador: Paula Elisa Hubner Duarte Lima. São Paulo, 2018, 1 arquivo. Mp3 (58 min.).
9 EXECUTIVA DE NEGÓCIOS. Entrevista 16. [abr.2018]. Entrevistador: Paula Elisa Hubner Duarte Lima. São Paulo, 2018, 1 arquivo. Mp3 (67min.).
10 REPRESENTANTE COMERCIAL. Entrevista 8. [mar.2018]. Entrevistador: Paula Elisa Hubner Duarte Lima. São Paulo, 2018, 1 arquivo. Mp3 (54 min.).
11 ESTUDANTE DE DIREITO. Entrevista 2. [fev.2018]. Entrevistador: Paula Elisa Hubner Duarte Lima. São Paulo, 2018, 1 arquivo. Mp3 (79 min.).
12 ESTUDANTE DE URBANISMO. Entrevista 1. [fev.2018]. Entrevistador: Paula Elisa Hubner Duarte Lima. São Paulo, 2018, 1 arquivo. Mp3 (57min.).
13 PUBLICITÁRIA. Entrevista 5. [mar.2018]. Entrevistador: Paula Elisa Hubner Duarte Lima. São Paulo, 2018, 1 arquivo. Mp3 (58 min.).
14 REPRESENTANTE COMERCIAL. Entrevista 17. [abr.2018]. Entrevistador: Paula Elisa Hubner Duarte Lima. São Paulo, 2018, 1 arquivo. Mp3 (53 min.).
15 AUXILIAR ADMINISTRATIVO. Entrevista 7. [mar.2018]. Entrevistador: Paula Elisa Hubner Duarte Lima. São Paulo, 2018, 1 arquivo. Mp3 (57 min.).
16 CULINARISTA. Entrevista 19. [abr.2018]. Entrevistador: Paula Elisa Hubner Duarte Lima. São Paulo, 2018, 1 arquivo. Mp3 (94 min.).
17 REPRESENTANTE COMERCIAL. Entrevista 17. [abr.2018]. Entrevistador: Paula Elisa Hubner Duarte Lima. São Paulo, 2018, 1 arquivo. Mp3 (53 min.).
18 ESTUDANTE DE ARQUITETURA. Entrevista 3. Entrevista 3.[fev.2018]. Entrevistador: Paula Elisa Hubner Duarte Lima. São Paulo, 2018, 1 arquivo. Mp3 (59min.).
19 ANA LÚCIA SESSO. Formação educacional 1984 - Licenciada em línguas portuguesa/inglesa - UNISANT’ANNA. Revisora plena de textos desde 1980. www.anasessorevisao.com.br

Autor notes

1 Mestre em Têxtil e Moda (EACH-USP), pós-graduada em Comunicação e Cultura da Moda pelo Centro Universitário Bellas Artes e bacharel em Design de Moda pelo Centro Universitário Senac. Conhecimentos em Design de Produto com ênfase em moda, atuando nos temas: Desenvolvimento de Produtos, Pesquisa de Tendências, Sustentabilidade, Comunicação e Imagem Pessoal.

Informação adicional

Financiamento: Esta pesquisa contou com financiamento daFundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).



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