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Três mitos, três incômodas verdades sobre o agronegócio brasileiro
Tres mitos, tres incómodas verdades sobre el agronegocio brasileño
Three myths, three uncomfortable truths about brazilian agribusiness
Estudios Rurales. Publicación del Centro de Estudios de la Argentina Rural, vol. 14, núm. 29, 2024
Universidad Nacional de Quilmes

Artículos

Estudios Rurales. Publicación del Centro de Estudios de la Argentina Rural
Universidad Nacional de Quilmes, Argentina
ISSN: 2250-4001
Periodicidade: Semestral
vol. 14, núm. 29, 2024

Recepção: 10 Outubro 2023

Aprovação: 14 Fevereiro 2024


Este trabalho está sob uma Licença Argentina Creative Commons Atribuição-NãoComercial-Compartilhamento pela mesma Licença.

Resumo: “Fome se resolve com uma agricultura forte” é um dos slogans adotados pela principal representação da agricultura patronal no Rio Grande do Sul. Em larga medida essa máxima é empregada, desde 2016, em campanha publicitária liderada pela principal rede de televisão do Brasil. Paradoxalmente, segundo dados da FAO ONU, 61 milhões de brasileiros enfrentaram dificuldades para se alimentar entre 2019 e 2021, sendo que 15 milhões passaram fome. O presente estudo centra sua mirada em desvelar as contradições subjacentes ao encomiástico discurso das virtudes do agronegócio brasileiro. Fome e superprodução de commodities conformam as duas faces de uma mesma moeda. Três mitos e três incômodas verdades pairam sobre o agro brasileiro, cuja dinâmica atual se mostra incompatível com os imperativos do desenvolvimento sustentável. O primeiro mito é de que o agro é a riqueza do Brasil; o segundo mito é o de que tal segmento se destaca na geração de empregos e ocupação da força de trabalho, enquanto o terceiro é de que este país seria o celeiro do mundo.

Palavras-chave: agronegócio, desenvolvimento sustentável, Brasil, segurança alimentar.

Resumen: “El hambre se resuelve con una agricultura fuerte” es uno de los refranes adoptados por la principal organización patronal del Estado de Rio Grande do Sul (Brasil). En gran medida dicha máxima es empleada, desde el año 2016, en campaña publicitaria liderada por la principal red de televisión de Brasil. Paradójicamente, según datos de la FAO ONU, 61 millones de brasileños enfrentaron dificultades para alimentarse entre 2019 y 2021, siendo que 15 millones sufrieron hambre. El presente estudios centra su mirada en desvelar las contradicciones subyacentes al encomiástico discurso de las virtudes del agronegocio brasileño. Hambre y superproducción conforman las dos caras de una misma moneda. Tres mitos y tres incómodas verdades recaen sobre el agro brasileño, cuya dinámica se presenta como incompatible con los imperativos del desarrollo sostenible. El primer mito es que el agro es la riqueza de Brasil; el segundo mito que exalta su importancia en la generación de empleo y ocupación de la fuerza de trabajo, mientras el tercero de que Brasil es el granero del mundo.

Palabras clave: agronegocio, desarrollo sostenible, Brasil, seguridad alimentaria.

Abstract: “Hunger is resolved with a strong agriculture" is one of the slogans adopted by the leading representation of agribusiness in the state of Rio Grande do Sul. To a large extent, this motto has been employed since 2016 in a publicity campaign led by Brazil's primary television network. Paradoxically, according to data from the FAO (United Nations Food and Agriculture Organization), 61 million Brazilians faced difficulties in accessing food between 2019 and 2021, with 15 million experiencing hunger. This study focuses on unveiling the contradictions underlying the laudatory discourse of the virtues of Brazilian agribusiness. Hunger and overproduction of commodities constitute two sides of the same coin. Three myths and three uncomfortable truths loom over Brazilian agriculture, whose current dynamics appear incompatible with the imperatives of sustainable development. The first myth is that agriculture is Brazil's wealth; the second myth is that this sector stands out in job creation and workforce engagement, while the third myth is that this country would be the world's granary.

Keywords: agribusiness, sustainable development, Brazil, food safety.

INTRODUÇÃO

Foi um longo caminho percorrido até chegar ao marco conceitual dos Objetivos (17) do Desenvolvimento Sustentável (ODS), o qual contempla um conjunto de 169 metas globais, em meio a uma intensa atuação da Assembleia Geral das Nações Unidas que congregou, em torno si, nada menos que 193 Estados membros. Um dos grandes avanços dos acordos costurados está justamente no reconhecimento da natureza interdisciplinar, multidimensional e transversal do desenvolvimento sustentável.

A questão da fome, essa chaga dolorosa que atinge hoje 828 milhões de pessoas no planeta, não pode ser aplacada mediante a simples ferramenta da transferência de renda ou da criação de corredores humanitários. Eis que no começo da década de 1980, Lappé, Collins e Kinley (1981) publicam uma obra cujo título desconcertante- Aid as obstacle: twenty questions about our foreingn aid and the hungry – deixa claro o paradoxo das medidas convencionalmente adotadas para combater a fome e a insegurança alimentar. Nesse contexto, a ajuda externa oferecida pelos países ricos aos países pobres, além de não ser a solução, pode inclusive ser um ingente obstáculo aos que buscam mitiga-la. Ao menos quatro problemas advêm desta estratégia fracassada.

O primeiro deles é que a ajuda humanitária enfraquece o objetivo de soberania alimentar nos países pobres, os quais podem converter-se em eternos dependentes do aporte externo. O segundo problema reside no fato de que os produtos que ingressam no país receptor são altamente subsidiados na origem e acabam produzindo uma queda dos preços internos, desestimulando os agricultores dos países pobres a cultivarem suas próprias terras. Em terceiro lugar, ao adotar esse tipo de encaminhamento os governos dos países pobres recorrentemente renunciam ao compromisso de empreender as reformas estruturais e desenhar políticas públicas de enfrentamento ao drama da fome. Por último, mas não menos importante, a ajuda externa, não raras vezes, alimenta esquemas de corrupção e de clientelismo político no controle e distribuição dos produtos enviados pelos países ricos.

“Fome se resolve com uma agricultura forte” é um dos slogans adotados pela Federação de Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul) para demonstrar a pujança deste setor junto à sociedade sul-rio-grandense. Nesta mesma toada, desde 2015 a mais poderosa rede de televisão brasileira desenvolveu uma milionária campanha publicitária que tem como mote “O agro é tech, o agro é pop, o agro é tudo” a qual visa enaltecer a contribuição do agronegócio à formação da riqueza nacional.

