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A PRODUÇÃO ACADÊMICA DA REGIÃO NORTE: UMA ANÁLISE NA ATA DO XI ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS

AN ANALYSIS OF THE ACADEMIC PRODUCTION OF THE NORTH REGION AT ENPEC

Tássila Zerbini Monteiro Pereira
Universidade Federal do Paraná, Brasil
Camila Silveira
Universidade Federal do Paraná, Brasil

REAMEC – Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática

Universidade Federal de Mato Grosso, Brasil

ISSN-e: 2318-6674

Periodicidade: Frecuencia continua

vol. 7, núm. 2, 2019

revistareamec@gmail.com

Recepção: 04 Agosto 2019

Aprovação: 10 Setembro 2019



DOI: https://doi.org/10.26571/REAMEC.a2019.v7.n2.p245-260.i8726

Os direitos autorais são mantidos pelos autores, os quais concedem à Revista REAMEC –Rede Amazônica de Educação em Ciências e Matemática -os direitos exclusivos de primeira publicação. Os autores não serão remunerados pela publicação de trabalhos neste periódico. Os autores têm autorização para assumir contratos adicionais separadamente, para distribuição não exclusiva da versão do trabalho publicada neste periódico (ex.: publicar em repositório institucional, em site pessoal, publicar uma tradução, ou como capítulo de livro), com reconhecimento de autoria e publicação inicial neste periódico. Os editores da Revista têm o direito de proceder a ajustes textuais e de adequação às normas da publicação.

Resumo: Esta pesquisa de natureza qualitativa tem como objetivo, fundamentada nos pressupostos da pesquisa documental, analisar a produção científica de pesquisadores da Região Norte no Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências (ENPEC), evidenciando as perspectivas teóricas e metodológicas das pesquisas. Para isso, foram utilizados como fontes de informação os trabalhos contidos nos anais do XI ENPEC e, para tratamento dos dados, a Análise de Conteúdo. Os resultados mostram que 5,8% dos trabalhos do XI ENPEC foram realizados por pesquisadores da Região Norte, sendo 61% desenvolvidos por participantes do estado do Pará. Os eixos temáticos com mais trabalhos foram Formação de Professores de Ciências (32%), Ensino e aprendizagem de conceitos e processos científicos (15%), Processos e materiais educativos em Educação em Ciências (15%), Educação em espaços não-formais e divulgação científica (11%), e Alfabetização Científica e Tecnológica, abordagens CTS/CTSA e Educação em Ciências (10%). Por fim, foi possível perceber que, apesar de haver um crescimento da representatividade da Região Norte no ENPEC, há uma influência grande dos locais onde os eventos são sediados – geralmente na região Sul e Sudeste – na divulgação científica da região, pois a distância dificulta a participação dos pesquisadores de estados mais afastados.

Palavras-chave: ENPEC, Perspectivas de pesquisa, Produção regional.

Abstract: This qualitative research aims, through documentary research, is understand how the North region manifested itself at XI ENPEC, by analyzing its representativeness and trends in the event. For this purpose, the works contained in the annals of ABRAPEC was use as a research tool and, for the treatment of the data, the Content Analysis. The results show that 5.8% of the XI ENPEC works was carry out by researchers from the North region, 60.2% of which were develop by participants from the state of Pará. The most important thematic areas were Education of Science Teachers (32%), Teaching and learning of scientific concepts and processes (15%), Educational processes and materials in Science Education (15%), Education in non-formal areas and scientific dissemination (11%), and Scientific and Technological Literacy, CTS/CTSA approaches and Science Education (10%). Finally, it was possible to notice that, although there is a growing representation of the North region in ENPEC, there is a great influence of the places where the events are held – usually in the South and Southeast – in the scientific dissemination of the region, because the distance makes it difficult the participation of researchers from more distant states.

Keywords: ENPEC, Prospects for research, Regional production.

