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Cultura Amazônia: da migração nordestina a sala de aula ribeirinha

Amazon culture: from the northeastern migration to the riverside classroom

http://orcid.org/Cultura Amazônia: da migração nordestina a sala de aula ribeirinha culturais. Deste modo, os processos dinâmicos naturais da cultura amazônica devem ser colocados em prática todos os dias de cada indivíduo. Arantes Ribeiro
Universidade Federal de Rondônia, Brasil

Cultura Amazônia: da migração nordestina a sala de aula ribeirinha

Revista Presença Geográfica, vol. 06, núm. Esp.01, 2019

Fundação Universidade Federal de Rondônia

Recepção: 29 Agosto 2019

Aprovação: 29 Agosto 2019

Resumo: O texto apresenta uma discussão a respeito da investigação das narrativas míticas do imaginário de uma comunidade ribeirinha que faz parte do contexto educacional dos alunos. Apresenta a forma como essas narrativas são trabalhadas na prática docente, diante da integração intercultural. Com o viés cultural, a sala de aula torna-se objeto de estudo, abordando os valores e as experiências vividas. O principal objetivo foi demonstrar sobre a importância de integrar os alunos à arte de narrar e às exp eriências cotidianas no ambiente escolar. O texto resulta da releitura da pesquisa de iniciação científica que abordou a Cultura Amazônica na sala de aula, à luz do processo migratório para a Amazônia e pelo viés da discussão de uma educação voltada para a emancipação. A pesquisa foi realizada no campo metodológico da Fenomenologia e da História Oral, sustentadas nas concepções de Merleau-Ponty (1994) e Meihy (2005). Foi possível realizar um estudo que perpassa pelo modo de ver e compreender o processo de conhecimento da cultura local nas escolas ribeirinhas, a partir de atividades desenvolvidas com os alunos, bem como com desenvolvimento das entrevistas e a concepção do outro. Identificou-se uma cultura ribeirinha - amazônica fundamentada na relação dos ribeirinhos com o rio e a mata, uma “ cosmovisão” (LOUREIRO, 1995). As discussões dos resultados partiram da identificação da cultura amazônica, a relação desta com a teoria da escola e a prática de aprender em sala de aula. Considerou o processo migratório para a Amazônia marcado pela presença dos nordestinos, onde sua a vivência contribuiu para a criação das representações dos grupos ribeirinhos e a formação da cultura amazônica. Essa cultura ultrapassa os muros da escola, tornando-se parte da Educação. Assim, ao trabalhar no ambiente escolar as diversidades culturais conduzem a compreensão da importância do conhecimento através da cultura de cada indivíduo.

Palavras-chave: Educação, Migração, Ribeirinho.

Abstract: The text presents a discussion about the investigation of the mythical narratives of the imaginary of a riverside community that is part of the educational context of the students. It presents the way these narratives are worked out in the teaching practice, in the face of intercultural integration. With the culturalbias, the classroom becomes an object of study, addressing the values and experiences lived. The main objective was to demonstrate the importance of integrating students with the art of narration and everyday experiences in the school environment. The text results from the re-reading of the scientific initiation research that approached the Amazon Culture in the classroom, in the light of the migratory process for the Amazon and by the bias of the discussion of an education focused on emancipation. The research was carried out in the methodological field of Phenomenology and Oral History, based on the conceptions of Merleau-Ponty (1994) and Meihy (2005). It was possible to carry out a study that goes through the way of seeing and understanding the process of knowledge of local culture in riverside schools, based on activities developed with students, as well as the development of interviews and the conception of the other. A riverine-Amazonian culture based on the relation of the riverside to the river and the forest was identified, a "cosmovision" (LOUREIRO, 1995). The discussions of the result s started from the identification of the Amazonian culture, its relation with the theory of the school and the practice of learning in the classroom. He considered the migratory process for the Amazonia marked by the presence of the Northeasterners, where his experience contributed to the creation of representations of the riparian groups and the formation of the Amazonian culture. This cultur e goes beyond the walls of the school, becoming part of Education. Thus, working in the school environment, cultural diversities lead to an understanding of the importance of knowledge through the culture of each individual.

Keywords: Education, Migration, Ribeirinho.