Contrariando a apologética visão das grandes organizações agrárias, o Brasil retornou ao mapa da fome em 2018. Segundo dados da principal agência da Organização das Nações Unidas (FAO-ONU), 61 milhões de brasileiros enfrentaram dificuldades para se alimentar entre 2019 e 2021, sendo que 15 milhões vivenciaram a insegurança alimentar grave, ou seja, passaram fome. Um cenário que já era complicado em 2019 se aprofundou com a pandemia do Covid-19. Nesse sentido, caberia indagar: como é possível um país como o Brasil, líder mundial na exportação agropecuária, conviver diuturnamente com o flagelo da fome? Que razões conspiram para esse quadro paradoxal?

Como uma nação dotada de tamanha biodiversidade, de um imenso estoque de recursos naturais e de um território extraordinário se mostra incapaz de assegurar uma oferta alimentar satisfatória à própria população? O caso brasileiro reveste importância na medida em que se mostra francamente distante ou mesmo antagônico aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, não somente no que tange aos alcances no plano da erradicação da fome, mas também da promoção de uma agricultura sustentável, da redução das desigualdades, do consumo e produção responsáveis, de pôr em marcha ações efetivas contra a mudança global do clima, da conservação e uso sustentável dos oceanos e dos recursos hídricos, de proteger e preservar os ecossistemas, recuperar terras degradadas e conservar a biodiversidade.

Longe estamos de realizar aqui uma avaliação exaustiva do desempenho do Brasil no que tange ao cumprimento dos ODS ou de propor um balanço cabal acerca do papel do setor agropecuário dentro do âmbito da produção agroalimentar. Tal tarefa ultrapassaria os limites deste artigo. O que nos cabe realizar, a partir das indagações apresentadas no parágrafo anterior, é desenvolver um olhar, a partir do qual, seja possível compreender as razões que conspiram para que exista uma abissal distância que separa o panegírico das organizações agrárias acerca da suposta grandeza do agronegócio brasileiro e a situação concreta do país no que tange ao cumprimento dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.

Mais além das estatísticas que apontam para o recente abandono das ações do Estado no sentido de manter políticas ativas voltadas ao enfrentamento da fome e da própria incúria dos governantes, há também outros aspectos subjacentes dentro de uma dinâmica de esvaziamento de ações estruturantes para a redução da pobreza, a exemplo da ampliação do acesso à terra, do combate às desigualdades, proteção da biodiversidade e dos recursos hídricos, apenas por enunciar alguns eixos inegociáveis que deveriam pautar a atuação estatal.

A hipótese sobre a qual trabalhamos é que o discurso encomiástico das virtudes do agronegócio foi edificado a partir de um processo de desconstrução da fome como tema da agenda estatal, assim como do imperativo da preservação dos recursos e da biodiversidade. Mas essa desconstrução não se deu por simples omissão ou desleixo. Em verdade, trata-se de uma ação deliberada dos setores mais conservadores que integram o agronegócio exportador e suas estruturas de sustentação no sentido de obliterar qualquer ânimo de contestação ao padrão intensivo de produção agropecuária e dos graves impactos que ele acarreta sobre a biosfera.

Romper esse bloqueio passa inexoravelmente por requalificar o debate e restituir a perspectiva crítica e reflexiva no seio dos grandes debates nacionais. Não é tarefa simples, sobretudo porque tal movimento há que se dar no domínio epistemológico, no plano cognitivo. Não basta retinir, aos quatro ventos, a relevância dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável e evidenciar uma prévia adesão aos princípios que ensejaram a sua criação.

O desafio de compreensão do mundo é enorme, sobretudo quando estamos diante da realidade de um país em que fome e superprodução agroalimentar conformam as duas faces de uma mesma moeda, em que opulência e miséria estão intimamente imbricadas, em que a pobreza e a insegurança alimentar incidem muito mais fortemente no campo do que nas cidades brasileiras. Em meio a tudo isso os apologistas do agronegócio brasileiro (ou simplesmente agro) se jactam de seus logros e se apresentam como signo inconteste da pujança nacional, como garantidores das contas públicas e fiadores da vitalidade de nossa balança comercial.

Frente a este quadro, caberia indagar: que artifícios os apoiadores do agronegócio brasileiro lançam mão para edificar tal discurso e para pôr em marcha as estratégias de poder no terreno das disputas com os detratores deste padrão de domínio político e conjunção de interesses? O objetivo deste artigo é refletir sobre esta e outras questões a partir do exame da literatura, do levantamento de dados secundários e do cruzamento de dados e informações reunidos a partir de quase trinta anos de pesquisas realizadas pelo grupo de investigação a que pertencem os autores do presente estudo, que se estrutura, além da introdução, em três outras seções.

A primeira delas propõe uma leitura crítica sobre a dinâmica atual do agronegócio brasileiro, analisando a natureza dos processos que ensejaram o discurso apologético que se impôs em meio ao esvaziamento da fome como prioridade da agenda estatal, assim como do imperativo da preservação dos recursos naturais e de combate às desigualdades. A segunda seção aborda o que se considera como os três mitos e as três incômodas verdades sobre o agro brasileiro. Nessa aproximação examinaremos as contradições que se ocultam nas estratégias dos grupos de poder que habitam o que acertadamente Gerhardt (2021) denomina sociedade do agronegócio em sua gênese e desenvolvimento. A terceira e última seção reúne algumas conclusões e considerações finais deste estudo.

O AGRONEGÓCIO BRASILEIRO

No final dos anos 1950 surge uma obra (A Concept of Agribusiness) Davis e Goldberg (1957) que foi rapidamente assimilada no debate acadêmico dos EUA e demais países do mundo. Tais pesquisadores argumentam que com o aprofundamento da modernização tecnológica verificada no período pós II Guerra, cresce a dependência da agricultura em relação aos insumos produzidos pela indústria, sobressaindo o caso das máquinas, equipamentos, adubos, agrotóxicos e sementes melhoradas empregados em todas as fases do ciclo produtivo. No final do século XIX, Kautsky (1980) já havia anunciado, em tom profético, o processo de industrialização da agricultura e o fim do divórcio até então existente entre ambos setores em virtude da incorporação crescente das inovações tecnológicas às atividades agropecuárias.

Essa agricultura modernizada tornou-se tributária de bens e serviços empregados também no armazenamento, processamento e distribuição da produção que chega aos mercados. Por conta disso seria anacrônico insistir na ideia de uma economia setorializada, de segmentos compartimentados e independentes entre si. O que acontece antes e além da porteira conformaria um todo completamente integrado ao que se desenvolve no interior dos estabelecimentos rurais. A autonomia dos produtores seria uma espécie de quimera, um delírio total. É sob o influxo deste novo conceito que Davis e Goldberg passam a exercer uma influência que transcende o âmbito estritamente acadêmico e científico. Vale frisar que:

Davis foi vice-ministro da Agricultura durante o governo de Eisenhower e presidiu a Commodity Credit Corporation, além de organizar uma série de delegações para incidir em conferências internacionais sobre o tema. Como professor de Harvard, seu objetivo era “lançar uma grande iniciativa para reestruturar a forma de se pensar a agricultura no país” (Mendonça, 2015, p.376; aspas no original).

