Artigos Científicos

Percepções e crenças de autoeficácia no trabalho com matemática e Resolução de Problemas na Educação Infantil

Perceptions and beliefs of self-efficacy in working with mathematics and problem solving in Early Childhood Education

Percepciones y creencias de autoeficacia en el trabajo con las matemáticas y la resolución de problemas en la Educación Infantil

Evandro Tortora
Universidade Estadual Paulista, Brasil
Nelson Antonio Pirola
Universidade Estadual Paulista, Brasil

Revista de Educação Matemática

Sociedade Brasileira de Educação Matemática, Brasil

ISSN: 2526-9062

ISSN-e: 1676-8868

Periodicidade: Cuatrimestral

vol. 17, núm. 1, 2020

sbem.sp.revista@gmail.com

Recepção: 01 Agosto 2020

Aprovação: 23 Setembro 2020

Publicado: 11 Outubro 2020



DOI: https://doi.org/10.37001/remat25269062v17id424

Copyright Revista de Educação Matemática 2020.

Resumo: Este estudo teve por objetivo interpretar as crenças de autoeficácia de professoras da Educação Infantil e suas percepções sobre resolução de problemas frente ao trabalho com conhecimentos matemáticos nas práticas com as crianças. Por meio de métodos qualitativos e quantitativos, fez-se a análise das respostas das docentes frente a uma escala de autoeficácia (respondida por 115 professoras) e de um questionário aberto (respondido por 55 professoras). Os resultados apontaram que as professoras têm crenças de autoeficácia positivas com relação ao trabalho com matemática na Educação Infantil e com o trabalho com a resolução de problemas, porém, apresentaram percepções sobre resolução de problemas que divergem do referencial teórico, as quais se aproximam do senso comum, indicando a necessidade do desenvolvimento de programas de formação continuada que abordem diferentes formas de se trabalhar com resolução de problemas na Educação Infantil.

Palavras-chave: Educação Infantil, Matemática, Autoeficácia, Resolução de Problemas.

Abstract: This article aims to interpret the self-efficacy beliefs of early childhood teachers and their perceptions about problem solving when working with mathematical knowledge in practices with children. Using qualitative and quantitative methods, the responses of the teachers were analyzed against a self-efficacy scale (answered by 115 teachers) and an open questionnaire (answered by 55 teachers). The results show that teachers have positive self-efficacy beliefs in relation to working with mathematics in early childhood education and working with problem solving, however, they have perceptions about problem solving that differ from the theoretical framework, which are close to the sense common, indicating the need to develop continuing education programs that address different ways of working with problem solving in Early Childhood Education.

Keywords: Child education, Mathematics, Self-efficacy, Problem solving.

Resumen: Este artículo tiene como objetivo interpretar las creencias de autoeficacia de los maestros de primera infancia y sus percepciones sobre la resolución de problemas al trabajar con conocimientos matemáticos en prácticas con niños. Utilizando métodos cualitativos y cuantitativos, las respuestas de los profesores se analizaron frente a una escala de autoeficacia (respondida por 115 profesores) y un cuestionario abierto (respondido por 55 profesores). Los resultados muestran que los docentes tienen creencias positivas de autoeficacia en relación al trabajo con las matemáticas en la educación infantil y al trabajo con la resolución de problemas, sin embargo, tienen percepciones sobre la resolución de problemas que difieren del marco teórico, las cuales se acercan al sentido común, lo que indica la necesidad de desarrollar programas de educación continua que aborden diferentes formas de trabajar con la resolución de problemas en la Educación Infantil.

Palabras clave: Educación Infantil, Matemáticas, Autoeficacia, Solución de Problemas.

1. Introdução

Parece haver um consenso entre pesquisadores e professores de que a Matemática é um campo de saberes com diversas aplicações à vida cotidiana de adultos e crianças. Ao nos referirmos à Educação Infantil, a ideia de que estamos imersos em um mundo em que Matemática se faz presente e necessária dá ao professor de Educação Infantil possibilidades de envolver as crianças em situações que culminem na aprendizagem de conceitos matemáticos.

Deste contexto, surge o desafio de planejar vivências em que as crianças consigam experienciar a Matemática de maneira significativa, contextualizada e respeitando os contextos das diferentes infâncias vivenciadas por elas (TORTORA, 2019).

Na Educação Infantil, diferentemente das outras etapas da Educação Básica, os conhecimentos a serem aprendidos pelas crianças não estão organizados em disciplinas. O planejamento do professor é voltado para o desenvolvimento de vivências por meio das quais acontecerão experiências com diferentes tipos de conhecimentos, dentre os quais se encontram os saberes matemáticos.

As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (DCNEI) (BRASIL, 2010), documento que aborda as prerrogativas curriculares para a Educação Infantil, ressaltam que as práticas pedagógicas na Educação Infantil devem garantir experiências que:

Recriem, em contextos significativos para as crianças, relações quantitativas, medidas, formas e orientações espaço temporais; Ampliem a confiança e a participação das crianças nas atividades individuais e coletivas; Incentivem a curiosidade, a exploração, o encantamento, o questionamento, a indagação e o conhecimento das crianças em relação ao mundo físico e social, ao tempo e à natureza (BRASIL, 2010, p. 25-26)

Percebe-se nesse documento a promoção da ideia do desenvolvimento integral de crianças de 0 a 5 anos de idade e, nesse sentido, busca relacionar todas as linguagens pelas quais a criança aprende, dentre as quais a linguagem matemática.

