Resumo: O artigo apresenta os resultados de análise da produção científica dos úl- timos 10 anos (2008-2018) acerca da chamada “delinquência juvenil”. A análise teve como objetivo compreender quais são as problemáticas asso- ciadas às juventudes e às violências e como tais questões têm sido abor- dadas pela comunidade acadêmica, a partir de estudos empiricamente localizados em países como EUA, França, México, Inglaterra e Brasil. O le- vantamento bibliográfico foi realizado em periódicos nacionais e interna- cionais de excelência classificados nas áreas da antropologia/arqueologia e sociologia, de acordo com o sistema de avaliação Qualis CAPES. O levan- tamento foi circunscrito aos periódicos disponíveis em língua portuguesa, espanhola, francesa e inglesa que têm como escopo estudos sobre “juven- tude”, “segurança pública” e “violência”. Foram sistematizados 289 artigos que por diferentes caminhos teórico-metodológicos abordaram questões relacionadas à imigração, encarceramento em massa, conflitos étnico-ra- ciais, gangues juvenis, tráfico de drogas e violência policial.
Palavras-chave: Delinquência juvenil, Violência, Juventude, Segurança.
Abstract: This paper presents the results of an analysis of the scientific pro- duction of the last 10 years (2008-2018) about the so-called “youth delinquency”. The analysis aimed to understand what are the prob- lems associated to youth and violence and how such issues have been addressed by the academic community, from studies empiri- cally located in countries such as the USA, France, Mexico, England and Brazil. The bibliographic survey was conducted in Brazilian and international journals of excellence classified in the areas of anthro- pology / archeology and sociology, according to the Qualis CAPES evaluation system. The survey was limited to journals available in Portuguese, Spanish, French and English that focus on studies on youth, law enforcement and violence. A total of 289 articles were systematized that, through different theoretical and methodologi- cal approaches, addressed issues related to immigration, mass in- carceration, ethnic-racial conflicts, youth gangs, drug trafficking and police violence.
Keywords: Youth delinquency, Violence, Youth, Law enforcement.
Resumen: El artículo presenta los resultados del análisis de la producción cien- tífica de los últimos 10 años (2008-2018) sobre la llamada “delin- cuencia juvenil”. El análisis tuvo como objetivo comprender cuáles son los problemas asociados con la juventud y la violencia y cómo la comunidad académica ha abordado dichos problemas, a partir de estudios empíricos ubicados en países como Estados Unidos, Francia, México, Inglaterra y Brasil. La encuesta bibliográfica se realizó en revistas de excelencia brasileñas e internacionales clasificadas en las áreas de antropología / arqueología y sociología, de acuerdo con el sistema de evaluación Qualis CAPES. La encuesta se limitó a revistas disponibles en portugués, español, francés e inglés que se centran en estudios sobre la juventud, la seguridad pública y la violencia. Se sistematizaron un total de 289 artículos que, a través de diferentes enfoques teóricos y metodológicos, abordaron cuestiones relacio- nadas con la inmigración, el encarcelamiento masivo, los conflictos étnico-raciales, las pandillas juveniles, el tráfico de drogas y la vio- lencia policial.
Palabras clave: Delincuencia juvenil, Violencia, Juventud, Seguridad pública.
Artigos
A delinquência juvenil em perspectiva comparada: uma análise bibliométrica dos estudos nas Ciências Sociais (2008-2018)
Recepção: 08 Dezembro 2019
Aprovação: 30 Dezembro 2019
A análise bibliométrica ora apresentada se constitui no esforço de um coletivo de pesquisadores(as)1 que integraram o projeto intitulado “Sociabilidades juvenis na periferia do Distrito Federal: um estudo comparado sobre a relação entre jovens e poli- ciais no Jardim Roriz (Planaltina) e no Sol Nascente (Ceilândia)”, desenvolvido no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade de Brasília2.
A pesquisa visou compreender as sociabilidades juvenis construídas a partir de territórios periféricos do Distrito Federal. Para tanto, optou-se em realizar trabalho de campo sistemático em escolas públicas, com o intuito de, a partir da observação do “mundo da escola”, vislumbrar os principais movimentos, circuitos e dinâmicas relacionadas ao mundo dos jovens.
