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Uma Arqueologia Biblioteconômica: paradigmas e discursos

A Library Science Archeology: paradigms and speechs

Uma Arquelogía Biblioteconómica: paradigmas y discursos

Mário Gouveia Junior *
Universidade do Porto e Universidade de Aveiro, Brasil
Diego Andres Salcedo
Universidade Federal do Pernambuco, Brasil

RDBCI: Revista Digital de Biblioteconomia e Ciência. da Informação

Universidade Estadual de Campinas, Brasil

ISSN: 1678-765x

Periodicidade: Cuatrimestral

vol. 14, núm. 1, 2016

ppec@unicamp.br

Recepção: 07 Agosto 2015

Aprovação: 30 Novembro 2015



DOI: https://doi.org/10.20396/rdbci.v14i1.8639481

Resumo: Discute a vigência e mudança de paradigmas nas relações discursivas e epistemológicas da Biblioteconomia. Apresenta as tradições, emergência, histórico e consolidação da Biblioteconomia, recorrendo às pistas guinzburguianas acerca do que foi dito e registrado. Respaldado na perspectiva foucaultiana, e nas pistas do não-dito, em torno de uma arqueologia do saber, relativiza tanto a necessidade de buscar o seu objeto de estudo, para além das noções humanistas e tecnicistas custodialistas e seus paradigmas infocomunicacionais, quanto o imperativo de esta área se impor em meio a outros campos do conhecimento que tratam da informação. Recorre a uma pesquisa exploratória. Espera-se apresentar uma projeção do que a Biblioteconomia, seus discursos e práticas podem representar por meio de uma interlocução teórica entre os paradigmas de Capurro e Silva e Ribeiro e as percepções metodológicas guinzburguiana e foucaultiana.

Palavras-chave: Biblioteconomia, Cientificidade, Pragmatismo, Paradigmas, Arqueologia do Saber.

Abstract: Discusses the validity and paradigm shift discursive and epistemological relations Library. Presents the traditions of the Librarianship, its emergence, historical and the consolidation this field of knowledge, using the Ginzburg's clues as to what was said and recorded. Backed in Foucault's perspective, and the trails of the unsaid, around an archeology of knowledge, relativizes both the need to seek his object of study for beyond the humanists notions and technologic custody notions, and their infocommunicative paradigms, as the need for this area impose yourself amid other fields of knowledge that deal with information. The article draws a exploratory research. As a result, it is expected to present a projection of what the Library, its discourses and practices can pose through a theoretical dialogue between the paradigms of Capurro and Silva and Ribeiro and guinzburguiana and Foucault's methodological insights.

Keywords: Librarianship, Scientificness, Pragmatism, Paradigms, Archaeology of Knowledge.

Resumen: Discute la vigencía y el cambio de paradigma discursivo y las relaciones epistemológicas de la Biblioteconomia. Presenta las tradiciones, de emergencia, histórica y consolidación de la biblioteca, usando las pistas guinzburguianas en cuanto a lo que se dijo y grabado. Con el respaldo de la perspectiva de Foucault, y en las laderas de lo no dicho, alrededor de una arqueología del saber, relativizar ambos necesitan para conseguir su objeto de estudio, además de humanistas nociones y tecnicistas custodialistas y sus paradigmas infocommunicative, como la necesidad de esta área de imponer en medio de otros campos de conocimiento relacionados con la información. Utiliza una investigación exploratoria. Se espera presentar una proyección de lo que la Biblioteca, sus discursos y prácticas puede plantear a través de un diálogo teórico entre los paradigmas de Capurro y Silva y Ribeiro y percepciones metodológicos de Ginzburg y Foucault

Palabras clave: Biblioteconomía, Cientificidad, El pragmatismo, Paradigmas, Arqueología del Saber.

1 Introdução

Notebooks, tablets, smartphones, redes sociais, acesso instantâneo à informação e possibilidades de criação de conteúdos denunciam a popularização da web 2.0 ? principal ferramenta desta realidade repleta de imperativos de conectividade e afetividade informacional (BARRETO, 2014). Caracteriza-se, assim, uma fase em que, individual ou coletivamente, todos os sujeitos são responsáveis pela construção, distribuição e fruição de conteúdos (CAPURRO; HJORLAND, 2007), (CASTELLS, 2013). Tudo isso leva à compreensão de que a necessidade de informação de que trata de Le Coadic (2004) não está restrita à demanda, mas também à sua oferta. Ambas as variáveis deste algoritmo têm crescido de modo diretamente proporcional.

É neste cenário de explosão da informação, ou big data (BARRETO, 2014) em que a Biblioteconomia se encontra imersa e recebe pressões no sentido de produzir atualizações para um novo paradigma, que se concentre no usuário e comunitariamente inovadora. Nesse contexto, o primeiro desafio tem sido a busca por soluções de melhores experiências de acessibilidade à informação (MANESS, 2007).

Outro imperativo percebido é quanto a sua necessidade de se determinar ante a emergência de novas especializações e ramificações de campos do conhecimento que também têm como objeto de atenções a criação de estratégias para o gerenciamento de informação. Essa necessidade de autodefinição dialoga com os conceitos de classificação e paradigma.

Desde o sistema de classificação de animais de Aristóteles e da Árvore de Porfírio, atravessando os séculos, as sociedades endemizaram a prática de separar pelas diferenças e aproximar pelas similitudes (POMBO, 1998). A intenção, grosso modo unânime, tem sido o tracejamento de paradigmas por meio dos quais as palavras e as coisas nutram entre si uma relação sígnica e/ou imagética, isto é, o ato de mencionar um termo engendra, instantaneamente, a projeção mental de um objeto. Nesse aspecto, a Biblioteconomia é comumente classificada como atividade inerente ao conjunto das técnicas e práticas de organização de livros em estantes de bibliotecas (LE COADIC, 2004), (ORTEGA, 2004).

O conceito paradigma, de acordo com Kuhn (1990), apresenta-se como o resultado fundamental partilhado pelos membros de uma comunidade científica em torno de uma teoria precisa, consistente e abrangente que seja passível de aplicações, resultados de experiências e de observações. Este trabalho, assim, busca empreender uma arqueologia biblioteconômica de modo a relativizar o seu objeto de estudo, para além das noções humanistas e tecnicistas custodialistas, bem como questionar essa necessidade de autodefinição. Numa palavra, será buscado o exercício de como se pode pensar uma essa arqueologia biblioteconômica a partir de uma interlocução teórica entre os paradigmas de Capurro (2003) e Silva e Ribeiro (2002, 2011) e as percepções metodológicas guinzburguiana e foucaultiana.

A primeira parte do artigo discorrerá acerca da proposição, da consolidação, da ruptura e da vigência simultânea de paradigmas. Também serão apresentados, contextualizados e confrontados dois modelos de paradigmas da informação pontuados por Capurro (2003) e por Silva e Ribeiro (2002, 2011). Ainda é brevemente pontuado o Paradigma da Cultura de Convergência Midiática.

Entre as primeiras iniciativas de coleção e armazenamento de informação de que se tem notícia, vivenciadas na Biblioteca de Alexandria, até as possibilidades de recuperação e compartilhamento de informação a despeito da fisicalidade dos suportes, proporcionadas pela Biblioteca 2.0, a segunda seção ? que, evidenciando a perspectiva ginzburguiana, trata dos testemunhos materiais ? concentra suas atenções na Biblioteconomia como um conjunto de técnicas necessárias à organização, guarda e recuperação da informação.

