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Tópicos de Física Moderna no Livro Didático “Física, v. 3 - Ciclo Colegial (1959)” do Autor Aníbal Freitas

Topics of Modern Physics in the Textbook “Física, v. 3 - Ciclo Colegial (1959)” by the author Aníbal Freitas

Temas de Física Moderna en el libro de texto “Física, v. 3 - Ciclo Colegial (1959)” de autor Aníbal Freitas

Poliana Telles da Silva
Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia de Santa Catarina , Brasil
Roberto João Eissler
Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia de Santa Catarina, Brasil

Revista de Ensino de Ciências e Matemática

Universidade Cruzeiro do Sul, Brasil

ISSN-e: 2179-426X

Periodicidade: Trimestral

vol. 12, núm. 3, 2021

rencima@cruzeirodosul.edu.br

Recepção: 25 Janeiro 2021

Aprovação: 10 Abril 2021

Publicado: 06 Junho 2021



DOI: https://doi.org/10.26843/rencima.v12n3a33

Una nueva publicación de artículo publicado en REnCiMa, de iniciativa de sus autores o de terceros, queda sujeta a la expresa mención de la precedencia de su publicación en este periódico, citándose el volumen, la edición y fecha de esa publicación

Resumo: O estudo do livro didático, recurso educacional amplamente empregado no meio escolar, contribui para o entendimento dos métodos e conceitos adotados pelos autores em suas épocas e proporciona conhecimentos acerca do desenvolvimento de uma disciplina. Assim sendo, o presente artigo tem como objetivo analisar a maneira com que tópicos de Física Moderna são abordados e estruturados no livro didático “Física, 3º Livro - Ciclo Colegial”, de Aníbal Freitas, na edição publicada em 1959 no Brasil. Para tal, observou-se o último capítulo do livro, intitulado “Teorias Modernas da Física” e buscou-se analisar o modo com que o mesmo foi organizado para cumprir as legislações e instruções metodológicas, bem como torná-lo ao alcance dos alunos do ensino secundário, critérios estabelecidos pelo autor no parágrafo introdutório do capítulo. As teorias apresentadas incluem mecânica eletromagnética, teoria da relatividade e mecânica ondulatória, perpassando por nomes como Lorenz, Michelson, Einstein, Planck e Schrödinger. Concluiu-se que o capítulo atende, de maneira geral, às instruções metodológicas previstas na legislação e que alcança seu objetivo de fazer um apanhado das teorias que então exerciam maior influência na explicação dos fenômenos físicos, apesar de o fazer apenas de maneira introdutória.

Palavras-chave: Livro Didático, Física Moderna, Ensino de Física.

Abstract: The study of the textbook, an educational resource widely used in the school environment, contributes to the understanding of the methods and concepts adopted by the authors in their time and provides knowledge about the development of a discipline. Therefore, this article aims to analyze the way in which Modern Physics topics are approached and structured in the textbook “Física, 3º Livro - Ciclo Colegial”, by Aníbal Freitas, in the edition published in 1959 in Brazil. To this end, the last chapter of the book, entitled “Modern Theories of Physics”, was sought and the aim was to analyze the way in which it was organized to comply with legislation and methodological instructions, as well as making it available to students of the secondary education, criteria established by the author in the introductory paragraph. The theories presented include electromagnetic mechanics, theory of relativity and wave mechanics, running through names like Lorenz, Michelson, Einstein, Planck and Schrödinger. It was concluded that the chapter meets, in a general way, the methodological instructions foreseen in the legislation and that it achieves its objective of making an overview of the theories that then had the greatest influence in the explanation of physical phenomena, despite doing so only in an introductory way.

Keywords: Textbook, Modern Physics, Physics teaching.

Resumen: El estudio del libro didáctico, recurso educativo muy utilizado en el ámbito escolar, contribuye a la comprensión de los métodos y conceptos adoptados por los autores en su época y aporta conocimientos sobre el desarrollo de una disciplina. Por tanto, este artículo tiene como objetivo analizar la forma en la que se abordan y estructuran los temas de la Física Moderna en el libro de texto “Física, 3º Livro - Ciclo Colegial”, de Aníbal Freitas, en la edición publicada en 1959 en Brasil. Para ello, se buscó el último capítulo del libro, titulado “Teorías modernas de la física” y se buscó analizar la forma en que se lo han organizado de modo a cumplir con la legislación y las instrucciones metodológicas, así como ponerlo a disposición de los estudiantes de la educación secundaria, criterio establecido por el autor en el párrafo introductorio del capítulo. Las teorías presentadas incluyen mecánica electromagnética, teoría de la relatividad y mecánica ondulatoria, pasando por nombres como Lorenz, Michelson, Einstein, Planck y Schrödinger. Se concluyó que el capítulo cumple, de manera general, con las instrucciones metodológicas previstas en la legislación y que logra su objetivo de hacer un repaso de las teorías que entonces tuvieron mayor influencia en la explicación de los fenómenos físicos, a pesar de hacerlo solo de manera introductoria.

Palabras clave: Libro Didáctico, Física Moderna, Enseñanza de la Física.

Apresentação

Os livros didáticos são recursos educacionais amplamente utilizados no meio escolar, atuando como componentes fundamentais nos processos educacionais (LAJOLO, 1996; BITTENCOURT, 2004). Como instrumento de aprendizado, o livro didático assume diferentes aspectos, vinculados aos programas oficiais e ao seu papel como meio propagador de uma cultura e língua. A pesquisa sobre livros didáticos tem adquirido maior destaque nos últimos 30 anos, com sua história fazendo parte de um campo de pesquisa em desenvolvimento (CHOPPIN, 2004).