1. INTRODUÇÃO

Os eventos científicos possibilitam o contato pessoal entre pesquisadores e, de acordo com Campello (2003), têm algumas funções, como aperfeiçoar os trabalhos científicos por meio de modificações sugeridas durante as apresentações nos eventos; ser um reflexo do estado da arte, permitindo identificar tendências e perspectivas da área; e ser um espaço de comunicação informal, oportunizando a troca de informações sobre projetos ou o desenvolvimento de trabalhos conjuntos.

Segundo Nardi (2005), a partir da década de 1970, foram criados os eventos nacionais específicos para discutir o ensino de Física, Química, Biologia e áreas afins, que contribuíram com a criação e consolidação do campo de produção de conhecimento denominado Ensino de Ciências. A crescente produção no Ensino de Ciências foi o que impulsionou a Associação Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências (ABRAPEC), em 1997, a criar o I Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências (ENPEC), que contou com aproximadamente 135 participantes em sua primeira edição (ABRAPEC, 1997).

O ENPEC tornou-se um evento bienal de grande importância e reconhecimento, com o objetivo de “reunir e favorecer a interação entre os pesquisadores das áreas de Ensino de Física, de Biologia, de Química, de Geociências, de Ambiente, de Saúde e áreas afins, com a finalidade de discutir trabalhos de pesquisa recentes e tratar de temas de interesse da ABRAPEC” (ABRAPEC, 2017). Assim, o público-alvo do evento são pessoas que se interessem por pesquisas em Educação em Ciências, podendo ser estudantes de pós-graduação, estudantes de licenciatura, pesquisadores e formadores de professores.

Em 2017, foi realizado o XI ENPEC em Florianópolis, Santa Catarina. Nesse evento foi possível perceber um aumento significativo de participantes e trabalhos em relação ao primeiro evento, demonstrando que a área de Ensino em Ciências está se consolidando: 1 498 participantes, 1 335 comunicações orais e 144 pôsteres (ABRAPEC, 2017).

Apesar de o ENPEC ser um evento de grande importância na área de Ensino de Ciências e de existirem diversos estudos que o analisam, há uma falta de pesquisas analisando diretamente como as regiões geográficas se apresentam no evento. Assim, este trabalho tem como objetivo analisar a produção científica de pesquisadores da Região Norte no Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências (ENPEC), evidenciando as perspectivas teóricas e metodológicas das pesquisas. Com base nos resultados, será possível construir contextos e tendências da Região Norte, o que fornecerá um panorama dos estudos dessa região voltados à educação em Ciências.

2. AS CONTRIBUIÇÕES DA REGIÃO NORTE PARA A PRODUÇÃO ACADÊMICA EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS

A preocupação acerca das pesquisas realizadas no Brasil já existe há tempos. Autores como Sidone et al. (2015), Cruz e Chaimovich (2010) e Albuquerque et al. (2002, 2005) chamam a atenção para o fato de que, apesar do crescente número de pesquisas na área, o Brasil, que representa apenas 1,4% da ciência mundial e 0,1% da tecnologia mundial em 2005, ainda necessita de incentivos às atividades de pesquisa e desenvolvimento. Esses incentivos devem ser especialmente ao sistema científico, para que haja uma melhor distribuição das atividades nacionais, as quais atualmente estão concentradas na região Sudeste.

Contudo, apesar do preocupante número associado às pesquisas brasileiras, muito vem se pesquisando sobre os eventos de Educação em Ciências. Mesmo que não existam estudos mais aprofundados sobre o ENPEC como os do tipo estado da arte ou estado do conhecimento, há um grande número de pesquisas que traçam algumas tendências presentes nos trabalhos disseminados por meio de suas atas.

Grande parte dessas pesquisas, como as de Gallon et al. (2017), Fonseca e Cardoso (2017), Fujihara e Labarce (2017), Silva et al. (2015), Moraes e Soares (2017), Slongo, Lorenzetti e Garvão (2015), buscam entender como tópicos específicos aparecem nos trabalhos do ENPEC, analisando-os de acordo com os referenciais teóricos, a distribuição geográfica, os conteúdos, os níveis de escolaridade e outras especificidades.