O fato é que as articulações tecidas nos EUA, sob a égide desse conceito e dessa nova unidade de análise, serviram ao propósito de evidenciar o peso econômico do agronegócio à formação da riqueza dos EUA e ampliar a base política dos atores a ele integrados, propagando o que se poderia chamar de uma ideologia tipicamente “neo-fisiocrática”. Foi durante os anos 1980 que esse debate desembarcou no Brasil. Inicialmente adotava-se o termo “complexo agroindustrial”, mas logo a seguir para a ser referido como “agronegócio”. Mais recentemente, a partir da portentosa campanha da Rede Globo de televisão, o termo usado passa a ser simplesmente agro.

O processo histórico de formação e consolidação do agronegócio brasileiro foi obra de diversas organizações que operam dentro e fora do país numa economia cada vez mais globalizada. Sob os auspícios das benesses do regime autoritário (1964-1985) se impôs o projeto de modernização conservadora (Guimarães, 1982) que socavou toda e qualquer tentativa de redistribuição da posse e propriedade da terra no país. Paralelamente a ditadura reprimiu movimentos sociais, perseguiu, torturou e assassinou lideranças rurais.

Assim, desde meados dos anos 1990, produtividade, eficiência, modernidade, competitividade, segurança alimentar são as pontas de lança do léxico incorporado à retórica da autoexaltação dos grandes logros do agronegócio brasileiro, como bem destacaram Delgado (2012), Almeida (2010) e outros autores. Não por acaso, Caio Pompeia cunhou a expressão “sinédoque política” que sintetiza essa visão totalizadora e totalizante do agronegócio como se fora “a grande riqueza do Brasil”. Por meio desse recurso midiático, veicula-se um discurso que proclama a existência de um suposto bloco monolítico, em cujo interior coabitam, harmoniosamente, megaempresários, produtores familiares e trabalhadores rurais. Com efeito,

Mobilizando esse argumento por meio de sinédoque política (ação para fundir conceito e concertação), agentes políticos do agronegócio constroem um simulacro (imagem da concertação com super-representatividade), no qual envolvem, portanto, todos os tipos de produção agropecuária. Escamoteando que não há união política entre a concertação e a maioria da agricultura familiar, eles podem promover, valendo-se do prestígio social dessa categoria, ações políticas que, no entanto, frequentemente são prejudiciais à maior parte dos produtores não patronais (Pompeia, 2020, p.205).

Segundo Gerhardt (2021), no auge dos anos 1980 o intento das corporações agrárias era no sentido de romper com estereótipos negativos associados aos fazendeiros e latifundiários (e.g. coronéis, gigolôs de vaca, oligarcas, caudilhos, etc.), devidamente enraizados na alma brasileira desde tempos pretéritos, bem como nos conhecidos arcaísmos do rural profundo. Mas há outra faceta da portentosa campanha da Rede Globo (“O agro é pop, o agro é tech, o agro é tudo”) iniciada em 2016 e que precisa aqui ser descortinada. O fato é que:

[...] para além de ser só um recurso midiático ou resultado de uma concertação, o que o Movimento Sou Agro inaugura é um esforço articulado de transformar o significante Agro em símbolo nacional, fixando-o no imaginário como sinônimo de brasilidade. Mais do que isso, o que parece estar em curso é um adiantado processo de fabricação de toda uma cosmologia Agro, tendo essa inclusive, como se verá, traços totêmicos e religiosos (Gerhardt, 2021, p.1030)

Além de mostrar a onipresença do agro na vida nacional, trata-se de convertê-lo em referente de sucesso, em motivo de orgulho nacional, em sinônimo de avanço tecnológico, cuja eficácia se agiganta ao produzir a sensação de pertencimento por parte dos brasileiros e brasileiras. Em outras palavras, ao traduzir-se em objeto de culto, de adoração e de identidade, o agro se apresenta ao país como se fora uma espécie de “totem” na acepção de Gerhardt (2021, p.1033), lembrando o clássico estudo de Durkheim (1989)[1].

Estudo realizado por Bittencourt, Romano e Castilho (2022, p.194) analisa a prática discursiva de lideranças ligadas ao agro brasileiro que busca destacar a qualidade moral de seus protagonistas que seguem a fórmula “o agro não para” propagado num momento preciso de comoção nacional, em pleno auge da pandemia da Covid-19, momento em que tais poderosos atores da cena política brasileira se jactavam de supostamente assegurar o acesso aos alimentos a um país que estava sob o signo do pavor e de incerteza.

O ardil não está somente no intuito de tentar faturar politicamente na desgraça, mas de ocultar o fato de que a maior parte das energias do agro brasileiro não está precisamente dirigida à produção de alimentos stricto sensu, como veremos na seção subsequente. No âmbito do poder legislativo a atuação da Frente Parlamentar da Agropecuária exerce um poder gigantesco na conformação das pautas e na relação com as demais instituições e poderes constituídos.

Destarte, os apologistas do agro propagam o ódio e a criminalização dos movimentos sociais de luta pela terra, desqualificam e intimidam todos os seus oponentes (lideranças sindicais, partidos progressistas, ambientalistas, etc.), fazendo uso, como reiterou Bruno (2021, p.467), de “um discurso salvacionista em defesa do agronegócio, considerado «a riqueza da nação»” (destacado no original). A literatura especializada sobre o assunto coloca especial ênfase no que se reconhece como o processo de construção do novo consenso das commodities, na virada do século XXI (Kato e Leite, 2020, p.462) que teve por corolário o fenômeno “land grabbing” ou açambarcamento direto de terras por grupos estrangeiros. Tal dinâmica é expressão do que Delgado (2012) define como a consolidação de uma economia política do agronegócio.

Por força desse cenário as medidas de democratização do acesso à terra por parte de grupos vulneráveis (trabalhadores rurais, comunidades quilombolas, comunidades tradicionais extrativistas, etc.) vem sendo sistematicamente obliteradas. Kato e Leite enunciam três dimensões, através das quais, é factível vislumbrar o quadro brasileiro sob a égide de um capitalismo financeirizado.