1. INTRODUÇÃO

O presente texto apresenta uma releitura da pesquisa vinculada ao projeto “Alfabetização de Ribeirinhos na Amazônia: uma proposta a ser construída”, ano 2005. Essa pesquisa investigou quais as narrativas do imaginário da comunidade de Santo Antônio fazem parte do contexto educacional dos alunos, observando ainda a forma como as narrativas míticas são trabalhadas na prática docente, diante da integração intercultural.

Nessa perspectiva e alinhando com a proposta do projeto de pesquisa, tem-se como perguntas norteadoras: Como a cultura através dos mitos, lendas, festas amazônicas podem contribuir para desenvolvimento da alfabetização? Abordou ainda, como a Escola trabalha a cultura local? Como os professores tratam a cultura local em suas aulas? Considerando a discussão sobre o universo das águas e das matas.

A partir dos questionamentos e da discussão sobre a compreensão de um imaginário próprio que caracteriza a Cultura Amazônica que perpassa pelo cotidiano dos ribeirinhos (LOUREIRO, 1995), pode-se compreender então que este imaginário ultrapassa os muros da escola, tornando- se parte da educação. Assim, é possível dar visibilidade a essa cultura pautada no respeito das diversidades socioculturais.

Diante disso, aborda-se a importância desta pesquisa ao abordar as narrativas do imaginário local que fazem parte do contexto educacional dos alunos e a identificação destas com o meio em que eles vivem, além da identificação da forma como as narrativas míticas são trabalhadas em sala de aula, diante da integração intercultural, proporcionando, assim, a melhor compreensão do espaço onde a escola está inserida.

Nesse universo da pesquisa, considera-se uma determinada comunidade ribeirinha onde existem elementos que se inter-relacionam com o cotidiano das pessoas e influenciam a formação cultural deste grupo. Em particular a comunidade pesquisada há de se destacar a pequena igrejinha católica de Santo Antônio, além dos trilhos da Estrada de Ferro Madeira Mamoré. Somando a estes elementos, a comunidade convive com o cemitério de Santo Antônio que, além de ser fonte de renda para muitos moradores, contribui enriquecendo o imaginário local.

2. CULTURA RIBEIRINHA: UM OLHAR TEÓRICO

Ao discorrer sobre a cultura ribeirinha torna-se possível realizar uma abordagem diferenciada ao considerar a extensão dos rios e as particularidades da mata inter-relacionando com o meio sociocultural dos grupos ribeirinhos na Amazônia, possibilitando um modo de vida caracterizado pelas subjetividades próprias que fazem parte da cultural local.

Diante dessa realidade Loureiro (1995) discorre sobre uma visão específica dos ribeirinhos, uma discussão que perpassa pela “cosmovisão”, que através dela o homem, a mulher e a criança ribeirinha explicam suas realidades.

Nessa mesma discussão, Geertz (1989) entende que a cultura está repleta de símbolos e significados voltados para o meio ambiente e social de cada ser humano, sob o domínio de uma estética que perpassa pela transmissão de geração para geração e permanecem na memória de um grupo social influenciando e determinando sua cultura e seu modo de vida.

Na mesma perspectiva de abordagem dos alotes acima Laraia (2004, p. 38) afirma que “o homem é herdeiro de um longo processo acumulativo, que reflete o conhecimento e a experiência adquirida pelas numerosas gerações que o antecederam.” Assim, o processo acumulativo de experiência que se tornaram hábitos de vivência entre os homens, decorre pela compreensão das culturas de seus antepassados.

Junto a essa abordagem, há de considerar que a forma de uma criança conviver em um determinado grupo depende dos ensinamentos dos pais, e quando esta se torna aluno vivenciará as relações no ambiente escolar. Em Mello (2000), a cultura apresenta acepções próprias, logo, torna-se possível analisar um grupo, enfocando sua cultura subjetiva. Para o autor, corresponde a compreensão de seus conjuntos de valores, conhecimentos e crenças, ou sua cultura objetiva: os hábitos, comportamentos, objetos de arte, todo o conjunto da obra humana (Mello, 2000).

A partir dessa percepção de cultura material, a soma de artefatos produzidos pelo homem no meio onde está inserido, fazendo um paralelo com a análise da cultura não material, conforme o autor acima, as ações, significados, crenças e conhecimento, proporcionando uma amplitude à cultura subjetiva enriquecendo a pesquisa e oferecendo diversificados campos de análise.

