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LETRAMENTO CIENTÍFICO NA DOCÊNCIA DE PROFESSORES DE BIOLOGIA: CONCEPÇÃO E PRÁTICA
Tadeu Teixeira de Souza; Simone Beatriz Reckziegel Henckes; Diógenes Gewehr;
Tadeu Teixeira de Souza; Simone Beatriz Reckziegel Henckes; Diógenes Gewehr; Bárbara Scartezzini; Andreia Aparecida Guimarães Strohschoen
LETRAMENTO CIENTÍFICO NA DOCÊNCIA DE PROFESSORES DE BIOLOGIA: CONCEPÇÃO E PRÁTICA
SCIENTIFIC LETTERING DOC DOCTORNY OF BIOLOGY PROFESSORS: CONCEPÇÃO AND PRACTICE
REAMEC – Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática, vol. 6, núm. 2, 2018
Universidade Federal de Mato Grosso
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Resumo: O presente estudo objetiva analisar como o Letramento Científico tem sido desenvolvido pelos docentes de Biologia nas escolas públicas de Ensino Médio do município de Iguatu/CE. Trata-se de uma pesquisa qualitativa, de cunho exploratório, com aproximações de estudo de caso. Para coleta dos dados, utilizou-se entrevista semiestruturada junto a 13 professores. As informações obtidas foram analisadas à luz da Análise Textual Discursiva. Os resultados demonstraram que os professores entrevistados apresentam insegurança quanto ao tema deste estudo, bem como, dificuldades em fazer relação com suas práticas diárias. Não possuem clareza quanto ao conceito de Letramento Científico. Utilizam como estratégia pedagógica principal para as aulas o livro didático, o qual muitas vezes é desconexo da realidade dos alunos, conforme os entrevistados. É possível inferir que este tema deve ser problematizado entre os professores a fim de habilitá-los para a reflexão, buscando uma prática docente intimamente significante para os alunos, almejando o Letramento científico destes.

Palavras-chave: Ensino de Biologia, Livro Didático, Letramento, Ensino Médio, Alfabetização Científica.

Abstract: The present study aims to analyze how the Scientific Literature has been developed by Biology teachers in public high schools of the municipality of Iguatu / CE. This is a qualitative, exploratory research, with case study approaches. For data collection, a semi-structured interview was used with 13 teachers. The information obtained was analyzed in light of the Discursive Textual Analysis. The results showed that the interviewed teachers present uncertainty regarding the subject of this study, as well as difficulties in making a relation with their daily practices. They are not clear about the concept of Scientific Letters. They use as main pedagogical strategy for the classes the textbook, which is often disconnected from the reality of the students, according to the interviewees. It is possible to infer that this theme must be problematized among teachers in order to enable them for reflection, seeking a teaching practice that is intimately significant for students, aiming at the scientific literacy of these.

Keywords: Biology Teaching, Textbook, Basic education, Literacy, Scientific Literacy.

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LETRAMENTO CIENTÍFICO NA DOCÊNCIA DE PROFESSORES DE BIOLOGIA: CONCEPÇÃO E PRÁTICA

SCIENTIFIC LETTERING DOC DOCTORNY OF BIOLOGY PROFESSORS: CONCEPÇÃO AND PRACTICE

Tadeu Teixeira de Souza
Universidade do Vale do Taquari , Brasil
Simone Beatriz Reckziegel Henckes
Universidade do Vale do Taquari – UNIVATES, Brasil
Diógenes Gewehr
Universidade do Vale do Taquari, Brasil
Bárbara Scartezzini
Universidade do Vale do Taquari, Brasil
Andreia Aparecida Guimarães Strohschoen
Universidade Vale do Taquari, Brasil
REAMEC – Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática
Universidade Federal de Mato Grosso, Brasil
ISSN-e: 2318-6674
Periodicidade: Frecuencia continua
vol. 6, núm. 2, 2018

Recepção: 26 Abril 2018

Aprovação: 01 Dezembro 2018


1. INTRODUÇÃO

Cada vez mais, os processos de ensino e de aprendizagem têm recebido ênfase especial de estudiosos da área da educação que buscam um equilíbrio harmonioso entre ambos processos. Para isso, tem se pensado dentro das universidades sobre assuntos pertinentes e que precisam ser estudados, refletidos e da mesma forma, compartilhados com a sociedade.

