Dossiê

PERSPECTIVAS DA PESQUISA (AUTO) BIOGRÁFICA PARA A EDUCAÇÃO MUSICAL: Um exercício metanarrativo

(AUTO)BIOGRAPHICAL RESEARCH PERSPECTIVES FOR MUSICAL EDUCATION: A metanarrative exercise

Jéssica de Almeida 1
Universidade Federal de Roraima (UFRR) , Brasil

Revista Orfeu

Universidade do Estado de Santa Catarina, Brasil

ISSN: 2525-5304

Periodicidade: Semestral

vol. 7, núm. 1, 2022

revistaorfeu@gmail.com

Recepção: 27 Janeiro 2021

Aprovação: 07 Abril 2022



DOI: https://doi.org/10.5965/2525530407012022e0103

Autores mantém os direitos autorais e concedem à revista o direito de primeira publicação.

Resumo: Este artigo ensaístico tem o objetivo de refletir sobre perspectivas da pesquisa (auto)biográfica atravessadas por estudos por mim realizados nos últimos anos, através de um exercício metanarrativo. Nesse esforço, realizo contrapontos entre produções (auto)biográficas, seus fundamentos teórico-metodológicos e recentes ponderações epistemológicas possibilitadas pelo Movimento (Auto) biográfico da Educação Musical no Brasil. Especificamente, percorro alguns fundamentos da pesquisa-formação e da biografia educativa, bem como, percepções advindas de pesquisas realizadas com essas bases e de leituras recentes que, além de atualizarem a compreensão sobre formação e pesquisa científica, fundamentam um campo epistemológico potente para pensarmos, também, sentidos para a própria música. Com isso, almejo avançar na compreensão sobre o lugar da música na pesquisa (auto)biográfica e as potências desta última para pensarmos a formação humana com e através da música.

Palavras-chave: Biografia músico educativa, Pesquisa-formação, Educação Musical no Brasil.

Abstract: This essay article has the goal to reflect about the (auto)biographical research perspective crossed by studies I have been making through a metanarrative exercise over the last years. In this endeavor, I make antithesis among (auto) biographical productions, their theoretical-methodological foundations and recent epistemological ponderings enabled by Movimento (Auto)biográfico da Educação Musical no Brasil. Specifically, I go through some foundations on the training research and educational biography, as well as concepts arising from the researches made on these cores and from recent readings that in addition to update the comprehension about the development and scientific research, it substantiates in a powerful epistemological field so we can also think of music as its own senses. Thereby, I crave on advancing in the comprehension about the music place in the research on (auto)biographical and the potency of this last one so that we can think of the human development with and through the music.

Keywords: Musical-educational biography, Training Research.

Introdução

Recentemente, realizei a leitura de um artigo de Morais e Bragança (2021), aceitando o convite feito pela segunda autora, na ocasião de sua exposição Pesquisa (Auto)biográfica: dimensões epistemopolíticas e movimentos formativos[2]. No escrito, que percorre reflexivamente o caminho teóricometodológico de duas pesquisas, uma concluída há 10 (dez) anos e outra em andamento, enfatizam “os sentidos que unem de forma indissociável pesquisa e formação, a tessitura de fontes narrativas e os desafios da interpretação hermenêutica” (MORAIS; BRAGANÇA, 2021, p. 1) nos estudos (auto)biográficos em Educação.

Para tanto, realizam um exercício metanarrativo, que conversa ambas as pesquisas, conduzidos por questionamentos voltados, sobretudo, para os princípios da perspectiva (auto)biográfica, seus dispositivos metodológicos e interpretativos.

Ao finalizar a leitura, senti-me provocada a narrar polifonicamente, ou seja, projetando-me por meio de e para um coletivo de pesquisas que transversalizam minha formação e atuação nos campos da Educação Musical e Educação. Assim, a questão o que faz a música para a perspectiva (auto)biográfica e esta para a música pareceu resumir bem, pelo menos provisoriamente, a linha condutora e espinha dorsal para sustentar este exercício. Além disso, tal indagação tem sido uma das tônicas discutidas pelo Movimento (Auto)biográfico da Educação Musical no Brasil, do qual faço parte desde 2018.

Das pesquisas

Antes de iniciar esta conversa metanarrativa entre meus escritos e lidos, vale esclarecer as possibilidades que dela decorrem. A construção narrativa, ao qual me desafio neste ensaio, diz respeito às reflexões tecidas, e ainda em construção, sobre os estudos por mim realizados desde que me interessei pela pesquisa (auto) biográfica. Para além de uma narrativa sequencial sobre as construções teórico-metodológicas pelas quais me aventurei nos últimos anos, desafio-me a dialogá-las com novos estudos, ou mesmo, novas leituras sobre termos nocionais já conhecidos, que me geraram desestabilizações teórico-conceituais fundamentais para nessas construções avançar.

Nesse percorrer, revisito compreensões sobre formação, pesquisa-formação e biografia educativa, fundamentos da biografia músico-educativa, termo que tenho cunhado nos últimos anos, com vistas a ponderar sobre o lugar da música na pesquisa (auto)biográfica e as potências desta última para pensarmos a formação humana com e através dela.

Assim, inicio este exercício metanarrativo analisando a trajetória teóricometodológica[3] iniciada há cinco anos, quando realizei uma pesquisa-formação com professores de música que atuavam na educação básica buscando entender, com eles, como as relações com a música e o seu ensino se projetavam em suas práticas docentes (ALMEIDA, 2016, ALMEIDA; LOURO, 2016; ALMEIDA, 2019b). Com esse mesmo interesse, revisito os fundamentos da biografia músico-educativa, que se relacionam com a primeira pesquisa, lançando-me em um ensaio sobre como a continuidade desse estudo (ALMEIDA, 2019a, ALMEIDA; LOURO, 2019, ALMEIDA, 2020, ALMEIDA, 2021a, ALMEIDA, 2021b) permitiu filiar-me a uma corrente de pesquisa em Educação Musical que debate sobre o lugar da música na perspectiva (auto)biográfica, bem como os resultados decorrentes deste trilhar.

Da compreensão sobre pesquisa-formação a partir da pesquisa de mestrado

Em 2016, concluí pesquisa de mestrado que teve o objetivo de “compreender como diferentes experiências e relações com a música incidem na prática profissional de professores de música na educação básica” (ALMEIDA, 2016, p. 16). Já naquela época, suspeitava que diferentes experiências musicais produziriam formas singulares de pensar e conceber o ensino da música, uma vez que observava, entre meus colegas, práticas profissionais bastante distintas entre eles e com fortes cruzamentos com as relações estabelecidas com a música ao longo da vida. Compreendia que, para acessar essas relações e experiências, a pesquisa-formação seria uma via potente, pois projetava os participantes da pesquisa em um processo investigativo sobre suas histórias de vida sem perder de vista a temática que nos aproximava: a prática docente na educação básica.