No contexto brasiliense importou aprofundar o conhecimento sobre o fenômeno das chamadas “gangues juvenis”3, todavia, antes do investimento empírico necessário, a equipe se propôs a analisar bibliografias mais recentes acerca de um dos temas clássicos da sociologia, a chamada “delinquência juvenil”. O de- safio de pesquisa estava em primeiro construir “o estado da arte” sobre a questão, através da realização do levantamento bibliográfico que serviu de subsídio para a revisão sistemática e a análise bibliométrica que compõem o material aqui apresenta- do. Os autores se dedicaram a tematizar as questões que mobilizaram pesquisadores(as) nacionais e internacionais, na última década, em torno da agenda de pesquisa acerca das juventudes e as diversas manifestações de violências.
O levantamento bibliográfico foi realizado no escopo dos artigos acadêmicos publicados no período de janeiro de 2008 a julho de 2018, em periódicos nacionais e internacionais revisados por pares, disponíveis em língua portuguesa, espanhola, francesa e inglesa, classificados como periódicos de excelência acadêmica nas áreas da antropologia/arqueologia e sociologia de acordo com o sistema de avaliação Qualis CAPES/CNPq4. O levantamento foi circunscrito aos periódicos que têm como escopo estudos sobre “juventude”, “segurança pública” e “violência”. Foram utilizados em português, inglês, francês e espanhol os seguintes termos de busca: gangues, gangues juvenis, galeras, delinquência juvenil, youth gangs, juvenile delinquency, gangs, bandes de jeunes, délinquance juvénile, pandillas juveniles e delincuencia. Por meio da leitura dos resumos, a partir do critério de afinidade te- mática, foram selecionados 289 artigos. Em seguida, realizoue a extração de informações bibliométricas do banco de artigos se- lecionados, as quais foram sistematizados numa planilha do software Excel, que contém: título, resumo curto, link para acessar o artigo, citação completa estilo APA, título do periódico, local do periódico, instituição à qual o periódico está vinculado, autor(a)(es), local onde fica a instituição de pesquisa do(a)(es) autor(a)(es), instituição à qual os(as) pesquisadores(as) estão vinculados(as), local do campo ou referência do estudo e ano da publicação.
Em relação à bibliometria, pode-se afirmar que o volume de pesquisas sobre juventude e delinquência juvenil, considerando critérios e áreas de concentração adotados na seleção, tem oscilado ao longo da última década. Ressalva importante de que o baixo número de publicações em 2018 se deve ao término do levanta- mento no primeiro semestre de 2018.
Quanto à autoria dos artigos, não há predomínio de autores que mais tenham publicado nos últimos 10 anos sobre o tema. O volume da produção relacionada à juventude e delinquência juvenil, de acordo com critérios e áreas adotados na seleção, está entre 01 e 02 artigos por autor(a). Não há, portanto, pesquisadores(as) que se destaquem como tendo maior lastro de estudos na temática. No que tange à distribuição geográfica, pode-se notar que as pesquisas são publicadas em sua maioria por periódicos associados a instituições de ensino superior e entidades de pesquisa de seis países, a saber: Inglaterra, Alemanha, Estados Unidos da América (EUA), Brasil, França e México.
As pesquisas têm sido desenvolvidas por instituições ligadas majoritariamente a cinco países, a saber: EUA, Inglaterra, Brasil, Canadá e França. Em sua grande maioria, são também instituições de ensino superior, com exceção da França, onde se encontra em maior número entidades de pesquisa não associadas a universidades.
Já quanto ao campo empírico pesquisado, há concentração de estudos nos EUA, Brasil, Inglaterra, França e México. Os dois primeiros países representam majoritariamente os campos empíricos das pesquisas sobre juventude e delinquência juvenil, segundo os critérios de seleção adotados na busca.
Conforme os dados bibliométricos podem demonstrar, a distribuição por países mostra que as pesquisas estão de múltiplas formas relacionadas principalmente a cinco países. Na Europa se trata da Inglaterra e da França; na América do Sul, o Brasil; na América do Norte, os EUA e o México. Tais países estão associados às pesquisas na área por terem mais instituições produzindo pesquisas relacionadas à juventude e delinquência juvenil, por terem mais periódicos publicando tais pesquisas ou por terem seus campos empíricos mais frequentemente pesquisados. Assim, faz-se necessário compreender quais questões contemporâneas afetam a juventude e suscitam a academia na busca por compreensão das dinâmicas da violência e delinquência juvenil.