Nessa discussão sobre a subjetividade cultural Loureiro (1995, p.56) entende que,

A Cultura Amazônica onde predomina a motivação de origem rural ribeirinha é aquela na qual melhor se expressam, mais vivas se mantêm as manifestações decorrentes de um imaginário unificador refletido nos mitos, na expressão artística propriamente dita e na visualidade que caracteriza suas produções de caráter utilitário – casas, barcos.

Ao abordar o mito na cultura Amazônia registra-o como elemento fundamental para compreender o processo da cultura amazônica, uma vez que decorre de um imaginário unificador e transfigurado. Por meio do mito o ribeirinho materializa a vida da própria natureza, ele cria seu mundo diante do mundo físico que está diante de seus olhos.

Diante dessa discussão sobre o um determinado universo sociocultural tem-se as relações na sala de aula que, fundamentadas na proposta de Adorno (1995), estabelece uma educação voltada para emancipação. Assim, aborda-se as vivências dos alunos para educar de forma emancipada, por meio da compreensão dos valores culturais, políticos e econômicos envolvidos no processo de aprendizado na escola.

Por isso, discorre sobre uma escola com uma nova postura para desenvolver caminhos pedagógicos que estimulem o pensamento, a autoria e a autonomia que leve cada aluno a sua própria reflexão.

Nesse termos, é interessante relacionar o saber na relação professor e aluno, à tarefa do educador, a quem não caberia dogmatizar o saber, mas em uma relação que enquadra cada processo cultural levando em consideração as diferenças encontradas dentro da sala de aula (Mello, 2000). Dessa forma, evidencia que o aluno traz consigo uma forma de saber e de pensar que refletem seus valores e hábitos individuais e que possibilitam a interação com a prática docente, caminhando assim para o constante fortalecimento do ensino-aprendizagem.

3. A PRESENÇA NORDESTINA NO ESPAÇO AMAZÔNICO: UMA POSSÍVEL REFLEXÃO

Na dinâmica de formação do espaço amazônico atual tem-se a marcante presença da migração nordestina. Estudos demonstram dois motivos que conduzem para essa migração, registra-se a fuga da seca e da fome. Há de se considerar também a propaganda do governo de uma vida melhor na Amazônia, sem fome, sem miséria e trabalho para todos. Nesse sentido, destaca-se o estudo apresentado na tese Seringueiros da Amazônia: sobreviventes da fartura,

No final do século XIX, uma forte seca que durou quase toda a década de 1870 e 1880, aliada a grande necessidade de mão-de-obra para os seringais na Amazônia devido à explosão de consumo de borracha no mundo todo, fez com que o governo brasileiro estimulasse a migração do nordeste para o norte. (SANTOS, 2002, p. 11)

Nesse contexto, pontua-se que há forte influência da migração nordestina na formação do espaço ribeirinho na Amazônia, destacando as comunidades ribeirinhas às margens do rio Madeira.

Um ponto de análise para formação do espaço nordestino na Amazônia perpassa pela compreensão que esse grupo de migrantes trouxeram de sua região de origem um conhecimento do modo de vida característico de sua cultura e se consolidaram pelas margens dos rios da Amazônia. Essa migração acentua-se durante ao período do ciclo da borracha, “quando da migração para Amazônia a partir de 1877, esses nordestinos foram “recrutados” por seringalistas e levados com suas famílias para áreas de seringais às margens dos rios [...]” (NASCIMENTO SILVA, 2000, p.85)

Dessa forma, ao se consolidaram nas margens dos rios da Amazônia e tornou viável o desenvolvimento do extrativismo e recriaram o modo de vida nordestino. Compreende-se que tal situação caracterizou a formação do espaço amazônico, onde pode-se tem-se como resultado deste tipo de migração a interligação culturalmente com a população local, proporcionando o desenvolvimento de uma nova cultura, segundo Loureiro (1995) a cultura cabocla ou ribeirinha.

Essa cultura ribeirinha herda do modo de vida no seringal características como as casas palafitas, presente ainda hoje, a farinha e o peixe como forma predominante de alimentação e a familiaridade com a mata que segundo Silva (2008, p. 75) “como viviam isolados, os seringueiros tinham como divertimento as pescarias e principalmente as caçadas”.