A primeira delas recai na financeirização da própria agricultura; a segunda tem a ver com a financeirização e estrangeirização da terra. A terceira remete ao “fenômeno global contemporâneo [...] conhecido como land grabbling” (Kato e Leite, 2020, p.463). O acirramento dos conflitos agrários, o desmatamento, a expulsão de comunidades tradicionais, a grilagem e a apropriação dos recursos naturais por grupos privados (nacionais e internacionais) são o reflexo direto de um fenômeno que cobra atenção como objeto de estudo e como objeto de atenção por parte do Estado.

TRÊS MITOS E TRÊS INCÔMODAS VERDADES SOBRE O AGRONEGÓCIO BRASILEIRO

O mito da formação da riqueza nacional

As organizações ligadas à agricultura patronal (Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária, Associação Brasileira do Agronegócio, Organização das Cooperativas, etc.) são enfáticas ao exaltar a performance de um segmento da economia nacional que integra a produção agropecuária stricto sensu, bem como a atividade industrial à montante e à jusante do processo produtivo. Os dados da Figura 1 indicam uma série histórica (1996-2022) relativa à evolução do Produto Interno Bruto – renda do Agronegócio brasileiro com a participação dos diversos setores (insumos, agropecuária, indústria e serviços). Os valores foram deflacionados, mostrando a passagem de um valor próximo a R$ 2 bilhões no começo do novo milênio para R$ 2,7 bilhões vinte anos depois.


Figura 1

PIB-renda do Agronegócio Brasileiro, 1996 a 2022, em R$ milhões de reais. O dado reflete a renda do setor, sendo consideradas no cálculo variações de volume e de preços reais, sendo estes deflacionados pelo deflator implícito do PIB nacional. Fonte: CEPEA (2024).

A participação percentual do agronegócio no PIB brasileiro é apresentada na Figura 2 no intervalo de tempo compreendido entre os anos 1996 e 2022. A série histórica de 26 anos mostra uma grande variabilidade no protagonismo desse setor. No primeiro ano considerado representou quase 35 % do PIB, enquanto em 2014 alcança um percentual mínimo (18,6%). No último triênio (2020-2022) a participação média alcança 26%. Todavia, como a seguir veremos, tais dados não podem ser tomados como expressão de verdade, como a seguir demonstraremos.


Figura 2

Evolução da participação (%) do Agronegócio Total no PIB brasileiro - 1996-2022.Fonte: CEPEA (2024)

Com efeito, a metodologia adotada pelas organizações aludidas tende a superestimar esta participação. Estudo realizado por Mitidiero Jr. e Goldfarb (2021), com base nos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), adverte que a participação da agropecuária no PIB brasileiro foi em média 5,4% entre os anos 2002 e 2018, muito distante do que apontam os dados das organizações supracitadas. Não menos importante é o fato de que tal desempenho se dá em meio a um processo de reprimarização da economia brasileira e de uma drástica redução da diversidade da pauta das exportações. Destarte, é sabido que o Brasil se tornou refém de um reduzido grupo de artigos, tendo a soja – exportada em bruto – como principal produto.

Estudo realizado por Delgado e Leite (2022) indica que no ano 2000 a soja representava 5% do valor exportado pelo Brasil, passando para 16,8% em 2020. Trata-se de produto altamente intensivo no consumo de recursos naturais, no uso de agrotóxicos e que emprega pouca mão de obra face o elevado grau de mecanização. E se isso não fora bastante para demonstrar as solenes contradições que tal movimento encerra, o principal destino destas exportações - enviadas ao exterior sem qualquer agregação de valor – corresponde a um único país (China), que sozinho concentra nada menos que 70% desse montante.

Em 2021 apenas dois produtos (milho e soja) concentraram nada menos que 89% do volume total de grãos produzidos no país. Nesse mesmo ano, ainda segundo dados do IBGE (2021), o valor da produção agrícola ascendeu a R$ 743,3 bilhões, sendo que apenas três cultivos (soja, milho e cana de açúcar) concentraram 71,8% desse montante, com destaque para a oleaginosa que, sozinha, concentrou 46% desta cifra. Tais números são objeto de preocupação num país onde grassa a fome, onde 32,8% de sua população estava submetida à insegurança alimentar (severa ou moderada) entre 2020 e 2022, segundo relatório da FAO/ONU (2022a).

Eis aí o primeiro mito a ser desfeito, qual seja, o de que o agro é a riqueza do Brasil. A primeira verdade incômoda é que essa expansão debilita a condição do país no cenário mundial, o qual se torna altamente tributário de um reduzidíssimo grupo de produtos primários. A espiral da soja, como se fora uma espécie de campo gravitacional, arrasta consigo a reconcentração da riqueza e amplia o poder dos conglomerados dentro do território nacional. O Brasil se desindustrializa[2] e reprimariza sua economia no bojo destas mudanças. E por que é necessária uma campanha publicitária tão forte para exaltar logros do agronegócio? A resposta nos é dada por Mitidiero Jr. e Goldfarb (2021, p.2)

O objetivo é claro, o de conquistar o consenso na sociedade brasileira de que o setor da economia recentemente intitulado de Agro é que assegura a economia nacional, sendo ele a “riqueza do Brasil”. Isso quer dizer que a publicidade, somada ao poder político do Agro nas esferas públicas, sobretudo no Legislativo e Executivo, e sua presença dentro das universidades e institutos de pesquisa tenta, a qualquer custo, posicionar o grande agronegócio como salvador da economia brasileira, proporcionando superávits comerciais e gerando renda e emprego como resultado dos milhões de toneladas de produção agrícola e pecuária (destaques no original).

Criar essa imagem junto à opinião pública nacional é uma estratégia concertada por agentes privados e públicos em torno a interesses eminentemente corporativos. Um dos grandes desdobramentos se dá no âmbito político justamente por produzir o esvaziamento do compromisso do Estado no sentido de promover as mudanças estruturais de que o Brasil tanto necessita, incluindo a reforma agrária, o fortalecimento da agricultura familiar e dos direitos dos trabalhadores rurais a empregos dignos. Tais coletivos são sempre preteridos em favor dos grandes conglomerados. A história nacional não deixa dúvidas disso. Não menos irônico é o fato de que a desindustrialização acaba por obrigar o país a importar fertilizantes para sustentar um modelo produtivo que é altamente tributário dos agroquímicos e ineficiente do ponto de vista energético face a alta dependência de combustíveis fósseis.

Mas o mantra do “agro, riqueza do Brasil” serve ao propósito de remover quaisquer obstáculos que impeçam o violento processo de integração entre o capital financeiro e a propriedade da terra. Como bem ressaltaram Kato e Leite (2020, p.471), os “Fundos especializados no setor agronegócio explodiram de 2005 a 2014, alcançando o montante de U$ 100 bilhões em investimentos em 2013”. Consta que grandes investidores privados realizam suas operações lastreados em fundos de pensão que aplicam em terras e no suculento mercado de commodities. O imóvel rural converte-se num poderoso ativo financeiro que alimenta a perversa dinâmica de expropriação de produtores familiares, indígenas, quilombolas, posseiros, sobretudo nos estados setentrionais do país.