Nesse sentido, ancorei-me em Josso (2010a) para sustentar a ideia de que seria possível, através da pesquisa-formação, uma conscientização sobre essas inter-relações por parte dos professores participantes, pois ela “contempla uma possível mudança de postura, ação e/ou visão sobre si, sobre o outro e sobre a profissão e todos os contextos envolvidos” (ALMEIDA, 2016, p. 23). Essa desestabilização, portanto, poderia potencializar tal conscientização. Para tanto, reuni os quatro professores participantes em dois pequenos grupos e planejei o encontro com cada um deles baseando-me nas etapas do trabalho biográfico apresentadas em Josso (2004). Com isso, explorava, pela primeira vez, algumas atividades da biografia educativa, que, mais tarde, se tornaria carro-chefe dos meus estudos e leituras.

Porém, optei por explorar essas atividades sem comprometer-me com a complexidade exigida ao assumir o procedimento biografia educativa para a realização dos estudos, decisão acertada, uma vez que o período para a realização de um mestrado não é ideal para alcançar o nível da maturidade teórica necessário para isso. Ainda assim, foi possível tornar o processo de investigação e reflexão sobre si acessível, confortável e com o distanciamento necessário para alcançar os objetivos propostos pelo trabalho. Nessa direção, considerando que conhecia, pessoalmente, Eli, Milton, Caetano e Nara[4], participantes da pesquisa, organizei rodas de chimarrão com cada uma das duplas, esperando, por meio de um encontro menos acadêmico, acessar os diferentes níveis do trabalho biográfico por meio de conversas conduzidas pela troca, pela partilha informal, flexível, e não, necessariamente, pelo seu conteúdo (categorias previamente pensadas, por exemplo) e formato.

De fato, experimentei uma forma diferenciada de conceber e realizar uma pesquisa acadêmica:

Das relações entre música e docência, navegamos em rios desconhecidos uns para os outros. Momentos de infância foram lembrados, personagens se personificaram nas tramas da memória. Mais uma vez, a pesquisa não era mais minha, e sim de todos nós [...]

A multiplicidade de rumos para as conversas é compreensível. Embora os quatro participantes se conhecessem, a ocasião do encontro para a pesquisa marcou a primeira vez que conversaram frente a frente sobre assuntos tão emergentes no desenvolvimento de suas carreiras: a escola e as diretrizes para o ensino da música, contextos de ensino, alunos, desafios da prática, experiências que deram certo (e não deram certo) (ALMEIDA, 2016, p. 38-39).

Porém, ao revisitar os fundamentos da pesquisa-formação, entendo que a sua realização extrapola (ou deveria extrapolar) os limites da pesquisa científica e adentra, prioritariamente, os contextos de formação, seja inicial, continuada ou permanente, potência que não foi devidamente explorada pela pesquisa de mestrado dados os seus limites, especialmente de tempo, para realização. Ou, melhor, compreendo a pesquisa-formação em um continuum que nasce de uma necessidade formativa, portanto, indagativa, para uma compreensão mais apurada sobre si mesmo, sobre os temas que advêm dessas indagações. Esses, por sua vez, demandam contextualizações e explanações que avançam para os conhecimentos ditos acadêmicos. Nesse trilhar investigativo, abre-se a possibilidade para que novos ou renovados saberes-fazeres emerjam.

Esse entendimento, que é resultado do exercício metanarrativo ao qual me desafio neste ensaio, ancora-se nos próprios fundamentos da pesquisa-formação. Isso porque, segundo Josso (2010a, p. 125), ela é “uma metodologia de abordagem do sujeito consciencial, de suas dinâmicas de ser no mundo, de suas aprendizagens, das objetivações e valorizações [...]”. A autora, dando continuidade ao argumento, reitera que é a formação dos participantes, vista como um processo, o espaço-tempo da pesquisa-formação.

Tal indissociabilidade entre pesquisa e formação, inclusive, tem sido debatida recentemente por autores como Bragança (2018), Motta e Bragança (2019), Vieira e Bragança (2020),Bragança, Prado e Araújo (2021), Morais e Bragança (2021), entre outros, que preferem a grafia pesquisaformação para representar, entre seus argumentos, uma “escolha teoricometodológica, política e epistemológica” (MORAIS; BRAGANÇA, 2021, p. 6). Os autores explicam que a união entre essas “palavras-conceitos” em seus escritos “é recente (BRAGANÇA, 2018) e aponta para a assunção de uma indissociabilidade radical entre as dimensões de pesquisa e de formação presentes nos trabalhos” por eles realizados.

Nesse sentido, pensamos que a pesquisaformação “[...] no processo de compreensão dos sentidos formativos, plasmados em cada história narrada, não acontece apenas para quem academicamente pesquisa. Acontece, também, para quem, reflexivamente, narra” (MOTTA; BRAGANÇA, 2019, p. 1044) (MORAIS; BRAGANÇA, 2021, p. 7).

Com esse entendimento e em direção semelhante, retomo três objetivos da pesquisa-formação, comuns às pesquisas-ações, apontados por Josso (2010a) que corroboram com esta compreensão: o valor de uso do saber construído, a implicação dos colaboradores e a produção do saber e sua legitimidade. Esses três elementos, inclusive, inscrevem a pesquisa-formação no cenário (e aposta) epistemo-político das perspectivas (auto)biográficas e me auxiliaram a refletir sobre o lugar da música nessas produções (de si, ou mesmo de pesquisas) intersubjetivas. O primeiro objetivo da pesquisa-formação refere-se à articulação entre “a perspectiva de conhecimento e a perspectiva de mudança numa mesma sequência temporal” (JOSSO, 2010a, p. 102). Ou seja, não só assume e entende que o conhecimento resulta de uma conscientização sobre o espaço-tempo da formação que se inscreve na vida como torna a própria vida, a práxis, o centro do conhecimento. O segundo objetivo refere-se à implicação dos colaboradores, visto que a pesquisa-formação altera “a divisão social do trabalho entre os pesquisadores como especialistas em produção do saber e os atores sociais como objetos ou suportes dessa produção” (JOSSO, 2010a, p. 103). Essas fronteiras porosas, para não dizer dissolvidas, carregam o potencial de modificar as relações de poder entre os envolvidos no processo ou, ao menos, tornar essas relações visíveis para que os sujeitos as modifiquem, se assim desejarem, já que isso “só é possível na medida em que os participantes transformam sua relação com o saber e se apropriam dos procedimentos técnicos concebidos em adequação à situação [...]” JOSSO, 2010a, p. 103).

Por fim, o terceiro objetivo da pesquisa-formação, fortemente atrelado aos dois primeiros, trata da produção do saber e de sua legitimidade.

Segundo Josso (2010a), se o saber elaborado na pesquisa-formação, previamente acordado entre os participantes, encontra sua legitimidade na eficácia frente aos objetivos fixados, os participantes se preocupam com as condições de conhecimento possível no contexto dessa prática. A referida autora pauta-se na filosofia, sobretudo na fenomenologia husserliana mediada por Ricoeur (1986) e, depois, na abordagem científica e filosófica de Gonseth (1973; 1975), para aprofundar este último objetivo tratando de duas ideias que circundam a pesquisa-formação: a intersubjetividade e a experiência.

A primeira entende que “quaisquer que sejam as condições sociais de exercício, o ato de conhecimento só existe pela prática dos sujeitos individuais” (JOSSO, 2010a, p. 104). Nesse sentido, a pesquisa-formação que, segundo a autora, não é nem mais, nem menos legítima que outra forma de elaboração de conhecimento, evidencia “um nós, num espaço-tempo escolhido entre os possíveis” (p. 107).