A última seção trata das entrelinhas ? que, adotando uma ótica foucaultiana, atende ao objetivo central deste artigo: a busca por uma arqueologia biblioteconômica centrada na análise dos discursos proferidos por teóricos da Biblioteconomia e da Ciência da Informação (CI). Questiona-se, ainda, a cientificidade desta área, sem que isso diminua a sua importância (LE COADIC, 2004).

2 Paradigmas da Informação: Capurro e Silva e Ribeiro em Confronto

Um paradigma pode ser definido como a pedra angular de todo um sistema de pensamento de uma sociedade e ao mesmo tempo ?o produto de todo um desenvolvimento cultural, histórico, civilizatório? (MORIN, 2011, p.77). Nesse contexto, o momento que antecede a formação de uma ciência se evidencia por atividades e opiniões desencontradas; quando emerge um paradigma, e este é amplamente aceito, a estruturação da ciência tende a se consolidar (KUHN, 1990). Todavia, credita-se às rupturas, e não às continuidades harmônicas, a responsabilidade pelas descobertas revolucionárias, já que o progresso das certezas científicas não se direciona para uma grande certeza (MORIN, 2011).

Enquanto Kuhn (1990) entende que os progressos científicos não se fazem de modo cumulativo e linear, mas a partir de saltos, ou seja, de revoluções científicas que respondem a momentos de crise em face da inadequação de respostas propostas pelo paradigma vigente, Karl Popper (2007) não percebe, necessariamente, na crise e na ruptura a oportunidade para o advento de um novo paradigma. Este teórico postula que o conhecimento científico progride à medida que se faz o exercício de falseamento e contestação a uma teoria já estabelecida. As possibilidades de mudança poderiam acontecer de modo mais recorrente.

Apesar de as teorias kuhniana e popperiana destoarem entre si no tocante a rupturas e sedimentações de experiências, respectivamente ambas confluem ao admitirem a possibilidade de desenvolvimento do conhecimento epistemológico e da própria ciência (GOUVEIA JUNIOR, 2012). No âmbito da Biblioteconomia e da CI, os conjuntos de paradigmas mais conhecidos [3], e citados atualmente, são os postulados por Capurro (2003) e os defendidos por Silva e Ribeiro (2002, 2011).

Uma outra perspectiva paradigmática, especificamente construída para a Biblioteconomia, pode ser identificada em Souza (1996). A sua natureza eminentemente pragmática não desmerece a importância deste estudo relativo aos fazeres biblioteconômicos, em especial no tocante à organização e recuperação de informação. Nessa vereda, antagoniza os postulados de Dewey e de Ranganathan no que concerne à organização da informação. Aquele estabelecera, ainda em fins do século XIX, um paradigma, baseado na estabilidade, através do qual a informação pudesse ser organizada e recuperada com base em uma divisão documental decimal por assuntos (SOUZA, 1996). A escolha de números decimais para as suas categorias permitia que o sistema fosse ao mesmo tempo numérico e infinitamente hierárquico; cada classe principal tendo dez divisões, e cada divisão, dez seções (BARBOSA, 1969). O referido sistema tem representado um sucesso internacional, desde então, e, apesar dos apontamentos de Souza (1996) no sentido de que exista uma crise no modelo Deweyiano, o mesmo continua a ser utilizado.

De acordo com Barbosa (1969), já no século XX, Ranganathan, que estudara os sistemas de classificação existentes, verificou as limitações de cada um, identificando uma rigidez generalizada no tocante à abrangência de todos os aspectos de um assunto. Por esse motivo, propôs um novo sistema de classificação chamado Classificação por Dois Pontos ? símbolo usado para correlacionar diferentes ideias ? modelo baseado na subdivisão dos assuntos em facetas e focos. Nesse contexto:

Segundo Ranganathan, analisar um assunto por facetas significa que cada aspecto desse assunto pode ser visto como as manifestações de certas características ou facetas que obedecem a postulados pré-determinados. O sistema toma-se, assim, multidimensional e ilimitado (BARBOSA, 1969, p.166).

Adepto da visão kuhniana, Souza (1996) entende o modelo Ranganathiano como uma superação do modelo Deweyiano, em crise, ainda que forneça subsídios para o entendimento de que ambos os paradigmas seguem simultaneamente vigentes.

Capurro (2003) entende o conceito de informação relacionado a três paradigmas, que servem de sustentáculo para diferentes análises do fenômeno da informação. Tais paradigmas seriam o Físico, o Cognitivo e o Sociocognitivo; cada um deles substituindo o anterior. No que concerne o Paradigma Físico, estritamente relacionado com a teoria da informação de Shannon e Weaver, um objeto físico, uma mensagem ou um signo é transmitido entre um emissor e um receptor; e é essa mensagem, e não uma informação, que reduz a incerteza. O referido paradigma, desse modo, exclui o protagonismo do sujeito cognoscente [4], identificado como usuário, no processo informativo e comunicativo (CAPURRO, 2003).

As limitações desse paradigma conduziriam ao Paradigma Cognitivo, que se apoia na ontologia popperiana e sua distinção de três mundos: o físico, o da consciência e o do conteúdo intelectual das teorias científicas. Este paradigma, de acordo com Capurro (2003) é aplicado ao modelo de Brookes como agente formador de uma rede existente nos espaços cognitivos, chamada informação objetiva ? percebida como uma perspectiva cognitiva a partir do momento em que se busca verificar de que forma os processos informativos são capazes, ou não, de transformar o usuário.

O paradigma em pauta, contudo, ignorava os critérios de subjetividade e autonomia em relação às análises de seleção e relevância conferidas pelo indivíduo; um ser social, e, portanto, dotado de conhecimentos apriorísticos, conhecimentos da área do domínio e necessidades de informação diferenciadas (GOUVEIA JUNIOR, 2012).

Em tempo, Saracevic (1996) considera que, desde a década de 1950, em virtude da chamada explosão da informação, a relevância tem recebido grandes atenções por parte do campo de Recuperação de Informação. O surgimento deste conceito, subjetivo e variável [5], está atrelado à criação de grandes estoques de conteúdos e suas respectivas adoções de técnicas eficazes de armazenamento e recuperação de informação (MIRANDA, 2012).

Emerge, então, de acordo com a ótica de Capurro (2003), o Paradigma Sociocognitivo e suas relações em torno da dimensão da relevância; conceito destacado por Saracevic (1996) como processo dinâmico e baseado na cognição humana, que demanda um contexto dentro do qual se alocam os seguintes atributos de relevância: relações (comunicações e trocas); intenções (objetivos e expectativas); inferências (percepções); e interações (processo dinâmico de cognição).

Ao proceder com uma revisão crítica do pensamento acerca da natureza da relevância no âmbito da CI, Saracevic (1996) classificou-a a partir das seguintes manifestações: relevância algorítmica (relação de efetividade entre uma busca e os textos recuperados pelo sistema de informação); relevância tópica (relação entre os assuntos de uma busca e dos textos recuperados pelo sistema); relevância cognitiva, ou de pertinência (relaciona-se com qualidade, novidade e correspondência cognitiva entre uma busca e os textos recuperados pelo sistema); relevância situacional, ou de utilidade (relação entre a situação, a tarefa ou o problema e os textos recuperados pelo sistema); relevância motivacional, ou afetiva (relacionada às intenções e metas do usuário e sua satisfação com o produto obtido).