Há 25 anos, Lorenz (1995) afirmava que ainda havia uma escassez de informações a respeito do ensino de Ciências na escola secundária brasileira desde seu início. Isso justificava a importância de trabalhos que buscavam realizar um estudo acerca dos conteúdos ensinados em sala de aula e dos direcionamentos que recebiam. Desde então, diversos autores dedicaram-se a estudar os livros didáticos de Física, sejam eles atuais, do século passado ou anteriores. Analisar os livros didáticos abre espaço para compreender um conteúdo apresentado, o tempo no qual se insere e as manifestações de tendências metodológicas referentes a este período. Assim, examinar um livro didático de Ciências é uma das formas de tornar possível a caracterização e desenvolvimento do ensino de Ciências no Brasil (LORENZ, 1986).

As pesquisas que dizem respeito ao estudo de livros didáticos no ensino de Ciências e de Física tiveram um aumento perceptível posterior à criação do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) em 1985, cujo objetivo centra-se na avaliação, seleção e distribuição dos livros didáticos. A percepção do livro didático como um material histórico reforça a possibilidade de estudo da história e do desenvolvimento de uma disciplina específica, atuando como uma grande fonte de informações sobre os métodos e conceitos adotados na época (MARTINS, 2015). Com isso, a intenção de investigar as formas com que os tópicos de Física Moderna adquiriram espaço nos livros didáticos expressa uma tentativa de contribuição para o entendimento de como a disciplina de Física se desenvolveu no contexto educacional brasileiro.

Nesse sentido, pretende-se analisar a maneira com que tópicos de Física Moderna são abordados e estruturados em livros de Física para o terceiro ano do Ciclo Colegial, do autor Aníbal Freitas, em edições correspondentes aos anos de 1947, 1953 e 1959, publicadas pela Edições Melhoramentos e utilizadas da década de 1940 até, pelo menos, a década de 1960.

Ao observar os conteúdos apresentados nos três volumes da coleção, notou-se que a inclusão de tópicos de Física Moderna inexiste na edição de 1947, aparecendo somente nas edições de 1953 e 1959, sendo as duas últimas diferentes na numeração das páginas, mas idênticas em conteúdo. Com isso, realizaram-se análises apenas do capítulo que propõe introduzir a Física Moderna no seguinte livro: “Física, 3º Livro - Ciclo Colegial”, de Aníbal Freitas, de 1959 (10ª edição). Dessa forma, buscou-se definir qual é o caráter que o livro assume ao tratar deste assunto (se é introdutório ou aprofundado) e de que forma o autor o planejou e estruturou para atender aos alunos do ensino secundário, considerando o que era previsto pela legislação.

O livro didático de Aníbal Freitas e sua época

O livro “Física, 3º Livro - Ciclo Colegial” (Figura 1), de Aníbal Freitas, de 1959 (10ª edição), possui capa dura, 457 páginas e 9 seções que dividem-se da seguinte maneira: 1. Óptica (com 10 capítulos), 2. Da Óptica Física (com 6 capítulos), 3. Fenômenos de Difração (com 3 capítulos), 4. Manifestações da Eletricidade (com 7 capítulos), 5. Massas Magnéticas (com 3 capítulos), 6. Corrente Elétrica (com 7 capítulos), 7. Campo Magnético das Correntes Elétricas (com 8 capítulos), 8. Generalidades Sôbre as Correntes Alternativas (com 6 capítulos) e 9. Descarga Elétrica (com 5 capítulos). Referente às Teorias Modernas da Física, o capítulo que a discute (capítulo V da seção 9) ocupa 7 páginas, correspondendo também ao último capítulo do livro.

No início, antes do índice, o livro apresenta uma reprodução do Programa de Física para a terceira série, juntamente com as Instruções Metodológicas Para o Estudo de Física (de 1951), exibindo os conteúdos previstos na legislação. Em termos gerais, o livro apresenta seu conteúdo por meio de um conjunto de textos, imagens (ilustrações de experimentos) e equações diversas.

 Capa e folha de rosto do livro
Figura 1
Capa e folha de rosto do livro
Acervo dos Autores

Na capa (Figura 1), destaca-se a frase “Uso autorizado pelo Ministério da Educação e Cultura”, e na folha de rosto, abaixo do título, encontram-se as palavras “De acôrdo com os programas oficiais”, que são apresentados logo em seguida no “Programa de Física” para a 3ª série do Curso Científico. Aqui, percebe-se a preocupação do autor em atender às legislações vigentes na época e tornar isso claro ao seu público. Ainda, a folha de rosto traz ao canto esquerdo superior da página uma assinatura manuscrita de um antigo proprietário, datada de 1961, indicando o uso do livro para além do ano da edição.

Aníbal Freitas foi filho de Francisco Augusto Freitas e Maria Eugênia Oliveira e nasceu em 15 de julho de 1885 em Resende, RJ. Realizou cursos preparatórios à Faculdade de Direito, mas ingressou na Faculdade de Farmácia no ano de 1903. Candidatou-se à cadeira de Física e Química no Ginásio do Estado de Campinas, em 1909, alcançando a primeira classificação. Em 1911, assumiu a cadeira de História Natural e, em 1923, elegeu-se vereador na Câmara Municipal de Campinas, ocupando o posto de Presidente do Poder Legislativo até 1930. Em 1928, nomearam-no diretor do Colégio “Culto à Ciência”, onde efetivou-se mais tarde. Dentre os lugares onde lecionou, estão o Ateneu Paulista, Cesário Mota, Diocesano Santa Maria e Progresso Campineiro. Além disso, esteve entre os fundadores da Escola de Comércio “Bento Quirino”. Na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade Católica de Campinas, ocupou a cadeira de Física Geral e Experimental. Entre suas obras, destacam-se “Noções de Química Geral” e “Física” (em três volumes, dentre eles o objeto de estudo desta pesquisa) (PREFEITURA DE CAMPINAS, 2020).