No âmbito do planejamento de vivências com a Matemática para crianças, os sentimentos do professor com relação a sua autoeficácia docente tem papel importante no planejamento de suas práticas. Ao definir autoeficácia, Bandura (1997, p. 3) afirma que “A autoeficácia percebida refere-se às crenças de alguém em sua capacidade para organizar e executar os cursos de uma ação requeridos para produzir certas realizações”. Para o professor, é importante perceber-se autoeficaz para proporcionar vivências de qualidade que resultem na aprendizagem de conhecimentos matemáticos pelas crianças da Educação Infantil.

Este artigo tem por objetivo interpretar as crenças de autoeficácia de professoras[3] da Educação Infantil e suas percepções sobre a resolução de problemas frente ao trabalho com conhecimentos matemáticos nas práticas com as crianças. Tal investigação tem relação com uma investigação desenvolvida no Programa de Doutorado em Educação para Ciência da Universidade Estadual Paulista (UNESP) de Bauru.

2. Educação Infantil, Matemática e Resolução de Problemas

Conforme as DCNEI (BRASIL, 2010) ressaltam, a Educação Infantil deve organizar-se por meio de práticas que têm por eixo norteadores as interações e a brincadeira. Diferentemente do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, o planejamento na Educação Infantil não é organizado por meio de disciplinas e a aprendizagem das crianças ocorrem a partir de suas experiências com diferentes conhecimentos nas práticas como a brincadeira e interações entre adultos, crianças, o ambiente e objetos do seu entorno.

Neste sentido, o professor não planeja vivências para as crianças que tratem exclusivamente do ensino de Matemática, mas contextos em que ela faça parte das experiências das crianças objetivando a aprendizagem de conhecimentos matemáticos. Smole (2003) chama atenção que algumas práticas podem acabar indo na contramão desse pensamento:

Comumente os professores se preocupam em transmitir às crianças da escola infantil rudimentos de noções numéricas – reconhecimento de algarismos, nomes dos números, domínio da sequência numérica – e os nomes de algumas figuras geométricas. Por trás desse trabalho está a concepção de que o conhecimento matemático vai ocorrer fundamentalmente através de explicações claras e precisas que o professor fizer (SMOLE, 2003, p. 62).

A ideia é superar um planejamento que privilegie os conhecimentos matemáticos de maneira isolada dos contextos da criança. Na verdade, trata-se de criar situações que se configurem como um “convite para a multiplicação de perspectivas, de perguntas, de investigações, de criações de respostas discutidas com outras crianças e com o professor” (BRASIL, 2018, p. 106).

A Matemática é um campo de saberes que se faz presente em diversas situações cotidianas de adultos e crianças. Estas situações em que a Matemática se faz presente podem se configurar boas oportunidades para aprender conhecimentos matemáticos na Educação Infantil, bem como podem ser ampliadas a partir do planejamento do professor. A título de exemplo, podemos citar as brincadeiras cotidianas no parque, contagens de crianças presentes e ausentes, interações com diferentes formas de realizar medições, desenhos com figuras geométricas etc.

Nesse contexto, há de se considerar também os conhecimentos prévios da criança. Sobre esse assunto, Lorenzato (2008, p. 24) afirma que “essa bagagem, que difere de criança para criança, precisa ser identificada pelo professor e, se possível, com o auxílio dos pais; o respeito a essa experiência pessoal é fator determinante para que sejam atingidos os objetivos desejados”.

Esses conhecimentos não vêm apenas das diferentes interações entre pessoas que compartilham a educação das crianças, mas também incluem suas explorações anteriores às vivencias na escola com jogos, pinturas, brincadeiras, explorações do espaço etc.

A Educação Infantil se propõe a ampliar esses conhecimentos em contextos de aprendizagem a partir do planejamento de tempos e espaços para aprendizagem das crianças. Sobre este assunto, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) (BRASIL, 2017, p. 34) ressalta que “as creches e pré-escolas têm o objetivo de ampliar o universo de experiências, conhecimentos e habilidades dessas crianças, diversificando e consolidando novas aprendizagens, atuando de maneira complementar à educação familiar”.

Considerando a aprendizagem de Matemática da Educação Infantil, a Resolução de Problemas se mostra como uma alternativa viável para o trabalho com as crianças. Onuchic e Allevato (2004) defendem a metodologia de Resolução de Problemas em Educação Matemática apontando que este trabalho tira o sujeito de uma postura passiva para torná-lo mais ativo e interessado na busca pelo conhecimento matemático. Na mesma direção, o trabalho com resolução de problemas rejeita a noção de que a Matemática é algo já pronto e a criança pode assumir uma posição de produtor de conhecimentos.