De acordo com o Paradigma Sociocognitivo, desse modo, o usuário é percebido como um ser dotado de um papel eminentemente ativo na sua busca por informação, influenciado pelo contexto social (CAPURRO, 2003).

Para Silva e Ribeiro (2002, 2011) as ações de gestão da informação vigoram com base em dois paradigmas: o Custodial, Patrimonialista, Historicista e Tecnicista e o Pós-Custodial, Informacional e Científico. O primeiro deles se aloca na sobrevalorização da guarda, conservação e restauro do suporte [6]; na identificação com a preservação da cultura erudita e da memória oficial; e na própria memória como fonte legitimadora dos Estados Nacionais.

O Paradigma Pós-Custodial, por seu turno, é marcado pela valorização da informação como um fenômeno [7] social; pela conscientização do dinamismo informacional; pela prioridade máxima dada ao acesso à informação através da intensificação de políticas pautadas em seu compartilhamento no âmbito científico e tecnológico; pela igualdade de oportunidades para todos os cidadãos; e pelo respeito à diversidade cultural e linguística na criação de conteúdos (SILVA; RIBEIRO, 2011). Esse paradigma tem como missão ?[?] fundamentar o campo da ciência da informação com uma carga teórica, de progressiva evolução, tornando perceptível que a documentação e biblioteconomia formem as bases identitárias desse campo? (MIRANDA, 2012, p.56).

Quanto ao Paradigma Custodial, este parece vigorar em grande parte das instituições de missão memorial [8] onde a desejada universalização da cordialidade da informação ainda é um sonho distante. Todavia, deve-se ressalvar que, em muitas instituições que se dedicam ao ensino e à pesquisa, repositórios institucionais passaram a ocupar o lugar de bibliotecas inacessíveis. Não obstante, o paradigma Pós-Custodial originado na segunda metade do século XX, no contexto da Sociedade da Informação, ainda aparece como estado de exceção, já que a transição entre paradigmas não se dá por ruptura, mas de modo gradual e repleto de tensões (SILVA; RIBEIRO, 2011).

Há relações de convergência nos postulados de Capurro (2003) e os de Silva e Ribeiro (2002, 2011) quando se associa o Paradigma Cognitivo, daquele, com o Paradigma Custodial, destes. Em ambos os casos, a informação é trabalhada como objeto separado dos usuários. Da mesma forma, no Paradigma Social, de Capurro, e no Paradigma Pós-Custodial, de Silva e Ribeiro, ?a cognição está na relação direta do sujeito com a informação e acontece, independentemente da quantidade de informação transmitida, por meio das necessidades pessoais em pesquisar e localizar a informação? (MIRANDA, 2012, p.83).

Em contrapartida, os paradigmas dos referidos teóricos da informação podem ser confrontados. Enquanto Capurro sugere três paradigmas, sucedendo, mediante ruptura, o anterior quando este não consegue atender aos problemas que se apresentam, Silva e Ribeiro admitem a possibilidade de vigência simultânea de paradigmas, aproximando-se dos conceitos popperianos no tocante à prescindibilidade (GOUVEIA JUNIOR, 2012).

Ainda em relação ao Paradigma Pós-Custodial, a sua emergência, de acordo com Ribeiro (2005), já era perceptível desde a década de 1960, como ecos dos avanços científicos e tecnológicos alcançados tanto pela Segunda Guerra, quanto pela própria Guerra Fria, e os seus serviços de informação e contrainformação (ORTEGA, 2004), (MIRANDA, 2012). Nesse aspecto, irmanada à informação, a tecnologia digital acabou por minar ?[?] a noção estatística e clássica de documento como conceito operatório e como objeto de conhecimento e assinalou a entrada dos Arquivos e das Bibliotecas na chamada ?era pós-custodial?? (RIBEIRO, 2005, p.5). Acerca das novas possibilidades de recuperação e compartilhamento de informação por meio de plataformas digitais, pode-se considerar que:

Desde Alexandria, o sonho da biblioteca universal excita as imaginações ocidentais. Confrontadas com a ambição de uma biblioteca onde estivessem todos os textos e todos os livros, as coleções reunidas por príncipes ou por particulares são apenas uma imagem mutilada e decepcionante da ordem do saber [?] com o texto eletrônico, a biblioteca universal torna-se imaginável (senão possível) sem que, para isso, todos os livros estejam reunidos em um único lugar (CHARTIER, 1999, p.117).

Em face da franca utilização das plataformas digitais de informação e comunicação, a conservação da memória passou a ser um imperativo, isto é, engendrou a necessidade inadiável de se tomar a decisão, já no ato da criação de determinado documento, sob pena de, a posteriori, este não poder ser resgatado [9] integralmente (RIBEIRO, 2005). Ademais o temor da perda da memória informacional é uma das inquietações que gravitam em torno das relações com os registros do conhecimento e a gestão de seus suportes. Nessa vereda, Chartier (1999) e Ribeiro (2005) mencionam o excesso de informação ? provocado pela duplicação exagerada, como cópias de segurança, que a tecnologia proporciona ? que pode representar um obstáculo ao conhecimento, caso não se utilizem instrumentos ?capazes de triar, classificar, hierarquizar? (CHARTIER, 1999, p.99).

3 Da Alexandria à Biblioteca 2.0: Por Entre Fios e Rastros

Por não ser dotado de determinadas especializações em seu corpo e em sua mente, o homem sempre precisou desenvolver próteses ou extensões para que pudesse dilatar as suas capacidades de executar trabalho, de se comunicar ou de armazenar informação (GOUVEIA JUNIOR, 2012). No que concerne ao armazenamento de informação, as literaturas fantásticas de Jorge Luis Borges (2001), e seu memorioso Funes, e de Gabriel García Marquez (2010), e sua desmemoriada Macondo, revelam casos antagônicos entre aquele indivíduo que se lembrava de absolutamente tudo e uma cidade que não era capaz de dormir nem de se lembrar de nada.

Enquanto àquele prodígio de memória, por uma motivação congênita qualquer, não era facultada a capacidade de refletir acerca de suas lembranças, os habitantes da referida vila erguida pelos Buendía, durante o período em que contraíram a febre da insônia, precisaram consultar pequenos textos, que revelavam o nome dos objetos mais triviais e suas funções e especificidades.

Entre temores míticos e reais no tocante a perdas de informação, diante, por exemplo, da morte de aedos e sábios contadores de histórias, o advento da escrita, e, depois, dos arquivos, das bibliotecas e dos museus foi um capítulo mais do que especial da busca pelo fármaco eficaz contra o esquecimento e os envenenamentos da memória.

As memórias de papel e as necessidades por lugares de memória (NORA, 1993), detentores de documentos e monumentos históricos e culturais, dilatavam-se de modo diretamente proporcional à complexificação das sociedades e suas relações. Visava-se o acúmulo de testemunhos materiais dos grupos humanos, ao mesmo tempo em que se buscava concretizar o sonho de armazenar o conhecimento produzido, e, em tese, torná-lo passível de recuperação (SILVA; RIBEIRO, 2011).