Há de se pontuar que uma das maiores características desse modo de vida é a solidão e o isolamento, onde “a solidão é uma condição para adquirir a sensação de imensidade. A sós, nossos pensamentos vagam livremente no espaço” (TUAN, 1983, p.07). Além da relação de sobrevivência com o rio e a mata. Tal situação possibilitou o surgimento das representações culturais que marcam a cultura ribeirinha.

Nesse sentido, pode-se compreender que os pensamentos transitam pelo espaço na solidão da mente e proporciona experiências que ultrapassam a materialidade e são vividas e compartilhadas na cultura do grupo. Nesse contexto, tem-se a inter-relação do nordestino com o espaço amazônico situação que possibilitou o surgimento de um novo contexto sócio-cultural na Amazônia. Assim, “a inserção do nordestino na área ribeirinha foi decisiva para a caracterização e formação das localidades, onde seu trabalho movimentou a riqueza da região [...]” (NASCIMENTO SILVA, 2000, p. 109).

É notável a presença do nordestino no processo de formação cultural do espaço ribeirinho amazônico. Esses deixaram sua contribuição na cultura, economia e política das comunidades as margens dos rios da Amazônia. Aqueles que permaneceram na região constituíram famílias e, grande parte se concentrou na beira dos rios, desenvolvendo uma economia extrativista e de pesca. A vivencia no espaço amazônico foi caracterizando e organizando a vida dessas pessoas, pois desenvolveram outros mecanismos de sobrevivência nas margens dos rios, adaptaram suas vidas entre a cultura da época do seringal e as novas culturas que passaram a existir e caracterizar a vida ribeirinha na Amazônia.

4. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS E UM CAMINHO PARA ANÁLISE DOS DADOS

Os dados apresentados é uma releitura do resultado do Projeto de Iniciação Científica – PIBIC/ 2005, o qual foi desenvolvido por dois enfoques teórico-metodológicos. Há de pontura a Fenomenologia a partir da perspectiva de Merleau-Ponty (1994), por apresentar o estudo das essências que possibilita analisar a realidade abordada que perfila num modo de ver, compreender e planejar um possível caminho a um processo de conhecimento da cultura local na Educação das escolas ribeirinhas.

Diante desse caminho escolhido interpretou as questões relacionadas ao aluno que expõe as realidades características de sua cultura nas práticas pedagógicas, que geram implicações sobre as formulações de propostas pedagógicas e curricular, sobre o contexto professor – aluno e sobre o processo ensino – aprendizagem de uma determinada realidade cultural.

Nesta pesquisa optou-se por perceber o fenômeno educação enquanto prática que envolve saberes e culturas, geradora de concepção de conhecimento que demandam consequências sobre a cultura e a história da sociedade.

Outro enfoque teórico-metodológico que conduziu a pesquisa perpassa pela proposta metodológico da História Oral desenvolvida por Meihy (2005) para a realização, compreensão e desenvolvimento das entrevistas, bem como a concepção do outro e o agir diante do trabalho.

Ao considerar a inter-relação das duas propostas trilhou-se o caminho para o contato e a relação entre o pesquisador e os colaboradores/narradores desta pesquisa. Com a utilização destes pressupostos metodológicos foi possível perfilar um caminho rumo a um processo de conhecimento da cultura ribeirinha da comunidade de Santo Antônio na Educação local.

Nesse contexto, a pesquisa foi limitada a uma escola municipal, localizada na comunidade de Santo Antônio. Na época da realização do trabalho de campo notou-se a presença de alunos ativos onde correr, nadar e subir em árvores, atividades que fazemparte do dia a dia deles, demonstrando a interação com o meio ambiente em que vivem.

Há de pontuar que as atividades trabalhadas com os alunos tinham como principal objetivo levá-los a expressarem de forma livre as narrativas, para posteriormente serem contextualizada considerou-se ainda que a “experiência que passa de pessoa a pessoa é a fonte a que recorreram todos os narradores. E, entre as narrativas escritas, as melhores são as que menos se distinguem das histórias orais (BENJAMIN, 1980, p.198). Dessa forma, e com o objetivo de manter a caracterização da pesquisa, foi respeitada a liberdade e a maneira de expressão individual de cada texto/narrativa.