É importante considerar que os sujeitos dos processos de ensino e de aprendizagem (professor e aluno) devem estabelecer uma dinâmica para “[...] não se limitarem à memorização de fatos desconexos, mas sim estruturar um arcabouço relevante para análise de conceitos básicos para a compreensão da ciência [...]” (ZANCAN, 2000, p. 6). Observa-se que o livro didático, muitas vezes é a principal estratégia dos professores para dinamizar suas aulas. Este apresenta o “conhecimento científico como um produto acabado, elaborado por mentes privilegiadas, desprovidos de interesses político-econômicos e ideológicos” (NETO; FRACALANZA, 2003, p.151). Neste contexto, a dinâmica na forma de ensinar, deve buscar modelos efetivamente inovadores que possibilitem avançar sobre esse ensino memorizador, pronto e indiscutível apresentado nos livros didáticos. Isto principalmente através da valorização e implantação de uma prática educativa investigativa utilizando projetos de aprendizagem, resolução de problemas, inserção de textos de divulgação científica, práticas de contextualização do conhecimento, além de outras estratégias possíveis buscando qualificar o ensino (OLIVEIRA; ZANCUL, 2014).

Considerando o exposto, o presente estudo tem sua gênese na perspectiva do Letramento Científico (LC), sendo que este termo remete a um estudante que consegue efetivamente fazer uso do conhecimento científico na vida social de uma maneira ampla (SANTOS, 2007). Desta forma, buscamos neste texto conhecer as concepções de LC de professores de Biologia de escolas do Ceará/BRA; bem como analisar suas práticas pedagógicas e uso do livro didático como estratégias de letramento científico.

2. REFERENCIAIS TEÓRICOS

Nas pesquisas atuais sobre o ensino de Ciências e Biologia temos a crescente utilização do termo “Letramento Científico” (LC), sendo que este, juntamente com o termo “Alfabetização Científica” (AC) fazem referência à discussão sobre a educação científica dos estudantes. O termo “Alfabetização Científica”, conforme Sasseron e Carvalho (2011, p. 61) baseia-se em:

um ensino que permita aos alunos interagir com uma nova cultura, com uma nova forma de ver o mundo e seus acontecimentos, podendo modificá-los e a si próprio através da prática consciente propiciada por sua interação cerceada de saberes de noções e conhecimentos científicos, bem como das habilidades associadas ao fazer científico.

Para Santos (2007) a AC pode ser considerada como a apreensão de um código, ou seja a aprendizagem dos códigos da Ciência e dos seus conteúdos. E o LC vai além do domínio dos códigos, envolve processos cognitivos e domínios de alto, refere-se assim ao uso e aplicação social do conhecimento científico, considerando seu contexto sócio-histórico. Shamos (1995) pontua que o LC envolve um conhecimento mais aprofundando dos constructos teóricos da ciência e da sua epistemologia, compreendendo os elementos da investigação científica, da experimentação e da elaboração dos modelos científicos. Nesta perspectiva, o estudante além de ter conhecimento das teorias científicas deve ser capaz de propor modelos em ciência, exigindo o desenvolvimento de processos cognitivos de alto nível para elaborar modelos explicativos para os processos e fenômenos vivenciados (SANTOS, 2007).

Segundo Krasilchik e Marandino (2004), a competência de adquirir o LC não está atrelada a saber ler, escrever e resolver fórmulas, mas saber aplicar os conceitos na busca de pensar e encontrar soluções dos problemas da sociedade. Assim, “[...] os professores de todos os níveis precisam estar conscientes de que a ciência não é só um conjunto de conhecimentos, mas sim, um paradigma pelo qual se vê o mundo [...]” (ZANCAN, 2000, p. 6). O LC, desta forma busca desenvolver nos alunos competências que os tornem cidadãos críticos, investigativos, capazes de resolver problemas diante dos desafios impostos. Neste contexto, insere-se o ensino de Biologia, problematizado neste estudo.