Um trabalho via resolução de problemas torna a criança protagonista das suas aprendizagens matemáticas, uma vez que se criam condições que privilegiem práticas desafiadoras e reflexivas por meio de um engajamento ativo ao pensar nas atividades propostas. Sobre a habilidade de resolver problemas, Smole, Diniz e Cândido (2003a), salientam que:

Essa habilidade é importante não apenas para a aprendizagem de matemática, mas também para o desenvolvimento de suas potencialidades em termos de inteligência e cognição. Por isso, acreditamos que a resolução de problemas deva estar presente no ensino de matemática em todas as séries escolares, não só pela sua importância pela forma de desenvolver várias habilidades, mas especialmente por possibilitar ao aluno a alegria de vencer obstáculos criados por usa própria curiosidade, vivenciando assim, o que significa fazer matemática (SMOLE, DINIZ, CANDIDO, 2003, p. 13).

Pensar em situações que são problemas para as crianças vai além da ideia de propor problemas “padrão”, nos quais há uma sentença a ser lida pelo indivíduo e se espera uma resposta escrita. Na Educação Infantil os problemas propostos ganham outra configuração, visto que as crianças são estimuladas a pensar sobre situações que têm significado para elas.

Além disso, o ato de resolver um problema deve levar às crianças situações que se configurem como tal. Para Diniz (2001, p. 89), a resolução de problemas “[...] trata de situações que não possuem solução evidente e que exigem que o resolvedor combine seus conhecimentos e decida pela maneira de usá-los em busca da solução”. Nesse sentido, a resolução de problema se diferencia de ações e questionamentos que possuem soluções evidentes às crianças.

Vale ressaltar que ações cotidianas e mais corriqueiras têm valor para a Educação Infantil, visto que podem surgir outras tantas experiências destes contextos do dia a dia, mas cabe aos adultos ampliar as vivências e sugerir novos desafios às crianças, os quais podem se configurar como problemas. Sobre o ato de resolver problemas, Brito (2010) salienta que uma característica da situação problema é sua idiossincrasia, logo, uma situação pode ser problema para algumas crianças e para outras não.

Considerando a diversidade inerente dentro de qualquer turma de Educação Infantil, uma situação que não seja desafiadora para uma criança, pode ser um problema para outra e as crianças poderão, em um trabalho colaborativo, compartilhar conhecimentos nessas práticas cotidianas.

Para o desenvolvimento deste trabalho, adotou-se a definição de solução de problemas apresentada por Brito (2010). Para a autora:

A solução de problemas é entendida como uma forma complexa de combinação dos mecanismos cognitivos disponibilizados a partir do momento em que o sujeito se depara com uma situação para a qual precisa buscar alternativas de solução. Pode ser definida como um processo cognitivo que visa transformar uma dada situação em uma situação dirigida a um objetivo, quando um método óbvio de solução não está disponível para o solucionador, apresentando quatro características básicas: é cognitiva, é um processo, é dirigida a um objetivo e é pessoal, pois depende do conhecimento prévio do indivíduo (BRITO, 2010, p. 20).

Desta forma, podemos compreender a resolução de problemas matemáticos para Educação Infantil como uma ação que abrange aspectos cognitivos, envolve mobilização de conhecimentos matemáticos na sua solução, sendo dirigida a um objetivo que tenha sentido para a criança, bem como é pessoal e se desenvolve dentro de um determinado contexto de interações.

Taxa (2006, p. 77) afirma que:

O conteúdo matemático, por meio da solução de problemas, deve ser entendido como uma forma de linguagem que favoreça o desenvolvimento de uma série de conceitos fundamentais e de forma articulada, a fim de instrumentalizar o sujeito para a vida e o desenvolvimento do raciocínio.

A autora ainda complementa que é preciso compreender a resolução de problemas matemáticos como uma vivência que proponha ações desafiadoras às crianças e não pode ser confundida como uma ação repetitiva que envolve relações quantitativas.

Nesse contexto, destacamos que as crenças de autoeficácia no trabalho com resolução de problemas têm importância relevante. Na próxima seção, é apresentado um diálogo sobre a teoria da autoeficácia docente e suas contribuições para interpretar aspectos do trabalho docente.

3. A autoeficácia e o trabalho docente

Os principais estudos sobre autoeficácia são oriundos da Teoria Social Cognitiva (TSC), elaborada pelo psicólogo canadense Albert Bandura. Para este autor, o ser humano possui capacidade de controlar suas ações tendo como princípio fundamental a perspectiva da agência humana. Para Bandura (2008, p. 15), “ser agente significa influenciar o próprio funcionamento das circunstâncias de vida de modo intencional”.

Complementarmente, Azzi (2014, p. 29) explica que:

O indivíduo tem a possibilidade de intervir no seu ambiente, alterando-o e sendo por ele alterado já que, segundo a visão sociocognitivista, os indivíduos são produto e produtores do ambiente social em que vivem. Por meio de um movimento dinâmico e bidirecional entre indivíduo e sociedade, forma-se a individualidade das pessoas.

Nesta teoria, o autodesenvolvimento e a mudança de comportamento humano são explicados a partir da perspectiva da agência. Torisu (2010, p. 19) amplia a discussão sobre agência explicitando que:

ser agente significa ser capaz de desenvolver mecanismos de autorregulação que poderão determinar o caminho a ser seguido. Em outras palavras, ser agente significa ser capaz de fazer as coisas acontecerem de modo intencional. O indivíduo pode interferir no curso dos acontecimentos de acordo com o seu interesse. Ele é um participante ativo dos rumos que sua vida irá tomar, uma vez que estabelece metas que serão alcançadas através de trajetórias escolhidas por ele mesmo. Ele não sofre as influências do meio de forma passiva.