No Brasil da década de 1920, pouco antes de Aníbal se eleger vereador em Campinas, surgia no meio educacional um novo modelo pedagógico vinculado ao movimento da Escola Nova, que possuía, dentre seus princípios, a pretensão de financiar a prática dos educadores por meio de um conjunto de saberes autorizados e espaços para divulgação de metodologias educacionais através de Bibliotecas Pedagógicas. A partir de 1930, o modelo escolanovista passou a ser utilizado e permeou a educação brasileira até 1960 (RIBEIRO, 2017) com o intuito de estabelecer uma escola única, laica, gratuita e obrigatória. Com isso, a proposta era de que a educação e a atividade escolar não deveriam guiar-se unicamente pelas vontades dos educadores e sim pelas vontades dos alunos com seus interesses próprios. O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, documento pelo qual foram veiculados os princípios escolanovistas, sugere ainda que a formação de professores seja elevada também a nível superior, além de defender remunerações apropriadas visando manter a eficiência, dignidade e prestígio no trabalho docente (LEMME, 2005).

Em 1930, pouco depois de Aníbal ter sido nomeado como diretor do Colégio Culto à Ciência, tem-se a criação do Ministério da Educação e Saúde Pública, assumido por Francisco Campos, que modificou e reestruturou a ação estatal no ensino secundário e superior. Assim, com o decreto 19.890, de 18/04/1931, o ensino secundário passou a ter a duração de 7 anos com a presença de dois ciclos, o fundamental (duração de 5 anos) e o complementar (duração de 2 anos). Com isso, a legislação buscou conciliar o aspecto formativo e o propedêutico, de forma que o plano de estudos passou de humanista para focado nas Ciências Físicas e Biológicas (RIBEIRO, 2017).

Na década de 1950, a educação brasileira baseava-se em uma legislação de caráter acentuadamente prescritivo, acompanhada por uma série de portarias e circulares, gerando segmentos de leis que se adequavam às mudanças efetuadas na estrutura sociocultural do país. O ensino secundário, devido à Lei Orgânica do Ensino Secundário de 1942, caracterizava-se como um corredor cujo propósito era conduzir os jovens diretamente ao ensino superior (BRAGHINI, 2005; RIBEIRO, 2017).

O Estado tinha, em 1950, a intenção de, por intermédio das instituições escolares, acompanhar as modificações de forma rápida. O aprendizado dos estudantes deveria então ser múltiplo, dinâmico e mais acelerado, buscando evitar o ineficaz e o atrasado. Dessa forma, estas ações moldavam o ensino secundário, tocando em seus fundamentos e critérios de funcionamento. A ideia de uma educação boa nos anos de 1950 modelava-se por meio da relação entre o processo de escolarização e o mundo do trabalho. Assim, o jovem planejava-se para o futuro atentando-se para seu posto de trabalho e sua conduta social. Com isso, o trabalho atrelava-se ao exercício da cidadania, tornando a ética da utilidade um dos princípios da educação (BRAGHINI, 2005).

Braghini (2005) afirma que, dentre as razões que contribuíram para as mudanças na escola secundária em 1950, estavam elementos variados e múltiplos que unidos influenciaram a educação, para além das pressões economicistas e reivindicações sociais. As novas demandas que surgiam geraram um impacto na esfera educacional, que deveria ajustar-se a novos cenários e conhecimentos e modificar seus entendimentos tradicionais, favorecendo uma nova relação com o desenvolvimento e a economia vinculada à educação.

É importante ressaltar que o livro didático, que atua como um suporte para os conhecimentos escolares, também é uma mercadoria diretamente relacionada com a indústria editorial, cultural e ideológica de seu tempo e, com isso, baseia-se nos currículos educacionais elaborados pelo Estado. Ademais, coloca-se como um suporte também para os métodos pedagógicos, em sua intenção de propor estratégias, meios de trabalho e formas de avaliação aos educadores, o que o torna, por fim, um “veículo de um sistema de valores, ideologias e da cultura de uma época” (RIBEIRO, 2017, p. 43).

De acordo com Vechia e Lorenz (1998, apud MARTINS, 2015), os programas de ensino referentes à disciplina de Física a partir do ano de 1930 foram elaborados pelo Colégio Pedro II (que já havia elaborado 15 outros programas anteriores) e aplicados pelo então Ministério da Educação e Saúde não somente ao colégio, mas também ao ensino secundário público como um todo. Estes programas pertencem aos anos de 1931, 1942 e 1951, sendo que o último permaneceu em vigor até 1960.

As disciplinas de Física e Química eram ofertadas de forma simultânea até o programa do ano de 1926. Durante o período de 1850 a 1929, os conhecimentos referentes à Física eram vinculados ao ensino ginasial (correlato ao atual Ensino Fundamental) e, a partir de 1931, passou a compor também o ensino colegial (correlato ao atual Ensino Médio) sob o domínio da área das Ciências Físicas e Naturais. Entre os anos de 1926 e 1950, a Física desassociou-se da Química (VECHIA; LORENZ, 1998 apud MARTINS, 2015).