Essa primeira ideia é complementada por Josso em Gonseth (1973; 1975), cujos conceitos de referencial e idoneísmo a encorajaram em suas escolhas metodológicas, dado que “esta opção é acompanhada de uma abertura à experiência como processo de pesquisa. Gonseth permitir-me-á, pois, a passagem ao conceito de experiência como prática de conhecimento e de formação [...]” (p. 107).

Nesse ponto, a discussão dos objetivos da pesquisa-formação elucida, também, a compreensão do próprio conceito formação. Ao discutir este conceito, abordei a formação pela experiência através de uma reflexão sobre os últimos dois momentos promovidos pela biografia músico-educativa (ALMEIDA, 2021a). A partir de Larrosa (2016), para o qual a experiência é, fundamentalmente, transformadora, complementei este entendimento com Passeggi (2011), que reforça o sentido de perigo e de afeto a partir da discussão sobre os termos alemães erlebnis . erfahrung[5].

Ora, se “a formação é experiencial ou então não é formação [...]” (JOSSO, 2010a, p. 48 – grifos da autora), a pesquisa-formação, ao questionar o valor de uso do saber construído, por potencialmente modificar a implicação e a relação de seus participantes e ao reposicionar, de certa forma, a produção do saber e a sua legitimidade, fortalece-se, justamente, em um sentido de formação que é, todo, experiência (de um passado pensado no presente e potencialmente projetado em um futuro). Assim, metodologias de pesquisa-formação, como a biografia educativa (e biografia músico-educativa), podem, por meio da reflexão e implicação intersubjetiva necessárias para o seu desenvolvimento, promover não só um alargamento das aprendizagens adquiridas ao longo da vida, como repensá-las “a partir das descontinuidades da existência, das transformações (retomando o sentido de experiência), intervindo como uma retomada do curso da vida” (ALMEIDA, 2021a, p. 108). Isso porque “a formação depende do que cada um faz do que os outros quiseram, ou não quiseram, fazer dele” (DOMINICÉ, a partir de Jean Paul Sartre, 2010a, p. 95 – grifos do autor).

Esse entendimento orgânico de formação e de que maneira ele se configura a partir da práxis só foi devidamente compreendido por mim, porém, a partir do estudo teórico-metodológico do procedimento biografia educativa, que fundamentaria, depois, a biografia músico-educativa. É sobre isso que trato, brevemente, na próxima seção.

Da biografia músico-educativa às percepções da música na construção narrativa

Durante o doutorado, defendi a hipótese de que a elaboração e o estudo de biografias músico-educativas no ensino superior desencadeariam a conscientização sobre as inter-relações entre experiências pessoais e experiências acadêmico-formativas e delineariam novas perspectivas sobre processos formativos (ALMEIDA, 2019). Esse interesse, naturalmente, originou-se da pesquisa-formação realizada no mestrado, especialmente, da leitura sobre o potencial da biografia educativa como metodologia de pesquisa e formação (DOMINICÉ, 2000, 2010b, JOSSO, 2010a, 2010b, 2010c).

Também tinha interesse pessoal em realizar a pesquisa, pois, em 2017, fui afetada pelas narrativas de meus alunos no ensino superior. Sobretudo, incomodava-me o fato de existir, segundo percepções iniciais, certas fronteiras entre o que se ensinava no contexto acadêmico e as experiências que eu ouvia nessas narrativas. Esse distanciamento parecia ter uma influência direta no quanto aprendiam ou não aprendiam na universidade, portanto, a biografia educativa foi o caminho escolhido para tentar trazer os alunos para o centro da formação. Isso porque não apenas busca “compreender os sujeitos em seus cotidianos passados e atuais” (ALMEIDA, 2019, p. 125) como permite conhecer, segundo Dominicé (2000), uma verdadeira teia de vida em que as pessoas se afetam e se movimentam em contextos sociais.

Além disso,

[...] oferece a possibilidade de empoderamento individual, tendo em vista a interpretação colaborativa e contextual de suas narrativas. Por esse motivo, entendo a biografia educativa como uma experiência capaz de promover autonomia à formação dos indivíduos, torná-los sujeitos-autores (e atores) de sua própria trajetória acadêmica e profissional [...] (ALMEIDA, 2019, p. 125-126).

Esperava, com isso, certa mudança de perspectiva sobre os processos formativos com a música, seja em contextos institucionais ou em contextos não institucionais. Isso porque, segundo Dominicé (2000, p. 4 – tradução minha[6]), a biografia educativa “pode ajudar os adultos a entender melhor seu próprio processo de aprendizagem [...] eles entendem até que ponto a aprendizagem em muitas situações diferentes é uma busca ativa por significado” e que, ao colocarem-se no centro da investigação (a práxis como objeto de pesquisa-formação) “são ajudados a aceitar que eles têm suas vidas em suas mãos, mesmo quando eles também reconhecem que o curso de sua vida e seu aprendizado relacionado estão sujeitos a muitas influências” (DOMINICÉ, 2000, p. 4 – tradução minha[7]).

A inclusão da música no procedimento, inicialmente, partiu da necessidade de aproximação com o contexto da pesquisa. Primeiramente, porque algumas das atividades da biografia educativa exploradas, por mim, em um estudo piloto, acabaram interferindo e formatando as narrativas dos alunos participantes, que buscavam se adequar às minhas expectativas, enquanto pesquisadora. Em segundo lugar, suspeitava que a música possibilitaria uma forma narrativa diferenciada, mais próxima dos participantes da pesquisa, o que de fato ocorreu – abordarei sobre isso, especificamente, na última seção deste artigo.

Além disso, percebi que o que eu buscava, com as narrativas de si, aproximava-se do que outras pesquisadoras do campo da Educação Musical vinham tecendo há mais de duas décadas: aos estudos de Maria Cecília de Araújo Rodrigues Torres, por meio das autobiografias musicais (TORRES, 2003; 2004) e (auto) biografias musicais (TORRES, 2017) e aos escritos sobre musicobiografização, de Delmary Vasconcelos de Abreu (2011a, 2011b, 2011c, 2015). Foi essa busca que me aproximou, inclusive, do Movimento (Auto)biográfico da Educação Musical, que será apresentado em seguida.

De forma resumida, inicialmente compreendi que o que diferenciava a biografia músico-educativa de outras metodologias de pesquisa e formação estudadas em Educação (ABRAHÃO, 2011; DELORY-MOMBERGER, 2006; JOSSO, 2010b; NACARATO; PASSEGGI, 2013; PASSEGGI, 2002; PERES, 2008; 2010; 2011) incluindo a biografia educativa, era, naturalmente, “[...] a memória centrada na música. Aquela que marca, que transforma, que leva a vida para outros rios, que desenha modos de ser músico, ser estudante de música e professor de música” (ALMEIDA, 2019b, p. 102). Além disso, tomei como premissa que cada elemento desses daria acesso a distintos significados para a música, a tradições e relações com ela, que seriam refletidos e analisados pelos participantes através de suas atividades. Com isso, visava, por um lado “conscientizar os sujeitos de suas trajetórias formativas com a música” e, por outro, “um alargamento das interpretações sobre as músicas da vida para além de seus aspectos técnico-musicais” (ALMEIDA, 2019b, p. 102).