Nessa postura foi possível identificar muitas versões sobre as mesmas narrativas, predominantemente abordam o Boto, o Pé de Bode e o Homem de Branco.

Com a liberdade para expressar os alunos conseguem aprender a compreender o meio em que vivem, além de facilitar no processo de alfabetização, na produção de texto, frases, palavras ou reconhecimento de sílabas, podendo surgir músicas, brincadeiras e até expressões corporal direcionada pelo indivíduo referente a sua narrativa.

Outro ponto de abordagem durante a pesquisa considera a reflexão de Pucci (1995, p.123) “o homem é o único ser que necessita de uma instituição específica, de uma antecâmara – a escola – que o prepare para entrar no exercício cotidiano da maturidade”. Essa instituição Escola conduz a formação do indivíduo no coletivo mantendo uma afinidade no dia a dia entre os diversos grupos sociais existentes. A Escola é um período onde o aluno passa por um processo de formação considerando também a vivencia em sociedade.

Nesse conexto, considera-se ainda que os alunos têm a tendência de trazer a Escola às marcas e identificação do seu cotidiano, da sua cultura, por isso no processo de formação educacional a Escola precisa trabalhar além dos conteúdos historicamente construídos e abordar todos os instrumento necessários para que os alunos construam o conhecimento a partir da realidade vivida.

Nesse sentido, a pesquisa foi desenvolvida a partir da proposta de uma educação crítica, ao compreender que “a cultura é um processo e, ao mesmo tempo, o substrato de situações de enfrentamento e luta por hegemonia, autonomia, domínio, resistência e, no limite, sobrevivência” (Brandão, 2002, p.105). Assim, possibilitou aos alunos reconhecerem as diferenças entre os grupos sociais, assim como os valores culturais envolvidos na formação dos caminhos para o aprendizado na escola.

É interessante relacionar o saber, nessa perspectiva de instrumento de relação professor – aluno, à tarefa do educador, numa relação que enquadra cada processo cultural levando em consideração as diferenças encontradas dentro da sala de aula.

“Minha vó namorava com um boto [...] todo dia fazia festa lá na praia ai o boto pediu ela em namoro e ela aceitou ai ela vio que o boto tinha um buraco na cabeça dele ele usava um chapéu ”

Além da facilidade de expressão tanto na narrativa oral (fragmento acima) com na narrativa escrita (fragmento abaixo).

Figura 1– Texto de um aluno sobre a o Homem de Branco
Figura 1– Texto de um aluno sobre a o Homem de Branco
Fonte: Texto produzido durante a pesquisa de campo/2005.

Em análise interpretativa das narrativas apresentadas pode-se perceber que ambas estão relacionadas com as relaões famililares, demonstrando como a cultura ribeirinhas faz parte da vida destes alunos, é a naturalidade como são narradas essas experiências de vida envolvendo a cultura ribeirinhas Amazônica.

Registra-se que além das narrativas apresentadsa, durante o trabalho de campo foi possível registrar também a narrativa do Pé de Bode. Essa refere-se a um menino que apareceu na mata e certa vez pediu carona a um rapaz de moto. Quando percebeu o peso da moto olha para traz e nota o pé do menino igual à pata de um bode. Estas três narrativaa apareceram com mais frequência na fala dos alunos durante a pesquisa realizada.

Em uma reflexão sobre esta particular realidade ribeirinha, o comportamento diante de algo considerado realidade é o resultado de experiências individuais que no decorrer dos anos ganharam lugar privilegiado na memória coletiva deste grupo social (BOSI, 2003).

“Fui ao banheiro à noite [...] a mãe deixou, eu fui sozinho. Ai, lá do lado da casa do Anderson vi um homem aqui com a cabeça cheia de fumaça com cavalo.”

Nota-se que esta narrativa também refere-se ao “Homem de Branco”, já apresentada na figura 1, atribuindo-lhe vida e significado o que diferencia de elementos que possui apenas conteúdo. Tal situação “é próprio de quem está diante de algo que é imenso e diante do qual a pequenez do homem se evidencia” (LOUREIRO, 1995, p.61).