A Física Moderna nos currículos de Física

Em 1992, Terrazzan observou que os currículos de Física para o 2º grau (correlato ao atual Ensino Médio) possuíam falhas que resultaram na exclusão de tópicos como o nascimento da Ciência, transformações no pensamento científico durante a história e as teorias que surgiram a partir disso, comumente abordando apenas a Física correspondente ao período de 1600 a 1850. Em decorrência disso, a Física do 2º grau acabava por ser reduzida em Cinemática, Leis de Newton, Termologia, Óptica Geométrica, Eletricidade e Circuitos Simples, com uma programação que nem sempre era cumprida por inteiro. Consequentemente, os tópicos de Física Moderna e Contemporânea não chegavam ao alcance dos estudantes em um cenário onde os conhecimentos que correspondem a este tema exerciam grande influência no mundo (TERRAZZAN, 1992), apesar de estarem presentes em alguns livros já na década de 1950. Segundo Terrazzan (1992):

A física desenvolvida na escola de 2º grau deve permitir aos estudantes pensar e interpretar o mundo que os cerca. Aqui, o cotidiano vivido pelos estudantes assume papel fundamental na definição da forma de abordagem dos conteúdos previamente definidos como relevantes. Neste nível de escolaridade devemos estar formando um cidadão, pronto para sua participação na sociedade. Sua formação deve ser global, pois sua capacidade de intervenção na realidade em que está imerso tem relação direta com sua capacidade de compreensão desta mesma realidade. (TERRAZZAN, 1992, p. 213).

Alvetti, em 1999, coloca como uma das razões para introduzir os conhecimentos de Física Moderna e Contemporânea no Ensino Médio o fato de que a maioria dos alunos não segue para as universidades, afirmando que “não se pode participar de discussões sobre a relação risco-benefício da Ciência sem conhecer-se as transformações ocorridas” (ALVETTI, 1999, p. 22). Há, ainda, um contexto em que nem todos os que ingressam escolherão áreas técnico-científicas, o que faz do Ensino Médio a última chance para engajar os estudantes em discussões acerca da Ciência e sua relação com outros campos. É interessante relembrar que, como mencionado anteriormente, o ensino secundário dos anos 1950 buscava funcionar como um corredor que conduziria os jovens diretamente ao ensino superior.

Atualmente, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é o documento que apresenta as principais orientações para o ensino de Física no país, apesar de ainda não ter sido implementada em todo o território brasileiro. A Física Moderna é discutida nas Orientações Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN+), estando presente no seguinte trecho:

Alguns aspectos da chamada Física Moderna serão indispensáveis para permitir aos jovens adquirir uma compreensão mais abrangente sobre como se constitui a matéria, de forma que tenham contato com diferentes e novos materiais, cristais líquidos e lasers presentes nos utensílios tecnológicos, ou com o desenvolvimento da eletrônica, dos circuitos integrados e dos microprocessadores. A compreensão dos modelos para a constituição da matéria deve, ainda, incluir as interações no núcleo dos átomos e os modelos que a ciência hoje propõe para um mundo povoado de partículas. Mas será também indispensável ir mais além, aprendendo a identificar, lidar e reconhecer as radiações e seus diferentes usos. Ou seja, o estudo de matéria e radiação indica um tema capaz de organizar as competências relacionadas à compreensão do mundo material microscópico. (BRASIL, 2002, p. 70).

O que garante a presença da Física Moderna nos livros didáticos hoje é o PNLD (Programa Nacional do Livro Didático), de maneira que o assunto geralmente compõe o final dos terceiros volumes. Porém, a presença do tema nos livros não assegura sua discussão em sala de aula, em decorrência de fatores como a insuficiência de tempo para cumprir o programa integralmente (PEREIRA; GUERINI; SÁ-SILVA, 2019; FERREIRA, 2013) além de falhas associadas aos processos de formação docente que favorecem situações em que há, por exemplo, professores ministrando a disciplina de Física sem possuir formação específica na área.

De modo geral, são apontadas três vertentes principais referentes a abordagens metodológicas de introdução à Física Moderna e Contemporânea no Ensino Médio, que incluem a exploração dos limites de modelos clássicos, a não utilização de referências aos modelos clássicos e a escolha de tópicos essenciais. No que diz respeito à primeira vertente, Gil, Senent e Solbes (1988), ao analisarem 42 livros didáticos de Física da Espanha, concluíram que a maioria deles não fazia nenhuma alusão “ao caráter não linear do desenvolvimento científico; às dificuldades que originaram a crise da Física Clássica; às profundas diferenças conceituais entre a Física Clássica e a Moderna” (OSTERMANN; MOREIRA, 2000, p. 27). Na vertente da não utilização de modelos clássicos, Fischler e Lichtfeldt (1992 apud OSTERMANN; MOREIRA, 2000) afirmam que existe uma dificuldade no entendimento da Física Moderna em decorrência da utilização de analogias clássicas que acabam por atuar como obstáculos para a compreensão de novos conceitos. De acordo com os autores, deve-se então evitar menções à Física Clássica no ensinamento de temas como, por exemplo, a Mecânica Quântica. Por fim, para a escolha de tópicos essenciais, prevalece a ideia da seleção de poucos temas que contemplem e permitam o aprendizado de conceitos como elétrons, fótons, núcleos e estrutura atômica.

O capítulo de Aníbal sobre Teorias Modernas da Física possui algumas características pertencentes à vertente da exploração dos limites de modelos clássicos, pois discute os principais aspectos do assunto utilizando-se de menções às mudanças que ocorreram de uma teoria para outra.