De fato, algumas das contribuições pontuadas por autores da Educação que desenvolveram procedimentos de pesquisa semelhantes aos meus foram percebidas, também, na biografia músico-educativa, entre elas: a harmonização entre espaço-tempo individual e o espaço-tempo social (DELORY-MOMBERGER, 2006; NACARATO; PASSEGGI, 2013) e a conscientização sobre processos que podem provocar mudanças importantes na dinâmica de vida dos sujeitos (JOSSO, 2010b; PASSEGGI, 2002). Isso foi possível graças ao estudo do conteúdo das narrativas por meio das categorias que compõem os três níveis da Espiral Retroativa do Caminho para Si[8](JOSSO, 2010a).

Em seu primeiro nível, foi possível identificar “o processo de formação tal qual os sujeitos narraram, destacando as experiências que se tornaram significativas para a compreensão sobre o que cada sujeito se tornou” (ALMEIDA, 2019a, p. 176). Para os participantes, esta etapa foi vista como um desbravamento de uma história, por vezes, silenciada. Já no segundo nível, que estuda os processos de conhecimento, os participantes foram confrontados pelas suas próprias narrativas por meio do encontro com a narrativa do outro e de minhas intervenções, como pesquisadora. Com isso, caminhou-se de uma narrativa de si para uma narrativa de nós, entrelaçada e coletiva. Foi nesta etapa que as relações entre experiências narradas e experiências formativas no âmbito acadêmico, bem como, em alguns casos, sua conscientização, ficaram mais evidentes.

Por fim, a análise, em seu último nível, buscou a interpretação sobre como as biografias músico-educativas, de fato, estreitariam as inter-relações entre experiências pessoais e experiências acadêmico-formativas, fundamento de minha hipótese de pesquisa. Assim, estudei os gêneros das aprendizagens pontuados por Josso (2010a) em uma tripla temporalidade: “de um tempo-espaço pintado em suas histórias de vida relacionado ao presente, sobretudo às suas formações acadêmicas e, em alguns casos, ao futuro, quando configuram sonhos, expectativas e visões sobre ser-professor e ser-músico [...]” (ALMEIDA, 2019a, p. 180).

Porém, como uma pesquisa voltada para processos formativos que, apesar de partirem da música, não focavam somente nela, os resultados apontam para os sentidos de processos formativos produzidos pelas biografias músico-educativas, entre eles,

• que “os processos formativos acadêmicos ganham sentido a partir das experiências de aprendizagem musical nos contextos religiosos e nas aprendizagens musicais” (ALMEIDA, 2019a, p. 9), fora de contextos institucionalizados;

• que as aprendizagens e conhecimentos mais práticos adquiridos ao longo da vida “por vezes são silenciados, sobretudo quando contestados a partir do contato com conhecimentos mais formalizados, institucionalizados” (ALMEIDA, 2019a, p. 9); e

• que “os conhecimentos na formação, as aprendizagens e os conhecimentos compreensivos e explicativos”, mesmo quando não conscientizados, atuam como “refúgios, nos quais buscam subsídios para entender o quanto sabem, ou não sabem, na graduação” (ALMEIDA, 2019a, p. 9).

Para além dos resultados, após concluir a pesquisa de doutorado, refletindo sobre como as narrativas foram construídas para que essas considerações fossem acessadas (ALMEIDA, 2021a, 2021b), sobretudo, lembrando-me do engajamento dos participantes na pesquisa-formação, não pude deixar de justificar esses resultados positivos, entre outros elementos da biografia músico-educativa, à música, de certa forma.

A partilha de uma narrativa musical, atividade integrante do segundo momento da biografia músico-educativa[9], revelou dois (bastante próximos) espaços ocupados pela música em sua organização:

a manifestação musical como símbolo, representação de um todo: isso ocorreu, por exemplo, quando uma das participantes narrou sua história de vida na música repousando a mão em um livro de hinos. O simbolismo do livro de hinos foi perceptível quando a narradora abordou os sentidos da música em sua vida, estreitamente vinculados ao valor da música nas cerimônias religiosas. Sua narrativa se estruturava na partilha de algumas provações . desafios vivenciados em sua trajetória de educação musical e no quanto a música, sobretudo gospel, incluindo hinos do livro, a incentivava a perseguir o sonho de cursar licenciatura em música através de suas letras edificantes.

foco nas letras das músicas: a maioria dos participantes acabou ancorando suas narrativas, em dado momento, em letras de músicas. Provavelmente, devido à proximidade entre esse conteúdo e a atividade solicitada – uma narrativa verbal. A música, por meio da letra, permitia ao narrador explicar os impactos de determinada experiência em suas vidas, como se a letra, por si, fosse capaz de interpretar por eles os seus sentidos. Isso foi perceptível, por exemplo, durante a narrativa de um dos participantes que

relatou uma história de vida que se relacionou diretamente com a canção Bola de meia, bola de gude (Milton Nascimento) e, no final de sua narrativa, cantou e tocou a canção – a lembrança de um contínuo retorno ao menino, às relações que ele estabeleceu com a música desde a adolescência (ALMEIDA, 2021b, p. 181)

Essa percepção inicial foi alargada em estudos posteriores, sobretudo, através de minha participação no Movimento (auto)biográfico da Educação Musical no Brasil, o que permitiu novas leituras e partilhas com pesquisadoras do campo da Música que também se questionavam sobre o lugar da música nas perspectivas (auto)biográficas. Sobretudo, senti-me mobilizada a estudar outras potências da música na narrativa, para além daquelas percebidas na realização de minha pesquisa de doutorado. Provocada, além disso, por críticas às narrativas musicais (um possível distanciamento da música enquanto linguagem), passei a questionar, por exemplo, se a biografia músico-educativa poderia explorar narrativas não-verbais, antes do recurso verbal, e de que maneira essas possíveis interpretações difeririam daquelas possíveis pela escrita e oralidade.

Ao participar do referido Movimento, vi que outras pessoas percorriam questionamentos semelhantes e que nos encontrávamos, frequentemente, nas ponderações sobre o lugar da música na perspectiva (auto)biográfica e desta nas temáticas estudadas pelo campo da Música. Assim, compartilho, a seguir, reflexões decorrentes desse encontro polifônico, essencialmente coletivas e partilhadas esperando, com isso, contribuir com alguns direcionamentos teóricos resultantes dessas reflexões.

Movimento (Auto)biográfico da Educação Musical no Brasil

Em 2018, participei do VIII Congresso Internacional de Pesquisa (Auto) Biográfica (VIII CIPA) e apresentei a comunicação intitulada O método biográfico e a formação de professores: um recorte do contexto brasileiro, assinada com a minha orientadora, na época, professora Ana Lúcia Louro. Além das pertinentes pontuações dos colegas que assistiram à exposição, sobretudo, incentivando-me a debruçar-me sobre os períodos identificados no campo da pesquisa (auto) biográfica brasileira[10], compartilhados na ocasião, para publicação em artigo científico, o Congresso marcou-me por outras duas razões.