É importante frisar que a grande maioria desses trabalhos apresenta o mesmo ponto em comum sobre a relação de pesquisas acadêmicas e as regiões geográficas: há predominância das regiões Sul e Sudeste nas produções científicas, enquanto a Região Norte mostra-se com menor expressividade em quantidade de pesquisas. Tem-se como exceção o trabalho Feiras de ciências nos ENPECs (1997-2015): identificando tendências e traçando possibilidades (Gallon et al., 2017), o qual apresenta a Região Norte como a segunda região com mais trabalhos publicados sobre o tema feira de ciências nos anais dos ENPECs (1997-2015). Ainda de acordo com Gallon et al. (2017), a Região Norte demonstra um crescimento em relação às pesquisas sobre feiras e mostras como locais de pesquisa.

Segundo Sidone et al. (2015), a concentração de pesquisa científica em determinadas regiões está diretamente relacionada à localização dos campus das universidades públicas, pois estas são responsáveis pela maioria das atividades científicas.

De acordo com o Censo da Educação Superior (INEP, 2015), a Região Norte é responsável por 150 instituições, ou seja, 6,3% do total regional, sendo a menor representatividade das regiões geográficas brasileiras. Consequentemente, representou apenas 2,8% da produção científica regional entre os anos de 2007 e 2009.

Mesmo com a quantificação das pesquisas realizadas pela Região Norte, é necessário que se tenham análises qualitativas acerca das tendências dos estudos realizados por essa região. Assim, esta pesquisa tem o intuito de discutir a temática proposta com base nos postulados dos autores citados e perceber como a Região Norte brasileira se faz presente, em parte, na Educação em Ciências.

3. MATERIAIS E MÉTODOS

Esta pesquisa é de natureza qualitativa, portanto, de acordo com Lüdke e André (2013, p.14), “envolve a obtenção de dados descritivos, obtidos no contato direto do pesquisador com a situação estudada, enfatiza mais o processo do que o produto e se preocupa em retratar a perspectiva dos participantes”. Tendo em vista o objetivo de compreender a representatividade da Região Norte no XI ENPEC, a pesquisa é do tipo documental.

São considerados documentos “quaisquer materiais escritos que possam ser usados como fonte de informação sobre o comportamento humano” (PHILLIPS, 1974, apud. LÜDKE e ANDRÉ, 2013). Assim, dentre os trabalhos completos publicados, buscou-se aqueles em que o primeiro autor fosse membro de alguma instituição da Região Norte. Para isso, foram examinadas manualmente as 15 linhas temáticas do evento.

Após essa etapa inicial, foram selecionados 90 trabalhos e realizada uma leitura na íntegra dos textos dessas pesquisas. Então, foram escolhidos apenas os de caráter empírico, por conterem elementos que permitiriam ampliar o entendimento sobre os encaminhamentos metodológicos das produções.

A técnica utilizada para o tratamento dos dados foi a Análise de Conteúdo (Bardin, 1977), a qual tem como pretensão compreender o que um trabalho comunica além dos significados imediatos encontrados em uma primeira leitura. É também possível verificar um caráter social nesse método de análise, pois: “é uma técnica para produzir inferências de um texto focal para seu contexto social de maneira objetivada e [...] uma categoria de procedimentos explícitos de análise textual para fins de pesquisa social” (BAUER e GASKELL, 2002, p. 191).

Com o tratamento e a interpretação dos resultados obtidos, o analista, se possuir resultados significativos, pode propor inferências e interpretações de acordo com o objetivo proposto ao estudo, ou até mesmo propor descobertas.

Assim, a utilização da Análise de Conteúdo teve como intuito classificar os trabalhos de acordo com: o número de autores por artigo, os estados e as Universidades dos primeiros autores, o objeto de estudo das pesquisas, a temática das pesquisas descritas nos trabalhos, as metodologias, as técnicas de constituição de dados e de análise e a tendência da pesquisa da Região Norte manifestada no evento em questão.

4. A REGIÃO NORTE EM FOCO: RESULTADOS E DISCUSSÃO

Com o propósito de obter dados atualizados sobre a representação da Região Norte no ENPEC, foram pesquisados os trabalhos empíricos presentes nos 15 eixos temáticos do XI ENPEC (2017), que continham como primeiros autores pessoas ligadas a instituições da Região Norte.