Para Bandura (1997), o indivíduo pode atuar no meio em que vive alterando-o ou sendo alterado por ele. A maior parte do comportamento humano é resultado dessas interações e a agência do ser humano é uma explicação para o papel produtor do indivíduo na sua relação com o meio.

Nós agimos no sentido de gerar resultados desejados, contudo, Bandura (1997, 2008) afirma que a decisão de agir ou não agir depende da crença que temos a respeito da nossa capacidade de executar com sucesso a ação pretendida e essa crença ou expectativa chama-se autoeficácia. Ao definir autoeficácia, Bandura (1997, p. 3) afirma que “A autoeficácia percebida refere-se às crenças de alguém em sua capacidade para organizar e executar os cursos de uma ação requeridos para produzir certas realizações”.

Podemos dizer que a autoeficácia é a base da motivação na agência dos seres humanos. Ela influencia nas escolhas que fazemos perante a uma tarefa, nos esforços que dedicamos a ela, na quantidade tempo que será dedicado em alguma ação e na persistência em realizá-la diante das dificuldades enfrentadas.

Sobre a importância da autoeficácia, Bandura (2000, p. 2) esclarece que:

a autoeficácia percebida ocupa um papel central na estrutura causal porque ela afeta o comportamento, não diretamente, mas pelo impacto que ela tem em outros determinantes, tais como metas e aspirações, expectativa de resultado, tendências afetivas, percepção dos impedimentos socioestruturais e estruturas de oportunidades.

O autor acredita que as crenças de autoeficácia influenciam diretamente o modo de pensar das pessoas, seja no otimismo ou no pessimismo em relação aos eventos, em que ação eles escolhem para realizar seus objetivos, em seu empenho pessoal, nas suas expectativas de resultado a partir do esforço empregado etc.

No âmbito das investigações sobre crenças de autoeficácia, vários estudos têm sido realizados a fim averiguar estas crenças (PAIVA E DEL PRETTE, 2009; BZUNECK; GUIMARÃES, 2010; CAPELO; POCINHO, 2014; FERREIRA, 2014).

Azzi e Vieira (2014, p. 37) apontam vários fatores que acabam influenciando nas crenças de autoeficácia do professor e explicam que:

Assim, na perspectiva da docência, autoeficácia contribui para a determinação de como os professores se sentem, pensam, automotivam-se e comprometem-se em relação aos seus pensamentos, ao contexto que vivenciam e as ações que realizam no cotidiano da prática docente ao desempenharem as tarefas ligadas ao processo ensino-aprendizagem no âmbito escolar e em muitos casos extraescolar.

Quando os professores apresentam crenças de autoeficácia mais baixas eles encontram mais dificuldades para lidar com desafios do cotidiano docente, além de apresentarem níveis maiores de estresse relacionado ao trabalho (BETORET, 2006).

Por outro lado, Schwarzer e Schmitz (2004) salientam que professores com crenças de autoeficácia elevadas tendem a acreditar que sempre é possível conseguir os meios necessários para proporcionar aprendizagens às crianças. Além disso, esses docentes tendem a ter mais iniciativa e a ser agentes de mudanças. Esses professores tendem a acreditar mais na sua responsabilidade com relação ao seu crescimento profissional, enfrentando as dificuldades que surjam no curso de suas ações.

Neste artigo, utilizamos este referencial teórico para elaborar instrumentos que possibilitaram interpretar as crenças de autoeficácia de professoras da Educação Infantil, bem como conhecer suas percepções sobre a o trabalho com resolução de problemas.

4. Procedimentos Metodológicos

Esta pesquisa foi desenvolvida em duas etapas, sendo a primeira de cunho quantitativo e a segunda de caráter qualitativo.

Ferreira (2015, p. 118) reforça a condição complementar entre esses dois métodos quando afirma que “na verdade, as duas abordagens de pesquisa — qualitativa e quantitativa — são convergentes em muitas pesquisas científicas realizadas, sendo o contexto o elemento definidor de qual caminho seguir, ou seja, em qual dos aspectos será colocada uma ênfase maior”.

Para autores como Dal-Farra e Lopes (2013), o uso das metodologias qualitativa e quantitativa possibilita explorar as potencialidades de cada abordagem envolvida quando são consideradas as especificidades de cada um destes tipos de pesquisa. O que demanda a utilização de ambos os métodos são as características do problema de pesquisa que, no caso deste estudo, é melhor explorado por meio de ambos os métodos.

Cabe destacar que ambos os métodos contribuíram complementarmente para a investigação do problema de pesquisa. Neste artigo são apresentados os resultados obtidos por meio de dois instrumentos: uma escala de autoeficácia docente quanto ao trabalho com a Matemática na Educação Infantil e um questionário respondido pelas docentes participantes da pesquisa.