Em tempo, ao ser realizado o levantamento de um histórico sobre determinada temática, é preciso estar atento aos estudos ginzburguianos acerca das relações entre os fios do relato ? que guiam os investigadores pelos labirintos da realidade, da verdade e de suas versões ? com os rastros perenes legados pelas sociedades ancestrais sob a forma de monumentos e documentos (GINZBUR, 2007). As associações entre o fio e os rastros de tudo aquilo que foi dito e registrado, portanto, em substituição ao desfile de uma série de eventos por meio de uma didática, porém equivocada e até redutora, linha do tempo, é o que inspira as considerações sobre este breve histórico da Biblioteconomia ? identificada no seu sentido restrito, como a área que realiza a organização, gestão e disponibilização de acervos de bibliotecas (ORTEGA, 2004).

O primeiro dos rastros ? repleto de fios [10] ? pertinente a este trabalho é a Biblioteca de Alexandria; fundada pelo faraó Ptolomeu Filadelfo, no século III a.C., é apontada como o primeiro momento em que se tentou acumular todo o conhecimento em um lugar [11]. Nesse esforço, o próprio faraó teria elaborado uma carta destinada a todos os soberanos e governantes da terra solicitando o envio das obras de poetas e prosadores, retóricos e sofistas, médicos e adivinhos, historiadores e demais autores de outros gêneros. Ademais:

Ordenou que fossem copiados todos os livros que por acaso se encontrassem nos navios que faziam escala em Alexandria, que os originais fossem retidos e aos proprietários fossem entregues as cópias; esse fundo foi posteriormente chamado de ?o fundo dos navios? (CANFORA, 1986, p.25).

O grau de organização e as proporções do acervo, que funcionava naquela que ficou conhecida, por mais de mil anos, como a capital cultural do Ocidente, inspirou Luciano Canfora (1986) a afirmar que a partir de Alexandria o saber e o livro se tornaram sinônimos. Desse modo, a Biblioteca de Alexandria ?[...] é talvez a melhor representante das Bibliotecas da Era Ancestral. Esse paradigma, tipicamente custodial, atende a uma pequena quantidade de estudantes, pesquisadores e líderes religiosos formando um grupo seleto de utilizadores? (MIRANDA,2012, p.103).

Ao longo da Idade Média a lógica da custódia de informação, não se modificou consideravelmente. A forma de produção de livros, naturalmente, recebeu um grande impacto diante da popularização do invento de Gutenberg, o que pode ter facilitado o acesso aos mesmos, ainda que este se mantivesse como privilégio de poucos, haja vista as restrições e/ou proibições emitidas regularmente pela Igreja Católica e pelas Coroas anglo-ibéricas (GOUVEIA JUNIOR, 2010).

São evocados como um segundo dos rastros os relatos de Adso de Melk sobre os eventos maravilhosos e terríveis que teria testemunhado um mosteiro beneditino no obscuro norte da Itália, em começos do século XIV (ECO, 1986). Os seus manuscritos foram adaptados por Umberto Eco e transformados em uma trama que transborda os limites de um romance policial, tendo em vista as motivações do bibliotecário Jorge no sentido de restringir o acesso à informação contida em textos considerados impróprios (CASTRO, 2006). O que revela, então, a persistência do Paradigma Custodial, Patrimonialista, Historicista e Tecnicista, denunciado por Silva e Ribeiro (2002, 2011).

A Ilustração objetivava fazer do livro a principal ferramenta de transformação da sociedade, modelando hábitos e edificando um cidadão esclarecido através de sua leitura (CERTEAU, 2008). Nesse contexto, elaborada entre 1751 e 1780, a Enciclopédia, pode ser apontada como um terceiro rastro, posto que esta tenha sido uma nova tentativa de concentrar em um suporte, mais especificamente em trinta e cinco livros, todo o saber derivado da razão (BURKE, 2012).

Esse grande esforço coletivo colocado à disposição da ideia de que, não mais a fé, mas o saber deveria nortear a capacidade do cidadão de raciocinar de modo autônomo, para, dessa forma, tomar parte nas decisões políticas de sua sociedade. Foi com base nesse conjunto de informações registradas, que disseminavam ideais de liberdade de mentes, corpos e economias que foram possíveis as Revoluções Americana, Francesa e Industrial, por meio das quais as sociedades puderam modificar as formas de pensar, agir, produzir e se relacionar (HOBSBAWM, 2009).

Apesar de muitas experiências ? que remontavam, pelo menos, há dois mil anos ? no que concerne a coleção e a organização de livros e de espaços que os abrigavam, a prática cotidiana da salvaguarda do patrimônio registrado das nações começou a ser realizada por bibliotecários e arquivistas a partir da ?Revolução Francesa e foi disseminando ao longo dos séculos XIX e XX, destacando-se as bibliotecas e os arquivos nacionais como locais que davam essa formação? (SILVA; RIBEIRO, 2002, p.131).

Apesar de, em fins do século XIX, a Biblioteconomia se apresentar como área científica consolidada em termos institucionais, com a existência de centros de formação, periódicos científicos e associações profissionais, a sua legitimidade epistemológica ainda deixava a desejar (ORTEGA, 2004).

A natureza excessivamente instrumental dos trabalhos publicados, bem como a existência de recorrentes discussões sobre os conteúdos que eram guardados ou tratados nas bibliotecas em detrimento de reflexões problematizadoras do seu objeto eram lacunas a serem preenchidas. Configura-se, assim, a tradição biblioteconômica, que se divide em duas grandes sub-tradições: a Tradição Humanista e a Tradição Tecnicista ou Cientificista. Enquanto aquela, notadamente pragmatista e generalista, percebe no bibliotecário um erudito dedicado à análise, crítica e transmissão dos artefatos culturais, esta última, de natureza representacionista, entende o profissional da biblioteca como um ente mediador-dinamizador, voltado para o reconhecimento, a identificação e a representação objetiva das técnicas e tecnologias produzidas pelo homem (SALDANHA, 2010). Fonseca (2007) complementa essa ideia ao afirmar que a formação do bibliotecário sempre esteve polarizada entre a erudição e a técnica, sendo aquela a orientação mais antiga.

O considerável incremento tecnológico no âmbito infocomunicacional e científico desenvolvido durante a Segunda Guerra e aplicado posteriormente fomentou o processamento de mudanças nas práticas dos setores que gerenciavam e salvaguardavam a informação (MIRANDA, 2012).

A despeito das mudanças de características, e até de funções, acreditava-se que as bibliotecas seguiriam com o exercício de seu antigo papel enquanto guardiãs do conhecimento registrado; sendo o bibliotecário o seu agente, que, dotado de ?instrumentais teóricos, técnicos e tecnológicos, pode contribuir para desterritorializações do acervo sob sua custódia, através do uso da informática e da digitalização? (CASTRO, 2006, p.130). Este seria um ponto de vista perfeitamente adequado à primeira versão da web, dotada de natureza digital, porém ainda estática, isto é, não colaborativa.

Essa nova realidade passou a demandar um bibliotecário dinâmico, participativo e especializado no tocante ao conhecimento sobre as principais fontes do seu campo, suas terminologias e o modo como este se estruturava como espaço de produção de saber (CASTRO, 2000). Este começava, então, a representar o profissional de uma instituição cada vez menos identificada como coleção de livros e documentos similares, devidamente, classificados e catalogados, e cada vez mais como assembleia de usuários da informação (FONSECA, 2007).