Inglaterra, França, Brasil, EUA e México são países que demons- tram conflitualidades e dinâmicas criminais que possivelmente auxiliem na compreensão do interesse acadêmico sobre o tema da delinquência juvenil. No caso da França e da Inglaterra, questões relacionadas à imigração que têm produzido estudos sobre as conflitualidades envolvendo a juventude. Ambos os países demonstram problemas relacionados à integração social de suas populações de origem imigrante, ainda que tenham desenvolvi- do políticas sociais inclusivas completamente distintas. Na Inglaterra se tem o modelo integracionista, que reconhece as diferenças culturais, étnicas e religiosas no espaço público e onde as representações dessas comunidades negociam diretamente com o poder público a fim de obter direitos particulares. Na França se aplica o modelo assimilacionista, que parte do princípio que as populações de origem imigrante, para se integrar a sociedade francesa, devem se “dissolver” na população e assim progressivamente “esconder” tais particularidades culturais, étnicas e religiosas em nome de um republicanismo universalista. Salienta-se que nesses dois países, assim como em outros países da Europa ocidental, a migração de populações das ex-colônias foi requisitada e incentivada por políticas públicas de Estado para auxiliar na reconstrução pós-Segunda Guerra Mundial. As- sim, entre anos de 1950 e 1970, tratava-se de uma mão de obra jovem, essencialmente masculina e pouco qualificada, que vinha por motivos de trabalho. Posteriormente, a partir de meados dos anos 1970, no intuito de antecipar os problemas relaciona- dos ao envelhecimento da população, foram incentivadas as migrações familiares. Assim, a preocupação com a juventude, nesta última década, pode ser compreendida a partir dos processos e dinâmicas sócio-políticas afetos à imigração. (Schnapper, 2003; Noiriel, 2002).
Em ambos os países europeus – França e Inglaterra – jovens imigrantes têm sido alvo de preocupação das autoridades, opinião pública e pesquisadores, por sua suposta participação em crimes de violência letal intencional, crimes contra o patrimônio e vandalismo. A questão imigratória e a estigmatização de jovens imigrantes marcam, nesses dois países, as relações entre policiais e grupos juvenis (Mucchielli, 2008; Mohammed, 2009; Mauger, 2016).
Nota-se também as políticas de policiamento que sofisticam cada vez mais os métodos de controle, ao passo que estigmatizam bairros de maioria de população imigrante (asiáticos, afro-caribenhos, latinos, afrodescendentes e árabes muçulmanos). Contraditoriamente, as pesquisas francesas demonstram que a suposição de que a juventude seria o grande elemento explicativo para a elevação da incidência criminal é falsa, uma vez que a juventude não foi relacionada estatisticamente ao aumento de tais crimes (Mucchielli, 2008; Mauger, 2016). O Estado francês, além disso, é historicamente presente no cotidiano e controle de sua população, o que se pode observar pela perenidade de políticas públicas de planejamento familiar, que datam de mais de dois séculos, nas quais a juventude foi sempre alvo de preocupação.
Já nas Américas do Sul e do Norte, o encarceramento em massa, o tráfico de drogas e a violência letal intencional são as conflitualidades marcantes nas pesquisas relacionadas à delinquência juvenil nestes últimos 10 anos. No período de 2007 a 2017, no Brasil, o encarceramento em massa cresceu na ordem 181% (Brasil, 2019), sendo marcante o encarceramento de jovens negros pobres e de periferia das grandes metrópoles no país, os quais são condenados pela prática de tráfico de drogas e crimes contra o patrimônio. Além disso, o problema dos homicídios constitui a maior preocupação acerca da criminalidade violenta no país, vitimando principalmente esse mesmo público. É coerente, portanto, que as pesquisas brasileiras tenham se dedicado à juventude, buscando compreender os elementos explicativos desses quadros.
No México, a prevalência da juventude e da delinquência juvenil como objeto de pesquisa está relacionada ao acirramento dos contextos de desigualdade, nos quais têm crescido o encarcera- mento em massa da juventude, cada vez mais vulnerabilizada pelo empobrecimento e pelo desemprego. Ao mesmo tempo, a reconfiguração do mercado de drogas ilícitas trouxe para o México oferta significativa de atividades criminosas, tais como sequestro, extorsão, homicídios e roubo de carga, que se tornaram alternativas de geração de renda ou ingresso em atividades econômicas – ainda que ilegais.