Caio Pompeia foi um dos autores que se dedicou a desmistificar a inflada contribuição do agro à riqueza do Brasil. Com base em dados do Cepea (2018), analisou separadamente a participação relativa dos quatro segmentos (insumos, agropecuária, indústria e serviços) na composição do PIB renda do agronegócio. A conclusão básica é que os dados divulgados pelos defensores do agro brasileiro estão superestimados. E se isso não fora bastante, da riqueza do agro teriam que ser deduzidos os generosos subsídios concedidos pelo Estado no crédito rural, os investimentos públicos na formação dos corredores de exportação, na isenção tributária e também no que tange à não-quitação de empréstimos bancários e dívidas dos empresários rurais com o sistema da previdência social.

At last but no least, há um aspecto surpreendente que nos parece importante sublinhar ao finalizar este tópico do artigo. Resulta que dados obtidos junto ao Word Trade Statistical (FAO/ONU, 2022b), referentes ao ano 2020, indicam que o Brasil se situa no 3º posto dentre os países do mundo em termos do valor das exportações de produtos agropecuários. A lista é encabeçada pelos Estados Unidos da América com U$ 124 bilhões de dólares (10% do total). Os Países Baixos figuram no segundo posto com U$ 79 bilhões de dólares (6% do total mundial). O paradoxo reside no fato de que esta pequena nação europeia supera o Brasil. É um país que cabe nada menos que 2,3 vezes dentro de Santa Catarina, uma das menores unidades federativas do Brasil. Diante desses números tem-se a impressão de que o lugar do agro brasileiro não parece ser precisamente o de produtor de valor, mas de volume. A estas alturas valeria indagar se procede seguir insistindo no gigantismo do agro brasileiro frente à pequena notável Holanda, cujo território cabe nada menos que 203 vezes dentro do Brasil.

O mito do agro na geração de empregos e ocupação da força de trabalho

Na introdução chamamos a atenção para três Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, onde consta, dentre outros aspectos, a) a erradicação da pobreza, b) a promoção do trabalho decente de crescimento econômico e c) a redução das desigualdades. A questão que se impõe é saber se, e em que medida, o agronegócio brasileiro está à altura de enfrentar-se a estes desafios e qual o seu papel na geração de empregos e ocupação da força de trabalho rural.

Os dados da Tab.1 não deixam dúvidas sobre a concentração da pobreza extrema no âmbito rural. Assim, entre 2016 e 2019 a pobreza rural oscila entre 1,8 e 1,6 vezes a pobreza total do país. Em 2020 tal incidência se reduz, mas segue sendo altíssima (1,7 vezes) em relação ao conjunto do país.

Tabela 1
Proporção porcentual da população abaixo da linha de pobreza por situação de domicílio.

Parâmetro adotado: U$ 5,50/dia.

IBGE – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (IBGE, PNAD Contínua, 2022).

Se a suposta pujança do agronegócio não se mostra capaz de reverter a pobreza rural no país, seria esse setor decisivo na ocupação da força de trabalho? O estudo realizado por Balsadi (2021), a partir dos dados do censo agropecuário (IBGE, 2021), é categórico ao afirmar que:

Os dados do Censo Agropecuário de 2017 evidenciaram redução de 1,4 milhão de pessoas ocupadas na agricultura brasileira em relação aos valores de 2006. Consolida-se, dessa forma, uma permanente redução da demanda de força de trabalho agrícola desde 1985, quando 23,4 milhões de pessoas estavam ocupadas nos estabelecimentos agropecuários (Balsadi, 2021, p.72; destaques nossos)[3].

A dinâmica do agronegócio – e isso não representa nenhuma novidade – é sempre no sentido de incrementar a produtividade dos meios de produção (terra, capital, trabalho), mediante o uso de transgênicos, agroquímicos e mecanização intensiva dos processos produtivos (aração, gradagem, colheita, etc.) e de reduzir drasticamente a ocupação de mão de obra. Mas há outros dados que cobram relevância.

O último censo agropecuário (IBGE, 2017) identificou mais de 5 milhões de estabelecimentos agropecuários, dos quais 77% são de caráter familiar, sendo estes responsáveis por absorver 67% da população ocupada na agropecuária. Os apologistas do agronegócio poderiam argumentar que parte dos estabelecimentos familiares está inserida na produção de commodities agrícolas, sobretudo no caso da soja. Isso é certo e representa uma grave distorção, dado que sua vocação natural deveria ser a produção de alimentos.

Todavia, é também correto afirmar que a parcela familiar de nossa agricultura concentra escassos 23% da área total dos estabelecimentos agropecuários, o que atesta o elevado grau de concentração da terra no Brasil. Eis aí um segundo mito a ser desfeito sobre o agronegócio brasileiro, o de que exerceria um papel transcendente na absorção da mão de obra rural.

Mas se isso não fora bastante, há outros aspectos que merecem ser sublinhados. Eis que em 2022 o número de trabalhadores rurais (2.254) em situação análoga à escravidão identificados por fiscais do Ministério Público do Trabalho chegou a um máximo histórico na última década, totalizando 55.429 pessoas nessa degradante condição, segundo dados do Portal da Inspeção do Trabalho (Ministério do Trabalho, 2023).

Em fevereiro de 2023 o Brasil assistiu estupefato a operação de resgate de mais de 200 trabalhadores em situação de trabalho análogo à escravidão em ação deflagrada pela Polícia Federal e Ministério do Trabalho e Emprego junto ao município de Bento Gonçalves, Caxias do Sul, Nova Roma do Sul e Flores da Cunha e outras localidades da chamada Serra Gaúcha. Trazidos da Bahia para a colheita de uva por aliciadores de mão de obra, os chamados gatos, eram os trabalhadores submetidos a condições degradantes no que tange à alimentação e moradia, além de serem obrigados a contrair dívidas na aquisição de gêneros de primeira necessidade, além de sofrerem maus tratos.

O aspecto chocante está no fato de que a Serra Gaúcha[4] se apresenta ao país como um destino turístico não somente pelas paisagens que remontam à velha Europa, mas pelos apelos à cultura italiana e alemã. O país estarrecido viu uma demonstração rotunda do racismo das falas de lideranças empresarias do setor vitivinícola e dos políticos regionais. A exploração de trabalhadores rurais na colheita da uva e da maçã mostra a face espúria do agronegócio brasileiro. Não é um caso isolado, mas uma doença social que afronta a ideia de país[5].