4.1. A escala de autoeficácia

Para esta pesquisa, foi construída e validada uma escala de autoeficácia que foi respondida por 115 professoras de Educação Infantil. Este instrumento é composto por 10 (dez) itens, sendo 5 (cinco) afirmações positivas e 5 (cinco) negativas. Trata-se de uma escala em que se usa um método somativo para averiguar a pontuação dos sujeitos frente à escala.

As afirmações positivas são as seguintes:

  1. 1. Eu tenho segurança de que consigo trabalhar conceitos matemáticos com as crianças.

    3. Eu tenho segurança de que tenho conhecimento suficiente sobre Matemática para planejar atividades que envolvam conhecimentos matemáticos para as crianças.

    5. Eu tenho segurança para trabalhar conceitos que envolvem grandezas e medidas com crianças.

    7. Eu tenho segurança para pensar em formas de envolver as crianças com os conhecimentos matemáticos.

    10. Eu tenho segurança para avaliar as situações nas quais as crianças lidam com resolução de problemas envolvendo conhecimentos de Matemática.

Já as afirmações negativas, foram as seguintes:

  1. 2. Eu não tenho segurança de que consigo trabalhar resolução de problemas envolvendo conhecimentos de Matemática com as crianças.

    4. Eu não tenho segurança para trabalhar com os números nas atividades com as crianças.

    6. Eu não tenho segurança de que posso trabalhar conceitos de geometria e orientação espacial com crianças.

    8. Eu não tenho segurança para elaborar problemas envolvendo conceitos matemáticos para as crianças.

    9. Eu tenho segurança para planejar situações-problema envolvendo conhecimentos de matemáticos com o cotidiano das crianças.

Esta escala é do tipo Likert, a qual é caracterizada por possuir pontuações para cada uma das respostas dadas às questões. Escalas desta natureza foram utilizadas em outros estudos, abordando diferentes componentes do ensino da Matemática (COUTINHO, 2020; SANTANA, 2019; PINHEIRO, 2018; SANDER, 2018). Para cada resposta dada, foram atribuídos pontos que variavam de 1 a 4, sendo as opções “concordo totalmente”, “concordo”, “discordo” e “discordo totalmente”, seguindo a seguinte lógica:

Tabela 1
Pontuações nas de autoeficácia
Valor da alternativa Afirmação positiva Afirmativa negativa
Concordo totalmente 4 1
Concordo 3 2
Discordo 2 3
Discordo totalmente 1 4
Fonte: Tortora (2019)
Fonte: Tortora (2019)

A partir da pontuação obtida na escala, foi calculada a média da pontuação de todos os participantes e este valor foi usado como parâmetro para afirmar se as professoras tendiam a ter crenças de autoeficácia positivas ou negativas em relação à Matemática. Aquelas professoras que tiveram uma pontuação acima da média foram consideradas participantes que tendem a ter crenças de autoeficácia mais positivas em relação ao trabalho com Matemática na Educação Infantil, enquanto as professoras que tiveram uma pontuação abaixo da média, tenderam a ter crenças de autoeficácia mais desfavoráveis ao trabalho com Matemática na Educação Infantil.

É importante observar que cada item ressalta uma característica do trabalho com a matemática. Destaca-se o item 8, o qual trata de crenças sobre elaborar problemas para as crianças e o item 9 que diz respeito ao planejamento dessas situações para as crianças.

4.2. Questionário

O questionário foi construído com 18 questões divididas em três categorias: “Sentimentos em relação à matemática”, “Matemática” e “Trabalho com a matemática na Educação Infantil”.

Nesse artigo, são apresentadas as análises de duas questões que fizeram parte do questionário e que auxiliaram na compreensão das crenças de autoeficácia das professoras participantes, sendo elas: A-) “Você se sente seguro para elaborar problemas envolvendo Matemática para crianças da Educação Infantil? Por quê?” B-) “O que é um problema de matemática para uma criança da Educação Infantil?”.

Para a questão A, foram obtidas respostas do tipo “sim”, “não” e “neutras”, nesta última apresentando docentes que se declararam indiferentes com o questionamento.

Para a questão B, as respostas das professoras puderam ser agrupadas em seis categorias:

  1. · Situações do cotidiano da Educação Infantil: situações que as professoras julgaram ser cotidianas ou simples para as crianças e que não necessariamente seriam problematizadoras sob a ótica do referencial teórico da pesquisa.

    · Situações de pensar, raciocinar e refletir: situações que foram respondidas pelas professoras com frases mais curtas em que esses três verbos se fizeram presentes.

    · Algo que precisa de um resultado: situação em que haveria alguma ação na qual a criança deveria buscar uma solução.

    · Um aprendizado: Algo que gerasse alguma aprendizagem para as crianças.

    · Desafio: situação mais próxima de um problema conforme defendido no referencial teórico adotado. Seria uma ação diferente, a qual pode estar presente no cotidiano, mas a criança estaria mobilizada a encontrar uma solução e o processo de resolução do problema geraria aprendizados.

    · Algo que não deve ser trabalhado com as crianças; Situação em que o trabalho com resolução de problemas poderia ser prejudicial ao desenvolvimento das crianças.

A fim de exemplificar as falas das professoras nas questões A e B, apresentam-se algumas das respostas dadas pelas docentes na descrição dos resultados. Estas respostas foram escolhidas aleatoriamente e servem para ilustrar e reforçar a ideias presentes a categorização das questões.