Finalmente, nos EUA, as tensões raciais não resolvidas são o centro das relações conflituosas que integram jovens e as forças policiais. Assim, o problema das violências de gangues e entre gangues e as polícias forma as preocupações relacionadas à delinquência juvenil. Também nesse cenário, marca-se a profunda presença de jovens de minorias étnicas (negros e latinos) como alvo prioritário do sistema de justiça criminal e da justiça juvenil.
A violência praticada pela juventude e a violência que incide sobre a juventude constitui uma questão social que explicita os desafios do enfrentamento social da desigualdade no mundo contemporâneo. Nos artigos brasileiros, a maioria dos trabalhos traz a associação entre delinquência e pobreza como categoria de análise preponderante para se pesquisar delinquência, seja de maneira crítica, quando a pobreza não parece ser crucial para se entender a delinquência (Vinuto & Alvarez, 2018; Paula, 2015; Zaluar 2012; Gurski, 2012); seja como pressuposto (Marinho & Vargas, 2015; Mattos, 2012; Zilli e Beato, 2012), quando a pobreza se mostra essencial para as dinâmicas de delinquência juvenil do campo.
A categoria “gangue” foi a segunda categoria mais usada como chave explicativa para a delinquência juvenil. No texto de Rocha (2015) a gangue é o que rege as dinâmicas territoriais das “guer- ras” entre jovens e é dentro da gangue que se estabelecem as sociabilidades entre jovens para alimentar as ditas “rivalidades violentas”. Para Zilli & Beato (2015) as gangues podem, inclusive, ser chave explicativa para entender o aumento nos homicídios no país. Já para Souza & Souza (2010), as gangues ocupam um lugar de instituição de socialização para os jovens que as constituem, formando “um sentimento de solidariedade e uma vinculação identitária com o grupo” (Souza & Souza, 2010, p. 281), o que se afasta do texto de Zaluar (2014), que acredita que as gangues trazem apenas vagamente as noções de confiança, le- aldade e reciprocidade e “que são as fundações da socialização” (Zaluar, 2014, p. 22).
A última categoria de análise nos estudos sobre Brasil é o con- texto educacional. Esta categoria pode aparecer como incidência de violência nas escolas (Souza & Souza, 2014), impacto da es- cola e dos métodos de aprendizagem na formação de um este- reótipo delinquente (Gomes et al., 2013), dinâmicas internas de socialização e interação nas escolas (Doob, 2006), ou a evasão escolar (Sento-Sé & Coelho, 2014).
Nas pesquisas sobre o contexto social norte-americano, a temática da delinquência juvenil é um ponto focal nos estudos sobre violência e juventude. Em relação aos adolescentes, Singer (2017) destaca a importância do estabelecimento de relações interpessoais entre adolescentes e adultos, assim como adolescentes entre si. O autor salienta que tais relacionamentos têm diminuído nos contextos de maior urbanização e crescido em contexto de suburbanização, nos quais relacionamentos entre adolescentes, pais, funcionários de justiça e escola podem ser mais contínuos (Singer, 2017). Destacam-se também nos estu- dos sobre os EUA, as pesquisas que relacionam a delinquência juvenil e o encarceramento em massa, mostrando que devem ser implementadas reformas nos contextos de justiça juvenil e no sistema de justiça criminal (Hannon & DeFina, 2012; Duck & Rawls, 2012). Da mesma forma, discutem-se relações entre as dinâmicas criminais do tráfico de drogas, o acirramento do capitalismo e o encarceramento em massa de jovens em regiões industriais periféricas. Tais contextos econômicos predatórios vulnerabilizam mais grupos empobrecidos que funcionam no varejo de substâncias ilícitas, tornando-os ainda mais margina- lizados pelas desigualdades econômicas. Trata-se de uma forma de lucrar com a dinâmica criminal, direcionada à quantidade mínima de capital gerado ilicitamente que é canalizada de vol- ta para a economia lícita, através de multas de justiça criminal, apreensão de ativos por confisco civil e advogados vorazes. De outro lado, o lucro com o encarceramento é ainda obtido dos contribuintes pelos provedores de serviços punitivos e terapêuticos, os quais desfrutam da administração das vítimas da acumulação predatória do capitalismo (Bourgois, 2018).