Primeiro, porque foi perceptível o cenário emergente e aberto para novos direcionamentos teórico-metodológicos das perspectivas (auto)biográficas, segundo, porque me encontrei com outras pesquisadoras da Educação Musical e, ao acompanhar os debates a partir de suas exposições, notei um grande interesse dos demais pesquisadores, alheios à área, nas pesquisas (auto)biográficas com e por meio da música. Além disso, firmamos, no CIPA, o compromisso de nos reunirmos para debatermos nossas pesquisas dali para frente.

No ano seguinte, em maio de 2019, Delmary Vasconcelos de Abreu criou um grupo no whats app com pesquisadoras (auto)biográficas da Educação Musical[11] e, com isso, passamos a compartilhar estudos, leituras e produções. Naquele ano, inclusive, algumas de nós reuniu-se novamente, na ocasião do XXIV Congresso Nacional da Associação Brasileira de Educação Musical (ABEM), e planejamos, dali para frente, atividades conjuntas visando o fortalecimento da perspectiva (auto) biográfica no campo da Música.

Desse interesse conjunto nasceu o Movimento (Auto)biográfico da educação Musical no Brasil. Ampliando as ações do Movimento, cadastrei, junto à Universidade Federal de Roraima (UFRR), um projeto de extensão com o mesmo nome para divulgar, registrar e certificar as suas atividades. O objetivo da extensão foi “desenvolver ações de estudo, pesquisa, debate e divulgação do movimento (auto)biográfico da educação musical no Brasil”. Para tanto, propus a realização de estudos sistematizados no âmbito de cada grupo de pesquisa envolvido[12], liderado por membros do Movimento[13] e, posteriormente, entre os nossos grupos, bem como a realização de webinários sobre temáticas sobressaídas dos estudos realizados nas primeiras atividades. Cabe ressaltar que apesar do registro e da coordenação vincularem-se à UFRR, apoiada pela UDESC, todas as atividades foram planejadas e acordadas entre as professoras que integravam o Movimento na época.

Para além das atividades previstas na extensão, o Movimento reunia-se periodicamente, o que resultou, também, na proposição e aprovação do Grupo de Trabalhos Especiais 8, no XXV Congresso Nacional da ABEM[14], e da presente proposta de dossiê, nesta Revista, além da apresentação de dois simpósios nacionais[15], dos 9 aprovados, no IX CIPA, em 2021. Foi comum, igualmente, o convite e a participação em bancas de mestrado e doutorado de alunos das integrantes do Movimento, bem como a participação dos membros em aulas específicas em disciplinas dos programas de pós-graduação dos quais fazemos parte.

Essa intensa agenda de atividades impactou diretamente pesquisas e estudos sobre a abordagem (auto)biográfica das áreas Música e Educação, alguns comunicados no referido Congresso da ABEM (MARQUES; PEDROLLO; MADEIRA, 2021; PEDROLLO; MATEIRO; MARQUES; MADEIRA, 2021; MADEIRA; MARQUES; PEDROLLO; MATEIRO, 2021; CRUZ; ALMEIDA, 2021 e outros). Particularmente, destaco as leituras realizadas, principalmente, aquelas que se referiram aos aspectos teóricos, políticos e metodológicos da pesquisa (auto)biográfica (PASSEGGI, 2021, 2020a, 2020b, 2016 PASSEGGI; SOUZA, 2016 e outros) e os webinários[16], que fundamentaram as ponderações apresentadas a seguir.

Sobre a música na perspectiva (auto)biográfica

Para iniciar esta subseção, é importante frisar que as reflexões sobre as interfaces entre música e pesquisa (auto)biográfica se encontram com as considerações já apresentadas sobre pesquisa-formação e biografia músico-educativa em dois pontos: nos princípios e encaminhamentos teórico-metodológicos da pesquisa (auto)biográfica, sobretudo, das narrativas (auto)biográficas, que sustentam apostas do paradigma (auto)biográfico (PASSEGGI, 2017, 2020a; 2020b, e outros) e os que, ainda que dentro deste primeiro, abordam especificamente a reflexividade narrativa e as possibilidades transformadoras que dela decorrem (PASSEGGI, 2021, PASSEGGI, 2020b).

A mudança na forma de conceber e fazer pesquisa por meio deste “retorno do sujeito” configurado na pesquisa-formação, ainda mais visível ao revisitarmos os seus três principais objetivos, se inscreve em uma mudança paradigmática no campo da pesquisa denominada giro linguístico ou giro discursivo, que inverte as “relações entre pensamento/cognição e linguagem” (PASSEGGI; SOUZA, 2016, p. 9). Nesse sentido, uma nova episteme é proposta por meio dos “estudos com as histórias de vida em formação e as narrativas autobiográficas [...]”, emergida “de uma reflexão sobre a experiência narrada, assegurando um novo posicionamento político em ciência, que implicam princípios e métodos legitimadores da palavra do sujeito social” (PASSEGGI; SOUZA, 2016, p. 11).

Especificamente no âmbito da formação, o movimento histórias de vida em formação[17], na década de 1980, adentraria o campo investigativo e formativo para explorar “’o continente obscuro da autoformação ao longo da vida’ e de coinvestir em saberes experienciais na validação da experiência adquirida e na (re) construção de projetos de vida” (PASSEGGI, 2020a, p. 61-62) servindo, portanto, principalmente para quem se forma. Nesse sentido, a autora destaca a pesquisa-formação como uma das grandes contribuições do movimento.

Essa potência possibilitada pelas abordagens (auto)biográficas é problematizada e bastante estudada por Passeggi, especialmente nos últimos anos (PASSEGGI, 2017, 2020a; 2020b, 2021). Em um de seus artigos sobre a pesquisa (auto)biográfica em Educação, publicado em parceria com Elizeu Clementino de Souza, questiona, por exemplo, o conhecimento gerado “com base nessas narrativas de si” e “qual é a sua relevância para a investigação científica no que concerne os conhecimentos humanos e sociais” (PASSEGGI; SOUZA, 2016, p. 9). Nessa busca, Passeggi vem delineando o que tem chamado de apostas ou dimensões do paradigma narrativo-autobiográfico, que parecem avançar no sentido de superar o dilema imposto à pesquisa (auto)biográfica em Educação de:

[...] ou acomodar-se aos padrões existentes do conhecimento dito científico ou, ciente da especificidade epistemológica do conhecimento que ela produz, contribuir para a construção de novas formas de se conceber a pessoa humana e os meios da pesquisa sobre ela e com ela (PASSEGGI; SOUZA, 2016, p. 9).

Na aposta epistemopolítica, Passeggi (2020a, p. 70) apresenta as ideias de Pineau e LeGrand (2012) que sugerem que por meio desse neologismo reconhece-se e legitima-se a capacidade humana “de fazer uso da reflexividade autobiográfica sobre o que acontece e o que nos acontece”, uma vez “que a epistemologia deve ser indissociável de uma visão política na pesquisa educacional”. Nesse contexto, destaca a educação conscientizadora ou libertadora de Paulo Freire e a ideia de que a formação serviria, primeiro, para quem se forma, defendida por Dominicé (2010a). Assim, para ela,

[...] a pesquisa educacional serve primeiramente para quem narra e para quem pesquisa pela interação dialógica entre eles, o mundo da vida e a sistematização científica. Só depois é que esse conhecimento serve para a ciência e a comunidade científica [...] (PASSEGGI, 2020a, p. 70).