Participaram desta pesquisa 115 professoras da rede pública de município de Campinas que trabalham em Centros de Educação Infantil administrados pela Secretaria Municipal de Educação. As professoras foram informadas sobre os objetivos da pesquisa e assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido aceitando participar desta pesquisa.

Após a resposta às escalas de autoeficácia, foi solicitado que as professoras respondessem ao questionário, o qual foi aplicado por meio eletrônico. Porém, das 115 professoras que responderam à escala, 55 docentes aceitaram responder ao questionário.

5. Resultados

A escala de autoeficácia mostrou que as professoras têm crenças de autoeficácia que tendem ser mais positivas. O Gráfico 1 mostra a distribuição dos participantes de acordo com as pontuações obtidas nesse instrumento.

Pontuação das professoras na escala de autoeficácia
Gráfico 1
Pontuação das professoras na escala de autoeficácia
Tortora (2019)

A pontuação mínima que poderia ser obtida na escala era de 10 pontos e a máxima era de 40 pontos. A média referente às respostas dadas pelas professoras é de 29,45 pontos, com desvio padrão de 5,134. Como critério para averiguar se as crenças de autoeficácia estão altas ou baixas, foi estipulado que pontuações acima da média demonstram crenças de autoeficácia mais positivas e, aquelas abaixo da média demonstram crenças mais negativas, seguindo os procedimentos utilizados em outros estudos como os de Sander (2018), Pinheiro (2018) e Santana (2019).

Nota-se que 67 professoras apresentaram pontuação maior que 29,45 pontos, ou seja, 58,3% das participantes apresentam crenças de autoeficácia mais elevadas em relação às outras professoras do grupo. Esse resultado ilustra um resultado semelhante ao de Cocca at al. (2018), o qual aponta que a maioria dos docentes da sua pesquisa apresentava pontuações mais elevadas em escalas de autoeficácia matemática.

Cada um dos itens da escala de autoeficácia, quando analisado separadamente, apontou parâmetros para análises aprofundadas. Dois itens desta escala abordaram questão do trabalho com a resolução de problemas, são eles: itens 8 (oito) e 9 (nove). Na tabela a seguir está representada a frequência de respostas das professoras nestes itens.

Tabela 2
Frequência de respostas das professoras com relação as afirmações negativas na Escala de Autoeficácia
Afirmações 8 e 9 da escala de autoeficácia Frequência das respostas
Discordo Totalmente Discordo Concordo Concordo Totalmente
N % N % N % N %
8 Eu não tenho segurança para elaborar problemas envolvendo conceitos matemáticos para as crianças. 20 17,39% 64 55,65% 31 26,96% 0 0,00%
9 Eu não tenho segurança para planejar situações-problema envolvendo conhecimentos de matemáticos com o cotidiano das crianças. 25 21,74% 68 59,13% 22 19,13% 0 0,00%
N - Número de participantes que assinalaram a alternativa
Fonte: Tortora (2019)

Chama atenção que estes itens são aqueles em que as professoras tiveram crenças de autoeficácia mais positivas, os quais fazem menção à resolução de problemas na Educação Infantil. No item 8, somadas as porcentagens “discordo” e “discordo totalmente” temos 73,04% de crenças positivas e, no item 9, somadas as porcentagens das alternativas “discordo” e “discordo totalmente” (por se tratar de uma afirmação negativa), obtém-se 80,87% das respostas.

Tais resultados corroboram as respostas obtidas nos questionários, no qual as professoras foram questionadas sobre sua postura como agente problematizadora de situações que abordam conhecimentos matemáticos. Tal questionamento foi abordado na seguinte pergunta: “Você se sente seguro para elaborar problemas envolvendo Matemática para crianças da Educação Infantil? Por quê?”.

A questão tinha a intenção de investigar crenças de autoeficácia autodeclaradas para elaborar problemas envolvendo Matemática para Educação Infantil. O gráfico a seguir representa as proporções das respostas das professoras.

Crenças de autoeficácia autodeclaradas para
elaborar problemas envolvendo Matemática para Educação Infantil
Gráfico 2
Crenças de autoeficácia autodeclaradas para elaborar problemas envolvendo Matemática para Educação Infantil
Tortora (2019)

As respostas das professoras ilustram sua segurança na execução dessa tarefa. Das 55 professoras que responderam ao questionário, 31 docentes sentem-se seguras para tanto e 21 professoras declararam que não se sentem seguras para problematizar situações envolvendo matemática para as crianças.

Tais resultados dão indícios sobre o grupo estudado, mostrando que há uma predominância de docentes que declaram ser confiantes para um trabalho com problematizações com a matemática. De acordo com a literatura estudada, considera-se importante que as professoras tenham autoeficácia docente positivas, pois isso pode influenciar na motivação deles para o ensino e, por conseguinte, também influenciar nas crenças de autoeficácia dos alunos (PINHEIRO, 2019; SANTANA, 2019).