Sendo assim, foram localizados 79 trabalhos e, com base nisso, observou-se que a Região Norte, apesar de dispor de uma quantidade pequena de trabalhos, teve um crescimento na quantidade de trabalhos presentes nas atas das últimas 5 edições.

Tabela 1
Representação da Região Norte no ENPEC (2009-2017).
Edição Ano Quantidade Representação
VII ENPEC 2009 22 3%
VIII ENPEC 2011 51 4%
IX ENPEC 2013 55 5,1%
X ENPEC 2015 72 5,6%
XI ENPEC 2017 79 5,8%
Fonte: Produção nossa.

Esses dados podem ser justificados pelo fato de as regiões Sudeste e Sul deterem a maior quantidade de cursos de nível superior e Programas de Pós-Graduação na área de Ensino de Ciências e, consequentemente, um maior número de pesquisadores desse tema. Outro fator refere-se ao fato de os ENPECs anteriores terem sido realizados 73% na Região Sudeste e 27% na Região Sul, favorecendo o deslocamento dos pesquisadores dessas regiões e proximidades e dificultando a vinda de pesquisadores de regiões mais distantes (SANTOS, 2008).

Ao analisar os autores dos artigos selecionados, encontrou-se uma forte tendência coletiva nas produções, havendo predomínio nos trabalhos com dois autores (41,3%), seguidos pelos trabalhos completos com mais de três autores (30%), depois com três autores (26%) e, por fim, pelo único trabalho com um autor (1%).

Em relação ao estado em que se localizavam os primeiros autores, percebe-se que apenas cinco dos sete estados que compõem a Região Norte têm trabalhos no evento, sendo eles Pará (61%), Amazonas (17%), Roraima (9%), Acre (8%) e Tocantins (5%). Os estados Amapá e Rondônia não apresentaram trabalhos selecionados de acordo com o critério estabelecido. É importante ressaltar que, analisando as outras pesquisas citadas neste trabalho sobre tendências nos ENPECs, os estados Amapá e Rondônia também não apresentaram trabalhos.

É importante observar que, da Região Norte, o Pará é responsável por 61% do total de trabalhos aceitos no XI ENPEC e os outros 39% estão distribuídos entre Amazonas, Roraima, Acre e Tocantins. Isso pode estar relacionado ao número de cursos de Pós-Graduação nos estados da Região Norte, pois o estado do Pará é o que mais possui cursos de Pós-Graduação, seguido pelo Amazonas. Contudo, o estado de Rondônia, mesmo com cinco programas de Mestrado relacionados ao Ensino de Ciências e Matemática em sua Universidade Federal, não apresentou trabalhos no XI ENPEC.

Em relação às IES (Instituições de Ensino Superior) dos primeiros autores, encontrou-se a distribuição organizada a seguir no Quadro 1.

Quadro 1
Distribuição de trabalhos encontrados por Universidade e estado dos primeiros autores.
Estado Instituição de Ensino Superior Número de trabalhos Percentual
Acre Universidade Federal do Acre 6 8%
Amapá ------------- -------------- -------------
Amazonas Universidade Federal do Amazonas 3 4%
Universidade do Estado do Amazonas 5 6%
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amazonas 4 5%
Universidade da Amazônia 1 1%
Pará Universidade do Estado do Pará 5 6%
Universidade Federal do Pará 39 50%
Secretaria de Estado de Educação 2 3%
Universidade Federal do Oeste do Pará 1 1%
Rondônia ------------- ------------- -------------
Roraima Universidade Estadual de Roraima 8 11%
Tocantins Universidade Federal do Tocantins 4 5%
Total 100%
Fonte: Silveira e Pereira (2019).