O ensino na perspectiva do LC apresenta como marco estruturante a possibilidade de promover o raciocínio, a reconstrução de conceitos e o questionamento de assuntos vividos pelos alunos, algo nem sempre perceptível no ensino de Biologia. Entretanto, esta prática propõe estabelecer uma ligação entre o conhecimento científico e o cotidiano através da reflexão crítica e interativa das situações reais (SANTOS, 2007). É possível perceber que a presença do contexto social dos alunos, no processo de ensino, contribui para promover nestes, habilidades pautadas na emissão de juízo de valores de forma crítica e reflexiva, a partir do próprio cotidiano (KOLSTO, 2001).

A definição acima evidencia a amplitude do processo, destacando a reflexão como procedimento indispensável, necessária para a construção de um novo modelo de ensino. Considerando o domínio do LC, o relatório do PISA (BRASIL, 2006) o define como sendo o “[...] conhecimento para identificar questões, adquirir novos conhecimentos, explicar fenômenos científicos e tirar conclusões baseadas em evidência científica sobre questões relacionadas a Ciências” (BRASIL, 2006, p. 34). O LC, em sua essência propõe um ensino de Biologia que inclua na sua dinâmica o uso de temáticas que estejam próximas do contexto social dos alunos, ao mesmo tempo em que os formam como cidadãos críticos e responsáveis (LORENZETTI; DELIZOICOV, 2001).

Neste contexto, é importante que os conhecimentos sejam apresentados aos alunos com criatividade, contextualizando-os, visto que quando os conhecimentos são familiarizados com o cotidiano, o saber torna-se mais satisfatório e significante (OLDONI; LIMA, 2017). Ressalta-se aqui a importância de discutirmos como os processos têm percebido estes processos e quais ações tem sido empreendidas para transformar o ensino estritamente informativo para um ensino transformador e criativo.

3. MATERIAIS E MÉTODOS

O desenvolvimento deste estudo ocorreu no município de Iguatu, localizado na região Centro-Sul do Estado do Ceará e distante 377 km da capital Fortaleza. Atualmente é considerada a principal cidade da região por apresentar um comércio em crescimento e pela ascensão do Ensino Superior. Na área educacional, o município possui em sua rede de ensino 53 escolas da Educação Básica, sendo 41 municipais – Ensino Fundamental, cinco escolas da rede privada de Ensino Médio, um Instituto Federal do Ceará e sete escolas estaduais de ensino médio

O presente trabalho é um estudo de abordagem qualitativa. Apresenta objetivo exploratório, com aproximações ao estudo de caso. A fim de conhecer as concepções e práticas de professores de Biologia de escolas de Iguatu/Ceará/BRA, bem como investigar o quanto o livro didático é considerado, por estes docentes como estratégia de letramento científico foram realizadas entrevistas semiestruturadas junto a 13 professores da disciplina de Biologia, nas sete escolas de Ensino Médio da cidade, no ano de 2013. Os professores de Biologia do município foram inicialmente contatados, receberam esclarecimentos quanto ao estudo e aqueles que aceitaram participar assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Durante as entrevistas, os pesquisadores registraram as falas dos 13 professores participantes através da gravação de áudio, a qual serviu para transcrição e análise dos depoimentos. Estes serão denominados neste texto doravante pelos números de 1 a 13 (P1, P2, P3…) a fim de preservar a identidade dos mesmos.

As questões utilizadas na entrevista versavam sobre as concepções e práticas pedagógicas dos professores de Biologia considerando o Letramento Científico, bem como o uso do livro didático como estratégia de Letramento Científico dos alunos.