Por meio de uma análise qualitativa das respostas das professoras sobre os porquês destes sentimentos, as docentes apontam razões bastante diversas. Algumas delas não explicitaram os porquês de se sentirem seguras, mas apresentaram formas de contemplar a resolução de problemas nos seus planejamentos, como em brincadeiras e práticas cotidianas (“buscando direcionar estes problemas de forma lúdica e com finalidade”, “brincando sempre, para que cresçam seguros também” ou “Porque com a criança pequena, trabalhamos o concreto, o lúdico, a brincadeira de maneira prazerosa e significativa”).

Outras professoras apontaram o que consideram ser benefícios dessa prática, como “porque auxilia no desenvolvimento do raciocínio lógico das crianças” ou “A Matemática vai além da aprendizagem de números e contas”. Esta questão gerou uma diversidade grande de respostas que apontam possíveis fontes de autoeficácia positivas e que variam para cada uma das professoras. A seguir, são descritas algumas falas das professoras sobre o porquê de trabalhar com resolução de problemas com as crianças:

  1. 1- Faço isso com certa frequência.

    2- Não acho que seja difícil e complicado fazer isso.

    3- Porque procuro preparar as atividades de acordo com a faixa etária da criança.

    4- Sim, porque auxilia no desenvolvimento do raciocínio lógico das crianças

    5- Porque tenho o conhecimento necessário e procuro me atualizar sempre

    6- Pois a Matemática está em tudo.

    7- Porque são conteúdos que tenho compreensão

    8- Me sinto segura se for em forma de brincadeiras.

    9- Porque direciono estes problemas de forma lúdica e com finalidade.

    10- Sim, pois estou sempre lendo e refletindo sobre a temática com crianças pequenas

    11- Acredito que sim, principalmente porque parte de situações reais e não imaginárias que o resultado não vai servir para nada.

    12- A partir do contexto de nossas vivências significativas.

    13- De forma lúdica pode desencadear outros conhecimentos e experiências.

Essas respostas dão indícios do que Schillinger (2016) já destacava nas conclusões do seu estudo, no qual afirma que há uma variedade grande de motivos para o desenvolvimento de crenças de autoeficácia e que estão relacionadas com as percepções individuais construídas ao longo de sua prática e de sua formação. O autor também afirma que, ao longo tempo e com o ganho de experiência, as crenças de autoeficácia do trabalho docente tendem a ficar mais positivas, o que influencia nas suas estratégias de ensino.

Até então, com base nos resultados da escala e do questionário, podemos inferir que estamos trabalhando com um grupo de professoras que se mostra com crenças de autoeficácia mais positivas. Apesar do número de professoras que respondeu ao questionário ser uma parte do grupo que respondeu à escala, percebe-se que a maioria das docentes declara ter crenças mais positivas para problematização de conhecimentos matemáticos para as crianças.

Analisando esse grupo de 55 professoras que respondeu ao questionário e com a intenção de entender algumas de suas percepções sobre o trabalho com resolução de problemas na Educação Infantil, percebemos que o grupo apresentou compreensões que divergem daquelas apresentadas no referencial teórico e se aproximam mais do senso comum.

Tais constatações puderam acontecer ao analisar a questão “O que é um problema de matemática para uma criança da Educação Infantil?” Percebemos que as respostas das professoras podem ser agrupadas em seis categorias, sendo: “Situações do cotidiano da Educação Infantil”, “Situação de pensar, raciocinar e refletir”, “Algo que precisa de um resultado”, “Um aprendizado”, “Desafio” e “Algo que não deve ser trabalhado com crianças”. A frequência das respostas é apresentada no gráfico 3.

Respostas das professoras a questão “O que é um
problema de matemática para uma criança da Educação Infantil?”
Gráfico 3
Respostas das professoras a questão “O que é um problema de matemática para uma criança da Educação Infantil?”
Tortora (2019)

Percebemos que 13 professoras apresentaram respostas relacionadas à categoria “desafio”, as quais apresentaram ideias de problema como uma situação nova e desafiadora. Trata-se das ideias mais próxima a que Brito (2010, p. 20) apresenta sobre uma situação problema.

Pode ser definida como um processo cognitivo que visa transformar uma dada situação em uma situação dirigida a um objetivo, quando um método óbvio de solução não está disponível para o solucionador, apresentando quatro características básicas: é cognitiva, é um processo, é dirigida a um objetivo e é pessoal, pois depende do conhecimento prévio do indivíduo.

A maioria das professoras (25) apontou que problemas são situações cotidianas das crianças na Educação Infantil citando exemplos, como jogos, brincadeiras, contar outras crianças etc. As respostas das professoras puderam ser agrupadas nesta categoria pois foram muito semelhantes as seguintes afirmações: “Algo ligado ao concreto, com situações do cotidiano... compreensível para ela", “São muitos... dividir os brinquedos com os colegas, por exemplo. Coisas do dia a dia.”, “Várias situações rotineiras, desde a roda inicial que ela consegue identificar quantos vieram, quantos faltaram etc.”.

As situações que se configuram como “desafio” apareceram em segundo maior número entre as professoras (13). Nesse caso as respostas elementos que se aproximam da concepção defendida no referencial teórico como: “Situações de desafio e superação”, “Deve ser um desafio! Tudo que a instiga à descoberta”, “Deve ser um grande desafio para a criança”, etc.