Em seguida, defende a tese de que “o centro da pesquisa é essa interrogação sobre a conectividade entre a pessoa (auto), a vida (bio) e o discurso das ciências (grafia)” (PASSEGGI, 2020a, p. 70), aproximando a primeira aposta da segunda, decolonizadora, igualmente política.

Ao sustentar esta última, dialoga as ideias de Bruner (1997), para o qual a produção do conhecimento provém dos modos de pensamento paradigmático (lógico-científico) e narrativo (subjetivo), com as de Boaventura de Sousa Santos (2002) e, assim, considera que o “paradigma narrativo-autobiográfico adota fundamentalmente o modo narrativo e se caracteriza como uma epistemologia do Sul, pela legitimidade e respeito a quem narra [...]” (p. 71) oportunizando que se aprenda com esse Sul.

Na aposta pós-disciplinar, por fim, Passeggi (2020a, p. 72) apresenta, a partir de Ferrarotti (2014), que “o ser humano constrói um conhecimento global e holístico sobre si mesmo e sua sociedade”, logo, “o caráter de globalidade da narrativa autobiográfica é subjacente à inteireza do humano que a ciência fragmenta para estudá-lo” e que a reflexividade autobiográfica faz apelo a esta mirada pós-disciplinar.

Assim, ao sustentarem as bases da perspectiva (auto)biográfica em Educação, essas três apostas frutificam, também, direções para pensarmos a música nesse contexto. Primeiro porque ao buscar-se instrumentos heurísticos e metodológicos onde os conhecimentos são delineados, ou seja, na própria vida, no cotidiano, a música (sobretudo os sons, para além da letra), enquanto linguagem, permite-se, talvez, falar pelo/com o sujeito, narrar o que a linguagem verbal não alcançou ou, talvez, comunicar o próprio sujeito.

Em segundo lugar, entendendo que a pesquisa, com essas abordagens, serve primeiro para quem se forma, temos um encontro com o sentido de música que extrapola a sua compreensão puramente técnica. Logo, é necessário buscar um sentido para a música, emprestando as palavras de Inês Bragança[18], como um limiar aberto e poroso que se expressa e extravasa em vários sentidos. Um conceito aberto que abriga a complexidade da música na vida das pessoas – que serve para quem a faz e para quem a ouve, em toda sua riqueza de práticas, comportamentos e sonoridades, envolta de uma diversidade de conhecimentos e formas de concebê-la, comunicá-la, praticá-la e interpretá-la. Isso exige olharmos para a música como olhamos para um si, retomando as palavras de Abrahão[19], visto que seu entendimento, para os sujeitos, também é construído na alteridade, por meio da narrativa. Com isso, entendo que a música carrega a potência de uma perspectiva (auto)biográfica por constituir-se um campo de sentidos e interpretação – para a realidade, para os sons, para a educação musical, para a música, em si – onde os sujeitos se entendem, compreendem e analisam suas histórias de vida pela música e na música. A pesquisa (auto)biográfica, para a música, oferece meios para que isso ocorra de forma sistemática e potencialmente consciente e que, assim, contribua em processos de autonomização e emancipação dos sujeitos em formação com e pela música.

Nesse contexto, a biografia músico-educativa, com base nos pressupostos teóricos da biografia educativa, mobiliza, justamente, esse narrar a partir da música, pela música e para a música e seus processos formativos. Ou seja, do que ela provocou, do que ela rememorou e significou pela música (através de narrativas musicais, da performance, de narrativas com música – sem esquecer da provocação trazida por Claudia Bellochio a um dos webinários[20], sobre a própria musicalidade da fala, da voz) – e para a música e seus processos formativos (nossos comportamentos, fazeres e saberes musicais e pedagógicos).

Enquanto um procedimento de pesquisa-formação, a biografia músico-educativa opera, justamente, na investigação de uma narrativa (auto)biográfica (feita da música, pela música e para a música/educação musical) planejada para permitir uma reflexividade narrativa, sendo esta a capacidade do sujeito operar por meio das linguagens (neste caso, também a musical) versões de si (e de si na música) e de dar sentido às suas experiências e, com isso, ao seu processo formativo na e pela música.

Esse processo retrospectivo, prospectivo e introspectivo que abraça passado-presente-futuro, que é trabalhado através da mediação e que exige dos narradores um esforço biográfico para transitar nessas diferentes versões e perspectivas de si (a reflexividade narrativa), resulta em um processo de musicobiografização[21].E é neste processo complexo que está o potencial formativo da pesquisa (auto) biográfica para a música.

Por fim, o que busquei compartilhar, por meio deste exercício narrativo foi uma reflexão guiada por questionamentos que têm me movimentado há um tempo: como poderia o sujeito nadar nessas águas alimentadas por afluentes tão plurais sem se deixar banhar, ainda que um pouquinho, por cada um deles? Será que a narrativa (auto)biográfica trabalhada pela biografia músico-educativa não poderia contribuir para alimentarmos as noções de música que cada um carrega consigo e que, muitas vezes, reverbera em nossa compreensão sobre a música e o seu ensino? Será que a música, para a pesquisa (auto)biográfica, não seria, justamente, uma linha subjetiva (entre outras possíveis) que conecta o ser humano à narrativa? Que, assim como a fotografia e as artes visuais, evoca não apenas lembranças sobre cenas como, também, sensações, afetos, cheiros, cores, movimentos e, claro, sonoridades? Esses são questionamentos não respondidos pelo presente ensaio e que demandam estudos continuados e, preferencialmente, polifônicos daqui para frente. Aliás, a potência desses questionamentos está mais no percurso a ser trilhado em busca de possíveis respostas do que nas respostas, em si.

Ainda assim, entendo que este ensaio, ao revisitar pressupostos teóricos e metodológicos que me acompanham nos últimos anos, com um olhar renovado pelas atividades do Movimento, pode avançar as discussões sobre música e abordagem (auto)biográfica, justamente, pela sua incompletude... pelas possíveis provocações deixadas em aberto.

Considerações provisórias

Ao realizar este exercício metanarrativo, essencialmente polifônico, parti de compreensões e ideias circundantes à questão o que faz a música para a perspectiva (auto)biográfica e esta para a música que, no final do exercício, gerou ainda mais questionamentos, conforme apresentado na seção anterior. Entendo que esta seja a potência desse tipo de reflexão ancorada em leituras e produções científicas: justamente, a abertura para novas indagações que nos mantêm em movimento. Movimento, este, que só existe pela via coletiva, pois demanda reverberações, novos olhares e leituras.

Nesse sentido, reforço, mais uma vez, o momento histórico vivido por pesquisadoras e pesquisadores do campo da música que se aventuram por caminhos (auto) biográficos e participaram do Movimento (Auto)biográfico da Educação Musical no Brasil. Não só nos reunimos para debater temáticas de interesse comum, como nos permitimos conversar estudos e termos nocionais (como narrativa musical, biografia músico-educativa e musicobiografização) para, conjuntamente, tecermos possibilidades para a música nas abordagens (auto)biográficas.

Particularmente, escolhi revisitar minhas pesquisas, de mestrado e doutorado, bem como continuações dessas em publicações posteriores, para costurar ideias que tenho, hoje, que poderiam contribuir com o avanço da discussão da pergunta-central supracitada. Assim, ao abordar a pesquisa de mestrado, que já nasceu da percepção de que diferentes experiências musicais poderiam resultar em formas distintas de pensar e conceber o ensino da música, retomo o conceito de pesquisa-formação.