Também é possível observar que as Instituições de Ensino Superior dos primeiros autores são públicas, sendo que, de acordo com o Censo da Educação Superior (INEP, 2015, p. 54), as universidades particulares representam 86% das IES da Região Norte. Isso remete ao estudo realizado por Sidone et al. (2015), o qual diz que as universidades federais são responsáveis por grande parte das pesquisas científicas no Brasil. Pensando nisso e analisando as atas das edições anteriores do evento, nota-se que nos ENPECs entre 2009 e 2015 também não há trabalhos de participantes do estado Amapá – estado com o menor número de Programas de Pós-Graduação em Educação em Ciências.

Já em relação às linhas temáticas, o maior número de trabalhos está nos eixos temáticos de Formação de Professores de Ciências – FP (32%), Ensino e aprendizagem de conceitos e processos científicos – ECC (15%), Processos e materiais educativos em Educação em Ciências – PM (15%), Educação em espaços não-formais e divulgação científica – ENF (11%), e Alfabetização Científica e Tecnológica, abordagens CTS/CTSA e Educação em Ciências – ACT (10%), como mostra a Figura 1.

Relação entre o número de trabalhos selecionados e os eixos temáticos do
evento.
Figura 1
Relação entre o número de trabalhos selecionados e os eixos temáticos do evento.
Fonte: Silveira e Pereira (2019).

Ao analisar as linhas temáticas em relação aos estados da Região Norte, obteve‑se o panorama exposto a seguir no Quadro 2.

Quadro 2
Distribuição dos trabalhos por estado e linha temática.
Estados Linhas
FP ECC PM ENF ACT EA HFS DM ES LD AV CE PE QTM
Acre 0 1 0 1 0 0 0 1 0 0 0 1 0 0
Amapá 0 1 0 3 1 2 0 0 0 1 0 0 0 0
Amazonas 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Pará 19 3 8 2 5 1 3 1 2 1 1 0 1 1
Rondônia 3 4 1 2 2 1 0 0 0 0 0 0 0 0
Roraima 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Tocantins 0 1 3 1 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0
Fonte: Silveira e Pereira (2019).

Já em relação ao nível de ensino dos participantes da pesquisa, mesmo com o eixo de Formação de Professores de Ciências tendo o maior número de trabalhos, observa-se que os estudantes do Ensino Fundamental II foram os mais estudados (18%), seguido pelos estudantes do Ensino Médio (16%) e, por fim, os do Ensino Superior (14%).

Analisando os aspectos metodológicos dos trabalhos, foi possível identificar alguns fatores relacionados à natureza de pesquisa, por exemplo: o tipo de análise, os instrumentos utilizados para a constituição de dados e os referenciais teóricos e metodológicos mais presentes nas pesquisas da região em análise.

Com base na análise dos dados, foi possível perceber que, dos eixos temáticos de FP, ECC, PM, ENF e ACT, 25% dos trabalhos não especificaram qual a natureza da pesquisa realizada. Isso representa uma considerável fragilidade no aspecto metodológico das pesquisas.

Ao analisar os trabalhos que tiveram a natureza identificada, observou-se que as pesquisas qualitativas foram responsáveis por 95% do total de trabalhos, enquanto as quali-quantitativas representaram 5% e as de caráter quantitativo não estiveram presentes na Região Norte.

Também há um número bastante expressivo de trabalhos que não determinam o tipo de pesquisa realizada. É possível perceber que 69% dos trabalhos não especificam o tipo de pesquisa, principalmente os que estão no eixo temático Ensino e Aprendizagem de Conceitos Científicos, o qual tem um total de 100% de trabalhos sem identificação.

Quanto aos tipos de pesquisa especificados nos trabalhos, tem-se os seguintes percentuais de utilização: Pesquisa Narrativa (69%), Estudo de Campo (16%), Estado da Arte (10%), Pesquisa Exploratória (5%) e Pesquisa Documental (5%).

Ao comparar os resultados dessa região no XI ENPEC com os resultados encontrados por Greca et al. (2002), é possível perceber uma mudança no perfil dos tipos de pesquisa utilizados nos trabalhos submetidos ao evento. No III ENPEC, a análise qualitativa foi o tipo de pesquisa mais utilizado pelos pesquisadores participantes (19%), enquanto a investigação narrativa, que hoje é responsável pelo maior número de pesquisas na Região Norte, representava apenas 7% em 2001. Já a pesquisa documental, que no último ENPEC representou 5% na Região Norte, em 2001 foi utilizada por 7% dos trabalhos totais.