Uma terceira categoria é a que faz menção às “situações de pensar, raciocinar e refletir”, nas quais aparecem respostas como: “Tudo o que envolve raciocínio”, “Lidar com situações que precisam de raciocínio e curiosidade”, “Algo para estimular o raciocínio lógico” etc.

A quarta e a quinta categorias que aparecem têm três professoras em cada uma delas, sendo “um aprendizado” e “algo que precisa de um resultado”. Aqui aprecem respostas bem pontuais que dizem que resolver problemas é uma oportunidade para aprender e algo que demanda um resultado.

Por fim, uma professora se manifestou dizendo que esse tipo de conhecimento deve ser evitado, por meio da resposta “Acredito que devemos evitar e explorar outras linguagens, aspectos e saberes mais significativos nessa fase, como a formação da personalidade, cidadania, resiliência, ética, interações, artes etc.”.

De fato, o problema pode ser uma situação cotidiana e exigir pensamento, raciocínio e reflexão, porém o seu grau desafiador deve ser levado em conta para que se configure como um problema desencadeador de aprendizagens. Segundo Smole, Diniz e Cândido (2000, p. 13), devemos orientar práticas de aprendizagem da Matemática das crianças para a resolução de problemas, “não só pela sua importância como forma de desenvolver várias habilidades, mas especialmente por possibilitar a alegria de vencer obstáculos criados por sua própria curiosidade, vivenciando, assim, o que significa fazer matemática”.

Observando que a Resolução de Problemas é um recurso valioso para a aquisição de um raciocínio relacionado a produção de conhecimentos matemáticos, é importante que as professoras saibam diferenciar uma situação problema de outras atividades do dia a dia para poder oportunizar situações problematizadoras às crianças.

6. Considerações finais

Este artigo teve por objetivo interpretar as crenças de autoeficácia de professoras da Educação Infantil e suas percepções sobre resolução de problemas frente ao trabalho com conhecimentos matemáticos nas práticas com as crianças

Por meio da escala de autoeficácia percebemos que a maioria das professoras apresentou crenças de autoeficácia positivas para o trabalho com resolução de problemas. O mesmo resultado foi obtido no questionário, no qual a maioria das professoras que declararam crenças de autoeficácia positivas quanto ao mesmo objeto.

Uma análise qualitativa dos questionários mostrou que a ideia de “problema” das professoras se distancia do que a literatura e documentos curriculares preconizam. A maioria das docentes apontou definições relacionadas a quaisquer situações do cotidiano ou meras perguntas a serem respondidas pelas crianças, bem como outras situações que abordam o raciocínio lógico, pensamento ou reflexão.

Em síntese, observando as respostas das professoras nos instrumentos aqui apresentados, é possível inferir que as docentes têm crenças de autoeficácia positivas com relação ao trabalho com resolução de problemas e matemática, as quais podem ser percebidas pela escala de atitudes e também foram declaras pelas professoras nos questionários. Porém, as respostas dadas pelas professoras nos questionários parecem divergir quanto ao referencial teórico sobre Resolução de Problemas.

Esses resultados mostraram que, apesar das crenças de autoeficácia positivas com relação ao trabalho com resolução de problemas, muitas das professoras não apresentaram percepções sobre resolução de problemas que corroboram a literatura e os documentos oficiais apontam para um trabalho envolvendo resolução de problemas.

Defendemos nessa pesquisa o caráter desafiador do problema. Logicamente, esse caráter desafiador não deve ser algo que vá muito além das capacidades das crianças, mas também não pode ser algo situado dentro de uma na zona de conhecimentos na qual a criança já atua com facilidade. A situação problema deve mobilizar um certo esforço cognitivo, dentro das características do resolvedor do problema, que o leva a responder à questão e, desta forma, adquirir um novo conhecimento.

Existem diversas formas para se propor esse tipo de prática por meio de brincadeiras, por exemplo que vão desde as mais tradicionais, como a amarelinha, até as algumas mais modernas envolvendo softwares de computador ou aplicativos em tablets e celulares, mas o caráter desafiador (na perspectiva da criança) é característica essencial desse trabalho.

Esses resultados indicam que, aliadas às políticas de formação que objetivem o desenvolvimento de crenças de autoeficácia positivas com relação à Matemática na Educação Infantil, deve-se planejar momentos de discussão e reflexão sobre o significado que o trabalho com resolução de problemas se propõe.

Para finalizar, vale a pena ressaltar algumas dúvidas que surgiram durante as análises feitas nesse trabalho e que podem suscitar outras investigações: as crenças de autoeficácia mais positivas inibiriam as professoras de buscar formação para o trabalho com resolução de problemas, visto que já se consideram entendedoras do assunto? De onde surgiram as percepções sobre resolução de problemas das professoras? As professoras já tiveram formação específica para o trabalho com resolução de problemas matemáticos na Educação Infantil? Pesquisas futuras podem ser desenvolvidas aprofundando-se em análises qualitativas que possam auxiliar na compreensão dessas questões.

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Notas

[3] Todas as participantes da pesquisa identificam-se como sendo do gênero feminino, portanto foi utilizada a palavra “professora” ao longo do texto ao referir-se às participantes da pesquisa.

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