A informação reunida nas Figuras 3, 4 e 5 ilustra o quadro explosivo da realidade rural brasileira, cobrindo o espaço de tempo compreendido entre 2014 e o primeiro semestre de 2023. Como é possível perceber, em 2020 ocorreram nada menos que 1007 conflitos no campo. São dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT) que vêm sendo contabilizados desde 1985. Dos 973 conflitos registrados em 2023, 791 envolveram disputa por terra, 80 por disputa de água e 102 a revoltante situação de trabalho em condições análogas à escravidão.

Os dados da Figura 3 referem-se ao mesmo período de tempo, mostrando a evolução dos assassinatos por disputa de terra, que em 2017 alcançou um total de 40 mortes. São dados estarrecedores. A história brasileira recente registra fatos horripilantes como o massacre de Corumbiara (1995) e Eldorado dos Carajás (1996) onde foram assassinados, respectivamente, 12 e 21 trabalhadores rurais. Em 2017, em Pau D’Arco, foram dez mortes produzidas pela disputa de terra. A execução recente (2022) do jornalista britânico Dominic Mark Phillips e do indigenista brasileiro Bruno Araújo Pereira em Atalaia do Norte (AM) repercutiu internacionalmente, assim como o genocídio recorrente dos indígenas Ianomâmi em meio à total complacência das Forças Armadas brasileiras. Tais episódios guardam estreita conexão com a ambição desmesurada por desalojar índios, quilombolas e trabalhadores rurais sem-terra para dar passo a formas cruéis de exploração da terra e dos recursos naturais. Como aludiram Kato e Leite (2020, p.478), trata-se da captura de terras (land grabbing), de água (water grabbing) e da própria natureza (green grabbing).

A bancada BBB (Boi, Bala e Bíblia), como assim se denominam os parlamentares de direita e extrema-direita nacional, constroem pactos que giram em torno destes mesmos interesses. E se alguém duvida do quão grotesca podem ser as alianças construídas pelos setores oligárquicos do país, basta lembrar o que ocorreu em abril de 2020. Enquanto o Brasil assistia atônito o acúmulo de óbitos produzidos pela pandemia da Covid-19, na fatídica reunião de ministros coordenada por Jair Bolsonaro foi construído o slogan – Vamos passar a boiada – que marcou uma era de flagrantes retrocessos na fiscalização de crimes ambientais e de destruição das estruturas de proteção dos povos tradicionais.


Figura 3

Conflitos no campo no Brasil, 2012 ao 1º sem 2023.Fonte: CPT (2024)


Figura 4

Assassinatos no campo no Brasil, 2012 ao 1º sem 2023Fonte: CPT (2024).

Os dados da Figura 5 informam a evolução do número de trabalhadores e trabalhadoras em condições análogas à escravidão no período compreendido entre 2014 e o primeiro semestre de 2023, segundo dados da CPT. Esta é outra face horripilante do agronegócio brasileiro. No último ano considerado (2023) nada menos que 1.408 indivíduos fizeram parte desta degradante estatística.


Figura 5

Evolução do número de trabalhadores em condição análoga à escravidão resgatados pelo Ministério do Trabalho entre 2014 e 2023. Fonte: CPT (2024).

O mito do agro como produtor de alimentos

Eis um slogan que é veiculado diuturnamente na apologia à suposta grandeza do agronegócio: o Brasil é um dos grandes celeiros do mundo. Em tradicionais escolas agrárias de ensino superior de todo país tal máxima converte-se numa espécie de mantra entoado durante o primeiro ao último semestre nas escolas de Agronomia. A produtividade de cultivos e criações é pedra de toque que legitima todas as práticas que, via de regra, se apoiam na ideia de subjugação da natureza em nome das modernas formas de produção agropecuária. Tudo pode ser sacrificado em nome desse imperativo.

Dissimular a realidade é um dos instrumentos de manipulação das mentes. O discurso ufanista não pode ser questionado de nenhuma forma, mesmo que a devastação seja evidente e que a catástrofe seja iminente. A exaltação do agronegócio assume um caráter doutrinário, um tom apologético. Todo ato de pensar numa outra forma de produzir alimentos, matérias primas e fibras enfrenta mecanismos de interdição tanto no âmbito dos debates públicos como no âmbito dos debates acadêmicos. Analisemos agora algumas informações.

Os dados da evolução da produção de soja são demasiado eloquentes, como mostra a Figura 6. Entre 2006 e 2021 a produção desta oleaginosa passou de 52,2 para quase 135 milhões de toneladas, um incremento da ordem de mais de 158%. Mas não é preciso ser nutricionista para lembrar que a soja não é um alimento. Trata-se de uma commodity exportada praticamente sem qualquer agregação de valor, sendo convertida (no exterior) em ração que alimenta os rebanhos da China, Europa e de outros países do planeta.


Figura 6

Evolução da produção de soja no Brasil em milhões de toneladas entre 2006 e 2022. Fonte: CEPEA (2024).

Não por acaso, alcançar o fim da fome e promover uma agricultura sustentável é o primeiro dos ODS. A fome mundial, que já dava sinais alarmantes, alcançando mais de 800 milhões de pessoas em 2020, se agravou em 2021 em decorrência da pandemia da Covid-19 com o ingresso de 103 milhões de almas a um contingente que ascende a 9,8% da população do planeta. E como o Brasil se apresenta diante desta macabra estatística? Como é amplamente sabido, este país retornou, tristemente, ao mapa da fome.

Depois de uma década de grandes avanços (2004-2014), a fome cresceu de forma acentuada. Segundo dados oficiais (IBGE, 2020), 36,7% dos domicílios do país se enfrentam, hoje, à insegurança alimentar. De acordo com a mesma fonte, em 2018 havia 10,3 milhões de famintos no Brasil, mas o mais impressionante é que esse fenômeno atinge 23,3% da população urbana e 40,1% da população rural.

Dados mais recentes referem que, em 2020, apenas 44,8% dos domicílios brasileiros se encontravam em situação de segurança alimentar. Consta ainda que: “dos 55,2% restantes, 9% passavam fome, ou seja, estavam em situação alimentar grave, sendo pior essa condição nos domicílios da área rural” (Rede Penssan, 2021, p. 8). O que o agronegócio tem a ver com esse quadro? Dentro desse plano de análise é crucial frisar que a expansão das commodities não se dá no vácuo. Agricultores deixam de produzir alimentos para entregar-se à soja, ao milho, ao fumo, sacrificando outras produções que são cruciais para assegurar a soberania alimentar nacional.