As “Teorias Modernas da Física” no livro de Aníbal Freitas

O livro intitulado “Física, 3º Livro - Ciclo Colegial”, do ano de 1959, 10ª ed., da Edições Melhoramentos, contém, em sua extensão, um capítulo dedicado às Teorias Modernas da Física. Localizado na seção 9 que recebe o título geral de “Descarga Elétrica”, o capítulo V é também o último do livro. Seu conteúdo, que ao todo ocupa 7 páginas, ramifica-se ao longo de quatro parágrafos (numerados do 386 ao 389) com os seguintes assuntos: Generalidades; Mecânica eletromagnética; A teoria da relatividade; e A descontinuidade dos fenômenos e a mecânica ondulatória.

No primeiro parágrafo, em Generalidades, o autor escreve:

É difícil resumir as teorias da Física moderna de modo a colocá-las ao alcance de alunos do curso secundário. Para cumprir, entretanto, as “Instruções Metodológicas” que acompanham o programa de Física do Curso Colegial, procuraremos fazer um apanhado daquelas que maior influência exerceram na explicação dos fenômenos físicos, nos últimos tempos. (FREITAS, 1959, p. 451).

A Portaria Ministerial n° 1.045, de 14 de dezembro de 1951, contém os Planos de Desenvolvimento dos Programas Mínimos e as Instruções Metodológicas para cada disciplina do curso secundário. No início deste livro de Aníbal Freitas, é possível encontrar uma reprodução do Programa de Física para a terceira série juntamente com as instruções metodológicas para o estudo de Física, informando quais são os assuntos que devem ser abordados durante o curso. Neste documento, em um tópico referente ao assunto da Eletricidade, há uma menção às “recentes teorias modernas”. O tema “Teorias modernas da Física” também é citado no mesmo grupo em que aparecem descargas elétricas, gases rarefeitos, raios catódicos, raios X, radioscopia e radiografia, efeito fotoelétrico, radioatividade, prótons e nêutrons.

Portanto, para atender à resolução de 1951, o livro deveria abordar, entre os demais assuntos, também as teorias recentes/modernas da Física. Entretanto, a instrução não especifica quais são as teorias modernas que devem ser incluídas, fornecendo liberdade para que o autor decida. O critério então utilizado por Aníbal Freitas para selecionar os temas foi, segundo o autor, a influência que as teorias exerceram na explicação de fenômenos físicos nos últimos tempos.

Após a introdução, inicia-se o segundo tópico, que trata da Mecânica Eletromagnética, e aqui, Aníbal utiliza o experimento de Michelson para discutir a velocidade de propagação da luz. Para tanto, escreve:

A experiência de Michelson (§ 95) sôbre a propagação da luz, prova que não há concordância entre essa propagação e a regra da composição das velocidades da mecânica clássica. Resulta daí que as leis da mecânica clássica não se aplicam à propagação das ondas eletromagnéticas, isto é, a velocidade da luz não é influenciada pelos movimentos de que estejam animadas as fontes luminosas. (FREITAS, 1959, p. 451).

É possível, porém, notar que o autor faz referência ao parágrafo 95, localizado na página 129, no qual explora o experimento realizado por Michelson. Descreve-o da seguinte forma:

Michelson modificou o método de Foucault fazendo incidir um feixe luminoso; proveniente de uma fonte luminosa; sôbre uma das faces de um espelho octogonal que gira em tôrno de seu eixo com grande velocidade. Êste feixe, refletindo na face do espelho ia incidir em outro espelho, colocado a cêrca de 35 quilômetros de distância. Experimentando aí nova reflexão, o feixe voltava para cair em outra face do espelho octogonal, onde refletia de novo e era recebido em uma luneta. (FREITAS, 1959, p. 129).

A descrição dos experimentos realizados por Michelson estão contidas no capítulo “Velocidade da Luz” que, por sua vez, localiza-se na seção 2 nomeada “Da Óptica Física” e explora detalhadamente, e por meio de figuras, o experimento Michelson-Morley de 1887, utilizado para determinar a constância da velocidade da luz, concluindo-se da seguinte forma:

Pode, pois, estabelecer-se que qualquer que seja a velocidade ou a direção do observador em relação à fonte luminosa, a velocidade da luz apresenta sempre o mesmo valor. Para explicar êste fato “Einstein imaginou que sua teoria da relatividade, que implica como característica fundamental a impossibilidade de medir qualquer deslocamento no espaço por meio de sinais luminosos”. Decorre desta teoria, cujos fundamentos não podem ser indicados aqui, que a velocidade da luz deve ser considerada como uma velocidade limite cujo valor não pode ser ultrapassado. (FREITAS, 1959, p. 131).