Dessa forma, ao trabalhar no ambiente escolar as diversidades culturais conduziria a compreensão por parte dos alunos dos meios variados de adquirir conhecimento através da interpretação dos modos de vida de cada indivíduo. Além de ultrapassar as ações diárias do planejamento escolar possibilitando desta forma um aprendizado a partir da cultural local.

Há de pontuar que tal postura por parte do educador conservaria culturas, como a ribeirinha, tempo necessário para ocorrer apenas mudanças naturais na dinâmica de cada sistema cultural.

Pontua-se que ainda durante o trablaho de campo as atividades realizadas enfatizaram a importância de educar por meio da cultura local. Notou-se que, durante as aulas, ao trabalhar imagens desta cultura facilitou o momento da leitura. Destacam-se as atividades que foram solicitadas leitura, a exemplo do compartilhamento do texto.

Outra situação relevante perpassa especificamente pela alfabetização, pois ao trabalhar com palavras que remetem a narrativas, como: boto, trilhos, castanheira, cemitério e outras, desenvolve-se o conhecimento de sílabas, letras números de letras e de sílabas iniciais de palavras. Ao considerar tal discussão demonstra na figura abaixo a construção de um jornalzinho demonstrando a possibilidade de ensinar considerando o meio onde os alunos vivem, facilitando a produção de texto, leitura e interpretação.

É possível a identificação da relação do aluno com o meio onde vivie, ultrapassando os muros da escola, onde identifica-se uma relção proxima quase exclusivamente com a mata e o rio para manter sua economia e sobrevivência e dessa relação surgem as representações culturais desse grupo social.

Assim, é possível observar, por meio das narrativas dos alunos, que tem um fenômeno que envolve e entrelaça o mundo natural com o cultural, mantendo uma relação entre o ribeirinho e o meio onde vive (LOUREIRO, 1995).

“formar seres humanos interagindo na sociedade, de forma consciente de seus deveres, direito e limites”

Figura 2 - Jornalzinho confeccionado junto com os alunos da Escola
Figura 2 - Jornalzinho confeccionado junto com os alunos da Escola
Fonte: Material produzido durante a pesquisa de campo/2005

Ao considerar o trabalho de pesquisa pode-se constatar aque as educadoras da escola pesquisada apresentam uma flexibilidade em ensinar os alunos quando estes relatam histórias da cultura local. Destaca a produção de livrinhos abordando historinhas produzidas pelos alunos onde surgiram três narrativas míticas, proporcionando uma integração entre a cultura local e sala de aula.

Dessa forma, ao trabalhar em sala de aula as múltiplas culturas os educadores permitem a construção da compreensão por parte dos alunos dos meios variados de adquirir conhecimento. Logo, culturas como a ribeirinha permanecem tempo necessário para ocorrer apenas mudanças naturais na dinâmica de cada sistema cultural, evitando a superioridade e inferioridade de cada grupo social.

5. Considerações

Ao aplicar uma educação como prática cultural, uma educação com liberdade de expressão e uma educação para o desenvolvimento social, obtêm-se uma interação de respeito e igualdade de realidades formando alunos aptos a conviver com as mudanças culturais. Deste modo, os processos dinâmicos naturais da cultura amazônica devem ser colocados em prática todos os dias de cada indivíduo.

Logo, a proposta emancipatória se faz presente como uma possibilidade de transformação da Educação através da cultura local, respeitando as individualidades do educando. A Escola é uma instituição que apresenta grande influência na formação cultural do aluno devendo, desta forma, adquirir características locais adaptando as realidades da cultura local.

Diante das diferenças culturais, a questão da cultura na Escola se apresenta sob uma perspectiva sócio-educativa que enfoca o ensinar e o aprender presente na cultura principalmente desta criança ribeirinha. Portanto, a descoberta deste espaço no universo ribeirinho das matas e dos rios presente na cultura dos alunos e dos seus pais que podem ser resgatadas através das narrativas míticas apresentadas na própria comunidade.

Nesse contexto tem-se as práticas docentes que são fundamentais para formação do aluno. Através das atividades observou-se os procedimentos adotados na sala de aula respeitando a cultural local e foi possível refletir sobre as práticas docentes, vivenciar os projetos desenvolvidos na escola, bem como a elaboração de atividades para a inserção da cultura amazônica na sala de aula.

REFERÊNCIAS

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