Os dados das Fig. 7 e 8 mostram a evolução dos dois mais importantes produtos da dieta dos brasileiros entre os anos 2006 e 2022. O caso do arroz indica uma produção absolutamente estagnada no período, sendo que no último ano chega-se a um mínimo histórico (10,7 milhões de toneladas) num intervalo de tempo em que a população nacional cresceu mais de 14%. Em meio a esse estancamento, dados da Carteira de Comércio Exterior do Banco do Brasil indicam que em 2020 o Brasil realizou o maior volume de importação de arroz dos últimos 17 anos, equivalente a 1,26 milhão de toneladas em equivalente arroz em casca. Não há como minimizar um fato desta grandeza para o caso de um produto que é considerado central à dieta alimentar dos brasileiros. Um país do tamanho do Brasil e com o nível tecnológico já alcançado na produção deste tipo de grão, especialmente na moderna lavoura arrozeira do Rio Grande do Sul, tal fato representa um acinte a qualquer esforço lógico de compreensão da realidade.


Figura 7

Evolução da produção total de arroz entre 2006 e 2022 em milhões de toneladas Fonte: IBGE-SIDRA (2022).

O caso do feijão é ainda mais dramático, em pese ter havido uma redução da ordem de 702 mil toneladas nos últimos 15 anos (Figura 8), o que equivale a uma retração percentual de mais de 19%. O que os dados mostram é que não se trata de uma situação singular ou conjuntural, mas de uma tendência que se aprofunda justamente no momento em que as commodities vivem máximos históricos, como vimos no caso da soja. Dados da Companhia Nacional do Abastecimento indicam que o Brasil vem importando volumes crescentes de feijão nos últimos anos para atender a demanda doméstica do produto. Tanto no caso do arroz como do feijão a saída do governo tem sido a de zerar tarifas de importação, facilitando este tipo de operação, de modo a forçar a uma baixa dos preços e reduzir o impacto inflacionário e o aumento do custo de vida junto às classes baixas e intermediárias.

Os dados do último censo agropecuário (2017) dão conta de que a agricultura familiar é responsável por nada menos que 70% da produção de feijão, 34% do arroz, 87% da mandioca, 60% do leite, 59% do rebanho suíno, 50% das aves e 30% dos bovinos. Vale lembrar que esta forma de agricultura representa 77% dos estabelecimentos rurais do país apesar de concentrar apenas 23% da superfície agrícola e absorver escassos 15% de todo o crédito disponibilizado para o financiamento das atividades agropecuárias. Diante destes números a retórica do Brasil “celeiro” do mundo se mostra algo deslocada quando vista sob o prisma da participação das grandes explorações.

O país que se jacta de seus feitos na produção de commodities assiste à estagnação na produção de produtos essenciais à cultura alimentar nacional, como ficou demonstrado no caso do arroz e do feijão. Destarte, uma pauta reduzidíssima de produtos exportados acarreta uma inserção subalterna do país na divisão internacional do trabalho. Mas há que sopesar também outros fatores.


Figura 8

Evolução da Produção total de Feijão - Brasil (em milhões de toneladas) Fonte: IBGE-SIDRA (2022)

Em primeiro lugar o fato de que essa febre das commodities, sobretudo no caso da soja, está associada ao processo de estrangeirização das terras, mediante o qual, grandes áreas passam a ser entesouradas pelo capital internacional. Em decorrência disso, há um forte impulso à especulação fundiária, à reconcentração da propriedade da terra e à expulsão de produtores familiares e comunidades tradicionais (quilombolas, indígenas, etc.). Em segundo lugar, não se pode olvidar o fato de que as commodities gozam de enormes favores e proteção do Estado tanto do ponto de vista do acesso ao crédito rural como de isenções fiscais. Com efeito,

[...] analisando as exportações de matérias-primas, o Brasil isenta, por meio da Lei Kandir, a exportação da matéria-prima bruta. Pagar imposto não é, em geral, um hábito comum aos ruralistas, como veremos, o que conduz a exportações de mercadorias sem nenhuma industrialização. Em outras palavras, o próprio Estado brasileiro incentiva essa forma de inserção do país nas relações comerciais globais. Com isso, não há outra interpretação que não seja da inserção regressiva e subalterna do Brasil no mercado internacional, somada à falta de estratégias para dinamização da economia nacional ou, em termo mais sociopolítico, à ausência de projeto nacional (Mitidiero Jr. e Goldfarb, 2021, p.8).

Estamos diante de mais uma verdade desconcertante. A vocação essencial do agronegócio não é a produção de alimentos, mas a geração de produtos agrícolas (em bruto) que são exportados sob condições extremamente favoráveis e contando com uma série de facilidades. As injunções políticas e o arco de alianças que suportam o discurso do “agro é tudo”, articuladas em torno à chamada Bancada Ruralista junto ao parlamento brasileiro, foi responsável por promover a maior liberação de agrotóxicos da história do país.

Nesse contexto, “o volume de vendas de agrotóxicos cresceu mais de 2,5 vezes entre 2006 e 2017, saltando de 204,1 mil toneladas para 541,8 mil toneladas de ingrediente ativo” (Valadares, Alves e Galiza, 2020, p. 7). E mais uma vez há um flagrante desconcerto no momento em que, à reflexão aqui proposta, agrega-se o fato de que:

Como os agrotóxicos são considerados insumos para atividade agrícola, assim como os fertilizantes, sementes, aviões para pulverização e maquinário, o gasto com a sua aquisição é abatido integralmente na apuração dos tributos sobre a renda (Imposto de Renda Pessoa Jurídica e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido). No mesmo estudo, Jensen e Novaes estimam uma desoneração anual da ordem de US$ 2 bilhões aos produtores rurais, tanto como pessoa física ou jurídica (Mitidiero Jr. e Goldfarb, 2021, p.26).

O discurso de que o agronegócio é um setor pujante, e que produz a riqueza do Brasil se desmorona diante estes números. A ópera farsesca do “Agro é tudo” segue sendo interpretada à luz do dia tanto no caso das aludidas campanhas publicitárias como em diversas arenas de debate público. É um paraíso ilusório dos que praticam a irreflexão através de estratégias diversionistas. Nesse sentido, vale dizer que:

A construção do agronegócio como mito contém um objetivo mais profundo, o de ocupar no imaginário coletivo uma posição muito parecida com a de um ídolo, tema que nos desloca surpreendentemente, por necessidade de análise de um arranjo de economia específico, para abordagem fundamentada nos domínios da teologia (Delgado e Leite, 2022, p.3).