No Quadro 3, tem-se a síntese do resultado quanto à natureza e ao tipo de pesquisa.

Quadro 3
Relação entre a natureza e o tipo de pesquisa dos eixos temáticos com mais trabalhos da Região Norte.
Eixo temático Natureza Trabalhos Porcentagem Tipo de pesquisa Trabalhos Porcentagem
ECC Não especif. 1 10% Não especificado 10 100%
Qualitativa 9 90%
FP Não especif. 5 22% Não especificado 10 45%
Pesquisa narrativa 8 36%
Qualitativa 17 77% Estado da arte 2 9%
Estudo de campo 1 4%
Pesquisa participante 1 4%
PM Não especif. 4 33% Não identificado 9 75%
Qualitativa 7 58% Pesquisa narrativa 2 16%
Quali-quanti. 1 8% Pesquisa de campo 1 9%
ENF Não especif. 4 44% Não identificado 8 88%
Qualitativa 5 55% Pesquisa narrativa 1 12%
ACT Não especif. 2 25% Não identificado 5 62%
Qualitativa 5 62% Pesquisa documental 1 12%
Quali-quanti. 1 12% Pesquisa exploratória 1 12%
Estudo de campo 1 12%
Fonte: Silveira e Pereira (2019).

Na sequência, observou-se quais técnicas de análise de dados foram utilizadas nos mesmos eixos temáticos, conforme o Quadro 4.

Quadro 4
Relação entre o tipo de análise de dados e os eixos temáticos com mais trabalhos da Região Norte.
Eixos temáticos Técnica de análise de dados Trabalhos Porcentagem
Formação de professores Não especificado 8 36%
Análise de conteúdo 5 22%
Análise textual discursiva 9 40%
Ensino e aprendizagem de conceitos científicos Não especificado 9 75%
Análise de conteúdo 2 16%
Análise documental 1 8%
Processos e materiais Não especificada 8 66%
Análise documental 1 8%
Análise textual discursiva 3 25%
Espaços não-formais Não especificado 6 66%
Análise diagnóstica 1 11%
Análise documental 1 11%
Conversas de aprendizagem 1 11%
Alfabetização científica e tecnológica Não especificado 4 50%
Análise do discurso 1 12%
Análise interpretativa 1 12%
Análise textual discursiva 1 12%
Análise interpretativa 1 12%
Fonte: Silveira e Pereira (2019).

É possível perceber uma tendência de utilização das técnicas de Análise Textual Discursiva (46%), Análise de Conteúdo (25%) e Análise Documental (10%). Já referente aos trabalhos que não especificam a técnica de análise utilizada, foi observado que 55% dos trabalhos totais se encaixam nesse perfil.

Quanto aos referenciais metodológicos, nota-se algumas tendências nos eixos temáticos, indo ao encontro das técnicas descritas no Quadro 5.

Quadro 5
Referenciais metodológicos adotados nas pesquisas da Região Norte.
Eixos temáticos Referenciais metodológicos
Formação de professores BARDIN (2002, 2009, 2011)
CONELLY, F. M. e CLANDININ, D. J. (1995, 2000, 2011)
MORAES, R. (1999, 2003, 2007)
MORAES, R. e GALIAZZI, M. C. (2007, 2011)
GONÇALVES, T. V. O. (2000, 2013)
MINAYO, M. C. (1994)
Ensino e aprendizagem de conceitos científicos TRIVIÑOS, A. N. S. (1987, 2008)
LÜDKE, M. e ANDRÉ, M. E. D. (1986)
MARCONI, M. A. e LAKATOS, E. M. (2010)
MINAYO, M. C. (2001)
Processos e materiais educativos GIL, A. C. (2008)
MORAES, R. e GALIAZZI, M. C. (2014)
CONELLY, F. M. e CLANDININ, D. J. (2011)
MARCONI, M. A. e LAKATOS, E. M. (2010)
Espaços não-formais GIL, A. C. (2008)
LÜDKE, M. e ANDRÉ, M. E. D. (1986)
Alfabetização científica e tecnológica GIL, A. C. (2008)
GONÇALVES, T. V. O. (2013)
SANTOS, W. L. P. (2007)
Fonte: Silveira e Pereira (2019).