Na disseminação de uma nova dinâmica global, chamada de Cultura Participativa (JENKINS, 2009), cada vez mais é percebido que, entre pessoas ou instituições, a notoriedade não reside mais no ato de guardar, mas nas possibilidades de compartilhar. O que engendra a defesa da superação de muitos paradigmas que prezam pela segurança a despeito da liberdade (GOUVEIA JUNIOR, 2014). A partir do Paradigma da Cultura de Convergência Midiática, então, são processadas interações jamais vistas entre mídias tradicionais e alternativas, e entre poderes, não de produtores e consumidores, mas de prossumidores [12].

No bojo dessas transformações está a emergência da Web 2.0 e seus ideais colaborativos, que propiciam dinâmicas de interação e atribuem aos usuários o protagonismo no desenvolvimento de uma rede pretensamente global, e que não se restringe a um conjunto de ferramentas fáceis de manipular e serviços convenientes, mas se apresenta como uma atitude de compartilhar conhecimento (O?REILLY, 2005).

É nesse contexto que se advoga a ideia da Biblioteca 2.0 como uma comunidade [13] virtual centrada no protagonismo do usuário, multimídia, interativa e dinâmica, que ?borra a linha entre bibliotecário e usuário, criador e consumidor, autoridade e novato? (MANESS, 2007, p.47). Inspirada na lógica das redes sociais [14], onde os usuários podem se conectar com outros usuários, com base em relações de interesse mútuo; catalogar os seus livros e ver o que os outros usuários compartilham desses livros; recomendar e receber recomendações de leituras; compartilhar figuras e demais recursos da Internet.

A Biblioteca 2.0 se apresenta como uma mudança paradigmática por meio da qual a Biblioteconomia precisaria não apenas abrir mão dos seus catálogos e coleções, mas do seu controle. Assim:

Biblioteca 2.0 demanda bibliotecas que foquem menos em estoques de sistemas seguros e mais em sistemas de descobertas colaborativas. Há talvez uma grande sincronia entre biblioteconomia e Web 2.0, mas vista holisticamente, Biblioteca 2.0 revoluciona a profissão. No lugar de criar sistemas e serviços para os usuários, os bibliotecários irão habilitar os usuários a criá-los (sistemas e serviços) para eles mesmos (MANESS, 2007, p.49).

É pertinente acrescentar que quando é promovido o encontro dos sistemas de informação [15] com os usuários se processa uma transição do isolamento para a interconectividade. As pós-edições e os comentários destes usuários fomentam uma produção sempre em progresso, tendo em vista as possibilidades de filtrar conteúdos de acordo com suas necessidades, decidir sobre sua importância e apresentar os resultados do conhecimento adquirido (MIRANDA, 2012).

4 Uma Arqueologia Biblioteconômica

De acordo com César Castro (2000), o bibliotecário é o profissional que constroi arqueologias de tratamento, organização, conservação e divulgação dos objetos que armazena. Para tanto, monta catálogos, elabora bibliografias, estabelece regras e recorre às atuais tecnologias de informação e comunicação. Tal assertiva traz em seu bojo um conceito e uma definição; é justamente em relação aos seus desdobramentos e possibilidades de interpretação que esta seção se concentrará. O conceito de arqueologia que o professor César Castro (2000, 2006) menciona não é o mesmo daquele que se destina a reconstruir o processo pelo qual se criou o mundo e as criaturas e sua cultura material, escrita ou não escrita (CHILDE, 1961), embora haja pontos de diálogo possíveis.

A arqueologia que interessa a este trabalho começa a se clarificar quando é tomado o termo em sua etimologia [16]; conhecendo a origem grega da palavra, que é formada pelos termos akrhé, que significa o que está à frente, o começo, o princípio de tudo, e logos, que significa discurso, linguagem, pensamento ou razão, explicação racional de algo. Forma-se, desse modo, a base para o entendimento inicial do conceito com o qual será trabalhado. Trata-se da Arqueologia do Saber, postulada por Michel Foucault (2004), que se constitui enquanto instrumental teórico para que seja tecida uma análise do discurso de uma área específica do conhecimento.

De acordo com esse prisma, os sujeitos e os objetos de um campo do saber recebem uma abordagem em um estrato anterior a sua classificação em tipos, e, portanto, em um nível mais elementar, o que torna possível uma neutralidade enquanto simplesmente discurso (MACHADO, 1974).

Foucault (2004) enfatiza que os discursos não dispõem de princípios de unidade, mas de dispersão [17] de elementos, uma vez que, em geral, a referida unidade é buscada por meio do objeto, pela homogeneidade no estilo de enunciação, da delimitação dos conceitos básicos e dos temas. Assim, o objeto não determina a unidade do discurso, antes, é este que foi constituído conforme tudo aquilo que se formulou ao seu respeito; coexistem em uma mesma disciplina enunciações de natureza heterogênea; um sistema fechado de conceitos, que não permite o advento de novos conceitos, por vezes até, incompatíveis com os demais, não é capaz de determinar qualquer discurso; assim como não é a presença una de um tema que particulariza os discursos (FOUCAULT, 2004).

Esses quatro feixes de relações postulados por Foucault formam o próprio discurso, sem que essa composição seja por mera soma de partes; eles são interdependentes, o que revela a máxima da complexidade moriniana de que o todo é maior do que a soma de suas partes (MORIN, 2011). Uma vez apresentadas as pormenorizações desses níveis do discurso, deve-se registrar algumas considerações que aproximam a Arqueologia do Saber da realidade vivenciada pela Biblioteconomia e pela CI [18].

Desse modo, em relação ao objeto não determinar a unidade do discurso, o estudo da informação, apontado como o objeto da CI, pode até a identificar, como defendem Capurro e Hjorland (2003), mas não a determina como campo do conhecimento. No tocante à coexistência de enunciações heterogêneas em uma mesma disciplina, Capurro e Hjorland (2003) destacam a importância concedida pela CI às discussões empreendidas por outras disciplinas sobre o conceito de informação, uma vez que muitas teorias e abordagens em CI, campo do conhecimento interdisciplinar por excelência, têm suas origens em outras áreas.

Quando afirma que um sistema fechado de conceitos não é capaz de determinar um discurso, Foucault abre espaço para que sejam consideradas as dinâmicas sociais e institucionais, bem como as possibilidades de mudança de paradigma, entre rupturas e vigências simultâneas de paradigmas, que podem engendrar novas discussões e mesmo o advento de novos conceitos. A emergência da web 2.0, por exemplo, conforme apresentado anteriormente, tem evocado novos conceitos como Cultura Participativa e mesmo Biblioteca 2.0; o que acaba por gerar novos discursos no âmbito da Biblioteconomia.

Por fim, no que concerne à perspectiva de que a presença de apenas um tema não contribui para a paralização dos discursos, Machado (1974, p.89) esclarece, nesse sentido, que ?um tema pode se encontrar em dois tipos diferentes de discursos como também um único discurso pode produzir temas diferentes?. A título de exemplo, o tema Organização da Informação pode engendrar, pelo menos, dois discursos: a Biblioteconomia e a Museologia. Enquanto daquela são passíveis de serem extraídas, entre outras temáticas, a Biblioteca 2.0 e os Paradigmas da Mediação da Informação, desta última derivam como temáticas o Estudo de Público e as Técnicas de Conservação e Restauro de Acervo.