Após a conclusão das entrevistas o áudio foi transcrito e analisado por meio da Análise Textual Discursiva (ATD), a qual possibilita uma análise criteriosa dos textos. Neste processo a “[...] análise textual discursiva cria espaços de reconstrução, envolvendo-se nisto diversificados elementos, especialmente a compreensão dos modos de produção da ciência e reconstruções de significados dos fenômenos investigados” (MORAES; GALIAZZI, 2006, p. 119). Esta análise tornou-se base para o desenvolvimento das demais etapas previstas para a realização deste estudo.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

De acordo com a transcrição das entrevistas, evidenciou-se que o tempo médio de docência dos professores de Biologia no Ensino Médio nas escolas é de cinco anos e seis meses. Em geral, são professores jovens. Incluiu-se nesse tempo médio a experiência de professores com 14 anos de magistério, bem como alguns com cinco meses de sala de aula, valores que equacionam a média acima mencionada.

Em relação à formação inicial, os professores entrevistados são graduados em Ciências Biológicas. Este cenário atende a exigência da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) 9394/96 (BRASIL, 2006) e qualifica os serviços educacionais prestados à comunidade escolar da rede pública de ensino.

Considerando as demais questões da entrevista emergiram duas categorias de análise. A primeira categoria busca discutir as concepções e práticas pedagógicas dos professores considerando o LC dos alunos. A segunda categoria que emergiu da fala dos professores, refere-se ao potencial do livro didático como estratégia para o LC dos alunos.

I - Concepções e práticas pedagógicas e o Letramento Científico

Quando perguntados sobre suas concepções de LC os professores apresentaram-se seguros em responder, fazendo referência ao significado do termo alfabetização. Deixaram externar que são duas nomenclaturas conceituais distantes de sua prática, ou seja, não fazem parte do cotidiano destes professores.

Os professores entrevistados relataram que existe semelhança entre Alfabetização Científica e Letramento Científico, utilizando como critério as definições das palavras:

[...] fazemos Alfabetização Científica quando falamos de projetos científicos, hipóteses, métodos [...] (P1).

Alfabetização Científica é mais profundo do que Letramento. É pegar aquele que não tem noção do que é científico e tentar alfabetizar na linha científica, principalmente a escrever, pesquisar e orientar. Na prática fiz na monografia e artigos, há muito tempo [...] (P3).

Mesma relação com a alfabetização gramatical. Inserir o aluno a aprender a escrever [...] (P7).

É o processo inicial do contato do aluno a pesquisa, com o conhecimento, com textos científicos (P13).

Com base nessas falas percebe-se que os professores entrevistados fazem uma relação forte entre AC e a construção de projetos de pesquisa, e que tanto o LC quanto à AC são vistas como ações esporádicas no ensino de Biologia. É necessário refletirmos que Alfabetização não é um termo diferente, porém o diferencial está no desafio de fazer o aluno pesquisar obedecendo a sua idade e evolução mental (DEMO, 2005). Assim, torna-se possível apropriar-se dos conceitos de AC e LC como competências básicas para a melhoria do ensino de Biologia.

Para Sasseron e Carvalho “[...] a Alfabetização deve [...] possibilitar ao analfabeto a capacidade de organizar seu pensamento de maneira lógica, além de auxiliar na construção de uma consciência mais crítica em relação ao mundo que o cerca” (2008, p. 334), ou seja, o modo como compreende e interpreta o mundo. Alguns entrevistados relataram não ter clareza sobre os termos apresentados e que não poderiam opinar. Como nas falas a seguir:

Já ouvi falar sobre letramento científico, mas penso que está relacionado ao ensino superior, e de pesquisas científicas (P12).

Não tenho certeza do significado, mas deve ter relação com Ciência (P5).

Posso até ter que aplicar com meus alunos, mas dizer que tenho domínio e sei o que é, não posso afirmar (P4).

[...] eu não sei te dizer o que seria Letramento Científico, mas leva a ideia de alfabetização [...] (P2).

Alguns entrevistados procuraram exemplificar com fatos ocorridos em sala de aula que envolvessem leitura, isso ficou visível nas falas que seguem abaixo:

É uma linguagem científica que nós professores de Biologia precisamos nos apropriar, pois estamos atrasados considerando que só [nos] ligamos em aprender os conteúdos que vamos repassar (P7).

Penso que é quando fazemos a leitura de um texto científico e discutimos (P9).