Pode-se observar que referenciais como Bardin, Moraes e Galiazzi, Minayo, Lüdke e André, Gil e Conelly e Clandinin estão presentes na maioria das linhas temáticas, o que está associado aos tipos de análises utilizados nos trabalhos desses eixos temáticos.

Na sequência, os referenciais teóricos adotados nas pesquisas analisadas são destacados no Quadro 6.

Quadro 6
Referenciais teóricos adotados nas pesquisas da Região Norte.
Eixos temáticos Referenciais teóricos
Formação de professores ANDRÉ, M. (1984, 2005)
CARVALHO, A. e GIL-PÉREZ, D. (1995, 2001, 2003, 2006, 2011)
CARVALHO, A. M. P. (1998, 2013)
LORENZETTI, L. e DELIZOICOV, D. (2001)
FREIRE, P. (1986, 1987, 1996)
CHASSOT, A. (1994, 2003, 2008, 2013)
CACHAPUZ, PRAIA e JORGE (2000, 2002, 2004)
WALLON (1979, 2007)
Ensino e aprendizagem de conceitos científicos BACHELARD, G. (1990, 1996)
VYGOTSKY, L. S. (1998, 2007)
REY, F. G. (2006, 2012)
Processos e materiais educativos CARVALHO, A. M. P. (2004, 2013, 2015)
KISHIMOTO (1996, 2005)
COLUMINA e ONRUBIA (2004, 2009)
AUSUBEL (1978)
MOREIRA, M. A. (2010)
Espaços não-formais AUSUBEL (2003)
MOREIRA, M. A. (2006)
CHASSOT (2004)
FREIRE (1996, 2005)
Alfabetização científica e tecnológica SASSERON e CARVALHO (2011)
MOREIRA, M. A. (1999)
Fonte: Silveira e Pereira (2019).

Ao observar o Quadro 6, vê-se que há alguns referenciais que se mostraram próprios dos eixos temáticos, mas também há referenciais que estão presentes em mais de um eixo temático, como Freire, Moreira, Ausubel, Carvalho e Chassot.

Analisando os trabalhos aceitos no XI ENPEC, obteve-se algumas tendências para a região, como a concentração de trabalhos provindos do estado do Pará, o qual tem o maior número de Programas de Pós-graduação da Região Norte, e a centralização de trabalhos da Universidade Federal do Pará. Desses trabalhos, grande parte foi submetida ao eixo temático de Formação de professores de Ciências (32%), porém, o público-alvo mais estudado foram os estudantes do Ensino Fundamental II, em grande parte por meio da pesquisa narrativa. Foi possível perceber, também, que 69% dos trabalhos não especificam o tipo de pesquisa, sendo o eixo temático de Ensino e Aprendizagem de Conceitos Científicos o com maior fragilidade na questão metodológica, totalizando 100% de trabalhos sem especificação desse aspecto.

Por fim, com os dados obtidos, é possível perceber a influência que os locais sedes de universidades e eventos podem ter nas produções acadêmicas das regiões mais afastadas do Sudeste e Sul. No entanto, com o forte crescimento dos Programas de Pós-Graduação na região, também é notório o crescimento de participantes dos estados da Região Norte a cada edição.

5. CONSIDERAÇÕES

As pesquisas em Educação em Ciências estão em contínuo crescimento no Brasil, sendo o ENPEC um grande evento para divulgação dos resultados encontrados. Considerando a última edição desse evento, o XI ENPEC, em 2017, já é possível ver o grande aumento de inscrições e submissões de trabalhos, o que reforça a consolidação da área no país. São muitos os trabalhos que analisam tendências de pesquisa das edições anteriores do evento; porém, são escassos os trabalhos que discutem como as regiões geográficas e suas especificidades revelam-se nas edições do ENPEC. Com base nessa perspectiva, este trabalho se propôs, por meio de análise descritiva, a analisar como a Região Norte contribuiu com a produção no XI ENPEC.