Derivadas dos discursos da Biblioteconomia e da Museologia, as quatro temáticas apresentadas no exemplo, por seu turno, podem tecer relações com outros discursos: a Biblioteca 2.0 com a Informática e o Pensamento Sistêmico; os Paradigmas da Mediação da Informação com a Comunicação e a Educação; o Estudo de Público com a Administração e a Mobilidade Urbana; e as Técnicas de Conservação e Restauro de Acervo com a Arquivologia e a Biblioteconomia.

Nesse aspecto, esta exemplificação acabou por associar, ainda que indiretamente, a Biblioteconomia com a Museologia, a Informática, a Comunicação, a Administração e a Educação. O que dialoga com a controversa assertiva de que a Biblioteconomia e a CI

[?] são apenas um disciplina em uma rede de disciplinas e meta-disciplinas que lidam com comunicação, tecnologia, sistemas e processos relacionados. Devemos tentar esclarecer melhor nossa identidade, nossos objetivos específicos e fortalecer a continuidade histórica do campo. Não deveríamos considerar o conceito de informação isoladamente, mas vê-lo em relação a outros conceitos, como, por exemplo, documentos e mídia (CAPURRO; HJORLAND, 2003, p.193).

Capurro e Hjorland (2003) revelam, desse modo, o seu entendimento no sentido de que a Biblioteconomia e a CI seriam uma mesma disciplina, que, por meio de uma trama reticular, estaria relacionada com outras disciplinas. Atentam, acertadamente, para a natureza interdisciplinar que envolve a CI. Entretanto a assertiva de que os dois mencionados campos do conhecimento representam uma perspectiva que os una ao ponto de representarem uma mesma ciência [19], parece uma polêmica noção de que a interdisciplinaridade seria uma justaposição de campos do conhecimento.

Apesar de a relação entre ambas ser muito forte ? fato evidenciado no compartilhamento do papel social e na utilização eficaz dos registros documentários ? é preciso anotar como principais distinções a seleção dos problemas de cada área e o modo como eles se definem; as questões teóricas e quadros estabelecidos; a natureza e o grau de experimentação, bem como o desenvolvimento empírico do conhecimento e as competências derivadas resultantes; e natureza e a força das relações interdisciplinares estabelecidas e a dependência do progresso das abordagens interdisciplinares (SARACEVIC, 1995). Ademais, a interação entre disciplinas científicas, para além de seus intercâmbios por entre conceitos e metodologias, sugere um modus operandi colaborativo, com a integração e transferência mútua de conceitos diretivos (POMBO, 1998). Nesse aspecto:

As contribuições de Saracevic (1995) e Le Coadic (2004) demonstram que a interdisciplinaridade é uma variável importante na construção e operacionalização de modelos para a acessibilidade. Além disso, a partir da cooperação de disciplinas, é possível explicar o fenômeno informação, assim como desenvolver sínteses em pares para explicar as vertentes de criação organização e uso da informação (MIRANDA, 2012, p.144).

Essa orientação colaborativa está intimamente ligada ao pensamento sistêmico, que, por seu turno, sugere uma articulação reticular motivada por noções de capital social. O pensamento sistêmico defende uma visão não-mecanicista e pós-cartesiana, afastando-se das noções reducionistas, deterministas e analíticas de se pensar o universo-como-máquina. O universo, por esse prisma, é percebido como um todo dinâmico, indivisível, cujas partes estão inter-relacionadas, enquanto que a ordem, a reversibilidade e o equilíbrio estático também tendem a ser evitadas pelo fato de não corresponderem às realidades das ciências, muito menos às dinâmicas sociais (GALINDO et al, 2014).

A concepção reticular, que, de acordo com Latour (1994), é tributária da interdisciplinaridade, e por isso defensora da supressão de fronteiras, apresenta-se como real, coletiva e discursiva. O entendimento de capital social, por seu turno, reside na estrutura das suas relações, posto que a apresenta como interação que une indivíduos em torno de objetivos comuns e evidencia relações de colaboração, reciprocidade e confiança mútua que os torna mais fortes. A força dessas relações reticulares, nesse sentido, depende de que cada ponto se apoie nos outros pontos da rede (GALINDO et al, 2014).

É importante registrar que os três conceitos mencionados ? pensamento sistêmico, redes e capital social ? têm sido vivenciados de modo pleno a expensas da popularização das plataformas digitais e dos paradigmas infocomunicacionais já mencionados [20]. Nesse viés, pode-se retornar à citação que principiou esta seção, associando-a a algumas definições de Biblioteconomia e suas relações interdisciplinares.

Quando César Castro (2000) menciona o papel do profissional bibliotecário no tocante à elaboração de bibliografias e ao estabelecimento de regras, sem perder de vista as novas tecnologias da informação e da comunicação, de certo modo, acaba por criar rastros para que se possa melhor perceber a natureza técnica ou científica dessa área. Acerca da celeuma entre técnica e cientificidade, Le Coadic (2004) declara que a Biblioteconomia nem é ciência nem é tecnologia rigorosa; define-a como uma prática de organização, uma arte criada para resolver problemas de formação e desenvolvimentos dos acervos a ela pertinentes.

Segundo Leilah Bufrem (1985), para quem a Biblioteca é uma instituição social de comunicação, dotada de valores pedagógicos e civilizadores, cuja função é reunir, conservar e difundir cultura [21], a Biblioteconomia seria uma tecnologia aplicada, algo como uma mescla entre teoria e prática, que se fundamenta em elementos de ciências puras, como a Matemática, a Lógica e a Linguística, e em elementos de ciências humanas, como a Psicologia, a Sociologia e a Economia. Nesse contexto, para Lena Vânia Pinheiro (1999) e para Cristina Ortega (2004), a Biblioteconomia, apesar de suas relações interdisciplinares com outras ciências, não se constitui como uma área científica. Miranda (2012, p.334) acrescenta que a Biblioteconomia, assim como a Arquivística e a Documentação, ?transitam na CI sem demarcar suas fronteiras, mas quando atuam independentes dela buscam suporte teórico em outras disciplinas porque elas por si só não se sustentam?.

Em artigo que questiona a cientificidade da Biblioteconomia, Sebastião de Souza (1986) a classifica como ciência social, que teria uma origem na classificação das ciências operada por Dewey e nas subsequentes, todas elas carregadas de um necessário empirismo. Não obstante, o próprio Souza (1986) pondera que se esta área do conhecimento não possui um corpo definido de teorias e leis, tal como a Física, nenhuma outra ciência social também o detém. Dessa forma, em seu entendimento, se a Biblioteconomia ?[?] não pode ainda ser considerada uma ciência, ela tem, todavia, seus princípios e suas teorias, que fazem dela quase uma ciência? (SOUZA, 1986, p.192).

Ao analisar uma considerável bibliografia que trata da cientificidade da Biblioteconomia, Santos e Rodrigues (2013) chegam à conclusão de que este campo do conhecimento tem sido considerado uma técnica de organização e disseminação da informação pouco focada com fundamentações teóricas. A resposta a essa lacuna seria a intensificação do exercício interdisciplinar; algo que já vem sendo praticado, tendo em vista a natureza da informação como fenômeno social, pertinente a diversos campos científicos.