Acho que é a leitura e interpretação de textos de revistas científicas, como os artigos produzidos por cientistas (P.6).

Na perspectiva da aplicabilidade, os professores entrevistados apresentaram poucos exemplos que representassem a ideia de Letramento, mas consideraram que se refere a práticas de escrita e leitura em um contexto social, próximo ao que define que uma pessoa letrada não é somente aquela que é capaz de decodificar a linguagem escrita, mas aquela que efetivamente faz uso desta na vida social (DIESEL et al., 2016). Ultrapassando a simples conquista das competências de decifrar a escrita mas preparando o cidadão para ser capaz de ler o mundo e fazer julgamentos críticos e até mesmo políticos (DEL PINO; FRIZON, 2011). Um dos exemplos apresentados pelos docentes foi:

[...] eu peço para os alunos lerem em voz alta um trecho do livro e faço perguntas para o restante da turma, para ver se entenderam (P9).

Quando perguntados sobre em que condições um indivíduo é letrado cientificamente, em âmbito geral tiveram dificuldade em responder. Como a maioria dos respondentes não demonstrou clareza conceitual sobre LC, é provável que isto no momento da entrevista tenha interferido nas respostas sobre as características de um indivíduo letrado cientificamente. Os professores não conseguiram observar que no cotidiano é possível acontecer situações práticas que promovam no aluno a capacidade de refletir e agir no seu dia a dia. Para Fourez (2003), o indivíduo só é considerado letrado cientificamente quando adquire competências que o ajudam a se comunicar, a entender e negociar com os problemas sociais de forma ética, responsável e lógica. Entretanto, precisa ir além de dominar termos e conceitos científicos. Como apresenta Shamos (1995) um cidadão letrado não apenas sabe ler o vocabulário científico, é capaz de refletir criticamente de forma significativa. Um dos entrevistados relatou que o letrado cientificamente

[...] é aquele aluno que sabe ler e entender os conceitos científicos, respondendo corretamente quando solicitado nas avaliações (P7).

Observa-se nesta fala a falta de conhecimento sobre a amplitude do conceito letramento científico e que este processo vai “desde o letramento no sentido do entendimento de princípios básicos de fenômenos do cotidiano até a capacidade de tomada de decisão em questões pessoais ou de interesse público ... O letramento como prática social implica a participação ativa do indivíduo na sociedade” (SANTOS, 2007, p. 480). Outros trechos das entrevistas corroboram com a falta de compreensão dos professores do processo de LC:

[...] o aluno letrado cientificamente é aquele que concluiu um curso superior na área de Ciências (P11).

É alguém que se interessa e lê sobre os assuntos de Ciências (P9).

Quando indagados sobre sua contribuição como professor para o LC dos alunos, percebeu-se uma lacuna nas respostas dos professores devido, provavelmente, ao desconhecimento dos conceitos de LC. Assim, as respostas demandam superficialidade nas ideias, como observado na fala da professora 1:

Se eu soubesse sobre as perguntas anteriores, talvez eu pudesse dizer que atuo no Letramento Científico dos meus alunos (P1).

Segundo Santos (2007), a contribuição dos professores de Biologia para desenvolver competências relacionadas ao LC se dará a partir da superação na forma de ensinar Biologia através da leitura de vocábulos, passando a ensinar os alunos a irem além de ler e compreender os textos científicos. Apesar de ter um importante papel, a escola sozinha não consegue “alfabetizar cientificamente” seus alunos, como problematizado por Lorenzetti e Delizoicov (2001), mas esta função não pode ser menosprezada.

II – Livro didático de Biologia e o Letramento Científico

Quando abordados sobre o uso de estratégias pedagógicas, o livro didático (LD) foi citado como sendo utilizado com todas as turmas de alunos. Percebeu-se que esta ferramenta é o recurso universal usado nas aulas de Biologia no cotidiano dos professores entrevistados. O mesmo pode ser observado em outros trabalhos que analisam o uso dos livros didáticos até mesmo em outras disciplinas (MILARÉ; ALVES FILHO, 2010) e níveis de ensino (BRANDI, GURGEL, 2002).