Para abordar um exemplo acerca das várias explicações sobre o resultado deste experimento, o capítulo “As teorias modernas da Física” segue fazendo referência a George Fitzgerald, físico irlandês que propôs “que os corpos em movimento se contrairiam no sentido dêste e conservariam suas dimensões no sentido perpendicular ao deslocamento” (FREITAS, 1959, p. 451). Aqui, exibe a seguinte equação pertencente à velha mecânica do sistema de transformações de Galileu (Figura 2):

 Equação referente ao sistema de
transformações de Galileu
Figura 2
Equação referente ao sistema de transformações de Galileu
Freitas (1959, p. 451)

O sistema de Galileu foi posteriormente substituído pelo sistema de transformações de Lorentz, para o qual o autor introduz as seguintes equações e gráficos (Figura 3 e 4):

 Equação referente ao sistema de
transformações de Lorentz
Figura 3
Equação referente ao sistema de transformações de Lorentz
Freitas (1959, p. 452)

Gráfico referente ao sistema de
transformações de Lorentz
Figura 4
Gráfico referente ao sistema de transformações de Lorentz
Freitas (1959, p. 452)

Freitas (1959) complementa essas equações e gráficos explicando que:

A transformação de Lorentz é aplicável aos fenômenos electromagnéticos e, graças a ela a propagação da luz no vácuo é verificada, tanto para o sistema de referência k em repouso, como para o outro sistema k’ em movimento. A transformação de Galileu pode considerar-se como o limite da transformação de Lorentz, quando a velocidade da luz se torna infinita em relação ao valor de v. (FREITAS, 1959, p. 452).

É interessante notar que a escolha das equações inseridas expressa a intenção do autor de tornar o assunto acessível e ao alcance de alunos do curso secundário, pois as operações que aparecem compreendem aquelas já exploradas por seus estudos anteriores, utilizando-se apenas de frações, raiz quadrada e funções matemáticas.

Em seguida, o autor dá início à discussão sobre a Teoria da Relatividade, ocupando cinco subdivisões (itens) no terceiro parágrafo do capítulo. Inicia o primeiro item com a afirmação de que essa teoria é um resultado do fato de que “as leis da Mecânica são as mesmas em qualquer sistema animado de translação uniforme e podem ser traduzidas, por isso, por expressões matemáticas independentes do sistema de referência.” (FREITAS, 1959, p. 452) e continua:

Para explicar então a célebre experiência de Michelson, Einstein, em 1905, admitiu que o princípio da relatividade é válido também para os fenômenos electromagnéticos. O eter perdeu assim sua realidade física e, de acordo com as idéias de Einstein, o eter não existe. Nesta ordem de idéias, conclui-se que é impossível evidenciar um movimento de translação uniforme mediante experiências electromagnéticas interiores ao sistema e que as leis do electromagnetismo são as mesmas em todos os sistemas animados de translação uniforme e podem ser traduzidas por expressões matemáticas independentes do sistema de referência. (FREITAS, 1959, p. 453).

Com isso, afirma que o antigo princípio da relatividade se aplica a todos os fenômenos (mecânicos ou eletromagnéticos) e que isto constitui o princípio da relatividade restrita. Inicia o segundo item com a afirmação:

De acôrdo com as concepções relativistas: as noções de espaço e de tempo perdem seu caráter de absolutismo. Isto é, uma determinada extensão do espaço não possui o mesmo valor quando avaliada por um observador em repouso e por outro, em movimento. As dimensões dos corpos variam com a velocidade. (FREITAS, 1959, p. 453).

Em seguida, propõe que se considerem dois sistemas animados um em relação ao outro de movimento retilíneo e uniforme de velocidade v, sendo que no primeiro sistema o comprimento que o observador mediu é representado por l e esse comprimento l medido por outro observador no segundo sistema tem o seguinte valor (Figura 5):

Equação referente às concepções expressas na teoria da relatividade
Figura 5
Equação referente às concepções expressas na teoria da relatividade
Freitas (1959, p. 453)

Com base nesta equação, Freitas (1959) esclarece que:

O comprimento é, pois, mais curto que em repouso. Para poder definir-se o espaço realmente ocupado por um corpo, não basta conhecer suas três dimensões. A velocidade dêle deve também entrar em linha de conta, isto é, o tempo que êle gasta para percorrer uma certa distância em relação ao observador, deve ser considerado. “O espaço depende do tempo e é, por isso, que se diz que o tempo é a quarta dimensão do espaço”. (FREITAS, 1959, p. 454).

Posteriormente, o terceiro item dedica-se à grandeza que, contudo, permanece invariável em todos os fenômenos: o intervalo de Einstein (ou intervalo entre a distância no espaço e a distância no tempo) (Figura 6), afirmando o seguinte:

Para um observador em movimento as distâncias parecem menores que para um observador em repouso, mas o tempo gasto para percorrer estas distâncias é também menor para o primeiro observador que para o segundo. Se se representasse a distância no tempo pela hipotenusa de um triângulo retângulo e a distância no espaço por um cateto, conservando constante o outro, embora os dois primeiros lados do triângulo variem, fig. 441, o último cateto, que representa o intervalo deEinstein, fica invariável. (FREITAS, 1959, p. 454).

 Gráfico referente ao intervalo de
Einstein
Figura 6
Gráfico referente ao intervalo de Einstein
Freitas (1959, p. 454)

O quarto item deduz, por meio dessa teoria, que a energia é dotada de inércia e que, em consequência disso, acontece o encurvamento dos raios luminosos que atravessam um campo gravitacional. Com isso, afirma que energia e matéria são dois aspectos de uma mesma causa, tornando-se expressões sinônimas, de forma que quando um corpo perde energia, sua massa diminui e que a massa de um corpo aumenta com a velocidade do mesmo, conforme concluído e verificado experimentalmente por Kauffmann, físico alemão, em 1908, por meio de elétrons de grande velocidade. “Se a massa de um corpo em repouso fôr m0, quando êste corpo descreve um movimento com velocidade v, sua massa será:” (Figura 7)(FREITAS, 1959, p. 455).