Esse reencontro partiu de suas características principais, que permitem compreendê-la “como um paradigma não aplicacionista em educação” (PASSEGGI, 2016, p. 75), ao trabalhar a temporalidade das aprendizagens adquiridas ao longo da vida “e admitir que as aprendizagens se fazem em todos os ambientes e nos mais diversos aspectos da vida (lifewide learning)” (PASSEGGI, 2016, p. 75), tornando o seu centro de pesquisa e formação a “experiência do sujeito biográfico”. É justamente desta “virada biográfica” (PASSEGGI, 2016, p. 75), da qual a pesquisa-formação emerge, que resulta uma nova forma de pesquisar e conceber a formação: a partir “da experiência como lugar de pesquisa-formação, mediante a construção de uma narrativa refletida sobre a docência como objeto de investigação” (PASSEGGI, 2016, p. 75).

Isso demanda não apenas pensarmos em novas formas de acompanharmos esta formação, sobretudo o sujeito que se investiga, conforme alerta Passeggi (2016), como, também, outras formas de fazer pesquisa que envolvam elementos expressivos e interpretativos desta experiência, como a própria música. Nesse sentido, os objetivos da pesquisa-formação – o valor de uso do saber construído, a implicação dos colaboradores e a produção do saber e sua legitimidade – vinculam-se, de forma indissociável, às três apostas ou dimensões do paradigma narrativo-autobiográfico: a epistemopolítica, a decolonial e a pós-disciplinar.

É justamente esta rica carga complexa desvelada pelo referido paradigma que permite pensarmos a música para além do seu recurso verbal (letra). De fato, ao realizar uma pesquisa-formação através do procedimento biografia músico-educativa no doutorado, deparei-me somente com dois espaços ocupados pela música na elaboração de narrativas musicais: a manifestação musical como símbolo, representação de um todo e o foco nas letras das músicas. Entendo, porém, que isso decorre do fato de eu não ter provocado uma construção narrativa por meio da linguagem musical, algo que precisa ser explorado pela área nos próximos anos. Ainda assim, foi perceptível que a música tinha o potencial de operar a narrativa ou, mesmo, constituir-se narrativa.

Por meio dessas reflexões, então, foi possível ponderar sobre a música na perspectiva (auto)biográfica retornando para a música. De forma resumida, penso que o avanço teórico-metodológico da biografia músico-educativa, como pesquisa-formação, se resume em percorrer três compreensões, ainda iniciais:

• A música como campo de sentido e interpretação – para a realidade, para os sons, para a educação musical, para a música, em si – no qual os sujeitos se entendem, compreendem e analisam suas histórias de vida pela música e na música.

• A música como uma forma narrativa (auto)biográfica – narrar a partir, pela e para a música e seus processos formativos.

• A música como uma disparadora de memórias – através de lembranças sonoras e musicais, possibilitar a localização de outras memórias e sensações, para além dela.

Com isso, espero tornar este ensaio um convite para que pesquisadores e pesquisadoras do campo da Educação Musical investiguem essas possibilidades, inclusive, para além da música. Mais especificamente, finalizo as reflexões tecidas neste ensaio apresentando alguns desafios que estão sendo enfrentados e que merecem um olhar mais apurado nos próximos anos.

O primeiro, de apresentar, na pluralidade de temáticas abordadas na área, as particularidades que a música traz às abordagens (auto)biográficas e os processos por ela desencadeados – tarefa à qual me desafiei neste ensaio. Sobre isso, Leda Albuquerque Maffioletti expôs, no Simpósio Nacional Movimento (Auto)biográfico da Educação Musical no Brasil, no IX CIPA, em 2021, uma comunicação que teve o objetivo de compreender as dimensões epistemológica e ontológica da Educação Musical enquanto campo de pesquisa na perspectiva (auto)biográfica, que parece avançar nesse ponto.

O segundo desafio emergido das pesquisas, sobretudo recentemente, é o de aprofundar o estudo sobre as correntes (auto)biográficas que adentram a pesquisa em Educação Musical e as implicações para seus objetos de estudo. Esta é uma tarefa complexa e permanente em que alguns pesquisadores têm se engajado, entre eles, Gontijo (2019); Cruz; Almeida (2021); Marques; Pedrollo; Madeira (2021), Pedrollo; Mateiro; Marques; Madeira (2021); Madeira; Marques; Pedrollo; Mateiro (2021); Röpke; Monti (2021), e outros.

Também, é necessário somar e harmonizar, ainda mais, vozes às pesquisadoras da área que há vinte anos e, especialmente, nos últimos dez anos, têm se debruçado em traçar novas possibilidades metodológicas e epistemológicas (auto)biográficas a partir da música. Esse aspecto tem sido tratado por Delmary Vasconcelos de Abreu em exposições recentes, como em sua participação no referido simpósio nacional, em que analisou como as figuras de ligação de sujeitos epistêmicos se entrelaçam no diálogo com a literatura da área da educação musical.

Que possamos, através de nossos estudos, contribuir, partindo dessa forma mais engajada e humana de fazer pesquisa, com novas interpretações sobre o conceito de música e sobre como ela mergulha e emerge das experiências narradas pelas pessoas. Que haja discussão, reflexão e crítica sobre a nossa produção a fim de provocar o debate-conjunto sobre os avanços e desafios da pesquisa (auto)biográfica na Educação Musical.

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TORRES, Maria Cecília de Araújo Rodrigues. Entrelaçamentos de lembranças musicais e religiosidade: “quando soube que cantar era rezar duas vezes”. Revista da ABEM, Porto Alegre, v. 11, p. 63-68, 2004. Disponível em: http://www.abemeducacaomusical.com.br/revistas/revistaabem/index.php/revistaabem/article/view/348. Acesso em: nov. 2021.

TORRES, Maria Cecília. Narrativas dos movimentos de uma tese: apresentar as entrevistadas e narrar o narrado. Ouvirouver, Uberlândia, v. 13, n. 2, p. 644-657, 2017. Disponível em: https://seer.ufu.br/index.php/ouvirouver/article/view/38838. Acesso em: nov. 2021.

VIEIRA, Juliana; BRAGANÇA, Inês F. de Souza. Pesquisaformação narrativa (auto) biográfica e a escrita de cartas como modo de dizer-ser. Crítica Educativa, Sorocaba, v. 6, p. 01-17, 2020. Disponível em: https://www.criticaeducativa.ufscar.br/index.php/criticaeducativa/article/view/486. Acesso em: nov. 2021.