Todos os professores entrevistados neste estudo relataram utilizar o LD durante as aulas ministradas. Confirma-se que “[...] o LD, na maioria das salas de aula, continua prevalecendo como principal instrumento de trabalho do professor, embasando significativamente a prática docente [...]” (DELIZOICOV; ANGOTTI; PERNAMBUCO, 2011, p. 36).

Dentre os entrevistados, dois professores mencionaram que usam o livro didático como apoio, pois através das ilustrações é possível ajudar os alunos a compreenderem os conteúdos discutidos. A partir da pergunta, “é possível acompanhar com os livros didáticos as definições dos termos biológicos e a resolução em conjunto de atividades”, a professora (P4) comenta que,

[...] a gente utiliza as imagens atrelado ao resumo do capítulo [...] (P4).

Oito professores entrevistados responderam que usam o livro didático para desencadear a mobilização dos alunos para a discussão dos conteúdos a serem estudados por meio da leitura dos capítulos, além de solicitar a resolução de exercícios propostos disponíveis nos mesmos. Observa-se que o livro didático assume funções diferentes, dependendo do docente e do momento. Apenas a professora (P1) relatou que além do LD ela procura utilizar outros textos extraídos de outras fontes, como sites da Internet:

[...] os textos diferenciados possibilitam fazer a contextualização e intercalá-los com o livro didático (P1).

Neste sentido, Viecheneski e Carletto (2013) relatam que esta diversidade recai apenas nas leituras e resoluções de exercícios de fixação. Ressalta-se, que há muitas alternativas para se trabalhar além do próprio LD.

Os professores foram questionados quanto ao atendimento dos “objetivos propostos para a disciplina de Biologia pelos LD”, a maioria dos entrevistados afirmaram que os LD possuem uma função de suporte no desenvolvimento da aula.

Nas atividades, em termo de conteúdo, de leituras de informações, de figuras, eu acho que não deixa a desejar (P3).

Não faz uma abordagem completa, mas dá certa introdução para o que é proposto (P11).

[...] além dos textos incentiva a leitura, a pesquisa em sites, diz aonde buscar (P13).

Nascimento e Alvetti (2006) esclarecem que um dos principais itens para serem abordados nos LD de Biologia está relacionado à inclusão de tópicos contemporâneos que discutem a relevância social e tecnológica dos conhecimentos biológicos na atualidade, bem como aproximação dos conteúdos programáticos almejando a formação do cidadão crítico e reflexivo. Segundo estes autores, a aproximação dos conteúdos propostos pelos LD acaba tornando um empecilho, pois ao terminar a situação didática na qual o assunto ou problema foi trabalhado, acaba-se o sentido dos saberes envolvidos, limitando seu contexto.

Os professores entrevistados relataram que os LD adotados por eles pertencem ao Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), condição esta que os habilita a serem adotados pelas escolas de todo país pois, de fato, buscam estabelecer esta relação do que ensinar com o que aprender, qualificando o ensino de Biologia. Nesta direção, Neto e FRACALANZA (2003) consideram essencial a elaboração de propostas alternativas para utilizar o livro didático convencional na perspectiva de garantir qualidade na aprendizagem dos alunos.

Em relação à “qualidade dos textos presentes nos LD” e “considerando o fato dos mesmos apresentarem informações atuais”, todos os professores entrevistados revelaram que os livros por eles adotados apresentam textos atualizados envolvendo temáticas atuais, destacando o professor (P1):

[...] como, por exemplo, biotecnologia, células tronco e transgênicos, de forma complementar, a cada final de capítulo (P1).

Segundo as Orientações Curriculares Nacionais (BRASIL, 2003) os conhecimentos de Biologia aparecem em evidência nos meios de comunicação, jornais, revistas e Internet, condições estas que ratificam a importância e a presença de textos atualizados nos livros adotados pelos professores como eixo norteador para atender a demanda do contexto social. Quanto aos “textos presentes nos LD que se referem à realidade dos alunos”, na condição de contribuir para o aprendizado e a motivação dos alunos, a maioria dos professores responderam que não atende ou atende parcialmente às necessidades dos alunos, pois cada unidade escolar

[...] tem uma realidade e os livros são elaborados com textos convencionais e gerais (P2).