Há que se ressalvar, no tocante a esse entendimento de cientificidade, que este conceito está ancorado em procedimentos e concepções dos séculos XVII e XVIII (RODRIGUES, 2010). Nesse sentido, tais perspectivas ainda encontrariam aplicabilidade para os mais que diversificados campos do saber de que dispomos na atualidade?

Com base na diversidade de opiniões acerca da cientificidade da Biblioteconomia, percebe-se que esta, assim como muitas ciências, parte da observação de casos ou fenômenos particulares, que, uma vez relacionados com outros, podem explicar um modelo geral. A Biblioteconomia trabalharia, então, com o método indutivo; o que sugere a transcendência de uma noção pragmatista, de modo a se aproximar de uma espécie de protocientificidade.

Um bom exemplo dessa noção indutivista seriam as cinco leis da Biblioteconomia, de Ranganathan (2009) ? fruto de suas experiências como bibliotecário na Universidade de Madras. Os livros servem para serem lidos; a cada leitor seu livro; a cada livro seu leitor; poupe o tempo do leitor; a Biblioteca é um organismo em crescimento (RANGANATHAN, 2009). Cada um destes cinco princípios tem implicações consideráveis para o entendimento da Biblioteconomia como um corpo teórico dotado de certo grau de cientificidade. O primeiro deles vai ao encontro da aplicação dos conceitos de compartilhamento de informação apregoados pela lógica pós-custodial.

Os três princípios subsequentes dizem respeito à importância de serem utilizadas metodologias e ferramentas eficientes de recuperação da informação para que o usuário, ou prossumidor, diante do cada vez maior manancial de conteúdos a sua disposição, busque a informação de que precisa com maior eficácia.

Por fim, a noção de que a Biblioteca é um organismo em crescimento sugere não apenas a questão da explosão da informação, ou big data, mas tangencia a perspectiva da complexidade moriniana no sentido de que este organismo é um todo, cujos integrantes ? bibliotecários, usuários, acervo ? não se podem distinguir, pensando-os em partes dissociadas. Por esse caminho, o quinto princípio Ranganathiano parece dialogar com entendimento de que a Biblioteca 2.0 é o caminho a ser seguido no tocante à busca por soluções de melhores experiências de acessibilidade à informação. O que revela ?a busca de se adaptar à nova realidade que o advento tecnológico apresenta: a organização da informação no espaço virtual? (SANTOS; RODRIGUES, 2013, p.129).

Considerações Finais

A crise que se configura ante um paradigma não é suficiente para que este seja completamente substituído por um novo. O que acena para a acertada ideia da vigência simultânea de paradigmas, cujos exemplos encontram-se, inclusive, em todos os segmentos sociais. Os grupos humanos, sobretudo diante da popularização da web 2.0, entendem a importância do regime de colaboratividade, no entanto, o espírito da competição persiste em determinados contextos, como o trânsito, por exemplo.

Foi contemplada, também, para além de um desfile de eventos históricos que revelassem a sua emergência como campo de conhecimento, uma análise ginzburguiana sobre os testemunhos materiais, rastros, que chegaram à contemporaneidade acerca das iniciativas de coleção e armazenamento de informação, desde Alexandria até a perspectiva da Biblioteca 2.0.

Foram enumerados como três rastros dessa história biblioteconômica, a existência da Biblioteca de Alexandria, os relatos de Adso de Melk, e a organização da Enciclopédia. Três perspectivas da vontade humana de acumular todo o conhecimento em um único lugar. O que diferencia esta última das experiências anteriores foi o seu direcionamento no sentido de tornar aquela massa documental passível de ser acessada ? catalisada que fora pelo invento de Gutenberg. Essa possibilidade de consumir a informação acumulada tornou possível a modificação dos estoques mentais dos sujeitos, que puderam modificar as suas realidades em seu viés político, econômico e social.

O livro revelava, então, a sua importância para além do importante registro documental; ele era um veículo capaz de comunicar, desde que fosse possível a sua localização em meio a um volume cada vez maior de outros livros. Por esse viés, ganhava importância também a função do profissional responsável pela guarda, e, principalmente, pela recuperação da informação ali contida. Os estudos em torno de práticas de organização e classificação da informação, desenvolvidos desde fins do século XIX, acabaram por atribuir à Biblioteconomia um caráter pragmático a despeito da quase que obrigatoriedade por um caráter científico, apregoado pelo Positivismo.

As novas tecnologias, que, muito rapidamente, começaram a serem aprimoradas após a Segunda Guerra, tornaram possível o desenvolvimento de iniciativas que levariam à Internet e depois à web 2.0 e sua lógica interativa e colaborativa. Esta perspectiva, por sua vez, modificou, consideravelmente, as formas de se pensar as relações entre produtores e consumidores de informação. Esse estado de coisas chegou à Biblioteconomia, há pouco menos de uma década, trazendo estudos sobre a Biblioteca 2.0 como uma comunidade virtual centrada no protagonismo do usuário, inspirada no funcionamento das redes sociais. Por esse prisma, o emprego das soluções de comunicação da web 2.0 pelas bibliotecas potencializa a ressignificação de suas atividades, e mesmo sua utilidade social, à medida que promove a intensificação da interação com os seus usuários.

De modo a seguir os postulados foucaultianos, buscando uma arqueologia biblioteconômica, a tratar de buscar no que há de implícito nos discursos, procedendo, assim, com uma análise dos discursos proferidos pelos teóricos da Biblioteconomia e da CI. Percebe-se, nesse sentido, que quando de sua formação, como um campo de atividades com leis e fundamentos, a Biblioteconomia foi pensada mediante a sua utilidade social, isto é, as suas capacidades práticas de representarem um serviço eficaz de armazenamento e recuperação de informação.

Deve-se considerar que a segunda década do século XX teria sido um momento de transição em que este campo do conhecimento consolidou a sua importância ao mesmo tempo em que principiou a busca por sua identidade como ciência. Ademais, a perspectiva da especialização, que já se anunciava desde as primeiras décadas do século XX ? como por exemplo a formação em Library Science, iniciada nos Estados Unidos em 1927 ? fazia com que surgissem outras áreas do conhecimento que partilhavam com a Biblioteconomia, o objeto da organização e recuperação da informação ? a exemplo da Documentação, da Arquivologia e da própria CI.

Não existe um consenso entre os teóricos acerca de a Biblioteconomia e a CI representarem uma mesma disciplina. O que vai ao encontro de um dos postulados da Arqueologia do Saber, que considera como legítima, e até salutar, a coexistência de enunciações de natureza heterogênea e a identificação de conceitos incompatíveis entre si dentro de um mesmo campo do conhecimento. Essa heterogeneidade conceitual em relação à unicidade disciplinar é percebida como fruto da natureza interdisciplinar que envolve as áreas mencionadas em ações colaborativas e integradas. É no bojo dessas relações, catalisadas pela popularização das plataformas digitais infocomunicativas, que surgiram as noções de pensamento sistêmico, tramas reticulares e capital social.