Cinco artigos sobre o campo empírico francês abordam direta- mente a questão da delinquência juvenil (Mucchielli, 2008; Bo- dy-Gendrot, 2013; Zauberman et al., 2013a; Zauberman et al., 2013b; Chéronnet, 2015). O artigo de Zauberman et al. (2013a) se limita a mencionar que os jovens delinquentes são tanto autores quanto vítimas de violências. Já no outro artigo do mesmo autor (Zauberman, 2013b), este mostra que os medos da população em relação à delinquência juvenil são bastante heterogêneos, mas que as supostas causas são frequentemente relacionadas à perda de moral e à imigração. Mucchielli (2008) aponta que a despeito do discurso sobre o aumento das violências no território francês e a suposta relação desta tendência com a delinquência juvenil, as pesquisas mostram que desde os anos 1960 houve uma estabilização geral das violências cometidas por jovens. Sendo assim, tal discurso seria então mais efeito de uma transformação dos valores e do “teto” de tolerância, de uma nova retidão moral frente à violência que tem como desdobra- mento mais denúncias para a polícia (p. 129). Por fim, Chéronnet (2015) aborda diretamente a questão da delinquência juvenil e se dá por missão desconstruir uma visão homogênea da delinquência, que esta seria produto da opinião pública, e que tem incentivado nos últimos anos os atores da justiça francesa (para menores de idade) a adotar sanções duras ao “isolar os atos cometidos dos elementos da trajetória do jovem” de manei- ra a mostrar maior serviço para a sociedade (o que ela chama de “maior performance da ação pública”). Por meio de uma análise empírica de reconstituição das trajetórias biográficas de 18 jovens (de 13 a 17 anos e meio de idade), colocando em evidência as dimensões estruturantes de seus percursos delituosos, a autora construiu três categorias ideais-típicas de representação da trajetória delinquente: i) os jovens em renúncia progressiva em relação à carreira delinquente; ii) os jovens que reivindicam sua delinquência como um novo modo de socialização; iii) os jovens que encaram a entrada no percurso delinquente como uma in- versão do estigma a eles atrelado. Em suma, para Chéronnet, a trajetória delinquente é mais o “produto de interações sociais e de pontos marcantes que conduzem os jovens a reinterpretar o seu percurso e a dar um sentido a este” (p. 315).
No México, a temática da delinquência juvenil é abordada, principalmente, a partir da desigualdade social como determinante principal da vinculação dos jovens com o mundo criminal, um exemplo desta associação pode ser encontrado num estudo de Bergman (2013) que mostra a correlação positiva entre a inserção precária da juventude mexicana no mundo do trabalho e a vinculação com esquemas de crimes patrimoniais como roubos a residências, automóveis e pessoas. Com respeito à problemática do encarceramento da população jovem, a partir das estatísticas oficiais, o estudo de Perez (2014) mostra a grande homogeneidade sóciodemográfica da população carcerária e seu aumento nos anos recentes, neste sentido, se sugere a existência de uma política de estado de encarceramento massivo de jovens de bairros populares. Com respeito à delinquência juvenil vinculada aos crimes contra o patrimônio e aos impactos na saúde, o estudo de Estrada et al. (2009) e o estudo de Zepeda (2018) vão analisar as dinâmicas cada vez mais cruéis da violência juvenil que envolvem assassinato de jovens para demonstrar que no México vem aumentando estas formas de violência por conflitos associados ao tráfico de drogas e que afetam principalmente os jovens.
Na Inglaterra são poucos os estudos que focam na questão da delinquência juvenil, porém, encontramos a pesquisa de Coom- ber et al. (2019) que descreve formas de policiamento voltadas para grandes “operações contra o crime” que possuem como foco principal jovens (homens e mulheres) que atuam nos pos- tos mais baixos do mercado do crack nas ruas das cidades ingle- sas. Outro estudo aponta que no imaginário social inglês con- temporâneo e no discurso público contra a imigração e favorável à deportação aparecem uma nova figura do “demônio crimino- so”, o “folk-devil”, representado pelo homem jovem migrante ou pertencente a alguma minoria étnica-racial (Griffiths et al., 2017). Finalmente, encontra-se alta participação da população jovem no cyber-crime, identificado como um tipo de crime de “colarinho branco” (White collar) (Levi, 2018).
Por fim, vale destacar que a análise bibliométrica proposta neste artigo visou tão somente permitir ao leitor(a) interessado(a) em temas relacionados às sociabilidades juvenis, de modo geral, e a delinquência juvenil, em particular, encontrar pistas teórico-metodológicas com base em pesquisas empíricas realizadas em contextos geográficos e sócio-políticos dos mais diversos como aqueles aqui apresentados.