Evidencia-se muitas vezes uma distância entre a cotidiano dos alunos e o que o livro apresenta. Neste caso, o uso exclusivo do LD não é a melhor alternativa, sendo que o professor no seu planejamento precisa averiguar o que é ou não é tão importante para seu planejamento e fazer os devidos acréscimos e aproximações.

Considerando as Orientações Curriculares para o Ensino Médio os textos devem abordar temáticas que considerem a realidade específica dos alunos, as potencialidades do local onde está inserida a escola e sua região circunvizinha. Desta forma, o professor tem a possibilidade de “[...] selecionar os temas que são mais significativos e resolver como deverão ser trabalhados de modo a possibilitar situações de aprendizagem a partir das vivências dos alunos” (BRASIL, 2003, p. 22).

Os professores entrevistados foram questionados quanto à “forma com que a realidade dos alunos é explorada em sala de aula”. Observou-se que a maioria dos professores não possui a preocupação em aproximar os conteúdos de Biologia com a vida dos alunos, sendo algo aleatório e superficial. Dois professores disseram que conseguem até relacionar a contexto social, porém de forma limitada, conforme os trechos abaixo:

[...] tem conteúdo que a gente faz essa relação, por exemplo, DST, vírus e dengue e que ele está levando um conhecimento de dentro da sala de aula para a sua casa e perceber os cuidados [...] (P1).

[...] somos seres vivos e é muito importante você se conhecer e conhecer as relações que estabelece com o meio ambiente [...] (P2).

Para outros professores, os LD de Biologia adotados não avançaram em relação à atualidade dos textos, conforme trechos a seguir:

Não apresenta atualidade, precisa renovar os textos (P5).

A gente nota que a Biologia vem modificando a cada dia, a ciência se aperfeiçoando a cada minuto e devido a isso são atrasados (P7).

De fato, os livros didáticos devem ser atualizados, conforme orientações do PNLD. Necessitam estabelecer relações entre os conteúdos e a realidade dos alunos, ampliar a compreensão dos fatos e relacioná-los com os acontecimentos da vida diária.

Quanto ao procedimento de explorar notícias de jornal da cidade, todos os entrevistados afirmaram não ter o hábito de incluir notícias locais como estratégia para gerar as discussões nas aulas. Isto evidencia que muitas vezes os educadores não conseguem promover a aproximação dos conteúdos com os assuntos locais e/ou regionais, restringindo às discussões aos textos do Livro didático adotado pela turma.

5. CONSIDERAÇÕES

A melhoria do ensino de Biologia está associada ao comprometimento dos professores e alunos, e isto só ocorrerá com a efetiva participação e compromisso de todos. De fato, o apoio dos professores é de fundamental importância para buscar alternativas para melhorar o ensino de Biologia despertando nos alunos competências desenvolvidas pelo LC.

É preciso estabelecer momentos de estudos com os docentes para discussão de conceitos importantes para a prática pedagógica, pois como observamos a falta de clareza conceitual faz com que os professores acabem não se preocupando com o letramento científico dos seus alunos. Além disso, definir de forma clara e objetiva o projeto pedagógico da escola, priorizando a inserção de textos científicos como possibilidade para desenvolver competências necessárias ao LC. Esta necessidade mostrou-se clara pelas respostas dos professores que demonstraram ficar restritos aos textos do Livro Didático da turma, o qual muitas vezes, conforme relatado não apresenta a contextualização necessária à realidade dos alunos.

Também é importante propor ações que desenvolvam nos alunos a capacidade de pensar em várias situações sociais do seu dia a dia, buscando a reflexão crítica, incentivando a construção de textos científicos com respostas claras e esclarecedoras para os problemas encontrados. Nestas condições, ao ensinar Biologia almejando o Letramento Científico dos alunos, acredita-se que o professor será capaz de aproximar o conhecimento científico da realidade da sala de aula e do contexto social dos alunos.

Material suplementar
REFERÊNCIAS
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