Quanto à análise dos discursos proferidos no que concerne à cientificidade da Biblioteconomia, vale considerar, inicialmente, o consenso entre os teóricos elencados de que os profissionais da biblioteca desenvolvem técnicas eficientes de organização, recuperação e disseminação de informação. No entanto a dimensão apontada como excessivamente pragmática dessa disciplina revela carências quanto a maiores fundamentações científicas ao ponto de esta demandar a sustentação teórica de outras disciplinas.

Foi levantada a ressalva de que a Biblioteconomia partiria de uma visão indutivista, ou seja, da observação de casos e fenômenos particulares e suas relações com outros fenômenos, o que concederia ferramentas para o delineamento de um modelo geral. Orientação que, a despeito de discussões no que concerne as fragilidades do modelo indutivo, poderia sugerir uma disciplina que transcende a noção pragmatista.

Pontuou-se, ainda, que a existência de um corpo definido de métodos, teorias e leis rígidas, uniformes e consolidadas como condição sine qua non para a configuração de uma ciência comprometeria qualquer ciência social. Nesse sentido, sendo possível relativizar a austeridade com que o status de científico e o seu caráter de demonstrabilidade e refutabilidade é comumente defendido, a Biblioteconomia, poderia ser identificada como um discurso que se encontraria no limiar da cientificidade.

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Notas

[1] Doutorando em Informação e Comunicação em Plataformas Digitais (universidade do Porto e Universidade de Aveiro). E-mail: gouveia_historiador@yahoo.com.br
[2] Professor no Departamento de Ciência da Informação da Universidade Federal do Pernambuco. E-mail: salcedo.da@gmail.com Enviado em: 07/08/2015 - Aceito em: 30/11/2015
[3] De modo complementar, aos dois modelos, identifica-se o Paradigma da Biblioteconomia, de Miksa (1992), que revela a Biblioteca como instituição social, cuja função de ser dos seus processos e serviços é viabilizar o acesso à informação.
[4] Dotado de modelos mentais do mundo exterior que são transformados ao longo do processo informacional e que tem necessidade de se informar para corrigir o seu estado anômalo de conhecimento (LE COADIC, 2004).
[5] A relevância de informação é relativa, uma vez que depende das necessidades, usos e experiências do usuário (SARACEVIC, 1996).
[6] Peculiar à atuação de arquivistas e bibliotecários desde quando aquelas instituições demandaram tais profissionais (SILVA; RIBEIRO, 2011).
[7] A informação é o fenômeno gerado na mente humana e que ao sair do sujeito fica submetido a um processo natural de reprodução e de transmissão/comunicação. Desse modo, o processo é a passagem da produção informacional para a consumação comunicacional (SILVA; RIBEIRO, 2002).
[8] Museus, bibliotecas e arquivos são instituições de memória por abrigarem em seus acervos testemunhos tangíveis e intangíveis das realizações das coletivas; da memória dos sujeitos e das comunidades; e de todo o seu patrimônio científico e cultural, o que lhes permite contribuir para o desenvolvimento social.
[9] A escolha de salvar, ou não, este texto, que já nasce digital, por exemplo, precisa ser tomada, e, em determinados casos, o descarte pode ser irreversível. Em outra medida, já consciente da importância destas linhas, é prudente o armazenamento deste documento em suportes distintos, seja na memória do computador, em um pendrive, ou no próprio e-mail do autor. É importante, ainda, considerar que, naturalmente, um trabalho deste porte dificilmente será elaborado em um único dia, o que sugere a criação de novas versões do mesmo a cada atualização, em geral, feita diariamente.
[10] A existência de muitos fios, isto é, de muitas fontes que se contradizem acerca de sua existência como um lugar de memória singular na Antiguidade, tornam a história da Biblioteca de Alexandria, ainda hoje é obscura, como os próprios documentos alusivos à sua destruição apresentam lacunas, e, por conseguinte, dúvidas (CANFORA, 1986).
[11] Ortega (2004) menciona a existência da biblioteca de Ebla, na Síria, e da biblioteca do soberano assírio Assurbanipal, entre outras, como exemplos de centros de organização e recuperação de informação mais recuados no tempo que a construção de Alexandria, no entanto, o pioneirismo no tocante à ambição de completude ainda é do faraó Ptolomeu Filadelfo.
[12] Roger Chartier (1999, p.24), acerca da revolução eletrônica, comenta as possibilidades de participação do leitor, que ?embaça a idéia de texto, e também a idéia de autor?.
[13] Para Maness (2007), o conceito de Biblioteca 2.0 não se relaciona a buscar, mas a encontrar; não trata de acesso, mas de compartilhamento; não de indivíduos, mas de comunidades buscando, criando e utilizando informação.
[14] Maness (2007) enfatiza, nesse contexto, que as funções das bibliotecas ao longo da história têm representado um lugar de reunião e de compartilhamento de identidade, comunicação e ação.
[15] Suscintamente definido como o conjunto de componentes, pessoas e/ou máquinas, inter-relacionados de modo que o todo forme uma organização, que, por meio de métodos organizados, manuais ou informatizados, destina-se a coletar, armazenar, processar, recuperar e disseminar dados que representam informação para o usuário (SILVA; RIBEIRO, 2002, 2011).
[16] De acordo com Capurro e Hjorland (2003), o retorno à história de uma palavra conduz comumente a desenhos ou modelos sobre como as coisas aconteceram ou foram feitas, o que contribui diretamente para o entendimento de seus significados e correlações.
[17] Em tempo, é forçoso tornar claro que a análise do discurso como dispersão de elementos age de acordo com regras que caracterizam aquele discurso como individualidade, apresentando-se como um sistema de relações entre os objetos, os tipos enunciativos, os conceitos e os temas e teorias. São esses níveis do discurso que tornam possível a passagem da dispersão à regularidade (FOUCAULT, 2004).
[18] Ao longo desta seção, serão contextualizadas as aproximações entre esses dois campos do conhecimento, que, apesar de partilharem objetos de atenção, representam, segundo o entendimento aqui defendido, disciplinas diferentes, assim como a Arquivologia, a Documentação e mesmo a Museologia.
[19] Existe, sobretudo entre os países nórdicos e anglo-saxões, uma tendência a considerar como uma grande área a Library and Information Science, ou seja, a Biblioteconomia e Ciência da Informação. Todavia, considera-se neste trabalho, a perspectiva de que apesar de ambas as áreas se relacionarem conceitual e historicamente, possuem diferenciações suficientes para serem distinguidas.
[20] O Paradigma Pós-Custodial e o Paradigma da Cultura de Convergência Midiática, sobretudo.
[21] O que denota possibilidades de gerar um empoderamento político de seus usuários, que devem ser pensados como sujeitos de um processo dialógico de construção e troca de saberes capazes de gerar novas informações e conhecimentos.
[22] Composto por Objetos de Operação (informação e suportes de informação); Sujeitos (produtores e consumidores); Procedimentos Operadores (organização e controle dos fluxos de seus objetos); Pesquisa Científica; e Educação (SOUZA, 1996).
[23] Constituído, basicamente, por sua prática de pesquisa científica e construção de conceitos advindos de seu mundo prático (SOUZA, 1996).

Autor notes

* Doutorando em Informação e Comunicação em Plataformas Digitais (universidade do Porto e Universidade de Aveiro).
Professor no Departamento de Ciência da Informação da Universidade Federal do Pernambuco.
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