 Equação referente às conclusões de Kauffmann
Figura 7
Equação referente às conclusões de Kauffmann
Freitas (1959, p. 455)

O quinto e último item pelo qual o autor se propõe a discutir a teoria da relatividade descreve:

Como é possível substituir-se um sistema animado de um movimento variado por um sistema equivalente animado de translação uniforme, contanto que se admita a existência de fôrças que substituam a causa da aceleração, o princípio, da relatividade restrita foi generalizado pelo próprio Einstein aos movimentos variados. A natureza dêste curso não permite entrar em maiores detalhes sôbre esta teoria. Indicaremos apenas que êste sábio deu uma nova concepção da teoria da gravitação. Para êle os planetas descrevem curvas “porque próximo do Sol, como de êste concentração da matéria, o Universo é de qualquer forma encurvado. O caminho mais curto de um ponto ao outro é uma linha que nos parece reta porque a medimos com réguas muito pequenas e em extensões diminutas”. (FREITAS, 1959, p. 455).

O livro conclui o tópico da relatividade alegando que Einstein pretendia reunir em uma única doutrina a gravitação e a eletricidade, com o objetivo de explicar os fenômenos eletromagnéticos por modificação da estrutura métrica do espaço. É possível notar, com este quinto e último item, que há, por mais sutis que sejam, menções às transformações que ocorreram na Física, perpassando diversas explicações que resultaram na superação da Teoria da Gravidade de Newton, destacando os cientistas que fizeram parte do processo e contribuíram para a história da Ciência. Novamente, o autor mantém equações e gráficos acessíveis a estudantes do curso secundário.

O último parágrafo do capítulo dedica-se à descontinuidade dos fenômenos e a mecânica ondulatória:

A unificação dos fenômenos físicos encontrou também uma grande dificuldade na solução do conflito entre as noções de continuidade e descontinuidade observadas em todos êstes fenômenos. De acôrdo com a teoria ondulatória, a energia emitida pelos corpos pode variar de uma maneira contínua, isto é, a energia ganha ou perdida nos fenômenos físicos pode ser dividida em porções tão pequenas quanto se queira. Os cálculos baseados nesta teoria levam à conclusão de que a energia emitida pelos corpos negros deveria distribuir-se de modo que as diversas radiações possuíssem tanto maior porção de energia quanto menor fôsse seu comprimento de onda, ou quanto maior sua freqüência, o que é o mesmo. (FREITAS, 1959, p. 455).

O autor continua expondo que essa conclusão conflita com a lei de Wien, “segundo a qual o máximo de energia emitida por aquêles corpos pertence a uma radiação cujo comprimento de onda varia com a temperatura absoluta.” (FREITAS, 1959, p. 455). As teorias eletromagnéticas não conseguiram, portanto, explicar a distribuição de energia no espectro nem porquê ocorrem os fenômenos de emissão de eletricidade por ação de luz (efeito fotoelétrico) ou elevação de temperatura (efeito termelétrico). Tais fenômenos podem ser explicados, porém, pela teoria formulada por Max Planck, “segundo a qual tôda fonte de radiação só pode emitir ou absorver energia por saltos bruscos, isto é, por unidades discretas, múltiplas de um certo quantum, que representa um átomo de energia. Êste quantum q é, entretanto variável e depende da freqüência v da radiação: q = hv(FREITAS, 1959, p. 456), em que h corresponde à constante universal de valor 6,55x10-27 erg x seg.

Nota-se que o autor refere-se ao efeito fotoelétrico, que é tratado anteriormente e ao longo de três páginas com maiores detalhes no parágrafo 366 do capítulo V da seção 8, intitulada “Generalidades sôbre as correntes alternativas”. Na página 424, escreve:

Se se dispuser uma lâmina de zinco sôbre um electroscópio de fôlhas carregado; e se fizer incidir sôbre ela um feixe de raios ultravioleta o electroscópio se descarrega, se estiver eletrizado negativamente. Se a eletrização do electroscópio fôr positiva sua carga não se altera. Explica-se êste fenômeno admitindo que as radiações incidentes arrancam partículas negativas da superfície do metal e as partículas mais profundas afluem então para a superfície até descarregar o electroscópio. Medindo a relação e/m entre a carga das partículas emitidas e sua massa encontra-se o valor 1,77 x 108 correspondente aos eléctrons. Êste fenômeno tem o nome de efeito fotoelectrônico ou fotoelétrico. (FREITAS, 1959, p. 424).

Com isso, é possível argumentar que o autor, apesar de criar e dedicar um capítulo específico à discussão sobre teorias modernas da Física, acaba por também discuti-las em outros momentos no decorrer do livro, a exemplo da seção 2 (em que discute o experimento de Michelson) e da seção 8 (em que explora o efeito fotoelétrico), ambos tópicos mencionados diretamente no capítulo.

Dando continuidade ao último parágrafo do capítulo, o livro afirma que a teoria de Planck está de acordo com a hipótese de Bohr acerca da emissão de radiações pelos elétrons ao saltar de uma órbita a outra. Portanto, a teoria dos quanta leva à conclusão de que um feixe de radiações de frequência v consiste em um enxame de corpúsculos designados fótons que transportam uma quantidade de energia correspondente a hv. Entretanto, essa teoria não esclareceu os fenômenos de interferência, difração e polarização da luz. Aqui, o autor menciona Louis de Broglie (Figura 8) e Erwin Schrödinger, alegando o seguinte:

L. de Broglie (1924) e Schrödinger (1926) conseguiram conciliar as duas teorias, ondulatória e corpuscular. Na teoria desenvolvida principalmente pelo primeiro dêstes sábios e denominada mecânica ondulatória “o foton é análogo a um projétil material que transporta energia com uma velocidade v”; em seu deslocamento êle se envolve de uma onda associada, cujo comprimento de onda λ é: (FREITAS, 1959, p. 456).