Notas

2 Este webinário fez parte das atividades integrantes do projeto de extensão Movimento (Auto) biográfico da Educação Musical no Brasil, apresentadas em outro momento do texto, vinculado à Universidade Federal de Roraima (UFRR) em parceria com a Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC).
3 Segundo Bragança (2018, p. 76), o termo não se refere a uma metodologia, “mas de atravessamentos entre teoria e metodologia, política e epistemologia, na construção de conhecimentos em educação”.
4 Todos/as eram, na época da realização da pesquisa, professores/as de educação musical (Arte) na educação básica, egressos/as do mesmo curso de Licenciatura em Música. Além desse espaço, atuavam, também, como professores/as de instrumento musical (guitarra elétrica, violão, teclado) e/ou musicalização infantil.
5 Segundo Passeggi (2011, p. 148), “Erlebnis traduz-se, geralmente, por ‘experiência vivida’ ou ‘vivência’, entendida como uma experiência mais imediata, pré-reflexiva e pessoal; Erfahrung associa-se a impressões sensoriais e ao entendimento cognitivo, que integra a experiência num todo narrativo e num processo de aprendizagem. A palavra Erfahrung compõe-se de Farht (viagem) e pode ser associada a Gefahr (perigo). Nesse sentido, ela remete a uma temporalidade longa e sugere a ideia de aventura”.
6 No original: [...] can help adults better understand their own learning process [...] they understand the extent to which learning in many different situations is an active search for meaning (DOMINICÉ, 2000, p. 4).
7 No original: [...] they are helped to accept that they hold their life in their hand even as they also recognize that their life’s course and its related learning are subject to many influences (DOMINICÉ, 2000, p. 4).
8 O caminho percorrido nesta análise foi descrito na tese de doutorado (ALMEIDA, 2019) e abordado de forma resumida em publicação posterior (ALMEIDA, 2021b).
9 A biografia músico-educativa é desenvolvida ao longo de cinco fases: um pré-momento e de quatro momentos de atividades, entre elas está a animação para organização de uma narrativa musical, a partilha desta narrativa, a leitura e reflexão sobre consonâncias e dissonâncias entre as narrativas musicais ouvidas e, posteriormente, lidas e o debate sobre percepções emergidas das atividades anteriores e escrita da biografia músico-educativa. O detalhamento de cada um dos momentos pode ser lido em minha tese de doutorado (ALMEIDA, 2019a) ou, de forma resumida, em artigos publicados (ALMEIDA, 2021a, ALMEIDA; LOURO, 2019).
10 No texto publicado nos anais do evento (ALMEIDA, LOURO, 2018), discorremos brevemente sobre três fases identificadas por meio de um estado da arte realizado sobre a produção brasileira com histórias de vida e(m) formação: Período de Imersões – discussões sobre a prática docente (décadas de 1980 e 1990), Período de Aplicações – processos formativos (segunda metade da década de 1990 e década de 2000) e Período de Relações – relações entre sujeito-pesquisador (década de 2010).
11 Inicialmente, integraram as professoras Ana Lúcia Louro (UFSM), Delmary Vasconcelos de Abreu (UnB), Inês Rocha (UNIRIO), Jéssica de Almeida (UFRR), Leda de Albuquerque Maffioletti (UFRGS), Maria Cecília de Araújo Rodrigues Torres (IPA) e Tamar Genz Gaulke (UFRN). Posteriormente, Teresa Mateiro (UDESC) e, recentemente, Cláudia Bellochio (UFSM).
12 Para esta edição do projeto, optou-se em realizar a leitura de recentes artigos científicos da pesquisadora Maria da Conceição Passeggi, sobretudo, os que avançavam na teorização de termos nocionais utilizados pela Educação Musical.
13 Nesta edição, participaram o Grupo de Estudos e Pesquisas (Auto)biográficas em Educação Musical (GEPAEM), da UFRR e o grupo Educação Musical e Formação Docente, da UDESC.
14 A proposta do GTE “Educação Musical e Pesquisa (Auto)biográfica” foi contemplar as dimensões epistemológicas e metodológicas, as potencialidades e os desafios das diversas abordagens para a pesquisa (auto)biográfica em educação musical. A relatoria sobre os trabalhos desenvolvidos pode ser conferida no link: https://www.youtube.com/watch?v=_3ZkZ5rVhl8.
15 “Movimento (Auto)biográfico da Educação Musical no Brasil” (Jéssica de Almeida, Tamar Genz Gauke, Delmary Vasconcelos de Abreu e Leda de Albuquerque Maffioletti) e “Narrativas de docentes e discentes no campo da Educação Musical: pesquisa (auto)biográfica e trajetórias de formação (Ana Lúcia Louro, Teresa Mateiro e Inês de Almeida Rocha).
16 “Especificidade do processo investigativo: como fazer ‘surgir’ as histórias de vida e como interpretá-las” (Profa. Dra. Maria Helena Menna Barreto Abrahão), “Pesquisa (auto)biográfica: dimensões epistemopolíticas e movimentos formativos” (Profa. Dra. Inês Ferreira de Souza Bragança), “Paradigma narrativo (auto)biográfico: elementos para pensar a pesquisa em educação musical” (Profa. Dra. Maria da Conceição Passeggi), “Movimento (Auto)biográfico da Educação Musical no Brasil – Parte I” (Profa. Dra. Delmary Vasconcelos de Abreu, Profa. Dra. Jéssica de Almeida, Profa. Dra. Leda de Albuquerque Maffioletti, Profa. Dra. Maria Cecília de Araújo Rodrigues Torres e Profa. Dra. Teresa Mateiro), “Movimento (Auto)biográfico da Educação Musical no Brasil – Parte II” (Profa. Dra. Ana Lúcia Louro, Profa. Dra. Inês Rocha e Profa. Dra. Tamar Genz Gaulke).
17 Segundo Passeggi (2016, p. 69), “os pioneiros desse movimento mais conhecidos no Brasil, Gaston Pineau, Pierre Dominicé, Matthia Finger, Marie-Christine Josso e, par anos da lusofonia, António Nóvoa, preocuparam-se com esse adulto em formação e buscaram em seus estudos entender o que ele tinha a dizer sobre suas experiências e o que podiam fazer com elas [...]”.
18 Webinário “Pesquisa (auto)biográfica: dimensões epistemopolíticas e movimentos formativos” (Profa. Dra. Inês Ferreira de Souza Bragança).
19 Webinário “Especificidade do processo investigativo: como fazer ‘surgir’ as histórias de vida e como interpretá-las” (Profa. Dra. Maria Helena Menna Barreto Abrahão).
20 Via participação no webinário “Paradigma narrativo (auto)biográfico: elementos para pensar a pesquisa em educação musical” (Profa. Dra. Maria da Conceição Passeggi).
21 Esse termo nocional tem sido rigorosamente estudado nos últimos anos pela sua criadora, professora Delmary Vasconcelos de Abreu, e pelos seus orientandos, vinculados ao Programa de Pós-Graduação em Música da Universidade de Brasília. A musicobiografização, como um “sentido para a relação da(s) pessoa(s) com a(s) música(s)” (ABREU, 2017, p. 214), objetiva “compreender os modos como os indivíduos desenvolvem, nas histórias de vida em formação com a música, a capacidade de tomada de consciência de si como alguém que se apropria, e sabe observar o que apropria e como apropria e decide sobre o que fazer com aquilo que apropriou” (ABREU, 2017, p. 214-215).

Autor notes

1 Professora do Curso de Licenciatura em Música e do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Roraima (UFRR). É líder do Grupo de Estudos e Pesquisas (Auto)Biográficas em Educação Musical (GEPAEM) a partir do qual desenvolve pesquisas sobre a formação e atuação de professores, especialmente, de música, em diferentes contextos a partir de abordagens (auto)biográficas
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