Para além dos argumentos esgrimidos neste artigo resta o entendimento de que a dinâmica do agronegócio brasileiro se mostra absolutamente desconectada dos imperativos de nosso tempo. Há uma distância abissal entre a autoidolatria edificada pelas organizações patronais e seus apoiadores e a realidade em que estamos imersos. Se os dados e informações reunidos parecem contrariar a máxima de que o agro é produtor de riqueza, o que nos parece insofismável é o enorme afastamento deste padrão produtivo em relação aos princípios básicos que nortearam a construção dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.

Soja e milho não são propriamente alimentos. Em verdade representam insumos empregados numa grande cadeia de suprimentos que inclui a produção de rações consumidas na geração de proteína animal (carnes, leite, ovos, peixes) em cadeias operadas à escala global. Analogamente seria algo como uma grande montadora de veículos. Nesse sentido, atribuir a estas commodities agrícolas o status de alimento é tão absurdo como considerar que peças fabricadas em algum canto do mundo, a exemplo do pneu produzido na Malásia ou alhures seria o automóvel propriamente dito. Eis aí mais uma forma de exprimir a sinédoque política descrita por Caio Pompeia, o erro grotesco de tomar uma parte como se fosse o todo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os dados do 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no contexto da pandemia da Covid-19 no Brasil, realizado pela Rede Penssan são alarmantes. Em 2022 nada menos que 33 milhões de brasileiros não tinham absolutamente nada que comer. Em pouco mais de um ano, desde a primeira edição deste inquérito, 14 milhões de brasileiros passaram a integrar essa macabra estatística. Segundo a mesma fonte, mais da metade da população (58,7%) convive, em algum grau, com a insegurança alimentar. No âmbito rural nada menos que 60% dos domicílios estão imersos nessa condição.

O Brasil dispõe de 65 milhões de hectares de terra agricultável. Não obstante, vive um quadro de concentração extrema do solo agrícola. Nas chamadas áreas dinâmicas, regidas pelas monoculturas de exportação, emergem os chamados “desertos verdes”, imensas superfícies cultivadas em lugares onde ninguém reside. Muita gente sem-terra e muita terra sem gente. Não obstante, áreas imensas são moldadas segundo os interesses imperiais do agronegócio exportador, que se espraia sobre grande parte do território nacional e alhures (Paraguai, Uruguai) por agentes brasileiros.

Além do desmatamento para incorporação de novas áreas, do uso intensivo de agrotóxicos e de sementes transgênicas, dita expansão se dá em meio à expulsão de comunidades tradicionais em virtude do processo de grilagem da terra. Para que se tenha uma ideia, o Matopiba[6] (73,1 milhões de hectares) equivale ao tamanho da Alemanha. Mais recentemente a mesma dinâmica se impôs em outras unidades federativas brasileiras, fazendo surgir o Sealba uma nova fronteira agrícola que integra os estados do Sergipe, Alagoas e Bahia.

O Brasil do "agro é Tech, agro é Pop, agro é Tudo" discrepa frontalmente dos imperativos do desenvolvimento sustentável. A construção dessa retórica de glorificação de seus supostos êxitos não encontra sustentação nos fatos. A ideia do Brasil celeiro do mundo é uma obra de ficção. Nem mesmo consegue atender à demanda de produtos que são centrais para a dieta da população. Regimes despóticos se valem de truques demagógicos para conquistar as massas e edificar paraísos ilusórios. Nesse contexto, os últimos quatro anos não foram de aprofundamento democrático, senão de duros reveses e claros retrocessos.

Todavia, desde antes disso os meios de comunicação de massa e os formadores de opinião mostram uma glacial indiferença em relação aos impactos dessa agricultura produtivista que sacrifica o futuro do país, a vitalidade dos biomas, a proteção dos recursos naturais e a saúde da população em nome de interesses imediatistas e dos lucros dos grandes conglomerados. Mesmo entre partidos e instituições consideradas progressistas há grupos que comungam do aludido consenso das commodities, rendendo-se ao discurso ufanista e às estratégias mistificadoras. Ao elaborar esse artigo nossa intenção foi fomentar o debate e eludir a superficialidade que hodiernamente acompanha a reflexão em torno dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável. E se, de alguma forma, os argumentos aqui apresentados contribuem nesse processo, damos por sentadas as premissas que ensejaram a sua elaboração.

Agradecimentos

Este artigo não poderia ter sido realizado sem o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) através da concessão de bolsa de pesquisador ao primeiro autor do trabalho (processo nº 302862/2021-8).

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Notas

[1] Trata-se da conhecida obra “As formas elementares de vida religiosa - O sistema totêmico na Austrália (Durkheim, 1989).
[2] O processo de desindustrialização do Brasil é preocupante. Dados do IBGE (Pesquisa Industrial Anual, 2019) indicam que entre 2013 e 2019 o país perdeu nada menos que 28.700 empresas (8,5% do total) e 1,4 milhão de postos de trabalho. Em 1985 a indústria de transformação representava 24,5% da riqueza brasileira, passando para apenas 11,3% em 2019. Apesar do crescimento da importância das atividades agropecuárias, tal participação alcança, segundo a mesma fonte, escassos 8,3%.
[3] A população total ocupada nas atividades agropecuárias era de 16.567.544 pessoas segundo o Censo Agropecuário em 2006. O descenso aludido no artigo citado corresponde a 8,4% dez anos depois. Se comparamos o mesmo indicador com os dados relativos ao censo anterior (1995) o declínio ascende a aproximadamente 16%, o que mostra claramente a tendência de progressivo encolhimento da população ocupada na agropecuária.
[4] As grandes vinícolas gaúchas (Aurora, Salton e Garibaldi) tentaram se eximir da responsabilidade pelo crime usando o argumento de que a operação da colheita é terceirizada. Pouco tempo depois soube-se que o conglomerado Brazilian Food (BRF), resultante da fusão da Sadia e da Perdigão, opera através deste mesmo processo de arregimentação de trabalhadores no sul do Brasil, onde são recorrentes as denúncias de trabalho análogo à escravidão. Ver a propósito Headline (2023).
[5] No momento de finalização desse artigo científico surge a notícia de que no dia 31/01/24 dezoito trabalhadores argentinos resgatados de condições análogas à escravidão em uma propriedade rural de São Marcos (Serra Gaúcha), incluindo um adolescente de 16 anos. A ação foi executada por auditores fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Não nos parece um exagero afirmar que a escravidão é o sabor dos vinhos da Serra Gaúcha. Ver a propósito Brasil de Fato (2024).
[6] Matopiba é um acrônimo que designa uma imensa região que se estende por territórios de quatro estados do Brasil, formado com as primeiras sílabas dos nomes dessas unidades federativas: Maranhão (MA), Tocantins (TO), Piauí (PI) e Bahia (BA). Do mesmo modo, Sealba compreende outra fronteira que integra regiões de Sergipe (SE), Alagoas (AL) e Bahia (BA).


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