Equação referente à teoria de L. de
Broglie
Figura 8
Equação referente à teoria de L. de Broglie
Freitas (1959, p. 456)

Na equação correspondente à Figura 8, m é a massa do fóton. Assim, a onda pilota o corpúsculo, nas palavras do autor, resultando nos fenômenos de interferência e difração, de forma que, quando a amplitude é nula, não há fótons e quando ela for máxima, há acúmulo de fótons:

Davison e Germer, físicos americanos, obtiveram fenômenos de interferência, por meio de eléctrons lançados com grande velocidade através de uma rede muito fina, constituída por uma delgada lâmina cristalina, o que constituiu uma bela verificação da teoria de De Broglie. O efeito Compton pode também ser explicado por esta teoria. Quando os fotons encontram a matéria, chocam-se contra os eléctrons e comunicam-lhes energia, saltando com uma energia menor. Há, portanto, diminuição de freqüência e aumento do comprimento de onda da radiação difundida. (FREITAS, 1959, p. 457).

O tópico conclui-se com a afirmação de que “as leis dos fenômenos são leis estatísticas que nos ocultam leis individuais da ação entre moléculas, átomos e eléctrons.” (FREITAS, 1959, p. 457).

Percebe-se, ao final do capítulo, que o mesmo não apresenta nenhuma proposta de exercício referente ao assunto. Contudo, essa é uma característica geral do livro em sua integralidade, pois o mesmo acontece para os demais capítulos, de forma que o autor desenvolve os temas baseando-se apenas na exposição de exemplos e representações gráficas, além de descrições das teorias e menção dos cientistas por trás dos conceitos.

Considerações finais

Por intermédio da análise do capítulo que o livro dedica às teorias modernas da Física observa-se que apesar de discutir e apresentar os principais conceitos que constituem a Física Moderna (como mecânica eletromagnética, a teoria da relatividade e a mecânica ondulatória), evidenciar os principais cientistas que fizeram parte dos avanços desse campo e incorporar equações e representações que podem ser desenvolvidas com alunos do ensino secundário, o autor traz apenas uma abordagem introdutória, pois, como menciona no início, a inclusão da Física Moderna no livro deve-se apenas à obrigatoriedade do cumprimento das Instruções Metodológicas previstas no programa de Física então instituído pela Portaria Ministerial n° 1.045, de 14 de dezembro de 1951.

Ademais, é possível constatar que não há discussões aprofundadas acerca de aspectos epistemológicos da Ciência e do pensamento científico neste capítulo, exceto por breves menções ao impacto de algumas transformações ocorridas como, por exemplo, o trecho “Indicaremos apenas que êste sábio deu uma nova concepção da teoria da gravitação” (FREITAS, 1959, p. 455), no qual se refere às contribuições de Einstein.

Ainda neste ponto, outros momentos parecem abordar, mesmo que não de maneira detalhada, aspectos do pensamento científico, eles são expressos pela composição de alguns trechos, como “Várias explicações foram formuladas para dar conta do resultado” (Ibidem, p. 451) e “Esta hipótese era aparentemente absurda, mas, Lorentz e Larmor mostraram ser ela admissível devido à natureza electromagnética das fôrças de coesão” (Ibidem) quando se refere a problemas encontrados na mecânica eletromagnética; “A transformação de Galileu pode considerar-se como o limite da transformação de Lorentz” (Ibidem, p. 452) quando aborda as transformações de Lorentz; “O eter perdeu assim sua realidade física e, de acôrdo com as idéias de Einstein, o eter não existe” (Ibidem, p. 453) e “Nos últimos anos Einstein pretendeu reunir em um mesmo corpo de doutrina a gravitação e a eletricidade, procurando explicar também os fenômenos electromagnéticos por modificação da estrutura métrica do espaço” (Ibidem, p. 455) quando discute a teoria da relatividade. São trechos que possibilitam discussões acerca da atividade científica e mesmo da busca pela unificação das teorias da Física, porém, são feitas apenas rápidas menções.

Ao observar os documentos oficiais que norteiam o ensino de Física no contexto atual, à exemplo da BNCC e dos PCNs, percebe-se que a presença da Física Moderna e Contemporânea nos currículos é reforçada para o desenvolvimento de uma participação e uma compreensão mais efetiva no mundo tecnológico, uma vez que imensa parte dele decorre de conhecimentos originários da Física e de outros campos da Ciência (TERRAZZAN, 1992). A BNCC destaca, no seguinte trecho, em que aborda o tópico da Contextualização Histórica, Social e Cultural da Ciência e da Tecnologia, que o mesmo deve ser acompanhado de discussões mais aprofundadas, ao invés de tratar “[...] apenas da menção a nomes de cientistas e a datas da história da Ciência” (BRASIL, 2021), apresentando “[...] os conhecimentos científicos como construções socialmente produzidas, com seus impasses e contradições, influenciando e sendo influenciadas por condições políticas, econômicas, tecnológicas, ambientais e sociais de cada local, época e cultura.” (Ibidem). Sendo assim, o livro de Aníbal não atenderia em totalidade ao que hoje pretende-se discutir quando a Física Moderna é abordada.

Contudo, considerando que o intuito expressado pelo autor era de “fazer um apanhado daquelas que maior influência exerceram na explicação dos fenômenos físicos, nos últimos tempos” (FREITAS, 1959, p. 451), pode-se dizer que o mesmo alcançou o seu objetivo.

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