Quanto aos eixos temáticos com mais representantes da Região Norte, têm-se Formação de professores de Ciências (32%), Ensino e aprendizagem de conceitos e processos científicos (15%), Processos e materiais educativos em Educação em Ciências (15%), Educação em espaços não-formais e divulgação científica (11%), e Alfabetização científica e tecnológica, abordagens CTS/CTSA e Educação em Ciências (10%).

O Pará foi o estado responsável por 61% dos trabalhos e houve uma totalidade de universidades públicas nos trabalhos selecionados. Quantos aos aspectos metodológicos, há um número expressivo de trabalhos que não especificam a natureza de pesquisa (25%) e o tipo de pesquisa (69%), o que mostra uma fragilidade na construção dos textos. Porém, ao analisar os trabalhos que contêm esses tópicos especificados, observou-se que 95% são de natureza qualitativa e que o tipo de pesquisa mais utilizado foi a Pesquisa Narrativa (69%). É recorrente também uma tendência de utilização das técnicas de Análise Textual Discursiva (46%), Análise de Conteúdo (25%) e Análise Documental (10%) para o tratamento dos dados. Já referente aos trabalhos que não especificam a técnica de análise utilizada, foi observado que 55% dos trabalhos totais se encaixam nesse perfil.

Todo esse levantamento mostra que existe um crescimento na participação da Região Norte no ENPEC, porém acompanhada de certa fragilidade em alguns trabalhos e eixos temáticos. As razões que permeiam esse panorama podem ser estudadas mais a fundo futuramente, pois este é apenas um estudo inicial dos trabalhos da Região Norte se apresentaram no XI ENPEC, considerando uma perspectiva geral dessa região no evento e as especificidades de certo grupo de eixos temáticos. Há diversas possibilidades de trabalhos de aprofundamento por meio dos dados fornecidos pelas atas do ENPEC, os quais podem ajudar a construir um perfil para as regiões nesse evento científico e a entender melhor como a pesquisa científica se comporta no Brasil.

Apesar de o crescente número de pesquisas na área, o Brasil ainda necessita de incentivos às atividades de pesquisa e desenvolvimento, particularmente no sistema científico, a fim de reduzir a concentração regional das atividades no território nacional, as quais hoje se concentram na Região Sudeste (SIDONE et al. 2015, CRUZ e CHAIMOVICH, 2010, ALBUQUERQUE et al., 2002, 2005).

Com a investigação realizada neste trabalho, foi possível perceber que a Região Norte está tendo um crescimento no número de trabalhos aceitos no evento, apesar de ainda representar somente 5,8% do total. Com os dados analisados, é possível perceber a influência que os locais sedes de universidades e eventos têm nas produções acadêmicas das regiões mais afastadas do Sudeste e Sul, as quais apresentam uma baixa adesão aos eventos científicos e submissão de trabalhos.

Os dados encontrados também podem ser reflexo da quantidade de programas de Pós-Graduação existentes na região Norte. Um exemplo é o estado Amapá, o qual não teve trabalhos apresentados nas edições de 2009, 2011, 2013, 2015 e 2017, com destaque para o ano de 2013, que não teve nenhum participante do estado no evento. Contudo, hoje já há um crescimento de programas voltados para a Educação em Ciências que, consequentemente, estão formando mais pesquisadores da área e novas pesquisas a serem apresentadas em eventos de divulgação científica.

REFERÊNCIAS

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Notas

5 CONSIDERAÇÕES
[1] Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e em Matemática pela Universidade Federal do Paraná. E-mail: tassilazerb@gmail.com.
[2] Professora adjunta do Departamento de Química, do Programa de Pós-Graduação em Educação em Ciências e em Matemática, e do Programa de Mestrado Profissional em Química em Rede Nacional da Universidade Federal do Paraná. E-mail: camila@quimica.ufpr.br.

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